Processo n.º 1261/2019
(Autos de recurso cível)
Data: 28/Maio/2020
Recorrente:
- A, LLC.
Recorrida:
- B Pty Ltd. (parte contrária)
Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
A, LLC., sociedade comercial com sede nos Estados Unidos da América, com sinais nos autos (doravante designada por “recorrente”), interpôs junto do Tribunal Judicial de Base da RAEM recurso do despacho do Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual dos Serviços de Economia, que concedeu a favor de B Pty Ltd., melhor identificada nos autos (doravante designada por “recorrida” ou “parte contrária”), o registo da marca N/..., para produtos na classe 43ª.
Por sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Base, foi julgado improcedente o recurso.
Inconformada, recorreu jurisdicionalmente para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“A. O Tribunal a quo analisou a questão da reprodução e imitação das marcas da Recorrente e, nesse âmbito, os requisitos previstos no artigo 215º, n.º 1 do RJPI, concluindo o seguinte: (i) que as marcas da Recorrente têm prioridade face ao pedido da Parte Contrária, (ii) que o pedido da Parte Contrária destina-se a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins aos assinalados pelas marcas da Recorrente, e (iii) que, apesar de haver semelhança clara entre as marcas da Recorrente e o pedido da Parte Contrária, tal semelhança não implica necessariamente que os consumidores serão induzidos em confusão.
B. A semelhança entre as marcas da Recorrente e o pedido da Parte Contrária é o único requisito da reprodução e imitação de marca que o Tribunal a quo considerou não estar preenchido.
C. Nos termos do RJPI, é requisito para que uma marca se considere reproduzida ou imitada, no todo ou em parte, por outra, que esta tenha tal semelhança gráfica, nominativa, figurativa ou fonética com aquela que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não possa distinguir as marcas em causa senão depois de exame atento ou confronto.
D. Comparando os sinais em crise no seu conjunto, facilmente se verifica que os mesmos causam a mesma impressão de conjunto no consumidor: não só por estar em causa o mesmo elemento principal “…”, mas sobretudo pela aparência geral das marcas, incluindo dimensão, posição, cor e estilo dos respectivos elementos.
E. O elemento predominante e distintivo das marcas em confronto é a letra “...”, que surge em destaque do ponto de vista gráfico – isolada, centrada e com dimensões bastante superiores às dos restantes elementos das marcas, pelo que é a mesma que ficará na memória visual dos consumidores, tendo em conta a impressão de conjunto das marcas.
F. Do ponto de vista cromático, existe uma enorme semelhança entre o pedido N/... da Parte Contrária e a marca N/... da Recorrente – os elementos das marcas em causa apresentam-se com letras em cor clara sobre um fundo escuro.
G. Os restantes elementos das marcas em questão – “...” e “...” -, por serem meramente genéricos e descritivos, são irrelevantes no conjunto da apreciação das marcas.
H. “Sinal descritivo é, normalmente, a denominação portuguesa ou estrangeira que indica, exclusiva e directamente, a produção (espécie, lugar e tempo), qualidade, quantidade, destino, valor, ou qualquer outra característica do produto ou serviço. Um sinal descritivo não é distintivo, na medida em que é comum aos objectos idênticos qualquer que seja a sua origem.” – pelo que tanto “...” como “...” consistem em sinais descritivos.
I. À cautela, ainda que se admitisse (o que não se concede) que os referidos substantivos relevam para a comparação das marcas, sempre se diria que não seriam certamente os mesmos que evitariam o risco de os consumidores confundirem as marcas em questão.
J. Os referidos substantivos situam-se por baixo da letra “...” e têm um tamanho de letra bastante reduzido relativamente àquela, pelo que quando o consumidor médio se deparar com qualquer das marcas em questão, certamente irá reter o elemento “...”, de grandes dimensões e com capacidade distintiva, em óbvio prejuízo das letras de tamanho muito reduzido que se encontram numa posição inferior (e, certamente, ilegíveis à distância).
L. O substantivo “...” não tem qualquer significado ou reconhecimento junto dos consumidores de Macau, pelo que este é um elemento sem percepção, compreensão e retenção pelo consumidor médio, sendo superficial e acessório na marca (para além da referida dimensão diminuta).
M. Nada consta dos autos que nos permita concluir que o consumidor médio de Macau atribua qualquer significado à palavra “...” e, muito menos, a produtos de carne com tal origem, pelo que esta conclusão do Tribunal a quo carece de qualquer fundamento.
N. O Tribunal a quo referiu que o elemento “...” das marcas da Recorrente não é um sinal forte (?!?) e que, por isso, não pode ser usado exclusivamente pela Recorrente (apesar de ter reconhecido que a marca “...” é notória…), mas olvidou a excepção que impede a apropriação de elementos fracos ou sem capacidade distintiva, segundo a qual “os elementos genéricos que integrem uma marca (e, até, uma marca constituída exclusivamente por tais elementos) poderão ser protegidos quando, na prática comercial, os sinais tiverem adquirido carácter distintivo” (cfr. Pedro Sousa e Silva, “Direito Industrial. Noções Fundamentais”, 1ª edição, Dezembro de 2011, p. 156).
O. «”Secondary meaning”, quando reportado a uma marca, pelo sentido figurado e implícito que contém e pela fantasia que transporta, é um fenómeno de conversão de um sinal originariamente privado de capacidade distintiva num sinal distintivo de produtos ou serviços, reconhecido como tal, no tráfico económico, através do seu significado secundário, por consequência do uso e de mutações semânticas ou simbólicas» (cfr. acórdão do Tribunal de Segunda Instância, proc. n.º 655/2016, de 16 de Fevereiro de 2017).
P. Por força de uma efectiva utilização no mercado, um sinal alegadamente indistintivo pode converter-se numa referência capaz de permitir ao consumidor médio reportar certos bens ou serviços a uma determinada origem, cumprindo, desse modo, a função distintiva associada à marca – sendo este o caso da marca “...” da Recorrente.
Q. Considerando que a letra “...” é o elemento predominante da marca (notória, tal como a DSE e o próprio Tribunal a quo reconhecem, e até mesmo de prestígio), e que constitui um elemento distintivo, será sempre esse o elemento a memorizar por qualquer consumidor, independentemente do seu nível de atenção.
R. Em relação ao pedido N/..., julgou o Tribunal Judicial de Base (proc. n.º CV3-19-0002-CRJ) estarmos perante reprodução e imitação das marcas da Recorrente, dando por verificados todos os requisitos do n.º 1 do artigo 215º do RJPI.
S. O Tribunal Judicial de Base entendeu haver semelhança entre os sinais em questão – nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 215º do RJPI –, afirmando que “as marcas em causa são muito similares na sua componente leonina, sendo que o que se acrescenta na registanda [o pedido da ora Parte Contrária], no confronto com o que se acresenta (em apenas duas) nas registadas [as marcas da ora Recorrente], não confere àquela face a esta diferenciação suficiente para afastar a imitação”, e que “É fácil perceber qual o coração dos sinais em confronto, que se impõe, reina, dominando na sua individualização: …. Este sinal, …, no seu efeito fonético e ou visual/gráfico destaca-se patentemente, relegando o que demais que compõe a marca registanda [o pedido da ora Parte Contrária] e duas das marcas registadas [as marcas da ora Recorrente] pela sua natureza meramente acessória, portanto a desconsiderar na identificação das marcas em disputa.”
T. A extensa prova que consta dos autos e que demonstra que o sinal “...” é imediatamente associado pelos consumidores à Recorrente deveria ter sido valorada pelo Tribunal a quo no sentido de este reconhecer a capacidade distintiva da marca “...” da Recorrente.
U. Quanto à intenção da Parte Contrária em praticar actos de concorrência desleal, observe-se que, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 9º do RJPI, é fundamento de recusa “O reconhecimento de que o requerente pretende fazer concorrência desleal, ou que esta é possível independentemente da sua intenção”, pelo que não cabe à Recorrente demonstrar a intenção da Parte Contrária, pois a mera possibilidade de concorrência desleal é suficiente.
V. Acto de concorrência desleal é o acto de disputa de clientela que é contrário às normas e usos honestos da actividade económica, designadamente o que seja idóneo a criar confusão entre produtos ou serviços de diferentes agentes económicos e o que configure aproveitamento da reputação empresarial de outrem (cfr. artigos 158º, 159º e 165º do Código Comercial).
X. A marca da Parte Contrária é claramente idónea a criar confusão nos consumidores (como foi, aliás, decidido pelo Tribunal no outro caso em juízo, sob o n.º CV3-19-0002-CRJ).
Z. A Parte Contrária pode aproveitar-se da reputação que a Recorrente tem em Macau visto a sua marca “...” ser objecto de notoriedade e prestígio em Macau, em virtude do sucesso que a tornou numa das mais reconhecidas operadoras no sector da restauração e hotelaria em diversos mercados, incluindo na região da Ásia-Pacífico.
AA. A Recorrente age de má-fé ao utilizar uma marca (notória e de prestígio) de um terceiro que se encontra previamente registada em Macau no âmbito da mesma actividade e para assinalar serviços idênticos, na mesma classe.
Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogado o despacho de concessão do registo da marca N/..., com todas as consequências legais.”
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Notificada a recorrida, foram apresentadas na resposta ao recurso as seguintes conclusões:
“a. Por douta sentença datada de 25 de Junho de 2019, foi o recurso interposto pela ora Recorrente, julgado improcedente e decidido manter o despacho da Chefe do Departamento de Propriedade Industrial da DSE que concedeu o registo da marca N/..., na classe 43.
b. O Tribunal a quo manteve a decisão de concessão por entender que, apesar de haver uma semelhança entre as marcas (a marca “…” da Parte Contrária e as marcas registadas da Recorrente) – devido à presença da letra “...” – a marca registanda não induz o consumidor em confusão.
c. A Recorrente alega que, no seu conjunto, os sinais em análise, causam a mesma impressão no consumidor, não só por estar em causa o mesmo elemento principal “...”, mas sobretudo pela aparência geral das marcas, incluindo dimensão, posição, cor e estilo dos respectivos elementos.
d. Entendendo também que restantes elementos das marcas em questão são meramente genéricos e descritivos.
e. No entender da Parte Contrária, basta uma simples análise comparativa para se perceber que as marcas são diferentes.
f. A Parte Contrária concorda com o Tribunal a quo a realça que o “...” utilizado nos sinais em confronto é substancialmente diferente, sendo que o utilizado na marca da Recorrente é um “...” maiúsculo sem qualquer estilização, o que o torna um sinal dotado de fraca capacidade distintiva.
g. Enquanto a marca registanda da Parte Contrária é uma marca muito mais complexa e elaborada, dotada de forte componente figurativa e, com elevada capacidade distintiva, sendo composta por vários elementos nominativos e visuais diferenciadores relevantes que lhe conferem forte distintividade e a diferenciam das marcas da Recorrente.
h. Foneticamente, enquanto as marcas da Recorrente são marcas nominativas compostas pela letra maiúscula “...” e pela palavra “...”, a marca registanda é uma marca mista formada pela letra maiúscula ESTILIZADA “...” e pela palavra “...”.
i. Refuta-se igualmente o entendimento da Recorrente de que se os restantes elementos componentes da marca registanda são meramente genéricos e descritivos.
j. Ora, enquanto o elemento acessório das marcas da Recorrente – “...” – é, por si, um elemento descritivo, fraco, do qual não é concedido uso exclusivo, o elemento “...” da marca da Parte Contrária é, por si, um elemento dotado de capacidade distintiva.
k. Com efeito, ao contrário do alegado pela Recorrente foi concedido o registo da marca “...” à Parte Contrária em várias classes, incluindo na classe 43, não se podendo, portanto, pode aceitar o entendimento do Tribunal a quo de que “...” é um elemento meramente acessório.
l. Todos os elementos da marca registanda são parte integrante desta, pelo que a marca não deverá ser dissecada e analisada elemento a elemento, mas deverá ser tida como um todo.
m. Por outro lado, enquanto a marca da Recorrente poderia não ter sido concedida, a marca registanda da Parte Contrária é, em si, dotada de forte capacidade distintiva como marca, visto que estamos perante um sinal gráfico complexo.
n. A Parte Contrária tem ainda a sua marca registada em várias jurisdições, inclusivamente em locais onde a Recorrente indica ter hotéis, pelo que é evidente que a marca da Parte Contrária não apenas detém capacidade distintiva inerente, como pode co-existir com as marcas da Recorrente sem haver qualquer possibilidade de confusão pelo consumidor.
o. A marca registanda é assim composta por vários elementos individualizadores relevantes que contribuem para que seja um sinal dotado grande individualidade e forte capacidade distintiva, facilmente diferenciável das marcas anteriores da Parte Contrária.
p. Deverá então concluir-se que as marcas em questão são manifestamente diferentes entre si e que as suas diferenças são (mais que) suficientes para que os consumidores distingam facilmente as marcas entre si, os serviços que assinalam e a respectiva origem comercial.
q. A Recorrente menciona ainda o processo CV3-19-0002-CRJ, cujo objecto é a marca “…”, a qual a Recorrente alega ser idêntica à marca registanda, alegando também que os casos deveriam ser decididos de forma idêntica.
r. O que a Recorrente falhou em mencionar é que aquele processo CV3-19-0002-CRJ não formou caso julgado, pois a Parte Contrária interpôs Recurso para o douto Tribunal de Segunda Instância, pelo que a decisão tomada pelo Tribunal Judicial de Base não deverá nunca ser tomada em consideração para o presente caso.
s. Por outro lado, como os sinais são inerentemente distintos e distinguíveis, não existe qualquer possibilidade de haver risco de concorrência desleal, não havendo também, contrariamente ao alegado pela Recorrente, possibilidade de desvio de clientela, visto que o consumidor não vai associar a marca registanda às marcas da Recorrente.
Nestes termos e contando com o douto suprimento de Vossas Excelências, Venerandos Juízes, requer-se, muito respeitosamente, seja considerado improcedente o presente Recurso e, em consequência a sentença recorrida ser mantida, dessa forma se concedendo a marca registanda à Parte Contrária, como é de JUSTIÇA!”
Enquanto a entidade administrativa ofereceu o merecimento dos autos.
*
Corridos os vistos, cumpre decidir.
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
2016年12月2日,對立當事人向經濟局遞交商標編號N/...的商標註冊申請書,指定類別為43,其具體產品/服務為:“Serviços de restaurantes; serviços de acolhimento/hospitalidade (comida e bebida); preparação de comida e bebida; provisão de comida e bebida; serviços de bar; serviços de fornecimento de comida e bebida. ”,商標式樣為:(見行政卷宗第1頁,有關內容在此視為完全轉錄)
…
2017年4月18日,就編號N/...商標註冊申請,上訴人向經濟局提交異議及有關文件。(見行政卷宗第5至25頁,有關內容在此視為完全轉錄)
2017年5月18日,上訴人向經濟局提交補充陳述及有關文件。(見行政卷宗第26至47頁,有關內容在此視為完全轉錄)
2017年6月22日,對立當事人就上述異議提交答辯書及有關文件。(見行政卷宗第49至66頁,有關內容在此視為完全轉錄)
2017年7月24日,對立當事人向經濟局提交補充陳述及有關文件。(見行政卷宗第67至70頁,有關內容在此視為完全轉錄)
2018年11月27日,經濟局知識產權廳廳長同意編號690/DPI報告書的內容,並在報告書上作出批准編號N/...商標註冊申請的批示。(見行政卷宗第76至85頁,有關內容在此視為完全轉錄)
上述批准註冊的批示公佈於2018年12月19日第51期《澳門特別行政區公報》第二組內。
2019年1月21日,上訴人向本院提起本上訴。
上訴人是編號商標N/…、N/…及N/...註冊權利人,有關商標的式樣、指定類別及其具體產品/服務見下表:
編號
商標式樣
指定類別
具體產品/服務
N/15978
…
42
Hotel, motel, serviços de resort, serviços de reserva em hotéis, serviços de bar e restaurante, serviços de catering, serviços de preparação de comidas e bebidas, serviços de café e cafetaria, providenciar informação de eventos especiais relacionados com férias, providenciar instalações para conferências e reuniões, serviços de spa, nomeadamente providenciar acomodações e refeições temporárias para os clientes do spa de beleza ou de saúde, serviços de resort de saúde, nomeadamente o fornecimento de comida e acomodação especializados em promover os padrões gerais de saúde e bem-estar.
N/…
…
43
Alojamento temporário; serviços de hotéis, serviços de motéis, serviços de pensões, serviços de pousadas; condução de eventos e fornecimento de instalações para reuniões e eventos; serviços de restaurante, bar, sala de estar, café e cocktail; serviços para fornecimento de comidas e bebidas; serviços de porteiro; fornecimento de instalações para reuniões e banquetes. Nota:* (Não foi concedido o direito no uso exclusivo da (s) palavra (s) "…").
N/...
…
43
Alojamento temporário; serviços de hotéis, serviços de motéis, serviços de pensões, serviços de pousadas; condução de eventos e fornecimento de instalações para reuniões e eventos; serviços de restaurante, bar, sala de estar, café e cocktail; serviços para fornecimento de comidas e bebidas; serviços de porteiro; fornecimento de instalações para reuniões e banquetes. Nota:* (Não foi concedido o direito no uso exclusivo da (s) palavra (s) "…").
*
Da alegada reprodução ou imitação da marca
Coloca-se a questão de saber se a marca registanda constitui reprodução ou imitação das marcas de que a recorrente é titular.
Preceitua a alínea b) do n.º 2 do artigo 214.º o Regime Jurídico da Propriedade Industrial que o pedido de registo é recusado sempre que a marca ou algum dos seus elementos contenha reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem, para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou que compreenda o risco de associação com a marca registada.
Por sua vez, dispõe-se ainda no artigo 215.º do mesmo diploma legal que “A marca registada considera-se reproduzida ou imitada, no todo ou em parte, por outra, quando, cumulativamente, a marca registada tiver prioridade, sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins, e tenham tal semelhança gráfica, nominativa, figurativa ou fonética com outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão ou que compreenda um risco de associação com a marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto”.
Conforme decidido na sentença recorrida, não se levantam dúvidas quanto à verificação dos primeiros dois pressupostos, resta saber se entre as duas marcas, registanda e registada, existe semelhança que seja susceptível de induzir facilmente o consumidor em erro ou confusão ou que compreenda um risco de associação entre aquelas duas marcas.
Segundo Carlos Olavo, “a imitação deve, pois ser apreciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem as marcas em cotejo, e não pelas diferenças que poderiam oferecer os diversos pormenores considerados isolados ou separadamente. Por isso, é por intuição sintética e não por dissecação analítica que deve proceder-se à comparação das marcas”1.
Isto é, para averiguar se há reprodução ou imitação, em princípio devem ser analisadas as marcas no seu todo, no conjunto dos elementos que as compõem, e não dissecada ou isoladamente.
No nosso caso, as marcas postas em confronto são as seguintes:
…
Marca registanda
… … …
Marcas registadas pertencentes à recorrente
A nosso ver, não se verifica uma cópia fiel de marca anteriormente registada.
Mas haverá imitação de marca anteriormente registada? Vejamos.
Diz Pupo Correia2 que “Imitação é a adopção de uma marca confundível com outra. Por conseguinte, a imitação não é identidade, antes supõe a existência de elementos comuns e outros diferentes.”
Ainda segundo o mesmo autor3: “Deste modo, se a semelhança de conjunto, entre a marca anterior protegida e a mais recente, sem consideração dos pormenores diferenciadores, gerar a possibilidade de confusão, pela fácil indução em erro do consumidor, haverá imitação da primeira pela segunda.”
É de notar que o único elemento comum nas duas marcas é a letra “...”.
Salvo o devido respeito por opinião diversa, somos a entender que o sinal “...”, pela sua apresentação visual, constitui o elemento predominante em ambas as marcas.
Ou seja, aquilo que mais se perdura na memória do público é a própria letra gráfica “...”, enquanto os demais elementos que compõem a marca registanda não deixam de ter natureza acessória, daí que, perante os olhos dos consumidores médios, aquilo que vai ficar retido na memória do público é o sinal “...” de que a recorrente já é titular, enquanto as restantes letras que compõem a marca registanda são meros elementos acessórios.
Ademais, considerando que as marcas em disputa se destinam a assinalar produtos e serviços de hospedagem, é capaz que a confusão será maior se o seu titular indicar na própria marca o local ou cidade onde fornece os serviços de hospedagem, daí que, estando escrita a palavra “...” na parte inferior da letra “...”, vai levar a que os seus consumidores pensem se tratar do mesmo grupo hoteleiro, fazendo com que os consumidores médios caiam em confusão com as marcas pertencentes à recorrente.
E, na verdade, este TSI já teve a oportunidade de julgar um caso semelhante ao presente, no âmbito do Processo n.º 157/2020, nos termos do qual foi determinado o indeferimento do registo da marca requerido pela ora recorrida.
Face às considerações acima tecidas, este TSI julga procedente o presente recurso jurisdicional e, em consequência, revogando o despacho que concedeu o registo da marca N/... a favor da recorrida B Pty Ltd., bem assim, determinando o indeferimento do registo daquela marca.
No demais, prejudicado fica o remanescente fundamento do recurso.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em conceder provimento ao recurso interposto pela recorrente A, LLC. e, em consequência, revogar o despacho que concedeu o registo da marca N/... a favor da recorrida B Pty Ltd., bem assim, determinar o indeferimento do registo daquela marca .
Custas pela recorrida em ambas as instâncias, fixando o valor da causa em 500 U.C.
Registe e notifique.
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RAEM, 28 de Maio de 2020
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Fong Man Chong
1 Carlos Olavo, in Propriedade Industrial, Volume I, 2ª edição, pág. 102
2 Miguel Pupo Correia, in Direito Comercial, 7.ª edição, pág. 341
3 Obra citada, pág. 343
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Recurso cível 1261/2019 Página 16