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Proc. nº 647/2019
Recurso Contencioso
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 02 de Abril de 2020
Descritores:
- Autorização de residência
- Comunicação da alteração dos fundamentos
- Cancelamento

SUMÁRIO:

I - É discricionário o poder conferido à entidade administrativa competente para, ao abrigo do nº4, do art. 18º do Regulamento Administrativo nº 3/2005, cancelar a autorização de residência por não cumprimento do prazo de comunicação da alteração da situação que esteve na base da concessão dessa autorização.

II - Só em casos pontuais de erro grosseiro, tosco e palmar é que a actuação administrativa discricionária pode ser sindicada com êxito judicial com fundamento na violação dos princípios gerais de direito administrativo, como é, por exemplo, o da proporcionalidade (tb. justiça e razoabilidade) sob pena de os tribunais estarem a fazer administração activa - o que, como é sabido, não cabe na esfera do poder jurisdicional - e dessa maneira violarem o fundamental princípio da separação de poderes.

Proc. nº 647/2019

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I – Relatório
A, do sexo masculino, casado, de nacionalidade chinesa, titular do Passaporte da República Popular da China n.º XXX (e do Bilhete de identidade de residente não permanente de Macau n.º XXX, emitido em 20 de Julho de 2017 pela Direcção dos Serviços de Identificação da R.A.E.M.), com endereço na XXX, Taipa, ---
Recorre para este TSI do despacho do Chefe do Executivo, de 22 de Fevereiro de 2019, exarado na Proposta n.º 00401/AJ/2019,---
Através do qual lhe cancelou a autorização de residência temporária em Macau.
Na petição inicial, o recorrente formulou as seguintes conclusões:
“A. O presente recurso contencioso foi interposto contra o despacho proferido pelo Chefe do Executivo da R.A.E.M. na Proposta n.º 00401/AJ/2019, que decidiu cancelar a autorização de residência temporária do Recorrente. Tal Proposta constitui parte integrante do acto recorrido.
B. À luz do conteúdo do acto recorrido, o Recorrente não tinha comunicado, no prazo de 30 dias, ao IPIM o término da relação de trabalho estabelecida com a “Companhia de Construção XX, Limitada (XX建築工程有限公司)”, pelo que foi proferida a decisão punitiva contra o mesmo.
C. Devido ao erro na interpretação da lei, o Recorrente entendeu equivocamente que só deveria comunicar ao IPIM a extinção ou alteração da situação jurídica, dentro de 30 dias após o início de funções em nova empresa, ou seja, depois da conclusão verdadeira da alteração.
D. Dos factos acima expostos e das informações constantes dos autos se vislumbra que, posteriormente, o Recorrente cumpriu plenamente as exigências da lei na altura em que voltou a mudar de emprego, verificando-se, portanto, o alcance do objectivo legislativo visado pela Lei n.º 4/2003 e do objectivo da supervisão visado pelo IPIM.
E. O Recorrente considera que o acto recorrido enferma do vício de desarrazoamento no gozo do poder discricionário por ter cancelado a autorização de permanência temporária deste, mesmo que se verifique o alcance do objectivo da supervisão visado pelos órgãos legislativo e administrativo.
F. Além disso, o acto recorrido padece também do vício de erro nos pressupostos de facto. O Recorrente não teve intenção de apresentar, de forma extemporânea, a comunicação à autoridade, mas sim, ele fez isso pela insuficiência do conhecimento jurídico, portanto, conforme as regras da experiência comum, é evidentemente desculpável o erro cometido por um indivíduo que acabou de obter a autorização de permanência temporária em menos de meio ano e teve a sua primeira mudança de emprego.
G. Se o Recorrente não reunir plenamente o “elemento cognitivo” nem o “elemento intencional”, e tiver cumprido o seu dever de atenção, deve considerar-se que este praticou, sem dolo nem negligência, o acto em causa, pelo que não deve o mesmo ser sancionado.
H. A conduta do Recorrente deve ser considerada justa causa prevista no n.º 4 do art.º 18º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, a par disso, por se verificar erro nos pressupostos de facto, nos termos do disposto no art.º 124º do Código do Procedimento Administrativo, é anulável o acto.
I. In casu, o cancelamento da autorização de residência temporária do Recorrente não só causa a perda do emprego e da qualidade de residência ao Recorrente, mas também prejuízo de difícil reparação à família do mesmo, a par disso, o Recorrente tem sustentado a pressão económica da família e trabalha duramente para suportar os encargos da vida familiar, por conseguinte, verifica-se a violação do princípio da proporcionalidade se se trazerem consequência e sacrifício tão graves para o Recorrente e sua família só por um caso de atraso na comunicação formal, sem haver qualquer prejuízo para a segurança interna, estabilidade de segurança, bens, interesses ou valores da R.A.E.M.
J. O acto recorrido violou o princípio da proporcionalidade, pelo que, nos termos do disposto no art.º 124º do Código do Procedimento Administrativo, deve o mesmo ser anulado.
Nestes termos, requer-se aos Venerandos Juízes que concedam provimento ao recurso contencioso interposto:
- Solicita-se aos Venerandos Juízes que anulem o acto recorrido por padecer do vício de desarrazoamento no gozo do poder discricionário; ou
- Se os Venerandos Juízes não concordarem com a opinião supracitada, solicita-se que seja anulado o acto recorrido por padecer do vício de erro nos pressupostos de facto; ou
- Se os Venerandos Juízes não concordarem com a opinião supracitada, solicita-se que seja anulado o acto recorrido por ter violado o princípio da proporcionalidade.”.
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Contestou a entidade recorrida, pugnando pela improcedência do recurso.
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Nas alegações facultativas, o recorrente reiterou no essencial a posição manifestada no articulado inicial.
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O digno Magistrado emitiu o seguinte parecer:
“Objecto do presente recurso contencioso é o despacho de 29 de Abril de 2019, da autoria do Exm.º Chefe do Executivo, que determinou o cancelamento da autorização de residência temporária concedida ao recorrente A.
Na sua petição de recurso, o recorrente imputa ao acto impugnado desrazoabilidade no exercício do poder discricionário, erro nos pressupostos de facto e violação do princípio da proporcionalidade, no que é contraditado pela entidade recorrida, que assevera a legalidade do acto.
Vejamos, começando pelo erro nos pressupostos de facto.
Como se apura do teor do acto e dos motivos em que assentou, está em causa a falta de comunicação ao IPIM, no prazo de 30 dias, da alteração dos fundamentos que estiveram na base da concessão da autorização de residência temporária. Alega o recorrente que o atraso na comunicação se deveu a justa causa, pelo que, ao não levar em conta esse justo impedimento, a Administração incorreu em erro nos pressupostos de facto.
Não se crê que lhe assista razão. A justa causa, enquanto motivo de impedimento da comunicação em tempo, há-de consistir em razões fácticas que obstam a que o interessado cumpra, ou encarregue alguém de cumprir, tempestivamente a obrigação. No caso, o que o interessado invoca é a falta de conhecimentos jurídicos para fazer uma leitura correcta da lei. Mas esta razão não colhe. Para além de a lei se apresentar clara, quanto ao prazo e quanto aos factos que desencadeiam a sua contagem, o desconhecimento da lei ou a sua má interpretação não aproveitam ao faltoso, tal como a entidade recorrida lembra na sua contestação.
Improcede este vício.
Vem também invocada a violação do princípio da proporcionalidade, através do exercício desrazoável do poder discricionário.
Não se detecta a aventada afronta ao princípio da proporcionalidade, não se afigurando que a Administração haja sido irrazoável no uso do poder discricionário. O princípio da proporcionalidade obriga a que as decisões administrativas que colidam com direitos e interesses legítimos dos particulares apenas possam afectar as posições destes na justa medida da necessidade reclamada pelos objectivos a prosseguir. Pois bem, como se sabe, Macau é um território minúsculo, em cuja península se abriga uma das maiores densidades populacionais do mundo e onde o direito de residência confere um estatuto equiparável, em certo sentido, ao de nacionalidade. Neste contexto, é natural que haja alguma contenção na concessão de autorizações de residência, compreendendo-se que, nessa matéria, eminentemente discricionária, a Administração controle com rigor todos os desvios às obrigações a que ficam sujeitos aqueles a quem é concedida residência temporária. É o próprio interesse da Região Administrativa Especial de Macau e dos seus residentes que justifica esse rigor. Se aquele a quem é dada autorização temporária de residência não cumpre os deveres inerentes a essa concessão, como sucedeu no caso em análise, é perfeitamente aceitável conferir primazia ao interesse público traduzido na observância daquelas obrigações e na disciplina do seu cumprimento, no confronto com o interesse do particular que almeja manter residência temporária em Macau.
Não pode, pois, dizer-se que o acto violou o princípio da proporcionalidade a coberto de uma utilização desrazoável do poder discricionário em que se moveu.
Soçobram também estes fundamentos do recurso.
Ante a improcedência dos suscitados vícios, deve negar-se provimento ao recurso.”
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é absolutamente competente.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamenterepre4sentadas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1 - Ao requerente foi concedida a autorização de residência temporária em 19/06/2017, adquirindo pela primeira vez o Bilhete de Identidade de Residente Não Permanente da RAEM em 20/07/2017.
2 - A partir dessa ocasião, o requerente exerceu funções de engenheiro geral de geotécnica e gestor de projectos na “XX建築工程有限公司Companhia de Construção XX, Limitada”, auferindo mensalmente o salário no valor de MOP$48.000,00.
3 - Em 30/11/2017, o requerente terminou a relação laboral com a “XX建築工程有限公司Companhia de Construção XX, Limitada”.
4 - Em 27/12/2017 o requerente estabeleceu a nova relação laboral com a “XX工程有限公司 Companhia de Engenharia XX, Limitada”, exercendo funções de engenheiro geral de geotecnia e gestão, auferindo mensalmente o salário no valor de MOP$60.000,00.
5 - Em 22/01/2018, a “XX工程有限公司Companhia de Engenharia XX, Limitada” notificou à Direcção dos Serviços de Finanças sobre o ingresso do requerente.
6 - No mesmo dia, ou seja, em 22/01/2018, o requerente notificou o IPIM sobre o seu ingresso na empresa.
7 - No momento em que o requerente se desligou da “XX工程有限公司Companhia de Engenharia XX, Limitada” em 30/11/2018, notificou o IPIM em 21/12/2018, apontando que em 10/12/2018, o requerente ingressou na “XX有限公司XX Company Limited (Macau)”, auferindo mensalmente o salário no valor de MOP$60.000,00.
8 - O requerente sempre tem emprego certo em Macau, e em 2017 permaneceu 294 dias, em 2018 216 dias.
9 - No dia 22/02/2019 foi lavrada a seguinte Proposta nº 0041/AJ/2019:
Assunto: Proposta de cancelamento da autorização de residência temporária (Processo n.º 0050/2015)
PROPOSTA N.º: 00401/AJ/2019
      Data: 22/02/2019
Exm.º Sr. Director do DJFR, Ian Chi Iong
1. Em 19 de Junho de 2017, nos termos do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, ao requerente, A, foi concedida a autorização de residência temporária, por este ter sido recrutado pela “Companhia de Construção XX, Limitada (XX建築工程有限公司)” como “engenheiro geológico geral e gerente de projecto”, e, no mesmo dia, foi deferido o pedido de autorização de residência temporária de seu cônjuge (B) e descendente (C). O prazo de validade da autorização de residência temporária concedida aos indivíduos supra mencionados termina em 19 de Junho de 2020.
2. Em 27 de Julho de 2017, este Instituto foi notificado pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública de que: A foi encaminhado ao Ministério Público para efectuar o respectivo procedimento penal por ser suspeito da prática do crime de dano. Assim sendo, por ofício n.º 06029/GJFR/2017, este Instituto pediu informações ao MºPº (vide anexo 1).
3. Conforme a resposta dada pelo MºPº no seu ofício datado de 9 de Novembro de 2017: Em 20 de Julho de 2015, altura em que A, na qualidade de empregado não residente, estava a operar o “despejo de betão” em estaleiro de construção civil, este despejou o betão num motociclo que circulava pela zona periférica do estaleiro. Tendo em conta que o incidente tratava dum dano não doloso, não constituindo crime ao abrigo do Código Penal, a par disso, a companhia em que trabalhava A, prometeu indemnizar o proprietário do motociclo e, por seu turno, o referido proprietário do veículo manifestou a não pretensão do procedimento criminal contra A, o MºPº proferiu despacho em 29 de Julho de 2016, decidindo não instaurar o inquérito face ao caso (vide anexo 1).
4. Em 22 de Janeiro de 2018, o requerente apresentou a declaração escrita e os documentos comprovativos, demonstrando a alteração da sua relação de trabalho (vide anexo 2):
A relação de trabalho em que se fundamenta a renovação da autorização de residência temporária
Pela primeira vez apresentada a situação da relação de trabalho recentemente estabelecida
Empregador
“Companhia de Construção XX, Limitada (XX建築工程有限公司)”
Empregador
Companhia de Engenharia XX, Limitada (XX工程有限公司)
Posto de trabalho
Engenheiro geológico geral e gerente de projecto
Posto de trabalho
Engenheiro geológico geral e gerente
Salário mensal
MOP48.000,00
Salário mensal
MOP60.000,00
Período do emprego
Exerceu funções a partir de 1 de Outubro de 2011 e o prazo de validade do contrato terminou em 30 de Setembro de 2016
Período do emprego
Exerceu funções a partir de 27 de Dezembro de 2017 e o prazo de validade do contrato terminou em 31 de Dezembro de 2018
Data da cessação de funções
30 de Novembro de 2017
Data do início de funções
27 de Dezembro de 2017
5. Visando acompanhar a situação, por ofício n.º 01933/DJFR/2018, este Instituto notificou o requerente para apresentar os documentos comprovativos suplementares relativos à nova relação de trabalho, e, posteriormente, o requerente apresentou os respectivos documentos (vide anexo 3).
6. Neste caso, o requerente não manteve a situação juridicamente relevante que fundamentou a renovação da autorização de residência temporária, bem como, não tendo observado a lei, não cumpriu a obrigação de comunicação perante este Instituto.
7. Assim sendo, em 4 de Julho de 2018, este Instituto realizou a audiência escrita do interessado e, a seguir, o requerente respondeu que, realmente, não tinha cumprido a obrigação de comunicação, explicando que, por motivo da família e do trabalho, ele não tinha apresentado, por negligência, a comunicação a este Instituto dentro de 30 dias após a cessação de funções, e que só tinha descoberto que era necessário cumprir a respectiva regra depois do início de funções em nova empresa, portanto, em seguida, apresentou imediatamente a comunicação a este Instituto (vide anexo 4).
8. Face à opinião de resposta acima exposta, cumpre-se analisar o seguinte:
(1) Nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 18º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005: “O interessado deve manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.”, e nos termos do disposto nos n.ºs 3 e 4 do mesmo artigo: “O interessado deve comunicar ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau a extinção ou alteração dos referidos fundamentos no prazo de 30 dias, contados desde a data da extinção ou alteração.”; e “O não cumprimento sem justa causa da obrigação de comunicação prevista no número anterior, dentro do respectivo prazo, poderá implicar o cancelamento da autorização de residência temporária”.
(2) Dos documentos constantes dos autos se vislumbra que a relação de trabalho entre o requerente e a “Companhia de Construção XX, Limitada (XX建築工程有限公司)” tinha cessado em 30 de Novembro de 2017, mas o requerente só apresentou a comunicação a este Instituto em 22 de Janeiro de 2018; daí se verifica que o requerente não apresentou a comunicação a este Instituto no prazo de 30 dias, contados desde a data da alteração da situação jurídica; além disso, entende-se que o requerente não cumpriu, no prazo legal, a obrigação de comunicação por não existir justa causa na supracitada tese invocada pelo mesmo.
(3) Deste modo, propõe-se a não admissão da situação jurídica recentemente estabelecida pelo requerente.
9. Embora, em 21 de Dezembro de 2018, o requerente tivesse comunicado a este Instituto que deixava de trabalhar na “Companhia de Engenharia XX, Limitada (XX工程有限公司)” em 30 de Novembro de 2018 e começou a exercer funções na “Companhia Shanghai XX (Macau), Limitada (XX(澳門)有限公司)” (vide anexo 5), a análise acima exposta emitiu o parecer desfavorável à manutenção da autorização de residência temporária concedida ao interessado, pelo que se propõe que não seja aceite a relação de trabalho ora estabelecida pelo requerente como fundamento do seu pedido de autorização de residência temporária.
10. Visando conferir a situação da presença do requerente na RAEM durante o período de validade da autorização de residência temporária que lhe foi concedida, em 8 de Outubro de 2018, por ofício n.º 05319/DJFR/2018, este Instituto pediu ao CPSP o fornecimento do registo de migração do requerente e das respectivas informações. Segue-se o registo da presença do requerente na RAEM, referente ao período entre 1 de Janeiro de 2017 e 30 de Setembro de 2018 (vide anexo 6):
Período
Número de dias em que o requerente se encontra presente na RAEM
01/01/2017-31/12/2017
294
01/01/2018-30/09/2018
216
Das informações acima expostas se revela que o requerente residia habitualmente na RAEM durante o período de validade da autorização de residência temporária que lhe foi concedida.
11. Pelo exposto, extinguiu-se a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização de residência temporária ao requerente, bem como se verificou a falta de cumprimento sem justa causa, no prazo legal, da obrigação de comunicação da alteração da situação jurídica por parte do requerente, pelo que não se pode aceitar a situação jurídica recentemente estabelecida pelo requerente como fundamento da concessão da autorização de residência temporária ao mesmo. Assim sendo, propõe-se que se submeta à consideração de Sua Ex.ª o Chefe do Executivo a proposta, para, nos termos do disposto no art.º 18º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, cancelar a autorização de residência temporária, com validade até 19 de Junho de 2020, que foi concedida ao requerente, A, e a seu cônjuge (B) e escendente (C).
À consideração superior.
Escriturária Director-Adjunto da DAJ
(Assinatura vide o original) (Assinatura vide o original)
XXX XXX
22 de Fevereiro de 2019 22 de Fevereiro de 2019
10 - Em 1/03/2019, o Director do DJFR pronunciou-se no seguinte sentido:
“Concordo com a proposta. Devido à alteração da situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização de residência temporária ao requerente, e à falta de cumprimento sem justa causa da obrigação de comunicação, findo o procedimento de audiência, venho propor que se submeta à consideração de Sua Ex.ª o Chefe do Executivo a proposta, para, nos termos do disposto no art.º 18º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, cancelar a autorização de residência temporária, com validade até 19 de Junho de 2020, que foi concedida ao interessado.
Submeto à apreciação superior.”
(Assinatura vide o original)
XXX/Director do DJFR
01/03/2019
11 - Em 27/03/2019, o Secretário para a Economia e Finanças manifestou concordância com a proposta.
12 - O Chefe do Executivo, em 29/04/2019, proferiu o seguinte despacho (a.a.): “Concordo com a proposta”.
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IV – O Direito
1 - Ao recorrente fora concedida em 19/06/2017 autorização de residência para exercer as funções de engenheiro geotécnico e gestão de projecto para a “Companhia de Construção “XX, Limitada”. Porém, a relação laboral com esta empresa terminou no dia 30/11/2017, vindo a estabelecer nova relação em 27/12/2017 com “XX工程有限公司” ou “Companhia de Engenharia XX, Limitada”, exercendo nela funções de engenheiro geral de geotecnia e gestão.
Contudo, apenas comunicou ao IPIM a alteração da sua situação jurídica em 22/01/2018. E foi por entender que o recorrente não respeitou o prazo de 30 dias previsto no art. 18º do Regulamento Administrativo nº 3/2005 que a autorização de residência lhe foi cancelada.
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2 - Da desrazoabilidade
O recorrente começa por dizer que o acto aqui sindicado incorre em manifesta desrazoabilidade no exercício do poder discricionário.
Relativamente à desrazoabilidade, enquanto modelação negativa ou desrespeito por aquilo a que se poderia dar o nome de “princípio da razoabilidade” o CPA de Macau não tem lugar para ele, por inexistir norma que especificamente o preveja1. Ainda assim, os tribunais vão contribuindo para a sua densificação de uma forma enviesada, conotando-o com o princípio da proporcionalidade ou com o da justiça.
E o que têm afirmado é que, só em casos pontuais de erro grosseiro, tosco e palmar é que a actuação administrativa discricionária pode ser sindicada com êxito judicial com fundamento na violação dos princípios gerais de direito administrativo, como pode este ser considerado ora invocado, sob pena de os tribunais estarem a fazer administração activa - o que, como é sabido, não cabe na esfera do poder jurisdicional - e dessa maneira violarem o fundamental princípio da separação de poderes. (v..g., do TUI, de 12/07/2017, Proc. nº 22/2017; Acs. do TSI, de 22/06/2017, Proc. nº 664/2015; de 19/04/2018, Proc. nº 265/2017; de 21/11/2019, Proc. nº 11/2019).
Ora, não nos parece que este caso possa inscrever-se no quadro de uma actuação “desrazoável” e desproporcional. Com efeito, a lei impõe a comunicação no prazo de 30 dias contados da “extinção” e da “alteração” dos fundamentos que estiveram na base da concessão da residência (cfr. art. 18º, nº3, do RA nº 3/2005).
Repare-se, por outro lado, que quando o recorrente de novo cessou a sua colaboração laboral com a empresa “XX” em 30/11/2017, apenas comunicou o facto em 21/01/2018. Ou seja, não respeitou o prazo de 30 dias contados desde a alteração da situação anterior.
Certo é que não estamos perante um poder vinculado da Administração, mas sim discricionário (nº4, do art. 18º do R.A. nº 3/2005; Acs. do TUI, de 22/05/2013, Proc. nº 28/2013 e de 13/01/2016, Proc. nº 79/2015). Contudo, não se vê que a aplicação desses poderes ultrapasse de uma maneira tosca os limites da sensatez e, por conseguinte, da razoabilidade e da proporcionalidade.
Desta maneira, não podemos dar por procedente o vício (art. 5º, nº2, do CPA).
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3 - Do erro nos pressupostos de facto
O recorrente, a este propósito, mantém a tónica já antes manifestada de que, por ter incorrido em má interpretação da norma acerca do respeito pelo prazo de comunicação, o erro desculpável sobre as circunstâncias de facto ou sobre a ilicitude em que incorreu o torna isento de culpa.
Esta argumentação não encaixa no vício de erro sobre os pressupostos de facto. Este deve incidir sobre a concreta actuação administrativa, isto é, só se fala em erro sobre os pressupostos de facto quando a Administração toma uma decisão baseada em factos que não são verdadeiros e que, portanto, não se ajustam à premissa fáctica contida na norma.
Ora, o que o recorrente pretende com a invocação em apreciação é desviar o eixo do vício para a sua própria conduta, tentando fazer crer que a decisão administrativa é inválida face ao erro em que ele próprio incorreu. Contudo, o paralelismo com o regime do Código Penal (arts. 15º e 16º) é, salvo melhor opinião, despropositado.
Com efeito, o que a Administração fez foi aplicar o seu poder discricionário ante um facto objectivo e que o próprio recorrente não desmente.
Improcede, pois, o vício.
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4 - Do vício de violação da proporcionalidade
Com fundamento no disposto no art. 5º, nº2, do CPA, o recorrente também invoca o princípio da proporcionalidade.
Contudo, esta matéria acha-se já estudada aquando da análise da desrazoabilidade invocada, pelo para o ponto IV-2 supra.
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V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça em 5 UCs.
T.S.I., 02 de Abril de 2020
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Joaquim Teixeira de Sousa
1 Ao contrário do que sucede no correspondente código português, que tem um preceito dedicado a este princípio da razoabilidade (cfr. art. 8º do CPA), o código de Macau não seguiu até ao momento a mesma solução normativa.
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Rec. Cont. nº 647/2019 19