--- 簡要裁判 (按照經第9/2013號法律修改的<<刑事訴訟法典>>第407條第6款規定) -
--- 日期:27/04/2020 -------------------------------------------------------------------------------------
--- 裁判書製作法官:陳廣勝法官 ---------------------------------------------------------------------
Processo n.º 191/2020
(Autos de recurso penal)
Recorrente (arguido): A
DECISÃO SUMÁRIA NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA
1. Por acórdão proferido a fls. 172 a 177 dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR1-19-0022-PCC do 1.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB), o arguido A, aí já melhor identificado, ficou condenado como autor material de um crime consumado de provocação de incêndio, p. e p. pelo art.o 264.o, n.o 1, alínea a), do Código Penal (CP), na pena de três anos e três meses de prisão.
Inconformado, veio o arguido recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), alegando, no essencial, e rogando o seguinte, na sua motivação de fls. 183 a 200 dos presentes autos correspondentes:
– a decisão condenatória penal ora recorrida padece do vício de erro notório na apreciação da prova previsto na alínea c) do n.o 2 do art.o 400.o do Código de Processo Penal (CPP), porque, por exemplo:
– no caso dos autos, como nenhuma das três testemunhas (vizinhas do próprio arguido) chegou a declarar se presenciaram que o instrumento usado pelo arguido para prática da acção incendiária tinha sido um isqueiro, o facto de se ter encontrado isqueiros na residência do arguido não basta para se dar por provado que o arguido utilizou isqueiro para acção incendiária, pelo que o facto provado 8 (segundo o qual o instrumento usado pelo arguido para a prática do crime é isqueiro) deveria passar a ser considerado como não provado;
– da mesma maneira, o facto de o pessoal da Polícia Judiciária ter apanhado uma toalha no chão da entrada da fracção autónoma vítima da acção incendiária não é suficiente para se dar por provado que a toalha foi instrumento usado pelo arguido para a prática do crime, pelo que o facto provado 12 (em sintonia com o qual a toalha foi instrumento usado pelo arguido para a prática do crime) também deveria passar a ser um facto não provado;
– o facto de uma testemunha policial ter dito na audiência de julgamento que a garafa de vidro encontrada no local do incêndio foi igual às garrafas de vidro encontradas na residência do arguido também não pode servir de fundamento para condenar o arguido pelo crime de provocação de incêndio;
– o facto provado 2 (de acordo com o qual o arguido buscou uma toalha e um isqueiro e uma garrafa contentora de líquido químico combustível na sua residência para se deslocar à zona exterior da entrada da fracção autónoma dos autos, para lançar tal líquido para essa zona, e usar o isqueiro para arder a toalha e atirar a toalha para [...]) também deveria passar a ser considerado como não provado;
– é muito provável que o arguido já sofreu de doença psiquiátrica na altura da ocorrência do incêndio;
– havendo, no acórdão recorrido, também o vício referido na alínea a) do n.o 2 do art.o 400.o do CPP, deveria o arguido ser absolvido do crime por que vinha condenado, por força do princípio de in dubio pro reo;
– e mesmo que assim não se entendesse, o acórdão recorrido não deixaria de ter violado os art.os 40.o, 48.o e 65.o do CP;
– deveria, pois, ser reduzida a pena até a três anos, com suspensão da execução por um período não inferior a três anos e seis meses, com imposição até de regras de conduta ou obrigações, à luz do art.o 48.o do CP.
Ao recurso, respondeu a Digna Delegada do Procurador a fls. 209 a 214v, no sentido de improcedência manifesta do recurso.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer a fls. 224 a 225v, opinando pela improcedência do recurso.
Cumpre decidir sumariamente do recurso dos arguidos, nos termos permitidos pelo art.o 407.o, n.o 6, alínea b), do CPP.
2. Do exame dos autos, sabe-se que o acórdão ora recorrido se encontrou proferido a fls. 172 a 177, cujo teor (que inclui a respectiva fundamentação fáctica e probatória) se dá por aqui inteiramente reproduzido.
3. De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao ente julgador do recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, conhecendo:
Da análise da argumentação principal tecida pelo recorrente, resulta nítido que ele está a fazer sindicar materialmente da livre convicção do Tribunal recorrido sobre os factos por que vinha acusado.
Entretanto, desde logo, há que observar que a fundamentação fáctica do acórdão recorrido evidencia que o Tribunal sentenciador já investigou, sem lacuna alguma, sobre a veracidade de todo o tema probando dos autos (sobre o que se deve entender por objecto do processo ou tema probando a nível do julgamento da matéria de facto, cfr., por exemplo, de entre muitos outros, os acórdãos deste TSI, de 22 de Julho de 2010, do Processo n.o 441/2008, e de 17 de Maio de 2018, do Processo n.o 817/2014), pelo que a decisão condenatória recorrida não pode ter enfermado do vício de insuficiência para decisão da matéria de facto provada.
Aliás, o tipo de argumentação recursória usada pelo arguido não tem a ver propriamente com esse vício aludido na alínea a) do n.o 2 do art.o 400.o do CPP, mas sim com o também alegado vício de erro notório na apreciação da prova.
Assim, é de ajuizar se o Tribunal recorrido errou ou não na apreciação da prova.
Há erro notório na apreciação da prova como vício previsto no art.o 400.o, n.o 2, alínea c), do CPP, quando for patente que a decisão probatória do tribunal violou inclusivamente as leges artis (neste sentido, e de entre muitos outros, cfr. o douto Acórdão do Venerando Tribunal de Última Instância, de 22 de Novembro de 2000, do Processo n.º 17/2000).
Na verdade, o princípio da livre apreciação da prova plasmado no art.º 114.º do CPP não significa que a entidade julgadora da prova possa fazer uma apreciação totalmente livre da prova. Pelo contrário, há que apreciar a prova sempre segundo as regras da experiência, e com observância das leges artis, ainda que (com incidência sobre o caso concreto em questão) não existam quaisquer normas legais a determinar previamente o valor das provas em consideração.
Ou seja, a livre apreciação da prova não equivale à apreciação arbitrária da prova, mas sim à apreciação prudente da prova (em todo o terreno não previamente ocupado por tais normas atinentes à prova legal) com respeito sempre das regras da experiência da vida humana e das leges artis vigentes neste campo de tarefas jurisdicionais.
E no concernente à temática da prova livre, é de relembrar os seguintes preciosos ensinamentos veiculados no MANUAL DE PROCESSO CIVIL (2.ª Edição, Revista e Actualizada, Coimbra Editora, 1985, páginas 470 a 472), de autoria de ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO E NORA:
– <
[…]
Há, todavia, algumas excepções ao princípio da livre apreciação da prova, que constituem como que justificados resíduos do sistema da prova legal.
[…]
Mas convém desde já conhecer os diferentes graus de convicção do julgador criados pelos meios de prova e precisar o seu alcance prático.
Quando qualquer meio de prova, não dotado de força probatória especial atribuída por lei, crie no espírito do julgador a convicção da existência de um facto, diz-se que foi feita prova bastante – ou que há prova suficiente – desse facto.
Se, porém, a esse meio de prova um outro sobrevier que crie no espírito do julgador a dúvida sobre a existência do facto, a prova deste facto desapareceu, como que se desfez. Nesse sentido se afirma que a prova bastante cede perante simples contraprova, ou seja, em face do elemento probatório que, sem convencer o julgador do facto oposto (da inexistência do facto), cria no seu espírito a dúvida séria sobre a existência do facto.
Assim, se a parte onerada com a prova de um facto conseguir, através de testemunhas, de peritos ou de qualquer outro meio de prova, persuadir o julgador da existência do facto, ela preencheu o ónus que sobre si recaía. Porém, se a parte contrária (ou o próprio tribunal) trouxer ao processo qualquer outro elemento probatório de sinal oposto, que deixe o juiz na dúvida sobre a existência do facto, dir-se-á que ele fez contraprova; e mais se não exigirá para destruir a prova bastante realizada pelo onerado, para neutralizá-la […]>>.
No caso dos autos, da leitura da fundamentação probatória da decisão recorrida, não se vislumbra que o Tribunal recorrido tenha violado qualquer norma jurídica sobre o valor das provas, ou violado qualquer regra da experiência da vida humana, ou violado quaisquer leges artis a observar no julgamento da matéria de facto, mormente ao considerar provado que o isqueiro e a toalha foram instrumentos usados pelo arguido para provocação do incêndio, bem como provado que o incêndio foi provocado por um líquido químico combustível contido em garrafa encontrada no chão da zona exterior da entrada da fracção autónoma em causa, e ainda provados os factos acusados pertinentes para a afirmação (a nível do Direito) do dolo do arguido na prática do crime de provocação de incêndio.
Como o resultado do julgamento de factos a que chegou o Tribunal recorrido não é desrazóavel, improcede necessariamente o suscitado vício de erro notório na apreciação da prova, cabendo notar que a tese de eventual imputabilidade penal (por doença mental) do arguido no momento da prática do crime já ficou afastada pelo teor dos dois relatórios médicos (um inicial e o outro, complementar) juntos a fls. 117 a 118 e a fl. 128 dos autos, antes da realização da audiência de julgamento.
Por fim, quanto à subsidiária pretensão da redução da pena, é patente que não pode proceder esse desejo do recorrente, porquanto ponderadas em conjunto todas as circunstâncias fácticas já apuradas em primeira instância, e atentas inclusivamente as prementes e elevadas necessidades da prevenção do crime de provocação de incêndio, especialmente ocorrido nas altas horas da madrugada em fracção habitacional, a pena de prisão já achada no acórdão recorrido para o arguido não admite, aos padrões da medida da pena vertidos nos art.os 40.o, n.os 1 e 2, e 65.o, n.os 1 e 2, do CP, mais margem para a pretendida redução.
Sendo mantida assim a pena de prisão imposta pelo Tribunal recorrido, que é superior a três anos de prisão, torna-se inviável, por inverificação, a montante, do pressuposto formal postulado no n.o 1 do art.o 48.o do CP, o pedido de suspensão da execução da pena de prisão.
Há, pois, que rejeitar o recurso, sem mais indagação por ociosa ou prejudicada, devido ao espírito do n.º 2 do art.º 410.º do CPP.
4. Dest’arte, decide-se em rejeitar o recurso.
Custas do recurso pelo arguido, com três UC de taxa de justiça e três UC de sanção pecuniária (pela rejeição do recurso).
Após o trânsito em julgado da presente decisão, comunique-a aos três ofendidos identificados no dispositivo do acórdão recorrido.
Macau, 27 de Abril de 2020.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
Processo n.º 191/2020 Pág. 1/9