Proc. nº 219/2017
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)
Data: 02 de Abril de 2020
ASSUNTOS:
- Princípio da livre apreciação das provas
- Reapreciação da matéria de facto
- Princípio da boa fé
- Emissão da licença de obra
SUMÁRIO:
- Segundo o princípio da livre apreciação das provas previsto n° 1 do artigo 558.º do CPC, “O tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”.
- A reapreciação da matéria de facto por parte deste TSI tem um campo muito restrito, limitado, tão só, aos casos em que ocorre flagrantemente uma desconformidade entre a prova produzida e a decisão tomada, nomeadamente quando não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação.
- O princípio da boa fé, sendo embora “dotado de elevado grau de abstracção”, está longe de ser uma “fórmula vazia pseudonormativa”.
- A sua concretização é possibilitada através de dois princípios básicos: o princípio da tutela da confiança legítima e o princípio da materialidade subjacente.
- A tutela da confiança pressupõe os seguintes requisitos:
* a existência de uma situação de confiança, traduzida na boa fé subjectiva ou ética da pessoa lesada;
* uma justificação para essa confiança, isto é, a existência de elementos objectivos capazes de provocarem uma crença plausível;
* o investimento de confiança, isto é, o desenvolvimento efectivo de actividades jurídicas assentes sobre a crença consubstanciada; e
* a imputação da situação de confiança, implicando a existência de um autor a quem se deva a entrega confiante do tutelado.
- Uma vez provado que a participação da A. é elemento indispensável para a anomalia ou irregularidade apurada do procedimento de licenciamento de obra em causa, aceitando “contrapartida” em decaimento das disposições vigentes para abstenção dos interesses pela requerida concessão dos “Quartéis de Mong Há”, não obstante o estudo prévio do terreno ter sido aprovado, com relaxação das condicionantes urbanísticas, e subsequente aprovações relativa à obra em parcelares, não existe expectativa legítima nem confiança legítima da A. merecedora da protecção jurídica, por falta do respeito pelos ditames ou limites de “boá fé” que se pautam à actuação, quer a Administração Pública quer aos particulares.
O Relator,
Ho Wai Neng
Proc. nº 219/2017
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)
Data: 02 de Abril de 2020
Recorrente: Companhia de Fomento Predial XX, Limitada (Autora)
Entidade Recorrida: Director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (Réu)
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – Relatório
Por sentença de 24/10/2016, o Tribunal Administrativo da RAEM julgou improcedente o recurso contencioso interposto pela Autora Companhia de Fomento Predial XX, Limitada.
Dessa decisão, vem a Autora, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
I. O OBJECTO DO PRESENTE RECURSO
1. O presente recurso tem por objecto:
- o despacho proferido pelo Tribunal a quo a fls. 287, o qual recaiu sobre a reclamação da Autora ao despacho que procedeu à selecção da matéria de facto e à base instrutória;
- o acórdão proferido pelo Tribunal Colectivo sobre a matéria de facto, no que se refere às respostas dadas aos artigos 1.º a 8.º e 12.º da base instrutória; e
- a sentença de fls. 662 e seguintes que julgou "improcedente a presente acção para determinação da prática de actos legalmente devidos intentada pela Companhia de Fomento Predial XX, Limitada e consequentemente absolve o Director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, dos pedidos deduzidos" .
2. De todo o modo, ainda que a matéria de facto que foi seleccionada e julgada assente se venha a manter inalterada - o que só acontecerá caso os recursos que ora se interpõem do despacho de fls. 287 e do acórdão proferido sobre a matéria de facto venham a improceder, hipótese que apenas por cautela e dever de patrocínio se admite - tal matéria, em caso algum, é de molde a permitir as conclusões nas quais a decisão recorrida se baseia.
3. Destarte, a impugnação do despacho proferido pelo Tribunal a quo a fls. 287, bem como do acórdão proferido pelo Tribunal Colectivo sobre a matéria de facto, é feita meramente à cautela (uma vez que, repita-se, ainda que a matéria de facto assente não venha a sofrer alterações, da mesma não resulta a satisfação dos requisitos de que depende a verificação dos vícios que a sentença recorrida aponta aos actos de aprovação praticados pelo DSSOPT e muito menos a sua não convalidação na esfera jurídica da Autora) precisamente para acautelar o caso deste Venerando Tribunal vir a perfilhar um distinto entendimento.
II. O RECURSO SOBRE O DESPACHO PROFERIDO PELO TRIBUNAL A QUO A FLS. 287
4. Conforme resulta da respectiva fundamentação, a decisão de improcedência da acção baseia-se no facto de, alegadamente, os actos praticados pelo DSSOPT e que antecedem a emissão da licença de obra estarem feridos do vício de desvio de poder.
5. Tal vício é definido pela doutrina como aquele "que afecta o acto administrativo praticado no exercício de poderes discricionários quando estes hajam sido usados pelo órgão competente com fim diverso daquele para que a lei os conferiu ou por motivos determinantes que não condigam com o fim visado pela lei que conferiu tais poderes", gerando, como é consabido, a anulabilidade do acto.
6. Por outro lado, no caso em julgamento, conforme salienta a sentença recorrida, o fim de interesse público teria sido preterido completamente "no puro interesse pessoal do ex-STOP (…) com vista a alcançar um fim de mero interesse privado", sendo que nestas situações a doutrina e a jurisprudência têm entendido de forma unânime ser essencial "o dolo, ou o «propósito consciente e deliberado» de prosseguir o fim ilegal".
7. Dito isto, importa frisar que, em momento algum dos autos e mormente na contestação, o DSSOPT veio alegar o suposto vício em que a sentença recorrida baseia a sua decisão de improcedência da acção - o vício de desvio de poder - confinando a sua defesa à alegação da excepção do regime da nulidade previsto na alínea i) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA e ao facto de as aprovações do projecto da Autora violarem o artigo 88.º do Regulamento Geral da Construção Urbana (RGCU), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M de 15 de Novembro e serem, por isso, anuláveis.
8. Ora, foi precisamente com base no facto de na contestação ter sido "suscitada uma excepção, cuja fundamentação se baseia na nulidade da decisão da aprovação de projectos" que a reclamação da Autora à selecção da matéria de facto assente foi quase in totum indeferida (vide despacho de tis. 287).
9. Sem embargo, o certo é que o Tribunal a quo veio a solucionar a questão de direito em apreço nos autos com base num suposto vício nunca antes alegado, conhecendo oficiosamente da pretensa anulabilidade gerada por um suposto vício de desvio de poder.
10. Para além de se considerar que a Meritíssima Juíza a quo não poderia ter conhecido desta questão oficiosamente (algo a que mais à frente se voltará), ao tê-lo feito não poderia, então, ter deixado de considerar os diversos factos alegados pela Autora na sua réplica e que demonstram à saciedade não só a impossibilidade de aplicação do regime da nulidade a que acima se fez menção mas também a não verificação dos requisitos de que depende a existência do vício de desvio de poder.
11. Efectivamente, os factos cuja selecção para a matéria de facto relevante para a decisão da causa foi negada pelo despacho de fls. 287, demonstram que, de modo algum, a aprovação do estudo prévio (e da P.A.O.) e do projecto da Autora correspondeu ao exercício de um poder discricionário mas antes a um poder que obedeceu unicamente a critérios técnicos pelo que jamais se poderá falar, no que à Autora diz respeito, em má fé.
12. Acresce que, o fundamento adicional em que se baseou o indeferimento da reclamação da Autora à selecção da matéria de facto - a circunstância de se estar perante matéria de excepção que só ao DSSOPT cabe provar - falece por completo quando na resposta à contestação, a Recorrente alegou factos impeditivos ou extintivos dos efeitos jurídicos dos factos alegados pelo DSSOPT e que têm pertinência quer o Tribunal tivesse assentado a sua decisão unicamente com base nas causas de pedir invocadas pelo Réu, quer, como o fez, com base numa causa de pedir nunca antes invocada.
13. Estão nesta situação os artigos 25.º, 42.º, 43.º, 44.º, 53.º, 61.º, 63.º, 64.º, 67.º, 68.º, 69.º, 70.º, 89.º, 93.º, 94.º e 95.º da réplica, os quais são impeditivos dos efeitos jurídicos dos factos alegados na petição inicial, em qualquer das suas vertentes e que, como tal, têm de ser considerados.
14. Os ditos artigos demonstram não só a inexistência de uma relação de dependência lógica entre o acto administrativo relativo à concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há à Companhia YY e o acto de aprovação do projecto de arquitectura da Autora, afastando-se assim a aplicação do regime previsto na alínea i) do n.º 2 do artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), mas também a circunstância de o segundo dos referidos actos ter sido um acto vinculado (ou seja não discricionário) e que a boa fé da Autora em todo este processo é um dado inatacável.
15. Deste modo, por constituírem uma excepção peremptória aos factos que o DSSOPT alegou na sua defesa nunca tal matéria deveria ter sido ignorada na matéria de facto assente, no que constituiu uma violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes previstos nos artigos 3.º e 4.º do CPC. Que ora expressamente se alega.
16. Destarte, deverá o despacho de fls. 287 na parte em que indeferiu o pedido de aditamento à matéria de facto assente dos artigos 25.º, 26.º, 41.º, 43.º, 44.º, 53.º, 61.º, 63.º, 64.º, 67.º, 69.º, 70.º e 89.º da réplica, ser revogado e substituído por outro que, dando procedência ao presente recurso, ordene tal aditamento, com a consequente completação da matéria de facto, na redacção e numeração acima sugeridas.
17. E o mesmo se diga dos artigos 117.º, 118.º, 131.º, 132.º, 135.º, 139.º, 143.º, 151.º, 153.º, 189.º, 195.º e 197.º da réplica, dos quais resulta provada ou, pelo menos, indiciada, a legalidade do acto de aprovação do projecto de obra da Recorrente e a natureza definitiva, executória e não discricionária do mesmo e que, consequentemente, nunca poderiam ter sido ignorados pelo Tribunal a quo como base fáctica da sua decisão.
18. Acresce que, os mencionados artigos vêm também demonstrar que a tese da pretensa má fé da Autora não passa de uma ficção e que o tratamento que o seu projecto recebeu foi em tudo idêntico ao tratamento que tantos outros projectos mereceram do DSSOPT, permitindo concluir da conformidade do acto de aprovação do projecto de obra da Autora com a legislação em vigor e comprovar também a natureza definitiva e consolidada de tal acto.
19. Termos em que, deverá o despacho de fls. 287, na parte em que indeferiu o aditamento aos factos assentes das alíneas GG., HH., II., JJ., KK., LL., com a redacção que lhe foi atribuída pela Autora na sua reclamação ao despacho saneador, ser revogado e substituído por outro que determine o aditamento de tal matéria aos factos assentes.
20. O mesmo devendo suceder ainda com os artigos 117.º e 151.º da réplica, cuja matéria por se encontrar plenamente provada pelas certidões juntas sob o Doc. D do requerimento da Autora de 28.03.2014 e pelas certidões emitidas pela DSSOPT que ora se juntam sob doc. n.ºs …, deverá ser integrada nos factos assentes, com a redacção que acima se sugere.
III. DO RECURSO SOBRE O ACÓRDÃO PROFERIDO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
21. Conforme acima já se afirmou, o presente recurso tem também por objecto o acórdão proferido pelo Tribunal Colectivo sobre a matéria de facto, no que se refere às respostas dadas aos artigos 1.º a 8.º e 12.º da base instrutória.
22. A fundamentação em que o referido acórdão assenta tem por base critérios puramente arbitrários o que, inevitavelmente, gera um erro notório na apreciação da prova, extravasando por completo os limites que resultam do princípio da sua livre apreciação.
23. Efectivamente, embora dotado de uma grande amplitude o princípio da livre apreciação da prova definido no artigo 558.º do CPC e aplicável ao contencioso administrativo por força da remissão contida nos artigos 1.º e 99.º, n.º 1 do CPAC, não é uma porta aberta para o livre arbítrio.
24. Com efeito, a "livre apreciação da prova não pode ser entendida como uma operação puramente subjectiva, emocional e portanto imotivável. Há-de traduzir-se em valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita ao julgador objectivar a apreciação dos factos, requisito necessário para uma efectiva motivação da decisão".
25. Ora, como bem demonstra a respectiva fundamentação plena de apelos a teorias conspirativas, deduções, com base em outras deduções, fazendo da Autora uma pessoa de mal, a livre convicção dos juízes que proferiram o acórdão de fls. 622 e seguintes assentou em critérios puramente subjectivos, emocionais e portanto e incontroláveis, sendo inclusive, quase impossível alcançar a motivação do Tribunal a quo na resposta aos quesitos em apreço em face da tamanha subjectividade que resulta da justificação dada para essas respostas.
A) Os artigos 1.º a 3.º da base instrutória
26. Conforme, referiu a Meritíssima Juíza Presidente em sede audiência de discussão e julgamento (track: recorded on 02-Apr-2014 at 17.42.09 (1(%%6HOW00164664).WAV), quando questionou a mandatária do Réu sobre a junção de certidão, com menção do trânsito em julgado, do acórdão proferido no n.º 53/2008 que envolveu o ex-Secretário A, a matéria relativa aos artigos 1.º a 3.º apenas admite prova documental, por força do disposto no n.º 2 do artigo 558.º do CPC.
27. Ora, de acordo com a fundamentação constante do acórdão ora impugnado em "relação aos factos constantes dos quesitos 1º a 3º, a convicção do Tribunal baseou-se essencialmente nos documentos juntos aos autos, nomeadamente a certidão do acórdão do Tribunal de Última Instância no processo nº 53/2008, actualmente com o nº CR3-09-0146-PCC, do parecer de fls. 52 do processo administrativo Vol. II.".
28. Ora, é evidente que o Tribunal a quo labora num equívoco pois como o atesta a não publicação em Boletim Oficial de qualquer despacho de concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há à Companhia YY - documento que, nos termos dos artigos 125.º, n.º 2, 127.º e 128.º da Lei n.º 6/80 de 5 de Julho Lei de Terras, em vigor à data dos factos, titula os contratos de concessão e faz prova, em juízo ou fora dele, da identificação do terreno e das situações que nele estiverem descritas - tal concessão nunca chegou a concretizar-se.
29. Assim, a resposta dada pelo Tribunal Colectivo ao artigo 2.º da base instrutória (e também a alínea S. dos factos assentes) peca por evidente falta de rigor e viola o n.º 2 do artigo 558.º do CPC, uma vez que o facto em apreço apenas poderia ter sido provado com base no despacho de concessão publicado em Boletim Oficial, o que nunca ocorreu.
30. Em suma, por se tratar de um facto que apenas poderia ter sido provado por despacho de concessão publicado em Boletim Oficial e nunca tendo esse despacho sido proferido pelo órgão competente e, concomitantemente, ocorrido a respectiva publicação, o artigo 2.º da base instrutória em que se afirma que o terreno designado como "Quartéis de Mong Há" foi concedido à Companhia YY, através da intervenção do Ex-Secretário A terá de considerar-se não provado ou, quando muito, apenas poderá ficar provado que tal pedido de concessão mereceu o parecer favorável da Comissão de Terras por intervenção do Ex-Secretário A.
31. Por outro lado, ainda no que concerne aos artigos 1.º e 3.º da base instrutória, ao invés do que resulta da fundamentação do acórdão proferido sobre a matéria de facto, quer o acórdão proferido pelo Tribunal de Última Instância no processo n.º 53/2008, quer o parecer de fls. 52 do processo administrativo Vol. II não são de modo algum aptos a provar esta matéria.
32. Quanto ao dito acórdão relevam os pontos 153 a 168 da matéria de facto aí dada como assente, dos mesmos se retirando que o pedido de concessão formulado pela Companhia YY em relação ao terreno dos Quartéis de Mong Há mereceu, efectivamente, o despacho de concordância por parte do Ex-Secretário (ponto 168) fruto de um acto de corrupção.
33. Porém, o que em momento algum se diz ou se conclui no referido acórdão é que o sucesso do pedido de concessão formulado pela Autora em relação ao mesmo terreno estaria à partida assegurado e que só assim não sucedeu por força do acto criminoso do Ex-Secretário.
34. E o mesmo se diga do parecer de fls. 52 do processo administrativo Vol. II., uma vez que este parecer, assinado pelo Réu nos presentes autos e não pelo Ex-Secretário A, se limita a justificar e a fundamentar do ponto de vista do interesse público a concessão do terreno dos "Quartéis de Mong Há" à Companhia YY e a propor o indeferimento dos outros pedidos de concessão concorrentes, tendo um deles sido formulado pela Autora.
35. Sem embargo, no aludido parecer não é feita - como, aliás, foi salientado pela testemunha Sra. Eng.a B nas longas declarações que prestou em sede de audiência de discussão e julgamento - qualquer análise comparativa dos vários pedidos de concessão, da qual se pudesse concluir que o que melhor servia o interesse era o da Recorrente.
36. Há, pois, uma clara extrapolação por parte do Tribunal a quo em relação aos dados objectivos que resultam dos citados documentos e que considera constituírem o fundamento da resposta a estes quesitos, enfermando a resposta aos mesmos de pura subjectividade.
37. O erro de julgamento na apreciação destes quesitos resulta também evidente quando, conforme consta do processo, se sabe que a Autora já depois da destituição do Ex-Secretário A e da não concretização da concessão em apreço à Companhia YY voltou a requerer ao novo Secretário para os Transportes e Obras Públicas (Lau Si Io) a concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há, pedido que, mais uma vez, não mereceu resposta favorável da Administração, que acabou por aproveitar o terreno com a construção de um complexo de habitação económica.
38. Termos em que deverá a resposta dada aos quesitos 1.º e 3.º ser revogada, dando-se ambos como não provados.
B) Os artigos 4.º, 5.º, 7.º e 8.º da base instrutória
39. Segundo o acórdão em apreço a resposta afirmativa aos artigos 4.º, 5.º, 6.º, 7.º e 8.º da base instrutória, assenta nos seguintes meios de prova:
(i) os documentos de fls. 74 e 75 do processo administrativo Vol. II, nomeadamente o memorando da reunião a que aí se faz menção e a sua comparação com o estudo prévio apresentado pela Autora (de fls. 136 a 142 da pasta n.º 13 do processo instrutor);
(ii) o depoimento da testemunha Sra. Engenheira B que teria dito que a expressão "ajustamento no âmbito do planeamento urbanístico" mencionado no documento de fls. 74 acima referido se refere normalmente à libertação da altura;
(iii) os requerimentos da Autora em que pede a concessão do terreno e a circunstância de não ter recorrido da decisão da Administração de não lhe deferir esta pretensão;
(iv) o requerimento de 4.03.2005 (e não 1/03/2005, como certamente por lapso se diz a fls. 624 do acórdão sobre a matéria de facto) em que a Autora alude à possibilidade de "estar em curso um acordo sobre o seu pedido de concessão".
40. Foram, pois, os referidos meios de prova, que "levou o Tribunal a acreditar que a isenção de cálculo de sombra foi fruto da instrução do ex-secretário com vista a fazer a Autora não pôr em causa a decisão de indeferimento de concessão (…) fruto de um acordo e não da conformidade com a decisão da causa".
41. Salvo o devido respeito, tal decisão entra no domínio da irracionalidade, carece de qualquer lógica, sendo puramente especulativo e subjectivamente perverso, valorando inclusive o facto (pasme-se!) de a Autora não ter recorrido de um acto praticado pela Administração no uso de poderes discricionários (uma faculdade que a lei lhe confere) e chegando mesmo ao ponto de configurar tal decisão como uma demonstração de má fé por parte da ora Recorrente!
42. Passando à análise dos documentos de fls. 74 e 75 do Vol. II do processo administrativo importa chamar a atenção para o que foi dito nessa reunião e que consta do respectivo memorando de fls. 74 ou seja da respectiva acta, mormente a expressão "ajustamento adequado no âmbito do planeamento urbanístico" que aí é referida.
43. Ora, no que concerne a essa expressão, nada do que é dito no referido documento, legitima a conclusão de que na reunião a que alude o documento de fls. 74 se falou "na ideia de libertação da altura" do projecto da Autora e que esta libertação seria uma "compensação" da não concessão à Autora do terreno dos Quartéis de Mong Há, conforme defende o Tribunal a quo.
44. Adoptando um critério lógico e objectivo aquilo que se conclui é precisamente o inverso.
45. Em primeiro lugar, é impossível com um mínimo de objectividade dizer a que projecto é que a expressão "libertação da altura" inserta no parágrafo 2 do documento de fls. 75 se está a referir: se ao projecto da Autora, se àquele que foi apresentado pela Companhia YY em relação ao terreno dos Quartéis de Mong Há e que, conforme se comprova pelo doc. n.º 5 junto com a contestação foi também declarado nulo.
46. No entanto, seguindo o critério adoptado na redacção do referido documento, aquilo que se afigura como muito mais provável é que tal menção se refere ao projecto da Companhia YY, conforme o comprova a inserção de tal expressão no mesmo parágrafo em que se refere que o Chefe do Executivo concordou com a proposta de concessão formulada por esta sociedade e também o facto de a expressão em apreço ter sido inscrita num parágrafo distinto e antecedente daquele que se refere à intenção da Autora em manter a sua pretensão à concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há, o que retira qualquer sentido lógico à interpretação que destes documentos é feita pelo Tribunal a quo.
47. Por outro lado, a acta de fls. 74 (o mesmo sucedendo com o documento de fls. 75) omite também qualquer referência ao facto de a Autora poder beneficiar de um "ajustamento adequado no âmbito do planeamento urbanístico" do seu projecto caso viesse a desistir do pedido de concessão em apreço o que, desde logo, retira qualquer legitimidade à' conclusão do Tribunal a quo, mormente tendo em conta o valor probatório atribuído a este documento (vide artigo 370.º do Código Civil). Pelo contrário, aquilo que se poderá inferir do conteúdo deste documento é que não há existe qualquer relação entre as duas situações.
48. Com efeito, aquilo que se infere do documento de fls. 74 é que o "ajustamento adequado no âmbito do planeamento urbanístico" que aí é mencionado se refere à adequação e, eventualmente, compensação, a dar ao projecto da Autora pelo facto de esta vir a ter de ceder à RAEM uma área de 1.168 m2 do seu terreno para abertura de uma via pública, como, aliás, resulta da P.A.O. aprovada pelo DSSOPT.
49. Se a documentação a que acima se fez referência é, pura e simplesmente, incapaz de provar o que quer que seja relativamente à matéria dos artigos 4.º, 5.º, 7.º e 8.º da base instrutória não é a sua conjugação com o depoimento da testemunha Sra. Enga. B que poderia permitir uma distinta conclusão, pois conforme se comprova pelo seu depoimento e que acima se transcreveu nada do que a mesma afirmou legitima as conclusões do Tribunal a quo.
50. A testemunha Sra. Enga. B, sujeita, como se disse a uma longa e também cerrada inquirição por parte da Meritíssima Juíza Presidente, não confirmou em momento algum a intervenção do Ex-Secretário A na aprovação do projecto da Autora ou que esta tivesse resultado de uma instrução deste, ou ainda que tal aprovação teria sido a moeda de troca para que a Recorrente deixasse de reivindicar a concessão dos terrenos dos Quartéis de Mong Há ou que existisse qualquer ilegalidade no processo.
51. Aquilo que, em suma, se retira do depoimento que acima se transcreveu é que a convicção do Tribunal a quo parece resultar muito mais das questões que colocou do que das respostas que foram dadas pela testemunha em apreço, sendo sintomática neste aspecto a última resposta que a mesma deu à última pergunta que lhe foi colocada e na qual confirma que não sabe de qualquer intervenção ilegal de quem quer que seja e nomeadamente do Ex-Secretário A na aprovação dos projectos da Autora.
52. O que supra se afirmou vale também na íntegra quanto ao documento de fls. 136 a 142 da pasta n.º 13 e que, no entender do Tribunal a quo, "indicia que o alargamento dos condicionamentos urbanísticos provinha de uma instrução ao ex-secretário".
53. Ao contrário do que preconiza o Tribunal a quo os documentos contêm uma justificação técnica para a aprovação do projecto da Autora, a qual é dada num extenso relatório (fls. 139 e 140), datado de 28.03.2005 e assinado por C, então técnico superior do Departamento de Planeamento Urbanístico e testemunha do Réu e também no parecer que consta do mesmo submetido à consideração do DSSOPT pelo Arquitecto responsável pelo dito Departamento.
54. O mesmo relatório é depois submetido (vide fls. 138) a despacho de dois superiores e só depois submetida a despacho do Réu, na qualidade de Director e que só depois o submete à apreciação do Ex-Secretário A, isto já mais de um mês após a emissão do mencionado relatório.
55. Do documento em apreço é, como tal, impossível retirar que a aprovação do projecto da Autora foi fruto de uma instrução do Ex-Secretário quando tal projecto foi sujeito ao crivo de vários técnicos e várias chefias antes de ser apresentado à tutela e quando, conforme a testemunha B confirmou (vide depoimento acima transcrito), se sabe que nenhum dos técnicos envolvidos recebeu quaisquer ordens ou instruções de A no sentido de o estudo prévio apresentado pela Autora ser aprovado.
56. A falta de lógica na apreciação que o Tribunal a quo faz deste documento é ainda revelada por o mesmo olvidar e negligenciar por completo aquilo que de mais importante ele transmite e que é a detalhada justificação técnica, assinada por um responsável da DSSOPT, que jamais foi alegado estar sob influência do Ex-Secretário A, para o ILUS e ILOS e isenção do cálculo da área de sombra atribuídos ao projecto da Autora.
57. Por último, quanto à eventual incongruência entre a conduta da Autora traduzida no facto de ter deixado de insistir na concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há e de, inclusive, ter no seu requerimento de 7/03/2005 aludido à hipótese de um acordo e que, uma vez mais segundo o Tribunal a quo, indiciaria a existência do tal acordo entre a Recorrente e o Ex-Secretário A no sentido de aprovação do projecto representar uma moeda de troca por não ter impugnado a decisão de atribuição da concessão à Companhia YY, tal análise peca uma vez mais por qualquer falta de rigor.
58. Neste particular convirá frisar que, a impugnação contenciosa de um acto administrativo (e também a graciosa) é uma faculdade que assiste ao particular, não um ónus ou uma obrigação, cujo não exercício resulta na impossibilidade da obtenção de um certo resultado ou na equiparação de tal conduta a uma atitude com o expresso fito de lesar interesses de outrem (ou seja má fé).
59. Ademais, in casu o não exercício pela Autora da faculdade de recorrer do indeferimento da sua pretensão em obter a concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há é, sem margem para dúvida, a atitude que mais se coaduna com a razão lógica e a normalidade das coisas.
60. Com efeito, foi o próprio Réu quem transmitiu à Autora que por decisão superior do Ex-Secretário e do Chefe do Executivo a proposta da Companhia YY iria ser aceite, no que está evidentemente subjacente que o Governo da RAEM havia decidido que, de acordo com os seus critérios de discricionariedade, esta proposta seria a que melhor serviria o interesse público.
61. Assim, tendo em conta que em matéria de concessão de terrenos vigorava ao abrigo da anterior legislação uma enorme discricionariedade, estando inclusive contemplada a possibilidade do Governo dispensar as concessões de terreno de concurso público, no que constituía, quase sem excepção, a prática então adoptada pela Administração, dúvidas não podem restar que a Autora adoptou a atitude que 99% dos particulares em situação idêntica teriam adoptado, acabando por se conformar com a decisão do Executivo de não lhe atribuir a concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há.
62. Aliás, realizada aturada pesquisa jurisprudencial não logrou a Autora vislumbrar qualquer caso em que um particular tenha procedido no sentido que o Tribunal a quo diz que seria o mais normal e muito menos, uma decisão que fosse dos tribunais a pôr em causa a definição de interesse público dada pelos órgãos públicos para justificar a concessão de terrenos.
63. Doutro passo, também não seria obviamente exigível à Autora que suspeitasse das intenções ou motivações do Ex-Secretário. Nem a Autora suspeitou, nem ninguém o fez, nomeadamente o DSSOPT que também concordou com o pedido de concessão formulado pela Companhia YY e tão pouco o Chefe do Executivo que avalizou também este pedido.
64. Salvo o devido respeito, aquilo que o Tribunal a quo faz é descontextualizar os actos praticados pelo Ex-Secretário, interpretando-os à luz do que hoje se conhece sobre as motivações de algumas das suas condutas.
65. Quanto ao tal requerimento em que a Autora/Recorrente admite a possibilidade de uma solução consensual com a Administração, o que resulta do mesmo é, sem margem para dúvidas, que tal solução tem por base a circunstância de aquela acatar o interesse público tal como foi definido pelo Governo e o facto de este implicar o sacrifício, tal como vem expressamente prevista na P.A.O. aprovada pelo Réu, de uma área considerável do seu terreno privado, o que vem também confirmar que a expressão "ajustamento" na dita acta de fls. 74 a que acima se fez menção se refere precisamente a este facto.
66. É isto o que expressamente a Autora refere no requerimento que dirigiu à DSSOPT em 7/03/2005, o qual é mencionado na fundamentação do acórdão de fls. 622 sendo ilegítimo e quase abusivo concluir que do mesmo resulta a convicção de que o que estava em causa era uma "compensação" pela não impugnação da decisão de concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há à Companhia YY.
67. Os meios de prova em que o Tribunal a quo fundou a sua convicção na resposta aos artigos 4.º, 5.º, 7.º e 8.º da base instrutória são assim incapazes, com um mínimo de objectividade, lógica e racionalidade, de provar a referida matéria, existindo, ao invés, no processo variadíssimos e distintos elementos e meios de prova dos quais resulta a prova do contrário do que é afirmado nos mencionados quesitos.
68. Desde logo, o facto de embora o DSSOPT jamais ter dito que a Autora manteve qualquer contacto directo ou indirecto com o anterior Secretário A e designadamente a propósito do projecto de obra em apreço, o certo é que em todo o processo administrativo não existe um único indício da existência desses contactos.
69. Efectivamente, de acordo com toda a documentação que faz parte do processo instrutor, todos os contactos e correspondência mantidos sobre este projecto pelos responsáveis da Autora foram-no com o DSSOPT e com outros responsáveis da DSSOPT, não constando em nenhum desses documentos a referência directa ou indirecta que a aprovação do projecto de alteração de arquitectura apresentado junto daquela direcção de serviços - e que prevê a construção de um edifício com 51 andares - teria como condição sine qua none a desistência do pedido de concessão por arrendamento por si formulado em relação ao terreno descrito sob o n.º ****7.
70. Ademais, todas as comunicações, notificações, pareceres de natureza técnica e despachos, nomeadamente os relativos à aprovação, e quaisquer outros documentos recebidos pela Autora no âmbito do processo 12/98/L foram remetidos e são unicamente provenientes da DSSOPT, a única entidade pública que desde a apresentação do projecto em apreço foi chamada a pronunciar-se (como efectivamente o fez) sobre a aprovação do mesmo.
71. Doutro passo, a ideia que o Tribunal a quo dá como assente de que, após a aprovação do seu projecto de arquitectura, não mais a Autora manifestou interesse na concessão do terrenos dos Quartéis de Mong Há é, como já se disse, incorrecta, não correspondendo à verdade.
72. Efectivamente, não só a Autora se queixou por escrito ao Secretário que sucedeu no cargo a A dos atrasos verificados na emissão da licença de obra que constitui o acto objecto dos presentes autos como, nas mesmas missivas, voltou a manifestar firme intenção de concorrer à concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há no caso de o Governo decidir rever a posição anteriormente adoptada quanto a esta matéria de não conceder o terreno à Autora.
73. Acresce que, conforme resulta do longo texto do acórdão proferido no processo n.º 53/2008 a que acima já se fez menção, a Autora não cometeu qualquer ilegalidade no processo que conduziu à atribuição da concessão por arrendamento do terreno conhecido por "Quartéis de Mong Há" à "Companhia YY International, Limitada" ou no processo de aprovação por parte do Réu do projecto de alteração para a obra a desenvolver no terreno que lhe pertence em propriedade plena, não tendo também a Recorrente e/ou os seus responsáveis sido alguma vez constituídos arguidos ou considerados suspeitos da prática de qualquer acto ilícito relacionado com a atribuição da referida concessão (ou qualquer outro) e com eventuais contrapartidas ilícitas associadas à mesma.
74. Mais, o Tribunal de Última Instância no acórdão que proferiu no âmbito dos Autos de Processo Comum Colectivo n.º 53/2008 relativos ao processo-crime a que se vem fazendo menção identificou claramente as contrapartidas directas e indirectas pela decisão de atribuição da referida concessão à Companhia YY, não se contando, obviamente, entre as mesmas a aprovação do projecto da Autora que correspondeu a um acto da inteira responsabilidade do Réu praticado no exercício de uma competência legal, própria e exclusiva.
75. Ainda no que concerne à questão do "ajustamento urbanístico" merece igualmente censura o desvalor que o Tribunal a quo deu ao facto de a P.A.O., aprovada pelo Réu, ter imposto um sacrifício considerável à Autora nomeadamente no que respeita à área do seu terreno a reverter para o domínio público e privado da RAEM.
76. Ou seja, a isenção do cumprimento do citado artigo 88.º e o cálculo da edificabilidade do terreno obedeceram no caso presente a critérios rigorosos, nomeadamente de carácter urbanístico, permitindo, através da constituição de servidões públicas e da doação à RAEM de uma área num total de 623 m2 do terreno de propriedade plena da Autora, para integração no domínio público, permitir a satisfação e a defesa do interesse público, que se manifesta, entre outros, na possibilidade de o terreno confinante ao terreno da Autora e que, como se disse, faz parte do domínio privado da RAEM, passar a beneficiar das vias públicas e do espaço verde que a Autora se comprometeu a construir.
77. Ademais, não se entende como pôde o Tribunal a quo, na ponderação que fez da matéria de facto em análise, ter ignorado a circunstância de a aprovação de projectos de obra ser um acto administrativo que por lei é da competência própria e exclusiva da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes e do seu Director, pelo que quaisquer ordens proferidas nesse sentido por parte do anterior Secretário A seriam sempre totalmente irrelevantes e ineficazes.
78. Com efeito, em virtude, entre outros, do disposto nos artigos 3.º, 19.º, 36.º e 42.º do RGCU e seguintes a apreciação e aprovação dos projectos de obras de construção, bem como a emissão das respectivas licenças é da competência própria e exclusiva da DSSOPT e do seu director.
79. Por outro lado, a competência exclusiva atribuída à DSSOPT para a aprovação de projectos de obras, por resultar de lei expressa, é em virtude do estipulado no n.º 1 do artigo 31.º do CPA, irrenunciável e inalienável sendo que, no caso presente, não houve também qualquer avocação, delegação de poderes ou substituição do Senhor Director noutra entidade distinta da DSSOPT conforme se comprova por toda a documentação que integra o Processo n.º 12/98/L.
80. A prova cabal de que, no presente caso, a aprovação do projecto de obras apresentado pela Autora correspondeu ao exercício pela DSSOPT e pelo seu Director, e somente pelos mesmos, de uma competência própria e exclusiva resulta de toda a documentação junta ao Processo n.º 12/98/L, da qual é possível constatar que, para além das entidades exteriores cuja audição é imposta pelos artigos 6.º e 35.º do RGCU, apenas os técnicos e outros responsáveis, entre eles diversos chefes de departamento e funcionários de diversas categorias, daquele organismo público foram chamados a pronunciar-se sobre a viabilidade técnica e legal do projecto apresentado pela Autora.
81. Aliás, conforme a testemunha B frisou nunca houve da parte do Ex-Secretário A quaisquer contactos com os técnicos da DSSOPT sobre esta matéria.
82. Registe-se também o facto de, conforme comprova a ausência nos autos de qualquer documento nesse sentido, o DSSOPT jamais ter participado às entidades responsáveis quaisquer pressões de que tenha sido vítima por parte do Ex-Secretário A no sentido de aprovar o projecto de obras da Autora.
83. Um outro elemento que o Tribunal a quo ignorou foi o facto de os dois despachos de aprovação final do projecto da Autora terem sido proferidos pelo DSSOPT muito depois de o Ex-Secretário A ter sido detido e destituído das suas funções e de este o ter feito no exercício de competências próprias e exclusivas.
84. Efectivamente, A veio a ser detido em 6/12/06, ao passo que os dois despachos de aprovação final por parte da DSSOPT do projecto de obras a que se vem fazendo menção e cujo licenciamento se requer foram emitidos muito depois da referida data, concretamente em 15 e 9 de Novembro de 2007.
85. Acresce que, para além dos referidos despachos, o DSSOPT manteve em vigor todos os despachos de aprovação anteriormente proferidos, designadamente os despachos de 18/08/05 e 16/03/06 (vide does. n.ºs 2 e 3 juntos com a petição iniciai), e também a Planta de Alinhamento Oficial n.º 96A065, cuja aprovação é igualmente da sua única responsabilidade, que prevê como altura máxima de construção 147,2 metros, a isenção do cumprimento do artigo 88.º do RGCU aprovado pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M aprovando também o índice Líquido de Ocupação do Solo (ILOS) e o índice Líquido de Utilização do Solo (ILUS) para o respectivo edifício.
86. Ou seja, já depois da detenção e destituição da sua anterior tutela (o Ex-Secretário A) o DSSOPT não revogou os actos de aprovação do projecto da Autora anteriormente por si praticados, nem tão pouco invocou ou arguiu qualquer ilegalidade em relação aos mesmos, o que vem uma vez mais demonstrar à saciedade a sua conformidade legal e a total falta de interdependência lógica ou relação causa/efeito entre o acto de concessão do terreno vulgarmente designado por Quartéis de Mong Há e aquela aprovação.
87. Esta constatação é ainda reforçada pelo facto de já em 2009 e depois de instado pela Autora nos termos dos artigos 64.º e seguintes do CPA a informar em que estado se encontrava o processo de aprovação relativo ao projecto sub judice, o Réu ter vindo reiterar, em certidão assinada pelo seu próprio punho, que tal projecto havia sido aprovado por seu despacho de 9/11/07 e que, inclusive, a Autora já havia requerido a emissão da respectiva licença de obra, não invocando, mais uma vez, qualquer vício susceptível de pôr em causa a validade da referida aprovação e, muito menos, que a mesma se encontrava revogada ou padecia de qualquer ilegalidade (vide doc. n.º 7 junto com a petição inicial).
88. Outro sinal inequívoco da ausência de quaisquer vícios ou irregularidades em todo este processo e, mormente da tese dada como assente pelo Tribunal a quo é o facto de já em 29/09/09, na sequência da apresentação pela Autora junto da DSSOPT do projecto de obra relativo aos restantes andares e que foi elaborado obviamente de acordo com o projecto de alteração de arquitectura e o projecto de fundações (cave e rés-do-chão) aprovado, como se disse, em 2007 prevendo a construção de um edifício com 51 pisos e 147,2 metros de altura, a DSSOPT deu cumprimento ao disposto nos artigos 6.º e 35.º do RGCU, promovendo a audição das outras entidades competentes, nomeadamente do Corpo de Bombeiros, da Comissão de Segurança de Combustíveis e da Companhia de Electricidade de Macau, com a advertência de que a não resposta destas entidades no prazo legal de 30 dias se traduziria na inexistência de motivo impeditivo para o prosseguimento da tramitação do processo (conforme se comprova pelo doc. n.º 2 junto com a réplica).
89. É igualmente incompreensível que o Tribunal a quo não tenha dado qualquer valor à informação de fls. 41 e seguintes da pasta 13 do processo administrativo - a qual faz menção ao pedido de emissão da certidão a que acima se fez referência e à comunicação da Autora de que iria proceder ao início das obras - pedindo parecer jurídico e que contém também um parecer da Eng.a B, nessa altura já Subdirectora da DSSOPT.
90. É que, neste parecer é, pela primeira vez, mencionado a questão da altura do edifício e do ILOS e do ILUS não se fazendo, porém, a mais leve referência a qualquer intervenção do Ex-Secretário neste processo ou ao facto de aprovação destes índices terem resultado de instruções suas como forma de compensar a Autora pela não impugnação da atribuição da concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há à Companhia YY.
91. Mas o mais importante é que ponderado e analisado de fio a pavio todo o processo, como a testemunha B reconheceu no extenso depoimento que prestou em sede de julgamento, a então Subdirectora da DSSOPT concluiu no seu parecer que estavam reunidas as condições técnicas para a aprovação do projecto.
92. De realçar são também os Docs. A e B juntos pela Autora com o seu requerimento de 28 de Março de 2014 e que se referem a notícias publicadas na imprensa local onde se reportam as declarações prestadas pelo DSSOPT em sede do processo-crime que teve como arguido o Ex-Secretário A e que amiúde já se fez menção.
93. O que esses documentos atestam é que o Réu negou perante o Tribunal, no que a si se refere, a intervenção e pressões por parte de A no processo de concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há, tendo defendido a legalidade e regularidade deste processo, afiançando também não ter existido qualquer atropelo à lei e que só via vantagens no mesmo, algo que está em total contradição com os factos que o Tribunal a quo deu como assentes.
94. Merecedor de censura e estranheza é também o desprezo que o Tribunal a quo, à semelhança do que sucedeu em relação a todos os factos a que se vem fazendo menção, dedicou às certidões juntas como Doc. D com o requerimento de 28.03.2014 e que dizem respeito a projectos de obras aprovados pela DSSOPT com isenção do cumprimento do disposto no artigo 88.º do RGCU (a chamada lei de sombras) e do ILUS e ILOS previstos na circular n.º 5/DSOPT/87 ou em que são autorizados um ILUS e um ILOS em valores superiores aos que resultam da referida circular e também daquela que a veio a substituir (circular n.º 1/DSSOPT/2009), e em que que a DSSOPT procedeu, sem entraves de qualquer espécie, à emissão das respectivas licenças de obras.
95. Tais certidões contribuem para desmistificar a excepcionalidade que o Tribunal a quo pretende atribuir à aprovação do projecto da Autora, demonstrando que o mesmo não só cumpria e cumpre os parâmetros regulamentares, como em nada fugia à prática da DSSOPT.
96. Por último, é igualmente incompreensível que o Tribunal a quo tenha desvalorizado por completo o depoimento das testemunhas C - Chefe do Departamento de Planeamento Urbanístico da DSSOPT - e o Eng.º D - técnico superior assessor da DSSOPT e subscritor de vários ofícios dirigidos à Autora a aprovar o projecto (vide ofício n.º 17285/DURDEP/2007 da DSSOPT, fls. 2 do pasta XI, em que se comunica a aprovação do projecto de alteração e de alteração da estrutura condicionado ao cumprimento dos requisitos aí mencionados) - desvalorização que é comprovada pela ausência de qualquer menção a estes depoimentos que é feita no acórdão de fls. 622.
97. A importância de tais depoimentos deriva do facto de as testemunhas em apreço, ambas com posições de chefia na DSSOPT resultante da sua qualidade funcional e também delegada, terem tido intervenção directa nas aprovações do projecto da Autora e de terem confirmado a inexistência de qualquer ilegalidade nessas aprovações.
98. O que ressalta do depoimento da testemunha C (acima transcrito) é não só que as autorizações concedidas ao projecto da Autora foram precedidas e obedeceram a todos os trâmites normais e regulamentares, nomeadamente com a elaboração do parecer favorável à emissão da P.A.O. (vide fls. 138-140 do Vol. XIII) e que antecede o despacho do Ex-Secretário e não o contrário (!), mas também que a atribuição da isenção do cálculo da área de sombra e a autorização e de um ILUS superior ao previsto na circular 5/87 para o projecto da Autora resultou do sacrifício de áreas do seu terreno e das contrapartidas em prol do Governo que se dispôs a oferecer a Recorrente, nomeadamente através do fornecimento de lugares de estacionamento e que tal constitui uma situação normal.
99. Como tal, fica uma vez mais desmentida a interpretação que o Tribunal a quo deu à expressão "ajustamento urbanístico" a qual, como se viu, não encontra, em termos de prova qualquer fundamento.
100. Quanto à testemunha Eng.º D há que destacar a sua peremptória afirmação de que a circunstância de o terreno da Autora se situar numa zona branca foi e é um factor decisivo para a aprovação do projecto que a mesma submeteu junto da DSSOPT, deixando assim uma vez mais clara a ausência de qualquer base factual da tese adoptada pelo Tribunal a quo.
101. Assim, conforme decorre do supra exposto, ao dar como assentes os artigos 4.º, 5.º, 7.º e 8.º da base instrutória o Tribunal a quo incorreu num erro notório na apreciação da prova pelo que tal resposta deverá ser revogada e ser substituída por outra que dê tais quesitos como não provados.
C) Do artigo 12.º da base instrutória
102. A resposta dada pelo Tribunal a quo ao artigo 12.º da base instrutória - não provado - constitui mais um erro notório na apreciação da prova.
103. Com efeito, a matéria relativa a este quesito foi corroborada, sem margem para dúvidas, não só pela testemunha D como pela própria representante do Réu em sede de audiência de discussão e julgamento que confirmaram que a zona onde o terreno da Autora se situa é uma zona branca, ou seja uma zona onde não existem limitações especiais de natureza arquitectónica, de defesa do património ou outras, à altura dos edifícios.
104. Termos em que, deverá a decisão do Tribunal a quo relativamente ao artigo 12.º da base instrutória ser revogada e substituída por outra que dê como assente tal quesito.
IV. Do RECURSO SOBRE A SENTENÇA
105. Dando-se provimento, como legitimamente se espera, aos recursos interpostos supra, mormente aquele que a Recorrente interpôs do acórdão proferido sobre a matéria de facto, a consequência jurídica imediata é a de o Tribunal passar a ser confrontado com um quadro factual que deslegitima por completo as conclusões retiradas na sentença recorrida.
106. Mas ainda que tal não venha a suceder, mantendo-se inalterados os factos assentes, nunca os mesmos seriam idóneos para decidir no sentido em que o faz o Tribunal a quo, ou seja que os actos de aprovação do projecto da Autora praticados pelo DSSOPT devem considerar-se anulados por estarem feridos do vício de desvio de poder e da violação do princípio da legalidade e que, in casu, esta anulabilidade seria insanável por força de uma pretensa má fé da Autora!
107. Começando pela pretensa má fé da Autora importa referir que, a Meritíssima Juíza a quo repete a argumentação contida no acórdão proferido sobre a matéria de facto sobre essa alegada má fé, ou seja que a mesma se consubstanciaria no facto de a Recorrente, em contrapartida da aprovação do seu projecto, não ter impugnado judicialmente a decisão de atribuição do terreno dos Quartéis de Mong Há à Companhia YY.
108. Sucede que, nada nos autos permite concluir neste sentido, não tendo sido feita qualquer prova que indicie a veracidade desta alegação. Mas ainda que assim não fosse, hipótese que apenas por dever de patrocínio e à cautela se admite, nunca tal facto poderia ou poderá ser interpretado como significando uma demonstração de má fé da Autora ou factor de ilicitude na aprovação seu projecto.
109. Antes de mais importa recordar que, conforme expressamente a sentença recorrida admite, o inequívoco facto de a Autora não ter tido qualquer "intervenção ou participação activa no caso de corrupção do ex-STOP para a concessão dos "Quartéis de Mong Há" à Companhia YY" ou sequer ter "tomado conhecimento de que a concessão "Quartéis de Mong Há" foi fruto do caso de corrupção entre o ex-STOP e o empresário E".
110. Assim, mesmo admitindo a existência de uma sugestão por parte do Ex-Secretário no sentido de a Recorrente não impugnar a decisão do Governo de conceder o terreno em apreço a outra sociedade e em troca beneficiar de um aumento da altura do seu projecto, aquilo que releva é meramente o facto que a Autora teria recebido uma sugestão/proposta, seja o que for, do máximo responsável pela área das obras públicas no exercício das suas funções, numa época em que a sua autoridade e honestidade eram ponto assente.
111. Ou seja, sendo inquestionável o desconhecimento da Autora em relação às motivações do Ex-Secretário A para atribuir a concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há à Companhia YY, aquilo que sobraria seria um dirigente de topo da Administração (cuja reputação na altura dos factos era inatacável e acima de qualquer suspeita) transmitir à Autora através do órgão competente - o DSSOPT - que o interesse público ficaria melhor servido com a preterição do seu pedido de concessão, em benefício de outro pedido e que, para prossecução e concretização desse mesmo interesse, o Governo estaria disposto a rever as condições do projecto da Autora conquanto esta, naturalmente, deixasse cair a sua pretensão em relação à concessão do terreno contíguo ao seu, o terreno dos Quartéis de Mong Há.
112. Só seria legítimo falar-se em má fé da Autora, caso esta tivesse conhecimento do fim e das motivações ilegais subjacentes à decisão de atribuição da concessão do terreno dos Quartéis de Mong Há à Companhia YY cenário que, como se viu, é totalmente afastado pela própria sentença recorrida e numa análise objectivamente reportada à época dos factos.
113. E o mesmo se diga da eventualidade do projecto da Autora violar as disposições legais aplicáveis pois parte alguma da matéria de facto está dito que a Autora tinha conhecimento que a aprovação do seu projecto violaria a lei.
114. Em suma não resulta de nenhum dos documentos juntos aos autos, mormente os relativos ao processo instrutor que a Autora sabia que a aprovação do seu projecto iria constituir um benefício ilegítimo ou provocar a lesão de um interesse de terceiros ou do interesse público.
115. Pelo contrário, aquilo que resulta da matéria de facto e da documentação junta aos autos é que o projecto da Recorrente foi favoravelmente apreciado por variadíssimos engenheiros e arquitectos da DSSOPT, pertencentes a diversos departamentos, e mereceu o parecer favorável de todas as entidades que nos termos do artigo 35.º do RGCU foram chamadas a pronunciar-se sobre o mesmo, assim se afastando por completo a alegada má fé que o Tribunal a quo atribui à Autora.
116. No que concerne ao alegado vício de desvio de poder, que a sentença recorrida assaca aos actos de aprovação do DSSOPT, importa uma vez mais frisar que nunca o DSSOPT alegou em sua defesa este suposto vício em que o Tribunal a quo baseia a sua decisão de improcedência da acção.
117. Ou seja, o Tribunal a quo solucionou a questão de direito em apreço nos autos com base naquele vício, o que corresponde a uma causa de pedir não invocada anteriormente, conhecendo pois oficiosamente da pretensa anulabilidade que o mesmo geraria.
118. Sucede que, os vícios que são sancionados com a anulabilidade não são do conhecimento oficioso, visto que a invocação de vícios integra a causa de pedir e o juiz não pode conhecer de causas de pedir não alegadas pelo autor ou recorrente (artigo 5.º do CPC).
119. Destarte, ao conhecer do suposto vício de poder o Tribunal a quo violou os princípios do contraditório e de igualdade das partes, previstos nos artigos 3.º e 4.º do CPC respectivamente, e o princípio do dispositivo previsto no artigo 5.º do mesmo diploma legal, padecendo por isso de nulidade nos termos do artigo 571.º, n.º 1, alínea d) do CPC.
120. Doutro passo, conforme já se referiu, o vício de desvio de poder é exclusivo dos actos praticados ao abrigo do poder discricionário.
121. Ora, conforme a própria sentença deixa claro, o acto de aprovação de um projecto de obra não corresponde obviamente ao exercício de qualquer poder discricionário antes obedecendo a critérios técnicos definidos na lei e em regulamentos ou directrizes internos.
122. Neste particular, é evidente a contradição da sentença recorrida que ao mesmo tempo que faz apelo a uma extensa enunciação de requisitos legais e de ordem regulamentar a observar na aprovação de projectos de arquitectura, faz recair sobre o acto de aprovação do projecto da Autora o vício de desvio de poder que está confinado aos actos puramente discricionários e aspectos puramente discricionários do mesmo.
123. E não se diga que a concessão da isenção do cálculo da área de sombra constitui um acto discricionário, uma vez que para que qualquer projecto possa beneficiar de tal isenção terá de cumprir uma extensa lista de exigências regulamentares e legais relativas à construção, e mau seria que a decisão sobre a altura e volumetria dos edifícios correspondesse ao exercício de um poder discricionário.
124. Acresce que, no "caso de o fim de interesse público ser preterido completamente em proveito privado, é essencial o dolo, ou o «propósito consciente e deliberado» de prosseguir o fim ilegal".
125. Ora, não resulta da matéria de facto assente qualquer dado ou indício que permita concluir que o DSSOPT ao aprovar o projecto da Autora actuou com dolo, algo que só seria possível caso o mesmo tivesse tido conhecimento de antemão de alguma conduta criminosa do anterior Secretário (algo que não está sequer em equação e que o mesmo, aliás, negou nas declarações que prestou no julgamento que envolveu aquele antigo responsável público) ou tivesse sido cúmplice do mesmo.
126. Não há, pois, na aprovação do projecto da Autora qualquer intenção por parte do DSSOPT de prosseguir, de modo consciente e deliberado, um fim ilegal, pelo que também por essa via fica afastada a aplicação deste vício.
127. Para além do vício de desvio de poder, a sentença recorrida assaca ainda ao acto de aprovação do projecto da Autora uma suposta ilegalidade, traduzida na violação do artigo 88.º do RGCU, aprovado pelo Diploma Legislativo n.º 1600, de 31 de Julho de 1963, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M, de 15 de Novembro, o que impediria a consequente emissão da licença.
128. Em primeiro lugar, ao contrário do que a sentença recorrida dá por assegurado o citado artigo 88.º não constitui uma norma de carácter imperativo, nem a protecção de interesses de ordem pública impõe a sua aplicação cega e indiscriminada a todas as situações subjacentes, no sentido de que a sua observância tem em vista a defesa de um interesse fundamental e inderrogável.
129. No próprio RGCU, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 79/85/M de 21 de Agosto (ou seja em momento posterior ao da aprovação do decreto-lei que aprovou a redacção do mencionado artigo 88.º), é prevista a possibilidade de ser dispensado o cumprimento das disposições nele contidas por parte da entidade competente DSSOPT, mediante justificação técnica apresentada pelo respectivo técnico responsável.
130. Foi isto o que sucedeu no presente caso, em estrita observância da disposição legal a que se vem fazendo menção, conforme o comprova o relatório de fls. 136 e seguintes da pasta XIII do processo administrativo onde é dada, com natureza detalhada, uma explicação técnica para o facto de o projecto da Autora vir a beneficiar do ILOS e do LIUS que lhe foi atribuído.
131. Quanto às circulares n.º 5/87 e n.º 1/DSSOPT/2009 que são igualmente citadas pela sentença recorrida como sendo também normas de carácter público, ou seja vinculativas, que teriam sido violadas com a aprovação do projecto da Autora, torna-se necessário afirmar que essa pretensa natureza pública das pseudo normas que emanam das referidas circulares é desmentida em toda a linha pelo facto de as mesmas serem meras directrizes sem valor normativo autónomo.
132. Como tal, qualquer desvio ao que se preconiza nas mencionadas circulares nunca, em caso algum, poderia constituir uma ilegalidade.
133. Acresce que, é a própria circular n.º 01/DSSOPT/2009 a referir, na respectiva nota introdutória, constituir apenas um instrumento para a apreciação dos projectos e que o conteúdo das anteriores circulares, nomeadamente a adoptada pela DSSOPT aquando da aprovação do projecto da Autora, se encontrava desajustado face à evolução das técnicas de construção e das teorias arquitectónicas.
134. No que à aplicação do ILUS e do ILOS para o cálculo da edificabilidade admissível nos lotes de terreno é a própria circular a que se vem fazendo referência que, no ponto 5, o classifica de eventual.
135. In casu, a atribuição ao projecto da Autora da isenção do cumprimento do aludido artigo 88.º foi, pois, feita com base em ponderosas razões de natureza técnica, o mesmo sucedendo com o ILUS e o ILOS que o DSSOPT expressamente aprovou no caso presente (vide relatório/informação de fls. 136 e seguintes da pasta XIII do processo administrativo), tendo tal isenção merecido também o parecer favorável dos técnicos da DSSOPT, pelo que a aprovação pelo DSSOPT da P.A.O. relativa ao projecto da Autora não enferma de qualquer ilegalidade.
136. Por outro lado, importa ter novamente presente que a referida aprovação e isenção foram acompanhadas da imposição à Autora de diversas obrigações e contrapartidas a favor da RAEM, do domínio e interesse público, expressamente mencionadas na P.A.O.
137. Ademais, o projecto sobre o qual a DSSOPT, nos termos do artigo 35.º do RGCU, requereu a audição de entidades exteriores foi o projecto que veio a aprovar e que contempla um edifício de 147,2 metros de altura, não tendo recebido dessas mesmas entidades qualquer parecer desfavorável.
138. Daí que, por o projecto da Autora reunir todas as condições de natureza técnica necessárias, a própria informação técnica antecedente ao parecer que antecede a informação n.º 5377/DURDEP/2009 (fls. 2 e seguintes do Vol. XIII do processo instrutor) é elucidativa ao propor a "Autorização para a emissão da licença de obra de fundação e estrutura (desde a cave 5 até ao r/c)", no que foi secundada pelo parecer, assinado pela Senhora Subdirectora da DSSOPT que expressamente conclui que de "acordo com os aspectos técnicos referidos na presente informação, considera-se que se encontram reunidas as condições para a emissão da licença de fundações e de construção dos pisos em cave".
139. Ao contrário do que é afirmado na sentença recorrida a aprovação do projecto de obras da Autora, que prevê a construção de um edifício de 147,2 metros de altura, com isenção do cumprimento do artigo 88.º aprovado pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M de 15 de Novembro, não violou qualquer disposição legal, não existindo, por isso, qualquer impedimento legal à emissão da respectiva licença de obras.
140. Por último, a profusão de processos ou situações - algumas delas de características muito semelhantes às da Autora e outras em que, inclusive, as contrapartidas e obrigações a respeitar pelos proprietários são de carácter bem menos gravoso do que aqueles que a DSSOPT impôs à Recorrente e que significaram a constituição de servidão pública e a perda a favor da RAEM de 65% do seu terreno (propriedade perfeita) com a construção, a cargo da Autora, das respectivas infra-estruturas públicas - revela também o carácter altamente discriminatório com que as legítimas pretensões da Autora são tratadas, com isso sendo violando de forma grave o princípio da igualdade e da proporcionalidade previstos no artigo 5.º do CPA.
141. Além de não enfermar de qualquer ilegalidade, o acto de aprovação do projecto de arquitectura e do projecto de fundações e estruturas (cave e rés-do-chão) titulado pelo Despacho do Senhor Director de 9 de Novembro de 2007 e comunicado à Autora pelo ofício n.º 17285/DURDEP/2007 de 28 de Novembro o mesmo ano, é um acto definitivo.
142. Efectivamente, de acordo com o regime fixado no RGCU, o procedimento de licenciamento de uma obra de construção civil se desdobra em duas partes: a primeira relativa à apreciação do projecto de arquitectura e a segunda relativa à junção e apreciação dos projectos de especialidade com vista ao respectivo licenciamento.
143. Ora, ao aprovar o projecto de arquitectura e o projecto de fundações e estruturas o órgão administrativo competente emite uma decisão final sobre os aspectos acima mencionados, passando a referida aprovação a ter, como acima se disse, a natureza de um verdadeiro acto administrativo.
144. E ainda que se diga que a aprovação do projecto de obras (arquitectura e especialidades) configura um acto prévio, por pressupor o posterior licenciamento da obra, o mesmo, como acto prévio, obriga a Administração de modo final e vinculativo.
145. Com efeito, a apreciação do projecto é o momento certo para a DSSOPT verificar do cumprimento de uma série de condições, entre elas a cota altimétrica do edifício a construir, a viabilidade de dispensa de cumprimento do artigo 88.º do RGCU e a edificabilidade do lote de terreno, que ficam definitivamente decididas, tornando-se tal acto de apreciação e aprovação em relação a tais aspectos: a) não só constitutivo de direitos para o requerente do licenciamento, no sentido de este ter direito a que esses aspectos não voltem a ser postos em causa no decurso do procedimento; b) mas também vinculativo para a DSSOPT no momento da decisão da emissão da licença.
146. Este entendimento é corroborado pelo facto de a própria lei - vide artigos 30.º do RGCU - admitir a aprovação e licenciamento do projecto por fases, e de, nos casos em que tenha sido aprovado o projecto e requerida a respectiva licença de obras sem que a mesma tenha sido emitida no prazo legalmente estipulado, se conferir ao requerente o direito de dar início às obras sem a emissão da licença (vide artigo 43.º, n.º 2 do RGCU), considerando-se que após a aprovação do projecto se está numa fase em que já há uma garantia segura relativamente à possibilidade e ao direito o requerente efectuar a construção da obra, tal como ela consta do projecto de arquitectura aprovado.
147. Se após a aprovação do projecto de arquitectura e especialidades - que, in casu, foi o que sucedeu - se permitisse que a DSSOPT pudesse voltar a colocar tudo em causa, reapreciando questões que anteriormente já decidiu, para com base nelas indeferir o pedido de emissão da licença de construção, estar-se-iam a violar de forma grave os princípios da protecção da confiança, da segurança jurídica e da boa-fé, com isso causando danos aos particulares que confiaram na Administração.
148. Do supra exposto decorre também a evidência de que a tese sustentada pela Meritíssima Juíza a quo parte de um pressuposto errado: é que, a mesma, a aceitar-se por boa, o que nem sequer se admite, seria apenas concebível numa fase em que apenas o projecto de arquitectura foi aprovado, encontrando-se ainda por aprovar os restantes projectos de especialidade e, nomeadamente - quando o projecto é apresentado por fases, como é o caso deste - o projecto de fundações e estruturas.
149. Ora, no caso presente não foi apenas o projecto de arquitectura a merecer aprovação mas também o projecto de fundações e estruturas, cuja aprovação é, segundo o RGCU, necessária para a execução parcial dos trabalhos.
150. Assim, verifica-se que a aprovação do projecto de obra só poderá se alterada ou eliminada através dos regimes de revogação dos actos administrativos constitutivos de direitos revogação que, no caso presente, está vedada por não se verificarem os respectivos pressupostos legais.
151. Com efeito, ainda que se considerasse, hipótese que apenas se admite por cautela ou dever de patrocínio, que o acto de aprovação a que se vem fazendo referência seria um acto ilegal porque o mesmo estaria em contradição com o previsto no artigo 88.º do RGCU, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M, o que permitiria afirmar que o referido acto era anulável (e nunca nulo), o mesmo há muito que se consolidou.
152. É que, os actos administrativos anuláveis apenas podem ser revogados nos prazos estabelecidos no artigo 130.º do CPA (dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida), que no caso presente há muito que se esgotou.
153. Acresce que, a definitividade e executoriedade dos actos em apreço foram uma vez mais confirmadas pela certidão emitida pelo DSSOPT e junta como doc. n.º 7 da petição inicial em que aquele certifica não só a aprovação do projecto, como a satisfação pela Autora das condicionantes técnicas exigidas, mas também o pedido de emissão da licença nos prazos legalmente estipulados.
154. Por último, não se diga que uma pretensa má fé da Autora, (que manifestamente não existiu), teria como consequência a não sanação do vício da anulabilidade.
155. Tal peregrina tese que não encontra acolhimento legal nem jurisprudencial teria como efeito tornar um acto anulável num acto nulo o que não tem qualquer acolhimento legal.
156. Com efeito, ao contrário do que sucede com os actos feridos de nulidade em que a boa fé dos particulares ou a má fé da Administração não têm nunca a virtude de convalidar tal nulidade, transformando tais actos em actos válidos, a sanação da anulabilidade decorrente do previsto na alínea c) do n.º 2 do artigo 25.º do CPAC e do n.º 2 do artigo 130.º do CPA é automática e não fica sujeita a qualquer condição.
157. Igualmente legalmente infundada é a consideração sobre o indeferimento tácito dos pedidos da Autora pois o indeferimento tácito não é na realidade um acto administrativo, sendo varrido da ordem jurídica pelo eventual indeferimento expresso que venha a ser produzido e que, in casu, nunca sucedeu.
158. A figura do silêncio administrativo consiste sim numa garantia adjectiva do administrado estabelecida em seu exclusivo benefício, pelo que este não é obrigado a impugnar o acto tácito podendo optar por aguardar pela prática do acto expresso.
159. Assim, uma vez que o indeferimento tácito não é um verdadeiro acto administrativo, pois não tendo havido decisão também não poderá haver caso decidido, continuava a impender sobre o DSSOPT o dever legal de decidir expressamente a pretensão da Autora de emissão da licença de obra e todos os actos conexos, pelo que nunca os pedidos da Autora poderiam ser considerados intempestivos, como parece depreender-se da fundamentação da sentença recorrida.
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O Réu respondeu à motivação do recurso da Autora nos termos constantes a fls. 906 a 959 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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O Ministério Público emitiu o seguinte parecer:
“….
1. Do recurso do despacho de fls.287 a 289 dos autos
Nas alegações do recurso jurisdicional em apreço (vide. fls.699 a 777 dos autos), a autora/recorrente manifestou, em primeiro lugar, a discordância com o douto despacho de fls.287 a 289 dos autos, solicitando a revogação e substituição desse por outro que permitiria o pretendido aditamento das matérias mencionadas nas 16 e 17 conclusões das sobreditas alegações.
Nos termos do disposto no n.º1 do art.430º do CPC, o juiz deve, no despacho saneador, seleccionar a matéria de facto relevante segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito. Em obediência ao princípio dispositivo (art.5º do CPC), pode-se inferir que a relevância ou pertinência deve ser aferida em função das questões colocadas pelas partes.
Atendendo ao pedido e a causa de pedir delineados na petição bem como a excepção deduzida na contestação, entendemos que as matérias de facto cujo aditamento foi requerido pela autora/recorrente na Reclamação de fls.255 a 266v e nas 16 e 17 conclusões das alegações do recurso em exame não mostram relevantes, pelo que o despacho de fls.287 a 289 na parte de indeferir o apontado aditamento não eiva da deficiência, excesso ou obscuridade.
1.1- À luz da doutrina e jurisprudência autorizadas no que respeitem à alí. i) do n.º2 do art.122º do CPA, a «nulidade» invocada na contestação é manifestamente infundada. O que nos leva a entender que as matérias descritas nos arts.41º, 43º, 44º, 61º a 64º, 70º e 89º da Réplica são pois irrelevantes, e que é prudente o MMº Juiz autor do despacho atacado.
Por sua vez, a MMª Juiz a quo rejeitou peremptoriamente, na douta sentença de fls.662 e seguintes dos autos (vide. fls.22 dessa sentença), a tese preconizada e defendida pelo Réu na contestação. Essa decisão corrobora, a posteriori, a irrelevância das matérias atrás referidas.
1.2- Note-se que no requerimento por si entregue em 07//03/2005 e registado sob o n.ºT-1540 na DSSOPT (doc. de fls.218 a 228 do vol. 8 do P.A., dado aqui por reproduzido para os devidos efeitos), a autora/recorrente reconheceu expressamente que «其間本公司經會議及信函多次與運輸工務司及貴局溝通,……。會議期間經貴局傳達運輸工務司意見,有關部門已考慮接納YY國際置業投資有限公司之交換方案,並建議放寬本公司計劃之城規作為雙方爭議之解決方案。»
No mesmo documento, a autora/recorrente manifestou a vontade e posição de «故考慮接納上述有關放寬城規之解決方案», e logo declarou «現本公司向貴局遞交建議方案一份,如該建議方案被接納,本公司將放棄之前所提交合併方案申請,並請求閣下對本建議方案准予批准。»
Tudo isto evidencia indubitavelmente que o Novo Estudo Prévio da autora/recorrente foi elaborado de acordo com «故考慮接納上述有關放寬城規之解決方案», e que ela iria desistir o seu pedido de desenvolvimento em conjunto sob condição da aprovação do Novo Estudo Prévio.
Na sua petição, Reclamação e também no recurso jurisdicional, a autora/recorrente não arguiu a nulidade, anulabilidade ou a falsidade do reconhecimento e declaração acimas transcritos. Daí resulta que a vontade e o conhecimento declarados no requerimento n.ºT-1540 correspondem com a verdade e intenção real. Deste modo, são igualmente impertinentes as matérias descritas nos arts.25º, 26º e 53º da Réplica.
1.3- Como se demonstrará infra, parece-nos que os factos assentes especificados nas alíneas E e G a P do douto Despacho Saneador tornam irrelevantes as matérias aduzidas nos arts.67º, 69º, 118º, 131º e 189º da Réplica. Resumidamente, tais matérias não podem sustentar o direito pretendido pela autora/recorrente, nem desencadeiam qualquer influência à legalidade e validade dos vários despachos de aprovação.
1.4- Nos arts.117º, 151º e 153º da Réplica, a ora autora/recorrente pretendeu apelar ao princípio da igualdade. Repare-se que enquanto a violação deste princípio germana a invalidade e, desta maneira, constitui a causa de pedir de recurso contencioso, a conformidade com o mesmo não garante a validade dos despachos de aprovação. Sendo assim, não podem deixar de ser irrelevantes.
1.5- Com o aditamento do facto assente sob alínea V no Despacho Saneador, o art.132º da Réplica perdeu a autonomia. Pois, a explicação constante deste artigo é conclusiva e apenas opinião subjectiva da autora/recorrente, por isso, não dispõe de força probatória.
1.6- Ora bem, óbvio é que os arts.195º e 197º da Réplica contém em si apenas conclusão e matéria de direito, não carecem de prova. Daí decorre inquestionavelmente que não podem ser incluídos na «Selecção da Matéria de Facto».
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2. Do recurso das Respostas aos Quesitos 1º a 8º e 12º na base instrutória pelo Tribunal a quo
Concluído o julgamento de matéria de facto, o tribunal colectivo da 1ª instância deu como provados os quesitos 1º a 5º e 8º, não provados os 6º e 12º, e como provado o 7º no seguinte teor: PROVADO que a fim de fazer a Autora não manifestar interesse pelo terreno de Mong Há, o ex-Secretário ordenou que fosse libertada a altura do edifício que aquela pretendia construir no seu terreno, passando este dos iniciais 25 andares para 51 andares. (cfr. Acórdão de fls.622 a 624v dos autos)
2.1- Quanto às Respostas aos quesitos 1º a 3º da base instrutória, a autora/recorrente assacou o erro de julgamento de facto, solicitando que estes três quesitos passariam a ser considerados Não Provados por falta do despacho de concessão publicado no Boletim Oficial.
Ora, nos termos das disposições no n.º2 do art.125º bem como nos arts.127º e 128º da Lei n.º6/80/M aplicável ao vertente caso, o despacho de concessão publicado no Boletim Oficial constituía título da concessão e prova probatória, em juízo e fora dele, da identificação do terreno e das situações que nele estiverem descritas.
No entanto, não é válida a interpretação a contrario sensu. Pois, a omissão da publicação no Boletim Oficial do despacho de concessão não pode constituir prova plena da inexistência da concessão – Basta pensar na hipótese em que tendo sido já aceite por interessado, o despacho de concessão venha a ser revogado ou declarado nulo antes da publicação.
Ao abrigo do preceituado no art.578º do CPC, os 153º a 168º e 172º a 173º factos dados como provados pelo Venerando TUI no aresto proferido no Processo n.º53/2008 são oponíveis à autora/recorrente, e podem plenamente constatar os quesitos 1º a 3º da base instrutória. Daqui decorre indiscutivelmente a não verificação do arrogado erro de julgamento.
2.2- Em relação às Respostas dadas aos quesitos 4º, 5º, 7º e 8º da base instrutória, a autora/recorrente assacou o erro notório na apreciação de prova, pretendendo igualmente que estes quatro quesitos passariam a ser considerados Não Provados.
Recorte-se que no seu requerimento apresentado em 07//03/2005 e registado sob o n.ºT-1540 na DSSOPT (doc. de fls.218 a 228 do vol. 8 do P.A., dado aqui por reproduzido), a autora/recorrente manifestou expressamente a posição de «故考慮接納上述有關放寬城規之解決方案», e aí declarou conscientemente «現本公司向貴局遞交建議方案一份,如該建議方案被接納,本公司將放棄之前所提交合併方案申請,並請求閣下對本建議方案准予批准。» E o «projecto» aludido nesse requerimento (建議方案一份) reporta-se exactamente ao Novo Estudo Prévio constante de fls.220 a 228 do vol. 8 do P.A. apenso.
Sendo assim, e ressalvado o respeito pelo esforço disponibilizado pelo ilustre mandatário da autora/recorrente, as 39 a 101 conclusões das alegações do presente recurso jurisdicional não podem deixar de cair por vão, sob pena de venire contra factum proprium.
De outro lado, afigura-se-nos que as quatro Respostas do tribunal colectivo da 1ª instância atacadas pela autora/recorrente são acertadas e prudentes, e judiciosamente fundamentadas, mostrando-se em plena conformidade com o «critério de valoração racional e lógica do julgador, com a observação das regras de conhecimentos gerais e experiência de vida e dos critérios da lógica» (vide. aresto do TSI no Processo n.º184/2011), critério que foi sagazmente extraído pelo Venerando TSI e, na nossa óptica, se aplica também à apreciação e valoração de provas por tribunal da 1ª instância.
2.3- No que respeite à Resposta dada ao quesito 12º da base instrutória, a autora/recorrente assacou igualmente erro notório na apreciação de prova, reivindicando o depoimento da testemunha, por si arrolada, de nome D.
Salvo devido respeito pela opinião em sentido contrário, preferimos acreditar no douto ajuizamento do tribunal colectivo da 1ª instância que chegou a conclusão de não ter produzido prova suficiente para formar convicção segura sobre a veracidade sobre o 12º quesito. E colhemos que em boa verdade, a prova testemunhal não é capaz nem idónea para provar o 12º quesito, ou seja, a matéria descrita neste quesito não pode ser provado por prova testemunhal.
Pois, é sem dúvida que o Regulamento Geral da Construção Urbana aprovado pelo Diploma Legislativo n.º1600 de 31/07/1963 e alterado pelo D.L. n.º42/80/M aplica-se a toda a área da RAEM, por isso, a isenção ou libertação das limitações legais de altura arquitectónica, na medida em que constitui o regime excepcional ao art.88º do RGCU, depende das disposições especiais que preveja consagração expressa.
Assim que seja, e por não se descortinar disposição especial tanto no RGCU como no D.L. n.º79/85/M, a pretendida «zona branca» tem de ser irremediavelmente insubsistente e, deste forma, são pois descabidas as 102 a 104 das conclusões das alegações do recurso em apreço.
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3. Do recurso da Sentença final
Nas alegações de fls.699 a 777 dos autos, a autora/recorrente pediu a revogação da douta sentença impugnada e a sua substituição por aresto judicial que julgaria procedente o presente recurso, de modo a deferir os quatro pedidos formulados na petição e reiterados nas ditas alegações, sobretudo o (primeiro) pedido de emissão da licença de obra respeitante às fundações e estrutura do edifício correspondente ao projecto entregue por via do Requerimento n.ºT-1540.
3.1- Para os devidos efeitos, convém consignar que segundo nosso prisma, na douta sentença em escrutínio, a MMª Juiz a quo alicerçou a decisão da improcedência da «acção para determinação da prática de actos legalmente devido» em cinco argumentos nucleares, a saber:
- A anulabilidade, derivada do vício de desvio do poder, do despacho aprovativo do Plano de Alinhamento Oficial em 01//07/2005, e ainda de todos os actos subsequentemente praticados, visto a autora/recorrente fazer parte activa na irregularidade ou ilegalidade no procedimento do licenciamento da obra, procedimento «que se enferma da ilegalidade autónoma do processo de concessão dos “Quartéis de Mong Há”……»
- Assim, «não se reconhece à A. o direito de edificar, cuja satisfação depende dos todos os actos praticados conforme à lei no culminar do procedimento», daí «carece da A. direito ou faculdade de exigir a prática de demais actos administrativos, com vista a dar conclusão a procedimento do licenciamento de obra pela consolidação do direito de edificação, ora viciado pela violação do princípio da legalidade (cfr. art.ºs 3.º e 124.º do C.P.A. e art.º 38.º, alíneas a) e d) do RGCU).»
- A autora nunca adquire o direito à licença da obra, em virtude de que «Segundo o exarado na informação datada de 24 de Outubro de 2007, a emissão da licença das obras de fundações e estruturas do edifício a constituir no terreno em causa fica sujeita à sanação das deficiências, dado que o plano de escavação e apoio provisórios apresenta muitas deficiências em matéria de segurança, o que se pode concluir ainda não é tomada qualquer decisão no sentido de aprovar todos os projectos de arquitectura já apresentados.»
- E, «não se vê a expectativa legítima nem confiança legítima da A. merecedora da protecção jurídica, dado provado que a sua participação ser elemento indispensável para a anomalia ou irregularidade apurada do procedimento de licenciamento da obra em causa, aceitando “contrapartida” em decaimento das disposições vigentes para abstenção dos interesses pela requerida concessão dos “Quartéis de Mong Há”, falta assim o respeito pelos ditames e limites de “boa fé” que se pautam à actuação, quer a Administração Pública quer aos particulares (cfr. art.º 8.º, n.º1 do C.P.A.).»
- Afinal, o silêncio aos requerimentos deduzidos pela A. a partir de Janeiro de 2008 implica, sem dúvida, o respectivo indeferimento tácito, pelo que não se pode concluir pela omissão do R. da prática de acto legalmente devido, nomeadamente não cabendo ao R. emitir a licença de obra das fundações e estrutura do edifício, proceder ou realizar demais actos administrativo a fim de fazer concluir o requerido licenciamento da obra do edifício a construir, com base da PAO datada de 01/07/2005.
3.2- Adverte-nos prudentemente o Venerando TUI (cfr. o sumário no aresto emanado no Processo n.º10/2007): Se, em recurso contencioso de anulação, o interessado não tem o direito que se arroga, o Tribunal, por força do princípio do aproveitamento dos actos administrativos proferidos no uso de poderes vinculados – segundo o qual não se deve invalidar o acto administrativo, apesar do vício de violação de lei constatado, se o sentido da decisão do acto for aquele que o bom direito imporia - deve negar provimento ao recurso contencioso, ainda que o acto administrativo tivesse aplicado mal a lei ou tivesse invocado normas legais ou regulamentares inaplicáveis.
À luz dos pressupostos e finalidade previstos nos arts.103º e 104º do CPAC, estamos com convicção de que esta orientação jurisprudencial tem aplicação mais justificada em acções para determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos.
Em esteira, podemos inferir que a constatada inexistência do direito directamente reivindicado por autor no seu pedido determina, de forma inevitável e irremediável, a improcedência da correspectiva acção para determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos.
Nesta ordem, devemos indagar, em primeiro lugar, se a autora já adquiria o direito à emissão da licença de obra? e se o Réu ficava adstrito ao dever legal de emitir a licença de obra insistentemente requerida pela autora? Para tal efeito, impõe-se, antes de mais, delinear umas condutas do Réu que é, no caso sub iudice, o então director da DSSOPT:
- Em 01/07/2005, ele aprovou e também emitiu o Plano de Alinhamento Oficial (doc. de fls.143 a 146 dos autos), que corresponde com o projecto de arquitectura/estudo prévio apresentado em 07//03/2005 por via do Requerimento n.ºT-1540 da autora/recorrente;
- Em 09/11/2007, o Réu lançou despacho de «Concordo» na Informação especificada na alínea H dos «FACTOS ASSENTES» (doc. de fls.5 a 7 do vol.11 do P.A., dado por reproduzido), aprovando condicionalmente o projecto das fundações e estrutura (caves e rés-do-chão), sendo a notificação desse despacho especificado na alínea G dos «FACTOS ASSENTES»;
- Desde 22/01/2008 data em que a autora/recorrente requereu, pela primeira vez, a licença de obra, e face aos requerimentos e impulsos descritos nas alíneas J a P dos «FACTOS ASSENTES», o réu não efectuou nenhuma das diligências e procedimentos requeridos.
3.3- Mediante o documento de fls.91 dos autos, o Réu reconheceu que transmitira a instrução do ex-STOP A à autora/recorrente no sentido do «ajustamento adequado no âmbito do plano urbanístico» do edifício a construir por esta no seu terreno. O que significa que foi o ex-STOP A quem sugeriu à autora/recorrente para libertar a altura do edifício por si a construir. Pois, não se descortina indício de que para alcançar a libertação e o aumento da altura do sobredito edifício, a autora/recorrente socorresse dolo, corrupção, chantagem ou outros meios fraudulentos. O que implica a inexistência da má fé da autora/recorrente no procedimento de licenciamento por si instaurado.
A leitura da douta sentença recorrida imbui-nos impressão de que a MMª Juiz a quo não imputou má fé à autora/recorrente, apenas retirou a boa fé à mesma. Daqui resulta que não podem deixar de impertinentes as 106 a 115 conclusão nas alegações do recurso em apreço.
Elencado na alínea T dos factos assentes, o requerimento de fls.93 aos autos revelou que a autora/recorrente tinha consciente e séria dúvida da legalidade da concessão do terreno Quarteis Mong Há à «Companhia YY Internacional Limitada» representada por E (E).
Por seu turno, a resposta dada ao quesito 8 torna firme que a autora sabia que a altura foi libertada a fim de ela deixar de manifestar interesse no terreno Mong Há. Tal resposta leva seguramente a inferir que ela sabia também que o seu Estudo prévio de 07/03/2005 com a altura de 147.20m infringe os índices aplicáveis à zona do seu terreno (vide. quesito 11).
Na nossa óptica, a autora/recorrente não ficava obrigada a instaurar acção contra a concessão do terreno Mong Há à «Companhia YY Internacional Limitada» representada por E (E), o que a mesma não podia nem devia fazer é que tentou tirar um enorme e especulativo proveito cuja ilicitude e ilegitimidade não se deviam ignorar.
A inegável deslealdade do estudo prévio apresentado em conjunto com o Requerimento n.ºT-1540 em 03/03/2005 leva-nos a sufragar, com toda a tranquilidade, a penetrante posição da MMª Juiz a quo, no sentido de que falta à autora/recorrente o respeito pelos ditames e limites de boa fé, e ela não tinha expectativa legítima ou confiança legítima merecedora da protecção jurídica.
3.4- Ora bem, as Respostas dadas aos quesitos 4 e 7 constatam firmemente que o projecto de arquitectura/estudo prévio apresentado por via do Requerimento n.ºT-1540 da autora/recorrente e o correspondente PAO foram aprovados e emitidos em 01/07/2005 pelo Réu sob pressão do ex-STOP A, que dera ordem verbal e expressa ao Réu no sentido de este aprovar e emitir o PAO de acordo com o sobredito estudo prévio ou projecto de arquitectura da autora/recorrente.
Embora seja seriamente duvidosa a legalidade do cumprimento (pelo Réu) do dever de obediência à ordem do ex-STOP A supra mencionada, o que é inequívoco é que foi ex-STOP A quem ordenou e determinou a aprovação e emissão do PAO em 01/07/2005.
É verdade indubitável que a autora/recorrente não tinha nenhuma intervenção nos crimes de corrupção passiva para acto ilícito imputados ao ex-STOP A em conluio com E (E) que agiu em nome e representação da Companhia de Fomento Predial e Investimento YY Internacional Limitada.
Porém, ao dar ordem verbal e expressa ao Réu no sentido de este aprovar e emitir o PAO de acordo com aquele estudo prévio da autora, o ex-STOP A actuou com a intenção e finalidade de encobrir o crime de corrupção passiva para acto ilícito cometido pelo ex-STOP A no processo de concessão do terreno denominado de Quarteis Mong Há ao indivíduo E (E).
Nos arestos tirados nos processos n.º11/2012 e n.º48/2012, o Venerando TUI firmou a nulidade dos despachos de adjudicação (de terrenos) prolatados pelo Exmo. Sr. Chefe do Executivo com base nos correlativos pareceres emitidos do ex-STOP A com a finalidade e motivação de receber corrupções para actos ilícitos.
Na nossa óptica, aquela ordem expressa do ex-STOP A desencadeia influência mais forte e decisiva ao Réu do que os pareceres submetidos ao Exmo. Sr. Chefe do Executivo. Pois, na estrutura administrativa da RAEM (arts.2º 8º n.º3 da Lei n.º2/1999 e 6º do Regulamento Administrativo n.º6/1999), enquanto o cargo do Chefe do Executivo é hierarquicamente superior ao cargo do STOP, o director da DSSOPT é apenas subalterno do STOP.
Sem perder da vista que para efeitos da libertação da altura do edifício para a 147.20m, a autora/recorrente não praticou crimes, vale realçar que foi o ex-STOP A quem ordenou decisivamente a aprovação e emissão do PAO, com a única finalidade e motivação de encobrir as corrupções para actos ilícitos.
Nestes termos, e atendendo à apontada inegável deslealdade do estudo prévio apresentado em conjunto com o Requerimento n.ºT-1540 em 03/03/2005 pela autora, afigura-se-nos que é nulo o despacho de aprovação e emissão do correspondente PAO em 01/07/2005 pelo Réu, e desta forma, não produz efeitos jurídicos.
Interpretando habilmente as disposições nos arts.36º a 40º do D.L. n.º79/85/M (vide. acórdão prolatado no Processo n.º992/2015), o Venerando TSI inculca: só o despacho de aprovação final duma certa obra tem a virtude de afirmar que a mesma se conforma com todos os aspectos e critérios legalmente estabelecidos e, por isso mesmo, está em condição de ser executada.
Em homenagem desta prudente jurisprudência, inclinamos a entender que mesmo esse despacho de aprovação e emissão do PAO pelo Réu em 01/07/2005 não fosse nulo e se consolidasse na ordem jurídico, só por si não deu luz ao direito de edificação, nem vincula a Administração.
3.5- Para além do sobredito despacho de aprovação e emissão do PAO em 01/07/2005, o Réu lançou, em 09/11/2007, ainda o despacho de «Concordo» na Informação no Proc. n.º12/98/L (T-5237 de 07/08/2007) (vide. factos assentes nas alíneas G e H, e doc. de fls.5 a 7 do vol. 2 do P.A.).
Note-se que o n.º5 dessa Informação aponta claramente «由於遞交的臨時開挖支護計劃存在著許多安全方面的缺陷,因此現階段並不具備條件可以考慮發出工程準照», e cuja alínea 6.03 sugere, de forma aplausível, apenas a aprovação condicional. Por isso, o ofício n.º17285/DURDEP/2007 contém a expressa informação de que «同時,當遵守上述各項意見後,本局才會對發出工程準照之申請作出審批» (doc. de fls.2 a 3 do vol. 2 do P.A.)
A nosso ver, a aprovação condicional dum projecto de arquitectura é, por natureza das coisas, de feitio de acto administrativo precário, e por isso, não produz efeito constitutivo de direitos ou interesses legalmente protegidos (Lino Ribeiro, José Cândido de Pinho: Código do Procedimento Administrativo de Macau – Anotado e Comentado, pp.753 a 754), não conferindo o direito à licença de obra à autora.
3.6- Sem prejuízo do elevado respeito pelo melhor entendimento em sentido contrário, chegamos à modesta opinião de que a autora ainda não adquiriu, ao intentar a acção decidida improcedente pela MMª Juiz a quo na douta sentença em questão, o direito à licença de obra, e não surgiu no Réu o correlativo dever legal de emitir tal licença.
Nesta linha de perspectiva, e não obstante a que a radical inércia do Réu a partir de 22/01/2008 (factos assentes nas alíneas I e P), segundo nos parece, não seja adequada para a reposição da legalidade e prossecução do interesse público, não podemos deixar de opinar que o presente recurso jurisdicional é improcedente, e os pedidos formulados nas alegações do mesmo recurso são descabidos.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso jurisdicional…”.
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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II – Factos
Foi assente a seguinte factualidade pelo Tribunal a quo:
- A Autora é dona e proprietária do prédio rústico sito na Rua de Kun Iam Tong, descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.º 2**** a folhas 134v do Livro B168M, e omisso na matriz Predial Urbana (fls. 33 a 35 dos autos) (alínea A) dos factos assentes).
- O prédio é composto por um terreno para construção com a área de 2.714 metros quadrados e encontra-se sujeito ao regime da propriedade privada (alínea B) dos factos assentes).
- No decorrer do ano de 1998, a Autora submeteu para apreciação e aprovação da D.S.S.O.P.T. um projecto de obras tendente à construção no terreno que compõe o Prédio de um edifício em regime de propriedade horizontal que se destina a ser comercializado (alínea C) dos factos assentes).
- Ao referido projecto foi atribuído o número de processo n.º 12/98/L (alínea D) dos factos assentes).
- Em 18/08/2005, 16/03/2006 e em 15/06/2007, a D.S.S.O.P.T. notificou a Autora da aprovação condicionada do projecto a que se vem fazendo menção, com as condicionantes referenciadas nos ofícios n.º 11136/DURDEP/2005, n.º 4183/DURDEP/2006 e nº 9766/DURDEP/2007 (fls. 39, 43, 47 e 48 dos autos, e fls. 99 a 100 do Vol. 10 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) (alínea E) dos factos assentes).
- A Autora, atempadamente, apresentou as necessárias modificações ao projecto (fls. 51 dos autos) (alínea F) dos factos assentes).
- Por ofício n.º 17285/DURDEP/2007 de 28/11/2007, foi a Autora notificada o seguinte: (fls. 56 a 57 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido)
“事由:申請核准位於澳門觀音堂之一幅土地,面積為2763m2的建築工程修改計劃 – 建築/地基至地面層結構修改計劃+臨時開挖支護計劃+申請發給地基及結構(地庫5至地面層)的工程准照(施工期24個月)
檔案編號:12/98/L
就上述事宜,現按照本局局長於本年11月9日所作之批示,通知貴公司,以下各項:
1. 已核准上述建築修改計劃及地基至地面層結構修改計劃,但須遵守以下意見:
1.1. 民政總署將發出的意見。
1.2. 地基至地面層結構修改計劃:
1.2.1. 根據《屋宇結構及橋樑結構之安全及荷載規章》第二十條及附件三之規定,應採用風力系數δf而不是單一的體型系數Cs去計算作用在建築物上的風力,但在遞交的風荷載計算書中,當中的數據並不清晰,須作出補充及澄清。
1.2.2. 須修正地基平面圖(圖號:EF1)上標注的岩層承載力。
1.2.3. 在計算各荷載組合下的地基反力時,由於只考慮了恒載和活載所產生的Mex和Mey,並沒有考慮相應的風和地震作用時所產生的Mex和Mey,因此,有關的計算結果並不正確,須作出修改。
1.2.4. 基於結構標高之修改,須遞交相應的地基圖則。
1.2.5. 仍須遵守本局6月15日第9766/DURDEP/2007號公函第12點意見。
2. 對於上述臨時開挖支護計劃,須按以下意見和要求作出修改及補充:
2.1. 在利用有限元程序分析擋土牆的變形和受力時,假定了擋土牆底部的結點設在基岩表面上並與岩體相連,然而,由於基岩結點的位移量很小,無形中使基岩約束了擋土牆底部的移動,但在客觀上,由於擋土牆底部的圍檁梁需在開挖完成後才可安裝,此圍檁樑並不能有效的約束開挖過程中擋土牆底部的移動。另外,分析模型中所選用的垂直邊界與擋土牆之距離太小,並不能充分地反映擋土牆的真正受力和變化,在一般情況下,此距離至小需取為開挖深度的2.5至3倍,因此,有關的擋土牆變形和受力分析存在著很大的安全缺陷。
2.2. 基於垂直邊界位置對擋土牆計算結果的影响,須重新考慮開挖區外圍固定性荷載的影响,同時,還須考慮一些施工流動性荷載及/或堆載的影响。
2.3. 對於擋土牆旁邊的入石工字鋼柱,由於它需承擔圍檁樑傳來的橫向荷載,因此,須覆核其安全性及基岩對它約束。
2.4. 在利用ETABS程序設計水平支撐及固檁樑時,第一、二層水平支撐除最外一跨的軸力不為零外,其餘各內跨的軸力皆為零,而第三至六層水平支撐也有類似的情況,此現象與實際上的「對頂作用」不符,須作出澄清及修改。
2.5. 對於第三至第六層水平支撐及圍檁樑,由於只承受三面側土壓力的作用,其中有一個方向的水平支撐並未能形成有效的對頂作用,但在遞交的設計中,並沒有就此問題作出處理。
2.6. 有關鋼桁架的設計,須考慮第一層與第二層支撐之間的側壓力最終傳給第一層支撐的壓力的影响,須指出計算中輸入的上、下弦杆構件橫向穩定約束的距離及提供有關的施工圖則,須提供低泥面標高處凸出地面的工字鋼柱的安全設計。
2.7. 對於卑利喇街空置地盤方向之臨時支護設計,須就彎壓杆件D1和D2橫向穩定約束的距離,及底部兩個支座點的受力傳至何處作出說明,另外,還須遞交解決此處高差但又不影响本樓宇地面層使用方案。
同時,當遵守上述各項意見後,本局才會對發出工程准照之申請作出審批。” (alínea G) dos factos assentes).
- O despacho referido na alínea G) dos factos assentes, datado de 09 de Novembro de 2007, da autoria do Director da D.S.S.O.P.T., foi o exarado na informação datada de 24 de Outubro de 2007 (fls. 5 a 7 do P.A., Volume 11, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido):
“事由:建築工程──建築/地基至地面層結構修改計劃+臨時開挖支護計劃+申請發給地基及結構(地庫5至地面層)的工程准照(施工期24個月)
案卷編號:12/98/L (T-5237 de 07/08/2007)
地點:澳門連接觀音堂街的一幅面積2763m2之土地
Sr. Chefe,
1. 因應本局6月15日第9766/DURDEP/2007號公函之意見和要求,申請人遞交了上述修改計劃及臨時開挖支護計劃,而根據該公函所述,本局已附有條件批准(Aprovado Condicionado)之前所遞交的工程計劃(T-2012 de 09/03/2007)。
2. 對於上述建築修改計劃,有關人士在MDJ內表示在地庫二至四層安裝隔火閘及加大地面層垃圾房的面積,因此,應諮詢IACM及本廳建築師之意見。
3. 審閱完上述地基至地面層結構修改計劃後,提出下列意見:
3.01 根據《屋宇結構及橋樑結構之安全及荷載規章》第二十條及附件三之規定,應採用風力系數δf而不是單一的體型系數Cs去計算作用在建築物上的風力,但在遞交的風荷載計算書中,當中的數據並不清晰,須作出補充及澄清;
3.02 須修正地基平面圖(圖號:EF1)上標注的岩層承載力;
3.03 在計算各荷載組合下的地基反力時,由於只考慮了恒載和活載所產生的Mex和Mey,並沒有考慮相應的風和地震作用時所產生的Mex和Mey,因此,有關的計算結果並不正確,須作出修改;
3.04 基於結構標高之修改,須遞交相應的地基圖則;
3.05 仍須遵守本局6月15日第9766/DURDEP/2007號公函第12點意見。
4. 審閱完上述臨時開挖支護計劃後,提出下列意見:
4.01 在利用有限元程序分析擋土牆的變形和受力時,假定了擋土牆底部的結點設在基岩表面上並與岩體相連,然而,由於基岩結點的位移量很小,無形中使基岩約束了擋土牆底部的移動,但在客觀上,由於擋土牆底部的圍檁梁需在開挖完成後才可安裝,此圍檁樑並不能有效的約束開挖過程中擋土牆底部的移動。另外,分析模型中所選用的垂直邊界與擋土牆之距離太小,並不能充分地反映出擋土牆的真正受力和變化,在一般情況下,此距離至小需取為開挖深度的2.5至3倍,因此,有關的擋土牆變形和受力分析存在着很大的安全缺陷;
4.02 基於垂直邊界位置對擋土牆計算結果的影响,須重新考慮開挖區外圍固定性荷載的影响,同時,還須考慮一些施工流動性荷載及/或堆載的影响;
4.03 對於擋土牆旁邊的入石工字鋼柱,由於它需承擔圍檁樑傳來的橫向荷載,因此,須覆核其安全性及基岩對它約束;
4.04 在利用ETABS程序設計水平支撐及圍檁樑時,第一、二層水平支撐除最外一跨的軸力不為零外,其餘各內跨的軸力皆為零,而第三至第六層水平支撐也有類似的情況,此現象與實際上的“對頂作用”不符,須作出澄清及修改;
4.05 對於第三至第六層水平支撐及圍檁樑,由於只承受三面側土壓力的作用,其中有一個方向的水平支撐並未能形成有效的對頂作用,但在遞交的設計中,並沒有就此問題作出處理;
4.06 有關鋼桁架的設計,須考慮第一層與第二層支撐之間的側壓力最終傳給第一層支撐的壓力的影响,須指出計算中輸入的上、下弦杆構件橫向穩定約束的距離及提供有關的施工圖則,須提供低泥面標高處凸出地面的工字鋼柱的安全設計;
4.07 對於俾利喇街空置地盤方向之臨時支護設計,須就彎壓杆件D1和D2橫向穩定約束的距離,及底部兩個支座點的受力傳至何處作出說明,另外,還須遞交解決此處高差但又不影响本樓宇地面層使用的方案。
5. 由於遞交的臨時開挖支護計劃存在着許多安全方面的缺陷,因此,現階段並不具備條件可考慮發出工程准照。
6. 結論:分析後,建議如下:
6.01 發急件寄送建築修改計劃諮詢IACM意見;
6.02 請本廳建築師審閱上述建築修改計劃;
6.03 附有條件批准(Aprovado Condicionado)上述建築修改計劃及地基至地面層結構修改計劃,有關人士須遵守和執行IACM和本廳建築師將發出的意見、及上述第3點各項意見;
6.04 對於上述臨時開挖支護計劃,須按上述第4點各項意見和要求作出修改及補充;
6.05 就申請發給工程准照之事宜,建議以上述第5點意見作回覆。
對於以上的建議,請 予考慮。” (alínea H) dos factos assentes).
- Em cumprimento do estabelecido no supra mencionado ofício, a Autora, por requerimento registado sob o n.º T-1062 datado de 22/01/2008, apresentou o projecto de alteração das fundações e estrutura (caves e rés-do-chão), solicitando ainda a emissão da respectiva licença de obras (fls. 63 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) (alínea I) dos factos assentes).
- Em Maio de 2009, ainda não tinha sido proferida qualquer decisão pela D.S.S.O.P.T. quanto ao referido requerimento n.º T-1062, nem emitida a respectiva licença de obras (alínea J) dos factos assentes).
- Em 31/07/2009, deu entrada na D.S.S.O.P.T. de uma comunicação, à qual foi atribuída a referência T-5336, nos termos da qual foi a D.S.S.O.P.T. informada, para os efeitos previstos pelo mencionado artigo 37º n.º 1º do RGCU, de que a Autora iria dar início às obras projectadas, no prazo de trinta dias a contar dessa data (fls. 12 a 24 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) (alínea K) dos factos assentes).
- Não obstante a comunicação assim efectuada, a D.S.S.O.P.T. não procedeu a qualquer notificação à Autora, nem a notificou de qualquer indeferimento do pedido de aprovação do projecto de fundações e estrutura (cave e rés-do-chão) do Edifício (alínea L) dos factos assentes).
- Em 01/09/2009, a Autora solicitou à D.S.S.O.P.T. a emissão da licença de obras, juntando para o efeito a declaração de responsabilidade pela direcção técnica da obra e a declaração de responsabilidade pela execução da obra (fls. 26 a 29 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) (alínea M) dos factos assentes)
- A D.S.S.O.P.T. não só não procedeu ao cálculo da taxa devida e a notificar a Autora para o seu pagamento, como também não emitiu a respectiva licença de obras respeitantes às fundações e estrutura (cave e rés-do-chão) (alínea N) dos factos assentes).
- Em 07/09/2009 foram requeridas à D.S.S.O.P.T. a realização das supra referidas diligências para fixar o alinhamento, as cotas de nível e confirmar as dimensões do Prédio, por requerimento à qual foi atribuída a referência n.º T-6129 (fls. 31 a 32, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) (alínea O) dos factos assentes)
- A D.S.S.O.P.T. não efectuou nenhuma das diligências e procedimentos requeridos (alínea P) dos factos assentes).
- Em 25/03/2003, a Autora dirigiu ao Chefe do Executivo um pedido de concessão por arrendamento, com dispensa de concurso público, de um outro terreno, contíguo ao seu, o prédio designado por “Antigo Asilo de Mong Ha” (também designado por quartéis de Mong Há), sito na Rua de Francisco Xavier Pereira, s/n, composto por um terreno com a área de 4498m2, descrito na CRP sob o n.º ****7 a fls 147 do livro B-48, inscrito a favor da Região Administrativa Especial de Macau (R.A.E.M.) sob o n.º ****5 a fls 29v do livro G-45 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.º 7214 (fls. 86 a 90, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) (alínea Q) dos factos assentes).
- O interesse da XX no terreno identificado supra prende-se com o seu aproveitamento conjunto com o prédio descrito na CRP sob o n.º 2****, propriedade da Autora, sito na Rua de Kun Iam Tong, como resulta do próprio requerimento: “A presente pretensão permitirá igualmente o reaproveitamento da parcela do referido prédio rústico com área de 1168m2 que, foi cedida ao Território para via pública e espaço livre, uma vez que não existia nenhum acesso ao mesmo” e ainda “Aliás, só com o desenvolvimento do prédio cuja concessão se requer poderá o prédio rústico de que a requerente é proprietária ser desenvolvido, tendo em conta que seria sempre necessário reservar uma parcela daquele para servir de acesso a este” (alínea R) dos factos assentes).
- O terreno conhecido como “Quartéis de Mong Há” veio efectivamente a ser concedido à “Companhia YY, International” (alínea S) dos factos assentes).
- Na sequência daquela concessão, a Autora, não se conformando com a decisão de concessão, apresentou o requerimento a fls. 93 dos autos ao Director da D.S.S.O.P.T., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (alínea T) dos factos assentes).
- A concessão referida na al. S) dos factos assentes veio a ser declarada nula por despacho do Chefe do Executivo de 28/05/2009, exarado na Informação n.º 86/DSODEP-2009, de 7/5 (fls. 95 a 97 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) (alínea U) dos factos assentes)
- Em 01/07/2005, o Director da D.S.S.O.P.T. emitiu a Planta de Alinhamento Oficial, constante de fls. 143 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (alínea V) dos factos assentes).
- A pretensão de concessão por arrendamento do prédio descrito em Q. dos Factos Assentes da Autora, não haveria de ser atendida, por intervenção no processo do ex-Secretário A (resposta ao quesito 1º da base instrutória).
- O terreno designado como “Quartéis de Mong Ha”, a pedido do empresário E, mediante um processo de corrupção, foi concedido à “Companhia de Construção e Investimento Predial YY International, Limitada”, da qual este empresário era gerente-geral, através da intervenção do ex-Secretário A (resposta ao quesito 2º da base instrutória).
- No caso do terreno dos “Quartéis de Mong Há”, o ex-STOP pretendia que este fosse atribuído à “Companhia de Construção e Investimento Predial YY International, Limitada”, independentemente de esta reunir ou não as melhores condições/projecto para o desenvolvimento do mesmo (resposta ao quesito 3º da base instrutória).
- Relativamente ao requerimento referido em T. dos Factos Assentes, o ex-Secretário, conhecedor do interesse da Autora pelo terreno “Quartéis de Mong Há”, expressamente ordenou, verbalmente, que fosse libertada a altura do edifício no prédio de Kun Iam Tong, propriedade da Autora, como forma desta deixar de reivindicar a concessão daquele terreno, sendo que poderia inclusivamente a Autora recorrer aos tribunais para impugnar judicialmente o indeferimento do seu pedido (resposta ao quesito 4º da base instrutória).
- A Autora, em vez de recorrer à via judicial pugnando pelo direito de lhe ser concedido o terreno contíguo ao seu para efeitos de aproveitamento conjunto, veio em 07 de Março de 2005, apresentar um novo estudo prévio – T-1540, para um edifício, desta vez com 147,20m de altura, a que corresponde 51 pisos, o que contrasta com os 25 pisos inicialmente previstos (resposta ao quesito 5º da base instrutória).
- A fim de fazer a Autora não manifestar interesse pelo terreno de Mong Há, o ex-Secretário ordenou que fosse libertada a altura do edifício que aquela pretendia construir no seu terreno, passando este dos iniciais 25 andares para 51 pisos (resposta ao quesito 7º da base instrutória).
- A Autora sabia que a altura do prédio foi libertada a fim de que deixasse de manifestar interesse pelo terreno de Mong Há (resposta ao quesito 8º da base instrutória).
- As circulares n.º 5/87 e n.º 1/DSSOPT/2009, ambas elaboradas pela D.S.S.O.P.T., no que respeita à matéria que ao presente processo interessa, estipulam: “A altura permitida dos edifícios a construir na RAEM e a edificabilidade admissível nos lotes é função da largura das vias públicas que lhes dão serventia, da classe de altura do edifício a construir, da natureza da sua utilização e da eventual aplicação de índices líquidos de ocupação e utilização do solo (ILOS e ILUS)” (resposta ao quesito 9º da base instrutória).
- Prevendo estas circulares condicionantes específicas para os edifícios das classes Alto e Muito Alto que:
“Os edifícios das classes A e MA ficam sujeitos às seguintes condicionantes:
- Cumprimento do disposto no artigo 88º do RGCU, conforme redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M, de 15 de Novembro de 1980.
- Cumprimento dos índices líquidos de ocupação e de utilização do solo (ILOS e ILUS) que constam da tabela I (circular nº 5/87) ou tabela II (circular nº 1/DSSOP/2009), consoante a tipologia do lote, a altura total do edifício a construir e a natureza da sua utilização.
- Nas vias de perfil transversal variável a DSSOPT poderá, nas plantas de alinhamento, estabelecer, no todo ou por partes, o valor da largura da via para efeito de cálculo das condições referidas nos pontos 5.1 e 5.2” (resposta ao quesito 10º da base instrutória).
- No caso do terreno pertencente à XX e seguindo as tabelas referidas na resposta dada ao artº 10º: Índices Líquidos de Ocupação e de Utilização do Solo (ILOS e ILUS), o ILUS permitido é 10 e o previsto para a edificação da XX (calculado consoante a área do terreno registado) é de 15,02, o que ultrapassa em 50% o valor permitido segundo os circulares referidos no art.º 9º (resposta ao quesito 11º da base instrutória).
- Nenhuma das entidades externas consultadas pela D.S.S.O.P.T. nos termos do artigo 35º do RGCU sobre o projecto da Autora que contempla um edifício de 147,2 metros de altura, emitiu parecer desfavorável ao mesmo (resposta ao quesito 13º da base instrutória).
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III – Fundamentação
1. Da insuficiência da matéria de facto:
Após a selecção da matéria de facto assente e integrada na Base Instrutória, a Autora, ora Recorrente, apresentou reclamação contra a mesma.
Por despacho proferido a fls. 287 dos autos, foi indeferida a aludida reclamação quase na sua totalidade.
Assim, ao abrigo do nº 3 do artº 430º do CPC, vem impugnar o despacho de indeferimento de fls. 287 em sede do recurso da decisão final.
Para a Autora, deveria aditar à matéria de facto assente os factos por si alegados nos artigos 25º, 26º, 41º, 43º, 44º, 53º, 61º, 63º, 64º, 67º, 69º, 70º, 89º, 117º, 118º, 131º, 132º, 135º, 139º, 143º, 151º, 153º, 189º, 195º e 197º da réplica, sob as seguintes alíneas:
V.
Toda a documentação junta ao Processo n.º 12/98/L da DSSOPT, relativo ao projecto de obras em questão foram apresentados pela Autora exclusivamente junto da DSSOPT.
X.
Nos termos do Processo n.º 12/98/L da DSSOPT, apenas os técnicos e outros responsáveis, entre eles diversos chefes de departamento e funcionários de diversas categorias, daquele organismo público foram chamados pronunciar-se sobre a viabilidade técnica e legal do projecto apresentado pela Autora.
Z.
Todas as comunicações, notificações, pareceres de natureza técnica e despachos, nomeadamente os relativos à aprovação, e quaisquer outros documentos recebidos pela Autora no âmbito do processo 12/98/L foram remetidos e são unicamente provenientes da DSSOPT.
AA.
A Autora e os seus responsáveis não foram constituídos arguidos ou considerados suspeitos da prática de qualquer acto ilícito relacionado com a atribuição da concessão referida supra na alínea S. e com eventuais contrapartidas ilícitas associadas à mesma.
BB.
Nas contrapartidas directas e indirectas identificadas pelo Tribunal de Última Instância no acórdão que proferiu no âmbito dos Autos de Processo Comum Colectivo n.º 53/2008 relativos ao processo-crime em que foi arguido o ex-secretário A pela atribuição da concessão referida na alínea S. não se conta a aprovação do projecto da Autora.
CC.
O Ex-Secretário A foi detido em 6/12/06, tendo na mesma data cessado funções e sido proposta ao Governo Central da República Popular da China a respectiva exoneração por Sua Excelência o Senhor Chefe do Executivo da RAEM.
DD.
Conforme resulta do doc. n.º 7 junto com a petição inicial de fls. e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, para além do despacho de aprovação referido na alínea G. não foram revogados os despachos de aprovação anteriormente proferidos, designadamente os despachos de 18/08/05 e 16/03/06 (vide docs. n.ºs 2 e 3 juntos com a petição inicial) e a Planta de Alinhamento Oficial n.º 96A065, que prevê como altura máxima de construção 147,2 metros, a isenção do cumprimento do artigo 88.º do RGCU aprovado pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M aprovando também o índice Líquido de Ocupação do Solo (ILOS) e o índice Líquido de Utilização do Solo (ILUS) para o respectivo edifício.
EE.
Em 29/09/09, na sequência da apresentação pela Autora junto da DSSOPT do projecto de obra relativo aos restantes andares do edifício a DSSOPT, em cumprimento do disposto nos artigos 6.º e 35.º do RGCU, promoveu a audição de entidades exteriores, nomeadamente do Corpo de Bombeiros, da Comissão de Segurança de Combustíveis e da Companhia de Electricidade de Macau, com a advertência de que a não resposta destas entidades no prazo legal de 30 dias se traduziria na inexistência de motivo impeditivo para o prosseguimento da tramitação do processo.
FF.
A Autora é a única requerente e interessada no processo n.º 12/98/L, em que foi proferido o acto de aprovação do projecto de obras.
GG.
Antes de a Autora ter submetido o projecto de alteração aprovado nos termos da alínea G. dos factos assentes - que contempla a construção de um edifício com altura de 147,2 metros - e quando ainda estava em apreciação o anterior projecto, a DSSOPT concedeu ao mesmo a isenção do cumprimento do artigo 88.º do RGCU.
HH.
Na sequência da submissão do projecto de alterações ao projecto de obras inicialmente apresentado o pedido de dispensa do cálculo da lei da sombra e a edificabilidade do lote de terreno formulado pela Autora mereceu o parecer favorável dos técnicos da DSSOPT.
II.
Na sequência de tais pareceres, o DSSOPT aprovou e assinou a Planta de Alinhamento Oficial relativa ao projecto da Autora que prevê expressamente a isenção da observância do artigo 88.º do RGCU aprovado pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M, ou seja a isenção de cálculo da lei de sombra, e 147,2 metros como altura máxima de construção e a edificabilidade do lote.
JJ.
Por força da aprovação da referida Planta de Alinhamento Oficial a Autora obrigou-se a ceder as seguintes áreas do terreno de que é proprietária:
- uma área de 168 m2 (Parcela B) que fica reservada como servidão pública, obrigatoriamente com finalidade de passeio público;
- a parte correspondente do solo da Parcela C, com a área de 1155m2, e até 3.5 metros do subsolo será considerado como servidão pública, assumindo a Autora a obrigação de construir a via pública e a instalação da infra-estrutura;
- uma área de 290 m2, parcela D, é destinada a via pública a construir pela Autora e a entregar à RAEM, livre e devoluta, após a conclusão das obras, para ser integrada no domínio público da RAEM; e
- uma área de 165 m2, parcela E, é destinada a zona verde pública, a construir pela Autora e a entregar à RAEM após a conclusão das respectivas obras, também para integrar domínio público da RAEM.
KK.
Nenhuma das entidades externas consultadas pela DSSOPT nos termos do artigo 35.º do RGCU sobre o projecto da Autora que contempla um edifício de 147,2 metros de altura, emitiu parecer desfavorável ao mesmo.
LL.
O acto de aprovação do projecto da Autora, a esta notificado nos termos do ofício referido na alínea G., não foi revogado pelo DSSOPT.
MM.
A DSSOPT tem isentado em inúmeras ocasiões os projectos de obras do cálculo da lei da sombra previsto no artigo 88.º da RGCU, nomeadamente nos seguintes projectos:
- terreno a que corresponde a PAO n.º 97A047;
- terreno em Macau, sito na Avenida Marginal do Lam Mau, PAO n.º 90A333;
- terreno no ZAPE, Lote A4, PAO n.º 2004A037;
- terreno no ZAPE, Lote A21, PAO n.º 2004A34/2003E13;
- terreno no ZAPE, Lote A2j, PAO n.º 94A058;
- obra na Calçada do Gaio, Processo n.º 523/02/L;
- Rua Ribeira do Patane, n.ºs 92-104, Processo n.º 223/05/L;
- Estrada do Coelho do Amaral, n.ºs 110-112, Processo n.º 324/05/L;
- Rua das Estalagens, n.ºs 51-55; Processo n.º 76/CT/2007/L;
- Avenida do Ouvidor Arriaga, n.º 44, Processo n.º 76/CT/2007/L;
- obra em Lam Mau, Lote PS1, Processo n.º 929/90/L;
- obra no Largo da Praia Grande, Zona A, Lote A9, Processo n.º 213/91/L;
- Processo n.º 650/92/L;
- obra no Largo da Praia Grande, Zona A, Lote 12, Processo n.º 488/03/L;
- Processo n.º 744/04/L, Windsor Arch;
- obra na Avenida Almirante Lacerda, n.ºs 178H-178L (antigo Teatro Lido), Processo n.º 558/05/L
- Nape, Zona B, Rua B2, Lote B, One Central, Processo n.º 573/2004/L;
- Zape, Lotes 9A 1 - 9A2, Processo n.º 605/L;
- Lote B4, junto da Avenida Marginal do Lam Mau, Processo n.º 160/05/L;
- obra na Travessa da Prosperidade, n.ºs 12-22;
- obra na Taipa, Lote 39, Edifício Fa Seng Prince;
- obra na Rua Coelho do Amaral, Processo n.º 210/05/L.
Sobre esta parte do recurso, o Dignº Magistrado do Mº Pº junto deste Tribunal emitiu o seguinte parecer:
“…
1. Do recurso do despacho de fls.287 a 289 dos autos
Nas alegações do recurso jurisdicional em apreço (vide. fls.699 a 777 dos autos), a autora/recorrente manifestou, em primeiro lugar, a discordância com o douto despacho de fls.287 a 289 dos autos, solicitando a revogação e substituição desse por outro que permitiria o pretendido aditamento das matérias mencionadas nas 16 e 17 conclusões das sobreditas alegações.
Nos termos do disposto no n.º1 do art.430º do CPC, o juiz deve, no despacho saneador, seleccionar a matéria de facto relevante segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito. Em obediência ao princípio dispositivo (art.5º do CPC), pode-se inferir que a relevância ou pertinência deve ser aferida em função das questões colocadas pelas partes.
Atendendo ao pedido e a causa de pedir delineados na petição bem como a excepção deduzida na contestação, entendemos que as matérias de facto cujo aditamento foi requerido pela autora/recorrente na Reclamação de fls.255 a 266v e nas 16 e 17 conclusões das alegações do recurso em exame não mostram relevantes, pelo que o despacho de fls.287 a 289 na parte de indeferir o apontado aditamento não eiva da deficiência, excesso ou obscuridade.
1.1- À luz da doutrina e jurisprudência autorizadas no que respeitem à alí. i) do n.º2 do art.122º do CPA, a «nulidade» invocada na contestação é manifestamente infundada. O que nos leva a entender que as matérias descritas nos arts.41º, 43º, 44º, 61º a 64º, 70º e 89º da Réplica são pois irrelevantes, e que é prudente o MMº Juiz autor do despacho atacado.
Por sua vez, a MMª Juiz a quo rejeitou peremptoriamente, na douta sentença de fls.662 e seguintes dos autos (vide. fls.22 dessa sentença), a tese preconizada e defendida pelo Réu na contestação. Essa decisão corrobora, a posteriori, a irrelevância das matérias atrás referidas.
1.2- Note-se que no requerimento por si entregue em 07//03/2005 e registado sob o n.ºT-1540 na DSSOPT (doc. de fls.218 a 228 do vol. 8 do P.A., dado aqui por reproduzido para os devidos efeitos), a autora/recorrente reconheceu expressamente que «其間本公司經會議及信函多次與運輸工務司及貴局溝通,……。會議期間經貴局傳達運輸工務司意見,有關部門已考慮接納YY國際置業投資有限公司之交換方案,並建議放寬本公司計劃之城規作為雙方爭議之解決方案。»
No mesmo documento, a autora/recorrente manifestou a vontade e posição de «故考慮接納上述有關放寬城規之解決方案», e logo declarou «現本公司向貴局遞交建議方案一份,如該建議方案被接納,本公司將放棄之前所提交合併方案申請,並請求閣下對本建議方案准予批准。»
Tudo isto evidencia indubitavelmente que o Novo Estudo Prévio da autora/recorrente foi elaborado de acordo com «故考慮接納上述有關放寬城規之解決方案», e que ela iria desistir o seu pedido de desenvolvimento em conjunto sob condição da aprovação do Novo Estudo Prévio.
Na sua petição, Reclamação e também no recurso jurisdicional, a autora/recorrente não arguiu a nulidade, anulabilidade ou a falsidade do reconhecimento e declaração acimas transcritos. Daí resulta que a vontade e o conhecimento declarados no requerimento n.ºT-1540 correspondem com a verdade e intenção real. Deste modo, são igualmente impertinentes as matérias descritas nos arts.25º, 26º e 53º da Réplica.
1.3- Como se demonstrará infra, parece-nos que os factos assentes especificados nas alíneas E e G a P do douto Despacho Saneador tornam irrelevantes as matérias aduzidas nos arts.67º, 69º, 118º, 131º e 189º da Réplica. Resumidamente, tais matérias não podem sustentar o direito pretendido pela autora/recorrente, nem desencadeiam qualquer influência à legalidade e validade dos vários despachos de aprovação.
1.4- Nos arts.117º, 151º e 153º da Réplica, a ora autora/recorrente pretendeu apelar ao princípio da igualdade. Repare-se que enquanto a violação deste princípio germana a invalidade e, desta maneira, constitui a causa de pedir de recurso contencioso, a conformidade com o mesmo não garante a validade dos despachos de aprovação. Sendo assim, não podem deixar de ser irrelevantes.
1.5- Com o aditamento do facto assente sob alínea V no Despacho Saneador, o art.132º da Réplica perdeu a autonomia. Pois, a explicação constante deste artigo é conclusiva e apenas opinião subjectiva da autora/recorrente, por isso, não dispõe de força probatória.
1.6- Ora bem, óbvio é que os arts.195º e 197º da Réplica contém em si apenas conclusão e matéria de direito, não carecem de prova. Daí decorre inquestionavelmente que não podem ser incluídos na «Selecção da Matéria de Facto».
…”
Trata-se duma posição com a qual concordamos na sua íntegra. Assim, com a devia vénia e em nome da economia processual, fazemos como nossos os fundamentos constantes do parecer acima transcrito, para negar provimento ao recurso nesta parte.
2. Da impugnação da decisão da matéria de facto:
Vem a Autora impugnar a decisão da matéria de facto quanto aos quesitos 1º a 8º, e 12º da Base Instrutória, a saber:
1º
A pretensão de concessão por arrendamento do prédio descrito em Q. dos Factos Assentes da Autora, não haveria de ser atendida, por intervenção no processo do ex-Secretário A?
2º
O terreno designado como “Quartéis de Mong Há”, a pedido do empresário E, mediante um processo de corrupção, foi concedido à “Companhia de Construção e Investimento Predial YY International, Limitada”, da qual este empresário era gerente-geral, através da intervenção do ex-Secretário A?
3º
No caso do terreno dos Quartéis de Mong Há, o ex-SOPT pretendia que este fosse atribuído à “Companhia de Construção e Investimento Predial YY International, Limitada”, independentemente de esta reunir ou não as melhores condições/projecto para o desenvolvimento do mesmo?
4º
Relativamente ao requerimento referido em T. dos Factos Assentes, o ex-Secretário, conhecedor do interesse da Autora pelo terreno “Quartéis de Mong Há”, expressamente ordenou, verbalmente, que fosse libertada a altura do edifício no prédio de Kun Iam Tong, propriedade da Autora, como forma desta deixar de reivindicar a concessão daquele terreno, sendo que poderia inclusivamente a Autora recorrer aos tribunais para impugnar judicialmente o indeferimento do seu pedido?
5º
A Autora, em vez de recorrer à via judicial pugnando pelo direito de lhe ser concedido o terreno contíguo ao seu para efeitos de aproveitamento conjunto, veio em 7 de Março de 2005, apresentar um novo estudo prévio - T-1540, para um edifício, desta vez com 147,20m de altura, a que corresponde 51 pisos, o que contrasta com os 25 pisos inicialmente previstos?
6º
A Autora, em declarações ao tribunal no Processo comum colectivo nº 53/2008, afirmou que não tinha recorrido à via judicial relativamente ao indeferimento do seu pedido de concessão do terreno Quartéis de Mong Há, porque a Administração lhe tinha, sic, dado um rebuçado?
7º
O ex-Secretário, como contrapartida por não ter concedido o terreno de Mong Há à Autora, ordenou que fosse libertada a altura do edifício que aquela pretendia construir no seu terreno, passando este dos iniciais 25 andares para 51 pisos?
8º
A Autora sabia que a altura do prédio foi libertada a fim de que deixasse de manifestar interesse pelo terreno de Mong Há?
12º
A zona onde se insere o edifício que a Autora pretende construir no seu terreno é vulgarmente designada por zona branca, significando com isso tratar-se de uma zona onde não existem limitações especiais de natureza arquitectónica, de defesa do património ou outras, à altura dos edifícios?
O Tribunal a quo considerou provados os quesitos 1º a 5º e 8º e não provados os quesitos 6º e 12º.
Quanto ao quesito 7º, considerou provado que “a fim de fazer a Autora não manifestar interesse pelo terreno de Mong Há, o ex-Secretário ordenou que fosse libertada a altura do edifício que aquela pretendia construir no seu terreno, passando este dos iniciais 25 andares para 51 pisos.”
Na sua óptica, os quesitos 1º, 3º, 4º, 5º, 7º e 8º da base instrutória deveriam ser não provados e o quesito 12º deve ser considerado provado.
O Tribunal a quo justificou a sua convicção nos seguintes termos:
“...
A convicção do Tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos, no depoimento das testemunhas ouvidas em audiência que depuseram sobres os quesitos da base instrutória, cujo teor se dá reproduzido aqui para todos os efeitos legais, o que permite formar uma síntese quanto à veracidade dos apontados factos.
Em relação aos factos constantes dos quesitos 1º a 3º, a convicção do Tribunal baseou-se essencialmente nos documentos juntos aos autos, nomeadamente a certidão do acórdão do Tribunal de Última Instância no processo nº 53/2008, actualmente com o nº CR3-09-0146-PCC, do parecer de fls. 52 do processo administrativo Vol. II.
No que se concerne aos factos constantes dos quesitos 4º, 5º, 7º e 8º, o Tribunal convence-se com o teor dos documentos de fls. 74 e 75 do processo administrativo do DSSOPT, Vol II, complementado com o depoimento da testemunha B que estava presente na reunião de 14/12/2004. Em particular, essa testemunha explicou que a expressão “ajustamento no âmbito do planeamento urbanístico” mencionado naquele documento se refere normalmente a libertação da altura do edifício e o aumento das áreas de utilização e é assim compreendido dentro ramo de construção. Por outro lado, a ideia de libertação da altura foi registada também na minuta de fls. 75 anexo ao memorando, o que levou o Tribunal a convencer que a mensagem transmitida ao representante legal da Autora naquela reunião foi a libertação da altura do terreno como “compensação” de não concessão do Quartéis de Mong Há. Conjugando ainda com o teor dos documentos sobre a análise do estudo prévio do novo projecto apresentado pela Autora em 07/03/2005, (de fls. 136 a 142 da pasta nº 13) em que indicia que o alargamento dos condicionamentos urbanísticos provinha da instrução ao ex-secretário o qual determinou a isenção de cálculo de lei de sombra. Através desse meio é que permitiu a aprovação do projecto mesmo sem a observância dos requisitos previstos nos circulares nº 5/87. Tudo isso levou o Tribunal a acreditar que a isenção de cálculo de sombra foi fruto da instrução do ex-secretário com vista a fazer a Autora não pôr em causa a decisão de indeferimento de concessão.
Dos requerimentos formulados pela própria Autora, de fls. 35 a 38 do vol. II e de fls. 43 e 48 do vol. I do processo administrativo anexo ao processo, resulta que antes e depois da decisão quanto a concessão do terreno à sociedade YY, a Autora insistiu o seu interesse no terreno nos Quartéis de Mong Há, até manifestou, em 09/02/2005, a sua discordância com a decisão da administração, mas em 07/03/2005, a Autora apresentou um novo projecto segundo o qual a área bruta de utilização total do mesmo terreno aumentou 25467.47 m2 (de fls. 2 a 15 da pasta nº 5) para 41409.00 m2 (de fls. 171 a 176 da pasta nº 13), e, acabou por não impugnar a decisão de indeferimento. As atitudes manifestadas pela Autora eram incoerentes. Mas no requerimento de 01/03/2005, a própria Autora admitiu “estar em curso um acordo sobre o seu pedido de concessão”. Daí se explicou que a mudança das posições pela Autora foi fruto dum acordo e não de conformidade com a decisão em causa. Com isso, acreditamos que a Autora, bem percebida a mensagem do ex-secretário transmitida pelo director do DSSOPT na reunião de 14/12/2004, ponderada e acabou por aceitar essas condições com a apresentação de novo projecto. Tudo indica que a Autora bem sabia que a altura do edifício foi libertada por instruções do ex-secretário em troca de não impugnação da decisão da concessão de terreno à sociedade YY.
Quanto aos factos constantes dos quesitos 9º, 10º e 11º, esses factos são considerados como provados essencialmente com base nos dois circulares juntos aos autos e de documento de fls. 132 a 134 e 136 da pasta nº 13, o que se afigura ter força suficiente para comprovar esses factos.
Não se ficou provado o facto dos quesitos 6º e 12º por não ter produzida prova suficiente para formar convicção segura sobre a veracidade de tais factos.
…”.
Quid iuris?
Antes de mais, é de notar que não obstante a Autora ter afirmado impugnar a decisão da matéria de facto quanto aos quesitos 1º a 8º e 12º da Base Instrutória, o certo é que quanto ao quesito 6º, nada referiu em concreto na sua motivação do recurso longa.
Assim, não é de apreciar a impugnação da decisão da matéria de facto em relação ao quesito 6º.
Como é sabido, segundo o princípio da livre apreciação das provas previsto nº 1 do artigo 558.º do CPC, “O tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”.
A justificar tal princípio e aquilo que permite a existência do mesmo, temos que o Tribunal a quo beneficia não só do seu prudente juízo e experiência, como da mais-valia de um contacto directo com a prova, nomeadamente, a prova testemunhal, o qual se traduz no princípio da imediação e da oralidade.
Sobre o princípio da imediação ensina o Ilustre Professor Anselmo de Castro (in Direito Processual Civil, I, 175), que “é consequencial dos princípios da verdade material e da livre apreciação da prova, na medida em que uma e outra necessariamente requerem a imediação, ou seja, o contacto directo do tribunal com os intervenientes no processo, a fim de assegurar ao julgador de modo mais perfeito o juízo sobre a veracidade ou falsidade de uma alegação”.
Já Eurico Lopes Cardoso escreve que “os depoimentos não são só palavras, nem o seu valor pode ser medido apenas pelo tom em que foram proferidas. Todos sabemos que a palavra é só um meio de exprimir o pensamento e que, por vezes, é um meio de ocultar. A mímica e todo o aspecto exterior do depoente influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe.” (in BMJ n.º 80, a fls. 220 e 221)
Por sua vez Alberto dos Reis dizia, que “Prova livre quer dizer prova apreciada pelo julgador seguindo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei. Daí até à afirmação de que o juiz pode decidir como lhe apetecer, passando arbitrariamente por cima das provas produzidas, vai uma distância infinita. (...) A interpretação correcta do texto é, portanto, esta: para resolver a questão posta em cada questão, para proferir decisão sobre cada facto, o tribunal aprecia livremente as provas produzidas, forma sua convicção como resultado de tal apreciação e exprime-a na resposta. Em face deste entendimento, é evidente que, se nenhuma prova se produziu sobre determinado facto, cumpre ao tribunal responder que não está provado, pouco importando que esse facto seja essencial para a procedência da acção” (in Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora IV, pago 570-571.)
É assim que “(...) nem mesmo as amarras processuais concernentes à prova são constritoras de um campo de acção que é característico de todo o acto de julgar o comportamento alheio: a livre convicção. A convicção do julgador é o farol de uma luz que vem de dentro, do íntimo do homem que aprecia as acções e omissões do outro. Nesse sentido, princípios como os da imediação, da aquisição processual (art. 436º do CPC), do ónus da prova (art. 335º do CC), da dúvida sobre a realidade de um facto (art. 437º do CPC), da plenitude da assistência dos juízes (art. 557º do CPC), da livre apreciação das provas (art. 558º do CPC), conferem lógica e legitimação à convicção. Isto é, se a prova só é "livre" até certo ponto, a partir do momento em que o julgador respeita esse espaço de liberdade sem ultrapassar os limites processuais imanentes, a sindicância ao seu trabalho no tocante à matéria de facto só nos casos restritos no âmbito do arts. 599º e 629º do CPC pode ser levada a cabo. Só assim se compreende a tarefa do julgador, que, se não pode soltar os demónios da prova livre na acepção estudada, também não pode hipotecar o santuário da sua consciência perante os dados que desfilam à sua frente. Trata-se de fazer um tratamento de dados segundo a sua experiência, o seu sentido de justiça, a sua sensatez, a sua ideia de lógica, etc. É por isso que dois cidadãos que vestem a beca, necessariamente diferentes no seu percurso de vida, perante o mesmo quadro de facto, podem alcançar diferentes convicções acerca do modo como se passaram as coisas. Não há muito afazer quanto a isso.” (Ac. do TSI de 20/09/2012, proferido no Processo nº 551/2012)
Deste modo, “A reapreciação da matéria de facto por parte desta Relação tem um campo muito restrito, limitado, tão só, aos casos em que ocorre flagrantemente uma desconformidade entre a prova produzida e a decisão tomada, nomeadamente quando não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação” (Ac. do STJ de 21/01/2003, in www.dgsi.pt)
Com efeito, “não se trata de um segundo julgamento até porque as circunstâncias não são as mesmas, nas respectivas instâncias, não bastando que não se concorde com a decisão dada, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de erro na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efectivamente, no caso, foram produzidos.(...).” (Ac. do RL de 10/08/2009, in www.dgsi.pt.)
Isto é, uma coisa é não agradar o resultado da avaliação que se faz da prova, e outra bem diferente é se detectarem no processo de formação da convicção do julgador erros manifestos de julgamento, incluindo eventuais violações de regras e princípios de direito probatório.
No caso em apreço, em face da prova efectivamente produzida e atentas as regras e entendimento acima enunciados, não conseguimos detectar algum erro manifesto de julgamento, nem qualquer violação de regras e princípios de direito probatório por parte do Tribunal a quo, pelo que o recurso não deixará de se julgar improvido nesta parte.
Na realidade, como bem observou o Dignº Magistrado do Mº Pº junto deste TSI que:
“…
2.1- Quanto às Respostas aos quesitos 1º a 3º da base instrutória, a autora/recorrente assacou o erro de julgamento de facto, solicitando que estes três quesitos passariam a ser considerados Não Provados por falta do despacho de concessão publicado no Boletim Oficial.
Ora, nos termos das disposições no n.º2 do art.125º bem como nos arts.127º e 128º da Lei n.º6/80/M aplicável ao vertente caso, o despacho de concessão publicado no Boletim Oficial constituía título da concessão e prova probatória, em juízo e fora dele, da identificação do terreno e das situações que nele estiverem descritas.
No entanto, não é válida a interpretação a contrario sensu. Pois, a omissão da publicação no Boletim Oficial do despacho de concessão não pode constituir prova plena da inexistência da concessão – Basta pensar na hipótese em que tendo sido já aceite por interessado, o despacho de concessão venha a ser revogado ou declarado nulo antes da publicação.
Ao abrigo do preceituado no art.578º do CPC, os 153º a 168º e 172º a 173º factos dados como provados pelo Venerando TUI no aresto proferido no Processo n.º53/2008 são oponíveis à autora/recorrente, e podem plenamente constatar os quesitos 1º a 3º da base instrutória. Daqui decorre indiscutivelmente a não verificação do arrogado erro de julgamento.
2.2- Em relação às Respostas dadas aos quesitos 4º, 5º, 7º e 8º da base instrutória, a autora/recorrente assacou o erro notório na apreciação de prova, pretendendo igualmente que estes quatro quesitos passariam a ser considerados Não Provados.
Recorte-se que no seu requerimento apresentado em 07//03/2005 e registado sob o n.ºT-1540 na DSSOPT (doc. de fls.218 a 228 do vol. 8 do P.A., dado aqui por reproduzido), a autora/recorrente manifestou expressamente a posição de «故考慮接納上述有關放寬城規之解決方案», e aí declarou conscientemente «現本公司向貴局遞交建議方案一份,如該建議方案被接納,本公司將放棄之前所提交合併方案申請,並請求閣下對本建議方案准予批准。» E o «projecto» aludido nesse requerimento (建議方案一份) reporta-se exactamente ao Novo Estudo Prévio constante de fls.220 a 228 do vol. 8 do P.A. apenso.
Sendo assim, e ressalvado o respeito pelo esforço disponibilizado pelo ilustre mandatário da autora/recorrente, as 39 a 101 conclusões das alegações do presente recurso jurisdicional não podem deixar de cair por vão, sob pena de venire contra factum proprium.
De outro lado, afigura-se-nos que as quatro Respostas do tribunal colectivo da 1ª instância atacadas pela autora/recorrente são acertadas e prudentes, e judiciosamente fundamentadas, mostrando-se em plena conformidade com o «critério de valoração racional e lógica do julgador, com a observação das regras de conhecimentos gerais e experiência de vida e dos critérios da lógica» (vide. aresto do TSI no Processo n.º184/2011), critério que foi sagazmente extraído pelo Venerando TSI e, na nossa óptica, se aplica também à apreciação e valoração de provas por tribunal da 1ª instância.
2.3- No que respeite à Resposta dada ao quesito 12º da base instrutória, a autora/recorrente assacou igualmente erro notório na apreciação de prova, reivindicando o depoimento da testemunha, por si arrolada, de nome D.
Salvo devido respeito pela opinião em sentido contrário, preferimos acreditar no douto ajuizamento do tribunal colectivo da 1ª instância que chegou a conclusão de não ter produzido prova suficiente para formar convicção segura sobre a veracidade sobre o 12º quesito. E colhemos que em boa verdade, a prova testemunhal não é capaz nem idónea para provar o 12º quesito, ou seja, a matéria descrita neste quesito não pode ser provado por prova testemunhal.
Pois, é sem dúvida que o Regulamento Geral da Construção Urbana aprovado pelo Diploma Legislativo n.º1600 de 31/07/1963 e alterado pelo D.L. n.º42/80/M aplica-se a toda a área da RAEM, por isso, a isenção ou libertação das limitações legais de altura arquitectónica, na medida em que constitui o regime excepcional ao art.88º do RGCU, depende das disposições especiais que preveja consagração expressa.
Assim que seja, e por não se descortinar disposição especial tanto no RGCU como no D.L. n.º79/85/M, a pretendida «zona branca» tem de ser irremediavelmente insubsistente e, deste forma, são pois descabidas as 102 a 104 das conclusões das alegações do recurso em apreço.
…”
3. Do mérito da sentença recorrida:
A decisão do mérito da causa prende-se com a questão de saber se a Autora, ora Recorrente, adquiriu o direito à emissão da licença de obra, e consequentemente o Réu ficava adstrito ao dever legal de emitir a licença de obra insistentemente requerida pela mesma.
O Tribunal a quo julgou no sentido negativo, nos seguintes termos:
“…
Nos autos, a A. vem invocar a titularidade do direito para que seja emitida a licença de obras e realizada demais actos procedimentais na sequência da aprovação da Planta de Alinhamento Oficial (P.A.O.) datada de 01/07/2005 sobre o edifício que venha a ser construído no prédio urbano por si titulado e sito Rua de Kun Iam Tong, por incumprimento ilegal do R. dos deveres consagrados nos termos dos art.º 37.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 17 de Agosto, no entender de que todas as alterações e condições impostas pela Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (D.S.S.O.P.T.), foram satisfeitas, comprovadamente, através do requerimento registado sob o n.º T-1062 de 22/01/2008 relativo ao projecto de fundações e estruturas (cave e rés-do-chão) do dito prédio, com argumento que se viria obstar ao registo predial do referido prédio e consequente celebração de compra e venda das fracções autónomas do edifício construindo.
No entender do R., a emissão da P.A.O. n.º 96A065 bem como o projecto de arquitectura elaborado, são actos consequentes da concessão à “Companhia de Construção e Investimento Predial YY International, Limitada” que tinha já sido declarada nula, falta à A. interesse legítimo na manutenção desses actos pela participação no processo de concessão, para além de que a emissão da licença de obras viria violar o art.º 88.º do Regulamento Geral de Construção Urbana (RGCU) aprovado pelo Diploma Legislativo n.º 1600, de 31 de Julho de 1963 (com redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M, de 15 de Novembro) e outras normas especiais em planos de urbanização.
Mostra-se útil contextualizar a história relativa ao processo do licenciamento de obra a ser realizada no prédio sito na Rua de Kun Iam Tong que a A. titula, com apelo aos factos provados, a fim de determinar se este processo tornou-se viciado pela nulidade da concessão dos “Quartéis de Mong Há” e, em consequência, se cabe ao R. emitir a respectiva licença de obra em causa e realizar os outros procedimentos alegadamente legalmente devidos.
Segundo os factos provados, foi no ano 1998 que a proprietária (“Companhia de Investimento e Fomento Predial ZZ, LDA.”) submeteu para apreciação e aprovação junto da então Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes o projecto de arquitectura tendente à construção no prédio rústico ou terreno sito na Rua de Kun Iam Tong (a A. veio invocar, apenas no requerimento apresentado junto da D.S.S.O.P.T. datado de 11/09/2002, a sua titularidade do terreno, cfr. fls. 5 do P.A., Volume 7) um edifício em regime de propriedade horizontal destinado a ser comercializado, o qual foi atribuído o número de processo n.º 12/98/L subsequente à apresentação do estudo prévio que afinal obteve o parecer favorável com condicionantes impostas (cfr. fls. 65 a 101 e 102 do P.A., Volume 1).
Na ficha técnica e no quadro das áreas apresentadas, para efeitos da aprovação do projecto de obra, datado de 09/06/1999, o edifício que viria a ser construído seria composto de 25 pisos (incluindo o rés-do-chão e 24 pisos) com os valores de ILUS e ILOS, de 7.998 e de 31.992%, respectivamente (cfr. fls. 2, 8 a 9 do P.A., Volume 1).
Na sequência deste requerimento, foi a proprietária informada da decisão da aprovação condicionada do projecto pelo despacho do Subdirector datado de 03/08/1999, nele se mencionou as condicionantes a que a proprietária se sujeitou, entre outros, “…12. Para o licenciamento desta obra, deverá observar-se o estipulado no ponto 4 das observações da Planta de Alinhamento Oficial...” (cfr. fls. 12 a 13 do P.A., Volume 4).
Refira-se no ponto 4 das observações da P.A.O. com n.º 96A065 o seguinte: “…4. O LICENCIAMENTO DE OBRA DO EDIFÍCIO, FICA DEPENDENTE DA EXECUÇÃO DAS INFRAESTRUTURAS URBANAS DO EDIFÍCIO ADJACENTE (BAIRRO MILITAR DE MONG-HÁ)…” (cfr. fls. 20 do P.A., Volume 4).
Ainda se mencionou na mesma P.A.O. as condicionantes urbanísticas e encargos especiais do referido terreno:
“… … …
CONDICIONAMENTOS URBANÍSTICOS
1. FINALIDADES PERMITIDAS: HABITACIONAL, COMERCIAL E ESTACIONAMENTO
2. NÃO SE ADMITE OCUPAÇÃO VERTICAL
3. O PISO LOCALIZADO AO NÍVEL DA LAJE DE COBERTURA DO PODIUM DEVE SER VAZADO E DESTINA-SE, EXCLUSIVAMENTE, A RECREIO/LAZER DOS UTENTES DO EDIFÍCIO E ACESSOS VERTICAIS DO MESMO.
4. PARA EFEITOS DO CÁLCULO DOS ÍNDICES URBANÍSTICOS A ÁREA DE TERRENO A CONSIDERAR É DE 2332 M2.
5. OBRIGATORIEDADE DO CUMPRIMENTO DO No. DE LUGARES DE ESTACIONAMENTO, DE ACORDO COM D.L. No. 42/89/M, DE 26 DE JUNHO.
6. NO RESTANTE, CUMPRIMENTO DE TODA A LEGISLAÇÃO GERAL E ESPECÍFICA EM VIGOR NO TERRITÓRIO, BEM COMO AS NORMAS REGULADORAS DA CONSTRUÇÃO, INCLUINDO AS CIRCULARES DA D.S.S.O.P.T.
ENCARGOS ESPECIAIS
CONSTITUI ENCARGO DO PROPRIETÁRIO, A EXECUÇÃO DAS INFRAESTRUTURAS URBANAS INCLUÍDAS DENTRO DA ÁREA A CEDER AO TERRITÓRIO (VIA, PASSEIOS, ESTACIONAMENTO, ARBORIZAÇÃO E MOBILIÁRIO URBANO) DE ACORDO COM PROJECTO A SUBMETER À APROVAÇÃO DA D.S.S.O.P.T.
… … …”
Na ficha técnica e memória descritiva das fracções autónomas apresentadas em anexo ao requerimento de rectificação do projecto de construção datado de 03/04/2002, constava que o edifício construindo manteve-se de 24 pisos (cfr. fls. 2 a 15 do P.A., Volume 5).
Não se registou ou indiciou nos autos e nos documentos anexos qualquer alteração introduzida nos parâmetros definidos na P.A.O. com n.º 96A065, antes da apresentação do novo estudo prévio da A. datada de 07/03/2005.
Entretanto, em 25/03/2003 a A. dirigiu ao Senhor Chefe do Executivo um pedido de concessão por arrendamento, com dispensa de concurso público, do prédio designado por “Antigo Asilo de Mong Ha” (também designado por “Quartéis de Mong Há”), a fim de fazer o aproveitamento conjunto com o seu prédio descrito sob o n.º 2**** (autuado sob o processo n.º 1195, Volumes I e II em anexo).
Fica provado que esta pretensão não haveria de ser atendida, atento que o terreno designado como “Quartéis de Mong Há”, a pedido do empresário E (E), mediante um processo de corrupção, foi concedido à “Companhia de Construção e Investimento Predial YY International, Limitada”, da qual este empresário era gerente-geral, através da intervenção do ex-STOP A. O ex-STOP pretendia que o terreno dos “Quartéis de Mong Há” fosse atribuído à “Companhia de Construção e Investimento Predial YY International, Limitada”, independentemente de esta reunir ou não as melhores condições para o desenvolvimento do mesmo.
Constatou-se nos autos (fls. 74 do processo n.º 1195, Volume II) um memorando e uma minuta escrita relativos à reunião realizada em 14/12/2004, nela estavam presentes o representante legal da A., o R. e a Sr.ª Chefia do Departamento da Gestão de Terrenos a fim de negociar sobre o pedido de concessão por arrendamento deduzido pela A. em 25/03/2003, onde se referiu:
“… … …
1. 於2004年12月14日下午3時,在土地工務運輸局(O.P.)四樓會議室舉行會議,出席者包括XX置業有限公司(XX)代表F先生及O.P.局長G工程師及土地管理廳廳長B工程師,為著商討XX公司提出批給一幅位於澳門黑鬼山(俾利喇街),面積3,550平方米,用作與其一幅毗鄰面積2,763平方米的私家地合併發展興建一幢住宅樓宇的申請。
2. G局長轉述A司長的指示:“經特首的認同,已開展以高士德馬路將興建一個公共停車場單位作交換黑鬼山3,550平方米的土地”,為此,對XX擁有的私家地,可在城規上作適當的調節。
3. F生表示有意取得3,550平方米的土地,即使透過公開拍賣,或可展開向高士德將建公共停車場業主購入該單位業權的商討等,不排除採取任何合法的法律途徑,務求不浪費“黑鬼山”的土地資源(開路讓割去1,168平方米的土地)及對一個具公共停車場,圖書館及綠化面積,不具商舖的住宅樓宇計劃的落實。並強調自2003年3月25日首次遞交申請後,尚未接獲任何的訊息。
4. G局長將會轉述F先生的意思予A司長。
… … …”
Tal como se explicou a testemunha Sr.ª Chefia do Departamento da Gestão de Terrenos na audiência de julgamento realizada, a expressão “ajustamento no âmbito do planeamento urbanístico” mencionado neste memorando, refere-se normalmente a libertação da altura do edifício e o aumento das áreas de utilização e é assim compreendido dentro ramo de construção” (cfr. Acórdão do Tribunal Colectivo de fls. 623v dos autos). Face a isto, conjugado com as referências escritas na minuta “Pode libertar a altura do terreno sito Mong Há” e “入則較E生申請先”, se convenceu o Tribunal que foi transmitida ao representante legal da A. naquela reunião a mensagem do ex-STOP da libertação da altura do edifício no prédio de Kun Iam Tong adjacente aos “Quartéis de Mong Há”, para a A. deixar do interesse pela concessão pedida e não impugnação da decisão da concessão do terreno à “Companhia de Construção e Investimento Predial YY International, Limitada”.
Não obstante que a concessão do terreno veio a ser determinada a favor da “Companhia de Construção e Investimento Predial YY International, Limitada” pelo despacho do deferimento do ex-STOP datado de 26/01/2005. (cfr. fls. 46, 52 e 53 do processo n.º 1195, Volume II), provado que a A. apresentou, na invocada qualidade de contra-interessada, em 08/02/2005, um requerimento junto da R. para arguir a legalidade da decisão da concessão (cfr. fls. 50 do processo n.º 1195, Volume II), onde se referiu:
“… … …
本人F是“XX置業有限公司”的負責人,現以對立利害關係人身份向 閣下就“YY國際置業投資有限公司”向閣下申請 ─ 有償交換行政當局座落于澳門俾利喇街望廈區的一幅土地 ─ 一事提出以下意見:
1. “YY國際置業投資有限公司”欲以166個位于高士德的車位有償交換行政當局座落于澳門俾利喇街望廈區的一幅土地。
2. 按照澳門現行土地法第76條的規定:“容許以私人實體或公共實體的地段交換本地區的無主土地”
3. 因此,按本人之愚見,認為“YY國際置業投資有限公司”的換地申請不為現行土地法所容許,因為法律只容許以地換地,而沒有明文規定容許以車位換地。
4. 土地法容許以地換地的精神在於方便行政當局有效利用土地資源,如開新路等,並在它的前言明確指出:設法確保所批出地段的利用,以消除投機手段,而該等手段往往以申請改變用途作為掩飾。
5. 再者,澳門行政程序法典第三條所規定的合法性原則,亦不允許將土地法第76條作擴充性解釋以使得“YY國際置業投資有限公司”的換地申請符合法律規定。
… … …”
Porém, pouco tempo depois, através do requerimento datado de 28/02/2005, a A. veio informar que pretendeu suspender o pedido da emissão da certidão deduzido em 25/02/2005, referindo por “estar em curso um acordo sobre o pedido de concessão formulado por requerente” (cfr. fls. 43 e 45 do processo n.º 1195, Volume II).
Efectivamente, se registou em 07/03/2005 a apresentação do novo estudo prévio relativo ao processo n.º 12/98/L – T-1540, junto do Réu, para um edifício com 147,20m de altura correspondente aos 51 pisos, o que contrasta com os 25 pisos inicialmente previstos no projecto de arquitectura inicial (cfr. fls. 218 a 228 do P.A., Volume 8).
A A. expôs neste requerimento os fundamentos seguintes:
“… … …
XX置業有限公司,註冊地址為澳門......巷...號地下...-...,載於澳門商業登記局之商業登編號為****1,代表人行政管理成員F。XX置業有限公司是一幅位於觀音堂街無門牌土地的業權人,該土地載於澳門物業登記局第B168M登記薄冊第124頁之標示編號為2****,屬私家地權性質。
本公司於二零零三年三月二十五日在土地工務運輸局遞交一份申請(收據登記編號為1323),以相隣私家地業權人身份,行使按法律所賦與權利依法向澳門特別行政區行政長官提出申請,請求以免公開競投方式,申請批給一幅與本公司上述私家地權土地相鄰,位於俾利喇街前望廈軍區住宅所在土地用作合併發展。
及後於二零零四年三月四日本公司正式向運輸工務司提交上述申請之建議方案,唯於同時YY國際置業投資有限公司亦以其位於高士德馬路發展計劃中之地庫一及地庫二兩層停車場作為條件,向運輸工務司提出有償交換上述政府地以作發展之用。
其間本公司經會議及信函多次與運輸工務司及 貴局溝通,除陳述本公司計劃之合法性外,並列舉該合併計劃所能提供之公眾利益,但一直未能與有關部門達致共識。會議期間經 貴局傳達運輸工務司意見,有關部門已考慮接納YY國際置業投資有限公司之交換方案,並建議放寬本公司計劃之城規作為雙方爭議之解決方案。
經慎重考慮後,即使本公司及公眾損失均非常重大,但為着本澳地區之和諧局面不被破壞,故考慮接納上述有關放寬城規之解決方案,並願意割讓更多私家地權土地用作開闢新道路以改善該區之道路網絡,為疏導該區極之擠塞之交通竭盡所能。
現本公司向 貴局遞交建議方案一份,如該建議方案被接納,本公司將放棄之前所提交合併方案申請,並請求 閣下對本建議方案准予批准。
… … …”
A mudança da atitude manifestada pela A., ou seja, em vez de insistir o interesse no aproveitamento conjunto do terreno contíguo que a A. se manifestou ao longo do período desde a dedução do pedido de concessão até ao finais de Fevereiro de 2005 (cfr. fls. 37 a 38, 103 e 35 a 36 do Volume I e fls. 50 e 74 do Volume II, todos do processo n.º 1195) e arguir a ilegalidade da decisão da concessão à YY através da troca dos lugares de estacionamento, se convenceu o Tribunal sem grande dúvida que este novo estudo prévio, com alterações significantes introduzidas à P.A.O. primitiva, foi apresentado pela anuência da A. à decisão da concessão do terreno à Companhia Sumhung, cuja aprovação se fez valer, como “contrapartida” da desistência do pedido de concessão do aproveitamento dos dois terrenos em causa.
Do requerimento exposto também resulta claro que durante a reunião realizada em 14/12/2004, a A. ou seu representante legal já foi informada do resultado infrutífero do requerimento da concessão do “Quartéis de Mong Há” com a proposta do ex-STOP do ajustamento dos condicionantes urbanísticos sobre o seu prédio que viria a ser desenvolvido, e pelo que, veio depois apresentar um novo estudo prévio do prédio com a modificação da altura de edificação de 25 pisos para 51 pisos.
É verdade que não se resulta dos autos qualquer indício que aponta a intervenção ou participação activa e directa da A. no caso de corrupção do ex-STOP para a concessão dos “Quartéis de Mong Há” à Companhia YY, tal como ficou provado nos autos do processo n.º 53/2008, do Tribunal de Última Instância, de 22 de Abril de 2009 (cfr. fls. 400 a 617 dos autos), muito menos que se pode considerar a aprovação do novo estudo prévio com novos parâmetros urbanísticos introduzidos ser um acto consequente da decisão de concessão do terreno que veio a ser declarado nulo em 28/05/2009, por Despacho do Chefe de Executivo (cfr. fls. 95 a 97 dos autos), a que se refere o art.º 122.º, n.º 2, alínea i) do《Código do Procedimento Administrativo》(C.P.A.). No entanto, as modificações introduzidas às condicionantes urbanísticas definidas na P.A.O. primitiva do terreno rústico da A. foram feitas por directiva e intervenção do ex-STOP para remover obstáculo de qualquer forma que viesse a disturbar a realização do seu plano criminoso.
Ainda que a A. não tomou conhecimento de que a concessão dos “Quartéis de Mong Há” foi fruto directo do caso de corrupção entre o ex-STOP e o empresário E, fica convencido que a altura do prédio foi libertada a fim de que a A. se deixasse de manifestar interesse pela concessão, o qual tinha aceitado pela conformação expressa da A. no novo estudo prévio apresentado em 07/03/2005.
Segundo as circulares n.º 5/87 e n.º 1/DSSOPT/2009, ambas elaboradas pela D.S.S.O.P.T., estipulam que: “A altura permitida dos edifícios a construir na R.A.E.M. e a edificabilidade admissível nos lotes é função da largura das vias públicas que lhes dão serventia, da classe de altura do edifício a construir, da natureza da sua utilização e da eventual aplicação de índices líquidos de ocupação e utilização do solo (ILOS e ILUS)”, e os edifícios das classes “Alto” e “Muito Alto” são sujeitos às seguintes condicionantes:
“- Cumprimento do disposto no artigo 88º do RGCU, conforme redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M, de 15 de Novembro de 1980.
- Cumprimento dos índices líquidos de ocupação e de utilização do solo (ILOS e ILUS) que constam da tabela I (circular nº 5/87) ou tabela II (circular nº 1/DSSOP/2009), consoante a tipologia do lote, a altura total do edifício a construir e a natureza da sua utilização.
- Nas vias de perfil transversal variável a D.S.S.O.P.T. poderá, nas plantas de alinhamento, estabelecer, no todo ou por partes, o valor da largura da via para efeito de cálculo das condições referidas nos pontos 5.1 e 5.2”.
Em relação à análise técnica e jurídica elaborada sobre este novo estudo prévio, consta na informação n.º 076/DPU/2005, datada de 28/03/2005, o seguinte (cfr. fls. 138 a 140 do P.A., Volume 13):
“… … …
二、 本局曾於1997年12月15日發出編號96A065的正式街道准線圖(見附件一)。
三、 上述街道准線圖是經過對有關地段及其周圍區域,進行了諸如樓群高度關係、城市空間關係、土地業權性質、土地資源的利用、發展意慾的鼓勵和社會利益的平衡等方面的詳盡城市規劃研究後發出的。
四、 隨著社會不斷發展,為市民提供視野開陽、環境衛生、設施完善、較大人均居住面積,還提供充足的公共停車位、公共圖書館、完善的道路網絡等配套社會、基建設施的居住環境,提昇市民的生活素質;充分利用土地資源更形重要。故有必要對原來街道准線圖的城規條例進行再次審視。
五、 業權人遞交的T-1540建議方案與上述第二點所提的正式街道准線圖有很大出入,謹詳列如下:
1. 96A065正式街線圖:
• 許可用途:住宅、商業、停車場;
• 原地段面積:2763米2;
• 實際發展地段面積:1598米2;
• 用以計算最大許可實用容積率(ILUS)/覆蓋率(ILOS)的地段面積:2332米2;
• 許可最大建築高度:MA級,但須遵守街影條例;
• 地段類型:Y型;
• 不許垂直佔用空間;
• 許可最大實用容積率(ILUS):9倍;
• (以實際發展地段面積1598米2計算,許可最大實用容積率=13.13倍)
• 許可最大實用覆蓋率(ILOS):37.5%;
• (以實際發展地段面積1598米2計算,許可最大實用覆蓋率=54.7%)
• 最少停車位數目:遵守第42/89/M法令;
2. T-1540建議方案:
* 用途:住宅、停車場;
* 原地段面積:2763米2;
* 實際發展地段面積:1167米2;
* 用以計算實用容積率(ILUS)/覆蓋率(ILOS)的地段面積:2763米2;
* 建築高度:147.2米(MA級),並免除遵守街影條例;
* 地段類型:Z型;
* 不垂直佔用空間;
* 實用容積率(ILUS):14.987倍;
* (以實際發展地段面積1167米2計算,實用容積率=35.48倍)
* 實用覆蓋率(ILOS):34.85%;
* (以實際發展地段面積1167米2計算,實用覆蓋率=82.52%)
* 住宅單位數目:387個;
* 停車位數目:211個汽車,70個電單車;
六、 從上點可見,T-1540建議方案在建築高度、實用容積率(ILUS)、實用覆蓋率(ILOS)和停車位數目等技術數據方面不但與上述第二點所提的正式街道准線圖有很大出入,與現行法令及行政指引也有出入。
七、 在考量上點所述技術數據時,必須注意到業權人為改善該區之道路網絡,自願割讓1596米2的完全所有權土地(私家地)作開闢新道路之用,佔原有土地面積的57.76%以上;致使可發展土地面積由原來的2763米2劇降到只有1167米2。這是業權人的一大損失。
八、 上述地段已荒置經年,存有衛生和安全問題;業權人也多次向政府當局提交建議方案,但礙於原有城規制約和平衡公眾利益等情況而長期無法確定發展方案。這也是業權人及社會的損失。
九、 業權人在申請書中提及,該公司經會議及信函多次與運輸工務司及本局溝通,但一直未能達致共識。會議期間,得知有關部門建議放寬該公司計劃之城規作為雙方爭議之解決方案。
十、 業權人經慎重考慮後,向本局遞交了T-1540建議方案,一方面接納有關放寬城規之解決方案,同時願意割讓更多私家地權土地用作開闢新道路以改善該區之道路網絡,為疏導該區極之擠塞之交通竭盡所能。
十一、 由於有關放寬城規之建議已超出本廳的職責範疇,無法發出技術意見。但從社會氣氛和諧、公眾利益著想、善用土地資源角度、改善和提昇市民生活素質等出發,考慮以獨立個案放寬有關地段的城規建議有其積極意義。
十二、 T-1540建議方案在城規方面要求:
* 用途:住宅、停車場;
* 用以計算實用容積率(ILUS) / 覆蓋率(ILOS)的地段面積:2763米2;
* 建築高度:147.2米(MA級),並免除遵守街影條例;
* 不垂直佔用空間;
* 實用容積率(ILUS):14.987倍;
* 實用覆蓋率(ILOS):34.85%;
* 遵守現行所有法例及行政指引;
十三、 以上分析,敬請上級批示。
… … …”
Tal como se refere na informação citada, existe grande divergência entre o novo estudo prévio e a P.A.O. primitiva tanto em termos da altura de edificação, valores de ILUS e ILOS e os números dos lugares de estacionamento, como em termos de conformidade com as disposições legais e regulamentares vigentes, o que se urge a necessidade da elaboração da nova P.A.O.. Com a proposta altura do edifício constituindo de 147.20m, se precisa uma isenção de cumprimento à regra sobre o cálculo da área de sombra projectada sobre a via pública definida no art.º 88.º do RGCU, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M, de 15 de Novembro. Ficou ainda provado que o ILUS calculado sobre esta nova edificação (consoante a área do terreno registado) é de 15,02, ultrapassando em 50% o valor permitido segundo esses circulares (cfr. fls. 8 a 11 do P.A., Volume 13).
Não obstante da irregularidade ou desconformidade legal verificada, este novo estudo prévio do terreno foi aprovado com a relaxação das condicionantes urbanísticas por despacho do ex-STOP de 11/04/2005 exarado sobre a informação n.º 076/DPU/2005, e a nova P.A.O. foi subsequentemente elaborada pelo Réu em 20/04/2005, com menções da altura máxima da construção de 147,2m e ABTU de 41.500,00m (cfr. fls. 208 a 211 do P.A., Volume 8).
Algumas alterações foram introduzidas pelas condições impostas ao novo projecto de arquitectura que afinal, se conduziu a elaboração da outra P.A.O. em 01/07/2005, em substituição daquela emitida em 20/04/2005, mantendo a altura máxima da construção de 147,2m e ABTU de 41.500,00m (cfr. fls. 154 a 155 do P.A., Volume 8). Com efeito, todas as notificações efectuadas após desta data para a eventual emissão da licença da obra, relativa à aprovação condicionada do projecto das fundações e estruturas do edifício a construir, foram feitas com base desta nova P.A.O. de 01/07/2005.
Dos expostos resultam inequívoco que a decisão da relaxação das condicionantes urbanísticas não foi feita objectivamente na prosseguição dos interesses públicos que se rege à actuação da Administração (cfr. art.º 4.º do 《Código do Procedimento Administrativo》(C.P.A.)), mas no puro interesse pessoal do ex-STOP para facilitar à concessão dos “Quartéis de Mong Há” à Companhia YY, de modo que esse procedimento seria feito com celeridade sem concorrência e argumentação quanto à sua legalidade. Em relação ao anteprojecto apresentado pela A., ainda que não demonstra ser em conformidade com as condicionantes urbanísticas constantes da P.A.O. emitida já em 15/12/1997, em decaimento absoluto de todas as regras legais respeitantes à construção e constantes nas circulares da D.S.S.O.P.T., e cuja aprovação se necessita manifestamente uma nova P.A.O. elaborada com libertação às essas condições, tudo isto foi de integral conhecimento da A. antes da apresentação como contrapartida da renúncia à negociação relativa ao pedido da concessão dos “Quartéis de Mong Há” para aproveitamento em conjunto dos respectivos dois terrenos, por ordem directa do ex-STOP.
Pelo que, ao lado de dar ordem à D.S.S.O.P.T. para aprovar o pedido de concessão formulado pela Companhia de Fomento Predial e Investimento YY Internacional, Limitada, tal como provada nos autos do processo n.º 53/2008, o ex-STOP transmitiu à A., através da reunião realizada em 14/12/2004, a mensagem de autorizar o “ajustamento no âmbito do planeamento urbanístico” relativo ao prédio rústico da A., que no nosso entender, no mesmo sentido de dar ordem à D.S.S.O.P.T. para aprovar o anteprojecto do prédio posteriormente entregue pela A..
Efectivamente, verifica-se na informação n.º 076/DPU/2005, datada de 28/03/2005, o parecer do Réu sobre este novo estudo prévio:
“Concordo com o exposto na análise técnica sobre o Estudo Prévio, e proponho do ponto de vista urbanística, a APROVAÇÃO dos condicionamentos conforme o indicado em #11, #12 e #13.”
Estipula o art.º 34.º do Decreto-Lei n.º 79/85/M,《Regulamento Geral da Construção Urbana (RGCU)》, de 21 de Agosto, o seguinte:
“34.º
(Apreciação dos projectos)
Na apreciação dos projectos, a D.S.S.O.P.T. considerará o aspecto exterior das edificações, a inserção no ambiente urbano e a conformidade com planos de urbanização e respectivos regulamentos e outros instrumentos de disciplina urbanística, podendo ainda verificar o cumprimento das normas técnicas que lhe sejam aplicáveis.”
Pela norma citada, o legislador atribui à entidade competente, ora Réu, faculdade na apreciação do projecto de arquitectura com certo espaço de autonomia (“poder discricionário”), de modo que a apreciação será feita conforme aos critérios e regras genéricas pre-elaboradas pela Administração em plano urbano e área técnica.
Tal como se apura nos autos, em suplemento ao RGCU, são elaboradas pela D.S.S.O.P.T. as circulares n.º 5/87 e n.º 1/DSSOPT/2009, respectivamente, para a apreciação dos projectos de obra.
“Estas normas genéricas poder ter a natureza de regulamentos, ou podem ser normas genéricas de outro tipo, mas correspondem sempre à ideia de que a Administração anuncia previamente os critérios de acordo com os quais via exercer o seu poder discricionário. Deste modo se satisfaz o princípio da igualdade de tratamento.
Nestes casos, a doutrina e a jurisprudência têm entendido que a Administração, embora tivesse nos termos da lei um poder discricionário, decidiu auto-vincular-se, e a auto-vinculação a que ela se submeteu obriga-a. Donde resulta que, se a Administração, depois de se ter auto-vinculado, praticar um acto que contrarie as normas que ela própria elaborou, e a que ela própria decidiu submeter-se, esse acto será ilegal, porque viola normas estabelecidas pela Administração, que constituem uma auto-vinculação do seu poder discricionário.”
No caso vertente, não obstante que a nova P.A.O. foi feita pelo Réu, com competência própria e exclusivamente conferida nos precisos termos do RGCU, se verifica a efectiva e directa intervenção do ex-STOP neste procedimento, pela ordem de autorização do ajustamento das condicionantes urbanísticas do terreno rústico da A., com vista a alcançar um fim de mero interesse privado, acto esse padecendo do vício do desvio de poder e assim enfermando todos os actos subsequentemente praticados com base dessa decisão de autorização do mesmo vício, i.e., o acto de aprovação do estudo prévio com elaboração da nova P.A.O. e todas as aprovações condicionadas feitas sobre as fundações e estruturas do edifício a construir no terreno rústico da A..
É de conhecimento perfeito da A. o novo anteprojecto do terreno não se sujeita ao disposto no artigo 88º do RGCU, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 42/80/M, de 15 de Novembro, nem pouco as fórmulas previstas nos Circulares n.ºs 5/87 e 1/DSSOPT/2009 quanto aos critérios dos valores de índices líquidos de ocupação e utilização de solo (ILOS e ILUS), e cuja aprovação depende unicamente da conformação da decisão da concessão dos “Quartéis de Mong Há” favorável à Companhia YY e desistência do interesse pela mesma concessão, ainda que a aprovação demonstra ser manifestamente violadora dos regulamentos previstos que se restringem em exercício do poder discricionário, violando assim o comando legal consagrado no art.º 34.º do RGCU sobre a apreciação do projecto.
Admite-se que não se verificou qualquer acto praticado pela A. que seja configurada a natureza criminosa, nem a participação no caso de corrupção do ex-STOP e o empresário E, no entanto, a A. faz parte activa na irregularidade ou ilegalidade no procedimento do licenciamento de obra do terreno em causa, procedimento esse que se enferma da ilegalidade autónoma do processo de concessão dos “Quartéis de Mong Há” o qual jamais a A. tivesse titulado a alegada qualidade de “contra-interessada” (cfr. art.º 122.º, n.º 2, alínea i) do C.P.A. e art.º 39.º do《Código de Processo Administrativo Contencioso》(C.P.A.C.).
É verdade que subsequente à aprovação condicionada do anteprojecto, o procedimento do licenciamento de obra do terreno da A. tem continuado e, designadamente, foi feita decisão de aprovação condicionada quanto às obras de fundações e estruturas do edifício a construir no terreno em causa pelo Réu em 09/11/2007, posteriormente à detenção do ex-STOP (cfr. fls. 47 a 48, 56 a 57 dos autos, fls. 97 a 100 do P.A., Volume 10, fls. 2 a 7 do P.A., Volume 11,e fls. 5 a 7 do P.A., Volume 13). Fica ainda provado que desde Janeiro de 2008 até Setembro de 2009, a A. apresentou diversos requerimentos junto da D.S.S.O.P.T. para emissão da licença de obra e realização de demais diligências administrativas para o devido efeito sem obtendo qualquer resposta.
Segundo o exarado na informação datada de 24 de Outubro de 2007, a emissão da licença das obras de fundações e estruturas do edifício a constituir no terreno em causa fica sujeita à sanação das deficiências, dado que o plano de escavação e apoio provisórios apresenta muitas deficiências em matéria de segurança, o que se pode concluir ainda não é tomada qualquer decisão no sentido de aprovar todos os projectos de arquitectura já apresentados.
Estipula no RGCU o seguinte:
“Artigo 30.º
(Entrega dos projectos de obra por fases)
1. A entrega dos projectos necessários à execução de qualquer obra objecto do presente regulamento deverá ser feita globalmente, ou seja, incluindo todos os projectos de especialidade.
2. Tratando-se de obras de construção e ampliação a entrega dos projectos referidos no número anterior poderá ser feita pelas seguintes fases:
a) Anteprojecto;
b) Projecto de obra.
3. Em casos excepcionais, devidamente justificados, poderá ainda a D.S.S.O.P.T. aceitar a entrega autónoma para apreciação e licenciamento do projecto de fundações e estruturas ou outros.
4. Tratando-se de projectos de alteração poderá igualmente a D.S.S.O.P.T. aceitar a sua entrega por fases nos termos definidos no n.º 2.
5. Sempre que ao projecto de obra antecede a entrega de um anteprojecto de obra deverá ser apresentada com cada uma dessas fases a memória descritiva das fracções autónomas, assinada pelo proprietário do prédio quando se pretenda a constituição da propriedade horizontal por este modo.
6. A ficha técnica referida na alínea d) do n.º 6 do artigo 19.º deverá também ser entregue com o anteprojecto de obra quando a entrega do projecto não seja globalmente feita.
Artigo 36.º
(Prazos de apreciação dos projectos)
1. São fixados os seguintes prazos, para que a D.S.S.O.P.T. se pronuncie:
a) Sobre processos referentes a projectos de obras de construção, os seguintes prazos:
- Anteprojecto de obra ....................................................................60 dias
- Projecto de obra:
- quando entregue globalmente .......................................................60 dias
- quando entregue por fases ............................................................30 dias
- Projectos de fundações e estruturas ..............................................30 dias
- Projectos de instalações gerais e especiais ...................................30 dias
b) Quaisquer outras obras ...............................................................30 dias
c) Projectos de alteração .................................................................30 dias
2. O director da D.S.S.O.P.T., em despacho fundamentado, que será notificado ao requerente, poderá prorrogar os prazos a que se refere o número anterior, antes de terem expirado, até ao seu dobro.
3. Os prazos fixados no n.º 1 contam-se a partir da data em que o processo esteja devidamente instruído, ou a partir da recepção do último dos pareceres referido no artigo 35.º, ou após o decurso do prazo mencionado no n.º 3 do mesmo artigo.
Artigo 37.º
(Não cumprimento dos prazos)
1. Não havendo resolução dentro dos prazos fixados no artigo anterior, o requerente poderá dar início às obras projectadas, trinta dias após comunicação por escrito feita à D.S.S.O.P.T., sujeitando todavia os projectos a tudo o que se encontra disposto no presente regulamento ou quaisquer outras disposições aplicáveis e ficando sujeito a todas as penalidades previstas, com excepção da falta de licença.
2. A falta de resolução no prazo fixado para tal fim relativamente ao anteprojecto de obra não dispensa o requerente da apresentação do respectivo projecto de obra.
Artigo 40.º
(Caducidade e notificação dos despachos exarados relativos aos projectos)
1. Os despachos de aprovações parcelares de projectos caducam no prazo de 180 dias, se entretanto não forem apresentadas as fases subsequentes.
2. O despacho de aprovação final caducará, se no prazo de 180 dias, após a respectiva notificação ao requerente, este não solicitar a emissão da respectiva licença de obras.
3. Os prazos referidos nos números anteriores poderão ser prorrogados a requerimento do interessado desde que a razão justificativa para o facto seja aceite pela D.S.S.O.P.T.
Artigo 42.º
(Requerimento da licença de obras)
1. Notificado o requerente da aprovação do projecto de obra ou utilizada a faculdade prevista no artigo 37.º, deverá aquele requerer a respectiva licença de obras.
2. Com o requerimento será apresentada declaração do técnico pela qual este assume a responsabilidade pela direcção da obra, bem como a declaração do construtor ou empresa de construção, assumindo a responsabilidade pela execução da mesma.
3. No prazo de 15 dias após a entrega do requerimento referido em 1, a D.S.S.O.P.T. procederá ao cálculo da taxa devida e emitirá a respectiva licença de obras, notificando o requerente para proceder ao seu levantamento.
4. Sempre que a realização de uma obra implique a execução de tapumes que ocupem a via pública, o requerente deverá fazer acompanhar o requerimento referido no n.º 2 com cópia da respectiva licença de tapumes emitida pela Câmara Municipal.”
Segundo as normas citadas, sabe-se que o licenciamento da obra se trata de um procedimento que se inicie com a apresentação do projecto de obra para apreciação, de que o projecto de obra pode ser desdobrado em parcelares para a sua apreciação, em fases, até ao licenciamento de obra sobre a aprovação do projecto, a que se segue a emissão do título formal da licença/alvará de obra. Com efeito, o direito de edificação fica dependente da aprovação absoluta do projecto de obra – “de jure condendo”, que a requerente A. não pudesse ser titular até à aprovação dos todos os projectos de arquitectura apresentados.
Ainda que se reconhece a produção dos efeitos jurídicos na esfera jurídica da A. pela aprovação condicionada dos projectos das obras de fundações e estruturas do edifício a construir, essa decisão não se vincula à Administração pela prática do acto final da concessão do licenciamento de obra, quer por força do art.º 34.º do RGCU, quer na esteira de direito constituído, o licenciamento de obra seria considerado mero acto executório da aprovação condicionada já concedida.
Daí a falta de decisão proferida no prazo máximo para a apreciação dos projectos de especialidades diversas elencadas no art.º 36.º do RGCU não se implica que o projecto da obra apreciando já está aprovado, logo, o deferimento tácito existe apenas nos casos expressamente se prevejam (cfr. art.º 101, n.º 1, do C.P.A.). Além disso, em situação desta, se reconhece apenas ao requerente interessado o direito de dar início às obras projectadas, sem dispensar os projectos “a tudo o que se encontra disposto no presente regulamento ou quaisquer outras disposições aplicáveis e ficando sujeito a todas as penalidades previstas ou quaisquer outras disposições aplicáveis e ficando sujeito a todas as penalidades previstas” (cfr. art.º 37.º do RGCU). De todo o modo, não se obriga à Administração a prática de demais actos com atropelo ao princípio da legalidade, designadamente, em violação dos regulamentos e normas elaboradas como limites e padrões em exercício do poder discricionário e desconforme com os fins para que esses poderes lhes forem conferidos (cfr. art.º 3.º, n.º 1 do C.P.A.).
No caso vertente, verifica-se que à apreciação e aprovação dos projectos de fundações e estruturas antecede a apresentação do anteprojecto do terreno em causa, o qual foi aprovado condicionalmente com libertação das condicionantes urbanísticas. E a seguir, foi proferida decisão de aprovação condicionada dos respectivos projectos de fundações e estruturas apresentados. Todavia, nenhum desse acto ou decisão de aprovação tomado sobre o anteprojecto ou projectos de fundações e estruturas concede à A. direito do licenciamento de obra e da subsequente emissão do título formal, ou seja, se equivale à aprovação final da construção de obra com licenciamento e emissão do alvará de obra (cfr. art.ºs 40.º, n.º 2, e 42.º, n.º 1 do RGCU).
Tal como se conclui supra, com a intervenção do ex-STOP no respectivo processo de licenciamento de obra, todos os actos subsequentemente praticados com base da decisão de aprovação do estudo prévio – a nova P.A.O. e todas as aprovações condicionadas feitas sobre as fundações e estruturas do edifício a construir no terreno rústico da A., padecem do vício da anulabilidade do desvio de poder. Embora que esses actos não foram impugnados dentro do prazo legal dos actos anuláveis consagrado no art.º 25.º, n.º 2, alínea c) do C.P.A.C., cuja efeitos assim se tornam consolidados na ordem jurídica, não se reconhece à A. o direito de edificar, cuja satisfação depende dos todos os actos praticados conforme à lei no culminar do procedimento. Nesse raciocínio, ainda que se não registou qualquer resposta da Administração aos requerimentos e comunicação feitas pela A. sobre a emissão da licença de obra do terreno em causa, carece da A. direito ou faculdade de exigir a prática de demais actos administrativos, com vista a dar conclusão ao procedimento do licenciamento de obra pela consolidação do direito de edificação, ora viciado pela violação do princípio da legalidade (cfr. art.ºs 3.º e 124.º do C.P.A. e art.º 38.º, alíneas a) e d) do RGCU).
“… O princípio da boa fé, sendo embora “dotado de elevado grau de abstracção”, está longe de ser uma “fórmula vazia pseudonormativa”.
A sua concretização é possibilitada através de dois princípios básicos: o princípio da tutela da confiança legítima e o princípio da materialidade subjacente. Quer dizer, a boa fé determina a tutela das situações de confiança e procura assegurar a conformidade material ─ e não apenas formal ─ das condutas aos objectivos do ordenamento jurídico.
... A tutela da confiança não é, no entanto, arvorada em princípio absoluto, ocorrendo apenas em situações particulares que a justifiquem. São, na verdade, quatro os pressupostos jurídicos de tutela da confiança. Desde logo, a existência de uma situação de confiança, traduzida na boa fé subjectiva ou ética da pessoa lesada. Em segundo lugar, exige-se uma justificação para essa confiança, isto é, a existência de elementos objectivos capazes de provocarem uma crença plausível. Igualmente necessário é o investimento de confiança, isto é, o desenvolvimento efectivo de actividades jurídicas assentes sobre a crença consubstanciada. Por último, surge a imputação da situação de confiança, implicando a existência de um autor a quem se deva a entrega confiante do tutelado.”
In casu, pese embora o estudo prévio do terreno em causa foi aprovado, com relaxação das condicionantes urbanísticas, e subsequente aprovações relativa à obra em parcelares, foram feitas sem terem sido anulados ou revogados, tal como se sustenta por Ministério Público no douto parecer a fls. 646 a 658v dos autos, não se vê a expectativa legítima nem confiança legítima da A. merecedora da protecção jurídica, dado provado que a sua participação ser elemento indispensável para a anomalia ou irregularidade apurada do procedimento de licenciamento de obra em causa, aceitando “contrapartida” em decaimento das disposições vigentes para abstenção dos interesses pela requerida concessão dos “Quartéis de Mong Há”, falta assim o respeito pelos ditames ou limites de “boá fé” que se pautam à actuação, quer a Administração Pública quer aos particulares (cfr. art.º 8.º, n.º1 do C.P.A.).
Daí carece a A. os fundamentos para suportar a alegada violação dos princípios da protecção da confiança, da segurança jurídica e da boá fé.
O silêncio aos requerimentos deduzidos pela A. a partir de Janeiro de 2008 implica, sem dúvida, o respectivo indeferimento tácito, nos termos do art.º 120.º do C.P.A. Da análise supra feita sobre o caso não se pode concluir pela omissão do R. da prática do acto legalmente devido, nomeadamente, não cabendo ao R. emitir a licença de obra das fundações e estrutura do edifício, proceder ou realizar demais actos administrativos a fim de fazer concluir o requerido licenciamento de obra do edifício a construir, com base da P.A.O. datada de 01/07/2005, no prédio rústico sito na Rua de Kun Iam Tong titulado pela A.. Nestes termos, deve improceder a presente acção para determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos, nos termos dos art.ºs 34.º, 37.º e 38.º do RGCU, e 104.º do C.P.A.C..
***
IV) Decisão:
Por tudo o que fica expendido e justificado, o Tribunal julga improcedente a presente acção para determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos intentada pela Companhia de Fomento Predial XX, Limitada e consequentemente absolve o Director da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, dos pedidos deduzidos.
Custas pela A..
Registe e notifique.
…”
Trata-se duma decisão ajuizada e correcta, pelo que é de louvar a sentença recorrida, e ao abrigo do nº 5 do artº 631º do CPCM, ex vi do artº 1º do CPAC, é de negar provimento ao recurso com os fundamentos constantes na decisão impugnada.
*
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento ao presente recurso jurisdicional, confirmando a sentença recorrida.
*
Custas pela Autora.
Notifique e registe.
*
RAEM, aos 02 de Abril de 2020.
Relator
Ho Wai Neng
Primeiro Juiz-Adjunto
Tong Hio Fong
Segundo Juiz-Adjunto
Fong Man Chong
Mai Man Ieng
1
219/2017