Proc. nº 157/2020
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdao: 19 de Março de 2020
Descritores:
- Marcas
- Essencialidade dos elementos
- Confusão e imitação
SUMÁRIO:
Quando a lei quer evitar a confusão de marcas, não está senão a pensar na semelhança, na parecença, na essencialidade dos pontos comuns ou de contacto e, portanto, na primeira impressão ou na impressão do momento que se colhe de uma e doutra, mais do que nas suas dissemelhanças. E isso tanto irá depender do aspecto gráfico, nominativo, figurativo, como também do fonético dos seus elementos (art. 215º, nº1, al. c), RJPI).
Proc. nº 157/2020
Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM
I – Relatório
“A”, sociedade constituída nos Estados Unidos da América, com sede em XXX, Estados Unidos da América (doravante, a “Recorrente”), ---
Recorre judicialmente para o TJB (Proc. nº CV3-19-0002-CRJ) ---
Do despacho da Direcção dos Serviços de Economia (“DSE”), publicado no BO n.º 51, II Série, de 19 de Dezembro de 2018, que concedeu o registo da marca N/118197 (classe 43) cujo pedido foi apresentado por “B Ltd.”, com sede em XXX, Australia..
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Na oportunidade foi proferida sentença, que julgou procedente o recurso, revogou a decisão administrativa e determinou o indeferimento do registo da marca em causa.
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É contra esta sentença que ora vem interposto o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações a contra-interessada “B Ltd.” formulou as seguintes conclusões:
a) Por douta sentença datada de 10 de Julho de 2019, foi o recurso interposto pela ora Parte Contrária, julgado procedente e decidido revogar o despacho da Chefe do Departamento de Propriedade Industrial da DSE que concedeu o registo da marca N/118197, na classe 43.
b) O Tribunal a quo entendeu que as marcas em causa (a marca “” da Recorrente e as marcas registadas da Parte Contrária) são semelhantes, sendo que os elementos adicionais de que a marca registanda é dotada não lhe confere diferenciação suficiente para afastar imitação, considerando igualmente que os demais elementos que compõe as marcas são de natureza meramente acessória.
c) No entender da Recorrente, basta uma simples análise comparativa para se perceber que as marcas são diferentes quer sob ponto de vista nominativo e visual, quer conceptual.
d) Enquanto a Parte Contrária e o Tribunal a quo defendem essencialmente que os sinais são semelhantes devido à presença gráfica da letra “W”, a Recorrente realça que o “W” utilizado nos sinais em confronto é substancialmente diferente.
e) O utilizado na marca da Parte Contrária é um “W” maiúsculo sem qualquer estilização, o que o torna um sinal dotado de fraca capacidade distintiva.
f) Enquanto a marca registanda da Recorrente é registanda é uma marca muito mais complexa e elaborada do que as da Parte Contrária, dotada de forte componente figurativa e, como facilmente se observa, com elevada capacidade distintiva, sendo composta por vários elementos nominativos e visuais diferenciadores relevantes que lhe conferem forte distintividade e a diferenciam das marcas da Parte Contrária.
g) Pelo que dificilmente o consumidor irá alguma vez confundir a origem comercial de ambas as marcas.
h) A Recorrente contesta também a afirmação do Tribunal a quo de que estamos perante marcas nominativas.
i) Com efeito, não estamos perante marcas nominativas: enquanto as marcas da Parte Contrária são, efectivamente, marcas nominativas, a marca registanda da Recorrente é uma marca mista
j) Por outro lado, refuta-se igualmente o entendimento do Tribunal a quo de que se deve desconsiderar tudo o que demais compõe a marca registanda e duas das marcas registadas pela sua natureza meramente acessória.
k) Ora, enquanto o elemento acessório das marcas da Parte Contrária - “hotels” - é, por si, um elemento descritivo, fraco, do qual não é concedido uso exclusivo à Parte Contrária, o elemento “XXX” da marca da Recorrente é, por si, um elemento dotado de capacidade distintiva.
l) Com efeito, foi concedido o registo da marca “XXX” à Recorrente em várias classes, incluindo na classe 43, não se podendo, portanto, pode aceitar o entendimento do Tribunal a quo de que “XXX” é um elemento meramente acessório.
m) Enquanto marca mista ambos os elementos da marca registanda são parte integrante desta, pelo que a marca não deverá ser dissecada e analisada elemento a elemento, mas deverá ser tida como um todo.
n) Por outro lado, e realçando o entendimento de Luís Couto Gonçalves enquanto a marca da Parte Contrária poderia não ter sido concedida (pois concebe-se a hipótese de impossibilidade de monopolização de uma letra do alfabeto), a marca registanda da Recorrente é, em si, dotada de forte capacidade distintiva como marca, visto que estamos perante um sinal gráfico complexo.
o) A Recorrente realça, mais uma vez, que “XXX” não é uma cidade australiana ou uma localidade, mas sim uma propriedade privada localizada em Queensland
p) Por outro lado, a Recorrente tem ainda a sua marca registada em várias jurisdições, inclusivamente em locais onde a Recorrente indica ter hotéis, pelo que é evidente que a marca da Recorrente não apenas detém capacidade distintiva inerente, como pode co-existir com as marcas da Parte Contrária sem haver qualquer possibilidade de confusão pelo consumidor.
q) A marca registanda é assim composta por vários elementos individualizadores relevantes que contribuem para que seja um sinal dotado grande individualidade e forte capacidade distintiva, facilmente diferenciável das marcas anteriores da Recorrente.
r) Deverá então concluir-se que as marcas em questão são manifestamente diferentes entre si e que as suas diferenças são (mais que) suficientes para que os consumidores distingam facilmente as marcas entre si, os serviços que assinalam e a respectiva origem comercial.
s) A marca registanda constitui, sem margem para dúvidas, um sinal com capacidade distintiva própria, por ser composta pela combinação de elementos nominativos e figurativos que, no cômputo geral, lhe atribuem identidade e forte capacidade distintiva, um sinal novo e diferente dos sinais anteriores da Recorrente.
t) Sendo assim evidente que o terceiro requisito de imitação plasmado no artigo 215.º não se encontra preenchido, pelo que deverá ser revogada a decisão do Tribunal a quo, e mantida a decisão de concessão de marca da DSE.
IV. DO PEDIDO
Nestes termos e contando com o douto suprimento de Vossas Excelências, Venerandos Juízes, requer-se, muito respeitosamente, seja considerado procedente o presente Recurso e, em consequência a sentença recorrida ser revogada, dessa forma se concedendo a marca registanda à Recorrente, como é de JUSTICA!”
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A entidade administrativa limitou-se a oferecer o merecimento dos autos.
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A recorrente judicial respondeu ao recurso jurisdicional, apresentando as seguintes conclusões:
“A. A Recorrida, A interpôs recurso da decisão do despacho do Chefe do Departamento de Propriedade Industrial da Direcção dos Serviços de Economia uma vez que a decisão em conceder o registo da marca N/118197 à ora Recorrente continha óbvios erros na aplicação do Direito.
B. Recurso esse que foi considerado procedente, revogando o despacho que concedeu o registo da marca N/118197, na classe 43.
C. O Tribunal a quo considerou correctamente que existia semelhança entre as marcas sub judice, não existindo um grau de distinção bastante para assegurar que a inexistência de confusão por parte do consumidor.
D. Como ficou provado e sujeito a douta apreciação do Tribunal a quo, os requisitos previstos no artigo 215.º, n.º 1, do RJPI- que fundamentam a recusa do registo de marca com base na alínea b) do n.º 2 do artigo 214.º do RJPI – encontram-se verificados, não devendo a marca N/118197 ser registada em Macau.
E. Uma vez que as marcas da Recorrida se encontravam previamente registadas, e que as marcas em causa se destinam a assinalar produtos ou serviços idênticos, a verificação dos requisitos decorre de uma mero confronto dos documentos juntos aos autos.
F. Tal como foi feito pelo Tribunal a quo, comparando os sinais em crise no seu conjunto, facilmente se verifica que os mesmos causam a mesma impressão de conjunto no consumidor: não só por estar em causa o mesmo elemento principal “W”, mas sobretudo pela aparência geral das marcas, incluindo dimensão, posição, cor e estilo dos respectivos elementos.
G. O elemento predominante e distintivo das marcas em confronto é a letra “W”, que surge em destaque do ponto de vista gráfico - isolada, centrada e com dimensões bastante superiores às dos restantes elementos das marcas, pelo que é a mesma que ficará na memória visual dos consumidores, tendo em conta a impressão de conjunto das marcas.
H. Do ponto de vista cromático, existe uma enorme semelhança entre o pedido N/118197 da Recorrente e a marca N/26415 da Recorrida - os elementos das marcas em causa apresentam-se com letras em cores escuras sobre um fundo branco.
I. Os restantes elementos das marcas em questão - “HOTELS” e “XXX” -, por serem meramente genéricos e descritivos, são irrelevantes no conjunto da apreciação das marcas.
J. “Sinal descritivo é, normalmente, a denominação portuguesa ou estrangeira que indica, exclusiva e directamente, a produção (espécie, lugar e tempo), qualidade, quantidade, destino, valor, ou qualquer outra característica do produto ou serviço. Um sinal descritivo não é distintivo, na medida em que é comum aos objectos idênticos qualquer que seja a sua origem.” - pelo que tanto “HOTELS” como “XXX” consistem em sinais descritivos.
L. Os referidos substantivos situam-se por baixo da letra “W” e têm um tamanho de letra bastante reduzido relativamente àquela, pelo que quando o consumidor médio se deparar com qualquer das marcas em questão, certamente irá reter o elemento “W”, de grandes dimensões e com capacidade distintiva, em óbvio prejuízo das letras de tamanho muito reduzido que se encontram numa posição inferior (e, certamente, ilegíveis à distância).
M. O substantivo “XXX” não tem qualquer significado ou reconhecimento junto dos consumidores de Macau, pelo que este é um elemento sem percepção, compreensão e retenção pelo consumidor médio, sendo superficial e acessório na marca (para além da referida dimensão diminuta).
N. Assim decidiu o Tribunal a quo, que considerou “os demais elementos das marcas concorrentes são muito menos susceptíveis de interessar e impressionar a atenção do consumidor médio” [negritos e sublinhado nossos].
O. Considerando que a letra “W” é o elemento predominante da marca (notória, tal como a DSE e o próprio Tribunal a quo reconhecem, e até mesmo de prestígio), e que constitui um elemento distintivo, será sempre esse o elemento a memorizar por qualquer consumidor, independentemente do seu nível de atenção.
P. O Tribunal a quo entendeu haver semelhança entre os sinais em questão - nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 215.º do RJPI-, afirmando que “as marcas em causa são muito similares na sua componente leonina, sendo que o que se acrescenta na registanda [o pedido da ora Recorrente], no confronto com o que se acresenta (em apenas duas) nas registadas [as marcas da ora Recorrida], não confere àquela face a estas diferenciação suficiente para afastar a imitação”, e que “É fácil perceber qual o coração dos sinais em confronto, que se impõe, reina, dominando na sua individualização: W. Este sinal, W, no seu efeito fonético e ou visual/gráfico destaca-se patentemente, relegando o que demais que compõe a marca registanda [o pedido da ora Recorrente] e duas das marcas registadas [as marcas da ora Recorrida] pela sua natureza meramente acessória, portanto a desconsiderar na identificação das marcas em disputa.”
Q. Quanto à intenção da Recorrente em practicar actos de concorrência desleal, observe-se que, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º do RJPI, é fundamento de recusa “O reconhecimento de que o requerente pretende fazer concorrência desleal, ou que esta é possível independentemente da sua intenção”, pelo que não cabe à Recorrida demonstrar a intenção da Recorrente, pois a mera possibilidade de concorrência desleal é suficiente.
R. Acto de concorrência desleal é o acto de disputa de clientela que é contrário às normas e usos honestos da actividade económica, designadamente o que seja idóneo a criar confusão entre produtos ou serviços de diferentes agentes económicos e o que configure aproveitamento da reputação empresarial de outrem (cfr. artigos 158.º, 159.º e 165.º do Código Comercial).
S. A marca da Recorrente é claramente idónea a criar confusão nos consumidores (como foi, aliás, decidido pelo Tribunal a quo).
T. A Recorrente pode aproveitar-se da reputação que a Recorrida tem em Macau visto a sua marca “W” ser objecto de notoriedade e prestígio em Macau, em virtude do sucesso que a tornou numa das mais reconhecidas operadoras no sector da restauração e hotelaria em diversos mercados, incluindo na região da Ásia-Pacífico.
U. A Recorrente age de má-fé ao utilizar uma marca (notória e de prestígio) de um terceiro que se encontra previamente registada em Macau no âmbito da mesma actividade e para assinalar serviços idênticos. na mesma classe.
V. Uma vez que se encontram verificados todos os requisitos previstos no artigo 215.º, n.º 1, do RJPI- que fundamentam a recusa do registo de marca com base na alínea b) do n.º 2 do artigo 214.º do RJPI- deverá ser mantida a decisão do Tribunal a quo
Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente1 e, em consequência, ser mantida a decisão que revogou o despacho de concessão do registo da marca N/118197, com todas as consequências legais, nomeadamente quanto à protecção devida às marcas registadas da Recorrida.”
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Cumpre decidir.
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II – Os Factos
A sentença deu por assente a seguinte factualidade:
- A recorrente é titular das seguintes marcas:
Marca
Nº de Registo
Classe
Especificação
N/26415
43
Alojamento temporário; serviços de hotéis, serviços de motéis, serviços de pensões, serviços de pousadas; condução de eventos e fornecimento de instalações para reuniões e eventos; serviços de restaurante, bar, sala de estar, café e cocktail; serviços para fornecimento de comidas e bebidas; serviços de porteiro; fornecimento de instalações para reuniões e banquetes.
N/26605
43
N/15978
42
Hotel, motel, serviços de resort, serviços de reserva em hotéis, serviços de bar e restaurante, serviços de catering, serviços de preparação de comidas e bebidas, serviços de café e cafetaria, providenciar informação de eventos especiais relacionados com férias, providenciar instalações para conferências e reuniões, serviços de spa, nomeadamente providenciar acomodações e refeições temporárias para os clientes do spa de beleza ou de saúde, serviços de resort de saúde, nomeadamente o fornecimento de comida e acomodação especializados em promover os padrões gerais de saúde e bem-estar.
- A parte contrária requereu após o registo destas marcas o registo da seguinte marca:
N/118197
43
Serviços de restaurantes; serviços de acolhimento/hospitalidade (comida e bebida); preparação de comida e bebida; provisão de comida e bebida; serviços de bar; serviços de fornecimento de comida e bebida.
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III – O Direito
1. A sentença impugnada, na fundamentação utilizada, apresenta o seguinte teor:
“Dispõe o artº214º nº2 al.b) do RJPI que “O pedido de registo é recusado sempre que a marca ou algum dos seus elementos contenha: reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem, para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou que compreenda o risco de associação com a marca registada”.
As marcas em confronto são aquele primeiro supra plasmado face aos restantes três, em todos eles surgindo em destaca o sinal W.
Dispõe o artº197 do RJPI que “só podem ser objecto de registo ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números (….), que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas”.
Emerge deste enunciado legal, pois, que a marca deve, por definição e no cumprimento do seu escopo, ter relevantes capacidades distintivas, deve, pois, ser idónea per si, de individualizar uma espécie de produtos ou serviços.
Na marca concedida esta capacidade não está em causa, “longe disso”.
O que está em causa é a circunstância de a DSE entender que a marca registanda não corresponde a imitação das registada em nome da recorrente e supra plasmadas em 2º a 4º lugares, por conseguinte entendendo não se colocar em “crise” o princípio da novidade ou da exclusividade.
Este princípio corresponde, na expressão esclarecida de Pupo Correia, o mais importante e complexo requisito legal quanto à constituição das marcas, impondo, numa formulação positiva, “que a marca seja nova, i.e., que não constitua “reprodução ou imitação no todo ou em parte de marca anteriormente registada por outrem, para o mesmo produto ou serviço, ou produto ou serviço similar ou semelhante”. - Cfr. A. cit. in Direito Comercial, 10ª Ed., Ediforum, p.347
Numa perspectiva, digamos, negativa, temos, pois, como pressupostos da recusa, além da (1) reprodução ou imitação (….) de uma outra marca e da (3) sintonia dos produtos que ambas visam salvaguardar, a (3) existência de registo anterior.
No caso, o terceiro requisito está observado, sendo o segundo também patente, bastando para o efeito o confronto dos quadros supra plasmados: quer nas marcas registadas quer na registanda contemplam os serviços de restauração típicos de restaurantes, bares e ou hotéis.
Quanto ao primeiro diremos, liminar e peremptoriamente, que não estamos perante qualquer reprodução ou contrafacção.
Esta, a contrafacção ou reprodução, como parece claro, corresponde a uma cópia fiel, integral, isto é, o uso da marca anteriormente registada sem qualquer modificação – Cfr. A. e loc. cit. .
No caso é evidente que não estamos perante cópia fiel de marca anteriormente registada.
Estaremos perante uma imitação de marca anteriormente registada?
A imitação corresponde à “adopção de uma marca confundível com outra. Por conseguinte, a imitação não é identidade, antes supõe a existência de elementos comuns e outros diferentes” - Cfr. A. e loc. cit.
Pela clareza de raciocínio não podemos deixar de continuar a transcrever aquele citado e Il. Professor da Universidade Lusíada e quanto à forma de aferir a existência de imitação de uma marca por outra, se é ou não confundível com outra anteriormente registada.
Refere que “(…) o legislador consagra dois critérios: um subjectivo e outro objectivo”.
Quanto ao segundo está o mesmo consagrado no artº215ºnº2 do RJIP e consubstancia uma presunção relativa de imitação: “considera-se reprodução ou imitação parcial de marca, a utilização de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada (….)”:
Nestes casos “é desnecessária a verificação da possibilidade psicológica de indução em erro, nos termos do critério subjectivo”.
Quanto ao primeiro está o mesmo consagrado, no nosso ordenamento, na al.c) do nº1 do artº215 do RJPI: “haverá violação do princípio da novidade quer as duas marcas se confundam quando postas em confronto, quer suceda que, estando apenas à vista a marca a constituir (a mais moderna), se deva concluir que ela é susceptível de ser tomada por outra ou associada com outra de que se tenha conhecimento, a menos que o observador proceda a um exame atento, ou confronto. Considera-se imitada a marca que for tão parecida com outra, que o consumidor só as possa distinguir depois de exame atento ou confronto de uma com a outra”.
Adianta ainda que “Esta formulação normativa harmoniza-se perfeitamente com a concepção de BÉDARRIDE, largamente acolhida pela doutrina e a jurisprudência, segundo a qual: “a questão da imitação deve ser apreciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca e não pelas dissemelhanças que poderiam oferecer os diversos pormenores, considerados isolados e separadamente”.
Deste modo, se a semelhança de conjunto, entre a marca anterior protegida e a mais recente, sem consideração dos pormenores diferenciadores, gerar a possibilidade de confusão, pela fácil indução em erro do consumidor, haverá imitação da primeira pela segunda”. Cfr. A. e op. cit. pag.348
Dito isto, que conclusão retirar em relação aos sinais conflituantes, haverá ou não imitação das registadas pela registanda?
A questão não se coloca à luz do referido critério objectivo, tanto bastando para o efeito o confronto dos sinais em crise e a respectiva natureza nominativa.
Não há na registanda a utilização de qualquer elemento de fantasia das registadas (que não os têm também), ou seja, uma qualquer expressão que deve reservar-se para termos sem significado próprio, cujo objectivo é apenas a sonoridade que resulta de uma determinada combinação de letras, fruto da imaginação e destituída de correspondência na realidade.
O problema tem de se resolvido, pois, à luz do critério subjectivo.
Não olvidando que estamos na presença de marcas nominativas e que, nessa medida, se deverá atender ao conteúdo ideológico ou significativo dos sinais, pela nossa parte, na procura da melhor solução, utilizando-se como critério a bitola do consumidor abstracto a que as marcas concorrentes se destinam, consumidor médio dos produtos e serviços que identificam e referentes à classe 42ª e 43ª, diremos que as marcas em causa são muito similares na sua componente leonina, sendo que o que se acrescenta na registanda, no confronto com o que se acrescenta (em apenas duas) nas registadas, não confere àquela face a estas diferenciação suficiente para afastar a imitação.
É fácil perceber qual o coração dos sinais em confronto, que se impõe, reina, dominando na sua individualização: W.
Este sinal, W, no seu efeito fonético e ou visual/gráfico destaca-se patentemente, relegando o que demais que compõe a marca registanda e duas das marcas registadas pela sua natureza meramente acessória, portanto a desconsiderar na identificação das marcas em disputa.
Os demais elementos das marcas concorrentes são muito menos susceptíveis de interessar e impressionar a atenção do consumidor médio. - Cfr. Ac. do STJ de Portugal de 25 de Março de 2004, in DGSI.
Acresce que a imitação é ainda mais patente em relação a marca registada que se compõe apenas com a letra W e na medida que, sendo composto apenas por esta letra, integra a registanda esse mesmo único elemento na sua marca e como componente dominante.
Procede, pois, o recurso, prejudicado ficando o remanescente fundamento do recurso.”.
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A sentença acabada de transcrever constitui a boa decisão da causa, pelo que a confirmamos inteiramente e fazemos nossa, nos termos do art. 631º, nº5, do CPC.
Resta acrescentar que a marca mista apresenta uma configuração sugestiva onde sobressai o elemento figurativo em forma de letra (W), conquanto estilizada, e uma palavra (XXX) que, aos olhos dos consumidores médios dos serviços e produtos da classe 43, se apresenta quase irrelevante ou neutra do ponto de vista da mensagem que se pretende transmitir. Neste sentido, o elemento gráfico em destaque, por ser predominante, pode cativar os interessados nos referidos serviços, levando-os a cair em confusão com as marcas , ou simplesmente , também estas para produtos e serviços da classe 43 (as 1º e 2ª) e 42 (a 3ª). Não se esqueça que quando a lei quer evitar a confusão de marcas, não está senão a pensar na semelhança, na parecença, na essencialidade dos pontos comuns ou de contacto e, portanto, na primeira impressão ou na impressão do momento que se colhe de uma e doutra, mais do que nas suas dissemelhanças. E isso tanto irá depender do aspecto gráfico, nominativo, figurativo, como também do fonético dos seus elementos (art. 215º, nº1, al. c), RJPI) – Ac. do TSI, de 18/05/2017, Proc. nº 246/2017.
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IV – Decidindo
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
T.S.I., 19 de Março de 2020
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
1 Certamente por lapso disse “procedente”, quando quereria dizer “improcedente”.
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