Processo nº 1052/2018
Data do Acórdão: 28MAIO2020
Assuntos:
Fundo para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética
Apoio financeiro para a redução energética
Aplicação do apoio a fins diferentes
Cancelamento e restituição do apoio financeiro concedido
SUMÁRIO
1. O bem jurídico que o artº 17º/-2) do Regulamento Administrativo nº 22/2011 visa tutelar é a boa e efectiva afectação dos recursos financeiros do erário público aos fins da protecção do ambiente.
2. Quem beneficia do apoio financeiro proveniente do erário público tem a obrigação de aplicar o apoio financeiro à aquisição dos produtos e à instalação dos equipamentos e manter em uso os produtos e em funcionamento os equipamentos nas instalações do seu estabelecimento, por forma a que a finalidade da redução energética possa ser alcançada.
3. Assim, se mediante a fiscalização in loco do seu pessoal tiver detectado a não presença dos produtos e a não montagem dos equipamentos, adquiridos com o apoio financeiro, nas instalações nos termos definidos no acto de concessão do apoio financeiro, a entidade administrativa, a quem a lei compete fiscalizar a boa aplicação por parte dos beneficiários do montante do apoio financeiro concedido, tem toda a legitimidade de tirar do facto objectivo da ausência dos produtos e equipamentos a ilação de que o apoio financeiro obtido pelo beneficiário não é aplicado aos fins a que se destina a concessão do apoio financeiro.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 1052/2018
Acordam em conferência na Secção Cível e Administrativa no Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I
Companhia de Lembranças X, Limitada (doravante simplesmente designada por X), devidamente id. nos autos, tendo sido notificada da deliberação do Conselho Administrativo do Fundo para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética (doravante simplesmente designada por FPACE) que lhe cancelou parcialmente o apoio financeiro anteriormente concedido na quantia de MOP$231.488,00, e ordenou a restituição dessa quantia, interpôs o recurso contencioso de anulação para o Tribunal Administrativo.
Devidamente tramitado no Tribunal Administrativo, veio a ser proferida a seguinte sentença julgando procedente o recurso:
I. Relatório
Recorrente COMPANHIA DE LEMBRANÇAS X LIMITADA (X手信有限公司), melhor id. nos autos,
interpôs o presente recurso contencioso administrativo contra
Entidade recorrida CONSELHO ADMINISTRATIVO DO FUNDO PARA A PROTECÇÃO AMBIENTAL E A CONSERVAÇÃO ENERGÉTICA (doravante denominada por FPACE), que cancelou parcialmente o apoio financeiro que lhe tenha sido concedido na quantia de MOP231,488.00 e ordenou a sua restituição.
Alegou a Recorrente, com os fundamentos de fls. 28 a 53 dos autos, em síntese
- o vício por violação dos princípios de boa-fé, legalidade e da colaboração entre a Administração e os particulares, e subsidiariamente,
- o vício de violação de lei e erro nos pressupostos de facto,
Concluiu, pedindo a anulação do acto recorrido.
A Entidade recorrida apresentou a contestação com os fundamentos de fls. 106 a 114v dos autos, na qual pugnou pela legalidade do acto recorrido por considerar que não enferma nenhum dos vícios que lhe são imputados, concluiu no sentido de ser o presente recurso julgado improcedente.
Nenhuma das partes apresentou alegações facultativas.
O Digno Magistrado do M.º P.º emitiu douto parecer no sentido de improceder o presente recurso por não se ter verificado os vícios imputados pela recorrente, com os fundamentos a fls. 145 a 150 dos autos.
*
Este Tribunal é o competente em razão da matéria e da hierarquia.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária e de legitimidade “ad causam”.
O processo é o próprio.
Inexistem nulidades, ou questões prévias que obstem a apreciação “de meritis”.
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II. Fundamentação
1. Matéria de facto
Dos autos e do P.A. anexo resulta provada a seguinte factualidade pertinente:
➢ 2012年5月28日,司法上訴人向環保與節能基金提交《環保、節能產品和設備資助計劃》申請表及相關資料,報稱預計購買或更換產品和設備的總額為澳門幣418,600.00元及申請資助金額為澳門幣334,880.00元 (見行政卷宗一第1頁至第60頁)。
➢ 2012年11月27日,環保與節能基金行政管理委員會在編號577/CA/FPACE/2012建議書上作出“核准本建議/意見書”的批示,決定批准司法上訴人之部分申請,獲批給資助的金額為澳門幣298,880.00元,環保與節能基金隨後於同年12月4日透過編號805/732/ADM/FPACE/2012公函通知司法上訴人有關結果 (見行政卷宗一第97頁至第102頁及背頁,有關內容在此視為完全轉錄)。
➢ 2012年12月11日,司法上訴人購買獲資助的產品(見行政卷宗一第108頁至第109頁的單據及“已購買或更換有關產品和設備的聲明書”)。
➢ 2013年1月11日,司法上訴人簽收由環保與節能基金簽發的批給資助款項澳門幣298,880.00元的支票 (見行政卷宗一第107頁及背頁)。
➢ 2015年5月28日,環境保護局人員到批給資助批示內所指的10個司法上訴人之場所進行訪查,以核實獲批的資助款項是否用於批給批示所指的用途,沒有發現部分已獲資助的產品和設備(見行政卷宗一第110頁至第129頁)。
➢ 2015年7月21日,被上訴實體在編號450/FPACE/2015建議書上作出“核准本建議/意見書”的批示,指出因部分獲批給資助款項並非用於批給批示所指的用途,可導致上述資助批給被取消,決定針對司法上訴人開展書面聽證程序。隨後於同年7月28日透過編號0727/660/ADM/FPACE/2015公函通知司法上訴人提交書面解釋及倘有之證明文件 (見行政卷宗一第130頁至第134頁及第147頁至第149頁)。
➢ 2015年8月11日,司法上訴人向環保節能基金提交書面解釋 (見行政卷宗一第152頁至第154頁)。
➢ 2015年12月14日,被上訴實體在編號983/FPACE/2015建議書上作出“核准本建議/意見書”的批示,指出基於司法上訴人所提交的書面解釋內雖有司法上訴人的印鑑,但其法定代表之簽署方式與其商業登記不符,決定對司法上訴人提交的書面解釋不予分析,另決定取消對司法上訴人的部分資助批給,並要求其返還有關款項,金額為澳門幣231,488.00元。隨後於同年12月18日透過編號1575/1467/ADM/FPACE/2015公函將上述決定通知司法上訴人 (見行政卷宗二第200頁至第204頁與第207-1頁至第208頁及背頁,有關內容在此視為完全轉錄)。
➢ 2016年3月10日,被上訴實體於環保與節能基金行政管理委員會第八次會議中作出決議,因沒有對司法上訴人提交的書面聽證作出分析等同於損害司法上訴人進行書面聽證的權利,認為取消已批給資助的決議存有程序上的瑕疵,議決廢止該決定,有關廢止具追溯效力至2015年12月14日 (見行政卷宗二第254頁至第255頁及背頁,有關內容在此視為完全轉錄)。
➢ 2016年3月11日,環保與節能基金透過編號0333/315/ADM/FPACE/2016 公函通知司法上訴人上述決議,並在公函中指出司法上訴人須於期限內重新提交具法定代表簽署且內容相同的書面解釋 (見行政卷宗二第254頁至第255頁及背頁與第257頁及第260頁,有關內容在此視為完全轉錄)。
➢ 2016年3月22日,司法上訴人向環保與節能基金提交書面解釋 (見行政卷宗二第265頁至第267頁)。
➢ 2016年8月22日,被上訴實體在編號1328/FPACE/2016建議書上作出“核准本建議/意見書”的批示,指出基於司法上訴人在批給批示所指的地點沒有安裝或該基金人員沒有發現部分已獲批給的產品和設備,即部分獲批給資助款項並非用於批給批示所指的用途,決定取消對司法上訴人的部分資助批給,並要求其返還有關款項,金額為澳門幣231,488.00元。隨後於同年8月29日透過編號1685/1631/ADM/FPACE/2016公函將上述決定通知司法上訴人 (見行政卷宗二第274頁至第280頁與第285頁至第287頁,有關內容在此視為完全轉錄)。
➢ 2016年9月30日,司法上訴人之訴訟代理人透過圖文傳真方式針對上指決定向本院提起本司法上訴。
2. Matéria de direito
A primeira questão que aqui importa apreciar e decidir é a de saber se a entidade administrativa na sua actuação violou os princípios fundamentais do direito administrativo, nomeadamente, os princípios de boa-fé e da colaboração entre a Administração e os particulares.
No que respeita à assacada violação do princípio de legalidade, o invocado vício como incide sobre os pressupostos do acto recorrido, será naturalmente apreciado em diante, em sede própria, na parte referente à violação da lei e ao erro nos pressupostos de facto.
Ora, nos termos alegados pela p.i., o vício de violação do princípio de boa-fé, tal como enquadrado pela recorrente prende-se com o exercício do direito de audiência prévia, na renovação do acto administrativo revogado pela deliberação do Conselho Administrativo do FPACE, datada de 10 de Março de 2016.
Da matéria de facto dada como provada sucede que, a entidade recorrida, ao notificá-la para uma nova audiência escrita, exigiu que a recorrente se conformasse com a forma de obrigar e com nova data, sem nada alterar os termos da defesa escrita face à sua defesa anterior.
Considera a recorrente que a entidade recorrida condicionou os termos da sua nova defesa e depois tornou a praticar o acto com conteúdo igual, induzindo-a em erro, violando assim o princípio de boa-fé.
Com o devido respeito, crê-se que tal vício não se verifica no caso em apreço, já que a entidade recorrida, na sequência da anulação do acto anterior, obriga-se a reinstruir todo o procedimento administrativo, com vista à repetição do acto anulado.
O convite à recorrente para apresentar de novo a sua defesa escrita, enquanto formalidade necessária para a conclusão do procedimento, é insusceptível de fazer suscitar nela confiança quanto ao sentido da decisão final que venha a ser tomada.
Dito de outra forma, a entidade recorrida embora decidindo no mesmo sentido da sua decisão anterior já revogada, não prejudicou nenhuma expectativa da recorrente digna da protecção jurídica.
Improcede a questão suscitada.
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Outra questão diferente é saber se o seu direito de audiência prévia chegou a ser prejudicado ou não em virtude da actuação administrativa acima referida, de modo a produzir ou não os efeitos invalidantes do acto recorrido.
Compulsados os autos, certo que não foi ignorado de todo o direito da recorrente na renovação do procedimento administrativo, em consequência da revogação anulatória do acto, pois a recorrente foi convidada por via do ofício n.º 0333/315/ADM/FPACE/2016, a apresentar de novo, a sua defesa escrita pela entidade recorrida, livre da deficiência formal da sua defesa anterior.
Além disso, a sua defesa foi analisada e tomada em consideração no acto recorrido.
Porém, é bem verdade que a audiência do interessado, no caso de ser obrigatória, não devia ser constrangida quanto aos termos do seu exercício.
E não há dúvida que a exigência feita à recorrente para esta apresentar sua defesa escrita nos mesmos termos que a defesa anterior, prejudicou o seu direito de audiência prévia que justamente consiste em fazer participar o administrado na decisão administrativa que lhe diz respeito, permitindo-lhes apresentar a sua posição sobre a questão tratada no respectivo procedimento.
A entidade recorrida determinou-se por proceder à revogação anulatória do acto anterior pelo vício que tenha inquinado o acto de audiência, se quiser depois renovar o acto revogado, estará necessariamente adstrito à reinstruir todo o procedimento e praticar de novo o acto sem aquele vício.
Não se vê como é possível, e afigura-se contraditório que a entidade recorrida, tendo embora revogado o seu acto por causa daquele vício, na renovação deste acto revogado, em vez de mandar repetir todo o acto de audiência, cingiu-se a sanação somente na parte afectada pela tal irregularidade formal, mantendo, por conseguinte, o resto inalterado.
Ainda mais, a dita irregularidade formal – a falta da assinatura na defesa escrita por quem tem poder de obrigar a sociedade, se se chegar a verificar, afectaria necessariamente o direito de quem com legitimidade na participação da decisão administrativa.
Pois, é evidente que aquele com legitimidade para intervir no procedimento e não interveio, deveria também ter oportunidade de pronunciar sobre a questão que lhe interessa.
Ao decidir permitir à recorrente suprir esta deficiência, terá inelutavelmente a entidade recorrida de repetir o acto de audiência na sua íntegra, não sendo jamais possível a sua conservação.
Pelo que, há aqui manifestamente a violação do direito de audiência da recorrente, consagrado nos termos dos artigos 93.º e 94.º do CPA.
Porém, sem se esquece que se situamos no âmbito da actividade vinculada da entidade administrativa, quer quanto à integração dos pressupostos do acto, quer quanto à aplicação da respectiva sanção, conforme estatui no art.º 17.º, n.º 2, alínea 2) do Regulamento Administrativo n.º 22/2011.
Refere-se o acórdão do TUI, recurso n.º 48/2012, “sempre que, no exercício de poderes vinculados por parte da Administração, o tribunal conclua, através de um juízo de prognose póstuma, que a decisão administrativa tomada era a única concretamente possível, a falta de audiência do interessado, prevista no artigo 93.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, degrada-se em formalidade não essencial do procedimento administrativo.”
No nosso caso, através de um juízo de prognose póstuma, conclui-se que a entidade recorrida não poderia decidir de outra maneira – a decisão que veio a ser tomada era a única concretamente possível.
Assim sendo, com a degradação em formalidade não essencial do procedimento administrativo, o vício de violação da audiência invocado pela recorrente não produz efeito invalidante do acto recorrido.
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De seguida, ocupamo-nos do vício de erro nos pressupostos do acto recorrido.
Estatui-se na norma do art.º 17.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011 o seguinte:
“ 1. O Conselho Administrativo do FPACE pode cancelar a concessão do apoio financeiro, quando se verifique uma das seguintes situações:
1) Prestação de falsas declarações e informações ou uso de outros meios ilícitos para obtenção do apoio financeiro;
2) Uso do montante do apoio financeiro concedido para fins diferentes dos fixados no despacho de concessão;
3) Uso do montante do apoio financeiro concedido por pessoa ou entidade diferente da beneficiária;
4) Não entrega da declaração e da factura relativa aos produtos e equipamentos adquiridos ou substituídos, nem do documento descritivo ou informações sobre os produtos e equipamentos e de outros documentos considerados necessários, referidos no artigo 13.º, no prazo de 30 dias após o deferimento do pedido, salvo motivos devidamente justificados e aceites pelo Conselho Administrativo do FPACE;
5) Não prestação, por parte da beneficiária, da colaboração referida no n.º 2 do artigo anterior.
2. O cancelamento da concessão do apoio financeiro implica, para a beneficiária, a restituição do montante do apoio financeiro concedido, no prazo de 30 dias a contar da data de notificação.
3. O incumprimento da restituição do montante do apoio financeiro concedido por força do disposto no número anterior implica a impossibilidade da beneficiária se candidatar à concessão de novo apoio financeiro previsto no presente regulamento administrativo, sem prejuízo do disposto no artigo 20. º ”
Ora foi servida à base do acto recorrido a referida norma n.º 1, alínea 2), ou seja, “Uso do montante do apoio financeiro concedido para fins diferentes dos fixados no despacho de concessão.”
Estando em causa um acto administrativo ablativo que retira ao particular o apoio financeiro que lhe tenha sido concedido, que sendo por isso, o acto administrativo de conteúdo positivo, compete então à entidade administrativa fazer prova dos factos que integram os pressupostos do seu acto.
Por outras palavras, não obstante o respeito por posição contrária, consideramos que o ónus de prova está com a entidade administrativa, cabendo a esta provar, neste caso concreto, o uso desviado do montante de apoio financeiro para os fins diferentes dos fixados no despacho de concessão.
A entidade recorrida logrou fazer tal prova?
Desde logo, o despacho de concessão exarado a fls. 101 do processo administrativo foi com o sentido ambíguo quanto aos fins de concessão do apoio financeiro, limitando-se a referir no ponto 3 da proposta que os produtos e equipamentos venham a ser utilizados nos diversos estabelecimentos pertencentes à recorrente.
Certo que não se deixa de perceber nas entrelinhas do texto da referida proposta, que o fim da concessão do apoio financeiro era adquirir os produtos para instalar nos locais indicados.
Mas em bom rigor, o despacho de concessão não fixou de forma mais expressa possível os fins a que se destinavam o montante deste apoio financeiro. Afigura-se ser a condição imprescindível para a avaliação do preenchimento do pressuposto estabelecido na previsão da norma do art.º 17.º, n.º1, alínea 2) da mesma Lei e para fazer funcionar a sanção aí prevista.
A dificuldade surge então justamente quando precisamos de apurar se ocorreu ou não o desvio do montante do apoio financeiro para os fins distintos dos que foram anteriormente fixados.
E outra dificuldade conexa consiste em saber até que medida se pode considerar cumprido o fim da concessão do apoio financeiro sem correr o risco de voltar a perdê-lo.
Basta que a recorrente adquira os produtos? Ou ela precisa de os instalar também nos locais indicados? Ou não basta com a instalação, é ainda necessário manter instalados os produtos para um período cuja duração seria incerta?
Como se vê, a lei não o especificou, relegou esta tarefa para a entidade administrativa no sentido de melhor densificar através dos fins a fixar no seu despacho de concessão.
Porém, não nos parece que a tarefa fosse bem cumprida.
Não obstante, parece certo que a entidade recorrida pretendia ir mais longe no desempenho das suas funções da inspecção do cumprimento do despacho e na aplicação da respectiva sanção.
Mas, ela não chegou a provar os pressupostos da sua actuação, uma vez que a inspecção foi efectuada mais que dois anos após a concessão do apoio financeiro, ainda que o seu resultado revelou que alguns produtos adquiridos não se encontravam instalados nos locais indicados, não é suficiente de nos demonstrar que os fins de concessão de apoio financeiro não foram cumpridos.
Aliás, como atrás referido, o despacho de concessão nunca estabeleceu nenhum limite temporal para a recorrente manter os produtos instalados, parece-nos suficientes a aquisição e a instalação destes produtos para dizer que os fins do despacho de concessão de apoio financeiro foram cumpridos.
Na ausência da prova quanto aos pressupostos do acto, deve a entidade administrativa suportar as consequências nefastas aí decorridas.
Por fim, é boa verdade que ao apresentar o seu requerimento, tendo assinado o plano de apoio financeiro à entidade recorrida, a recorrente já assumiu perante a entidade recorrida os deveres de comunicação, cujo conteúdo se transcreve nos seguintes termos:
“Na sequência da candidatura da empresa COMPANHIA DE LEMBRANCAS X LIMITADA (nome da empresa) à concessão do apoio financeiro no âmbito do Plano de Apoio Financeiro à Aquisição de Produtos e Equipamentos para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética, nos termos do disposto de Regulamento Administrativo n.° 21/2011 e do Regulamento Administrativo n.° 22/2011, apresentada ao Presidente do Conselho Administrativo do Fundo para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética (FPACE), esta declara que:
1. Todas as informações fornecidas estão correctas e completas;
2. No decurso do exame do processo de pedido de concessão de apoio financeiro, bem como após a concessão de apoio, a empresa compromete-se a autorizar a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental, o FPACE ou outras entidades encarregadas a fiscalizar, a quaisquer horas, a aplicação por parte da beneficiária, do montante do apoio financiado concedido para os fins constantes do despacho de concessão e a prestar a colaboração necessária;
3. Sem autorização prévia do FPACE, a empresa não pode ceder, hipotecar, empenhar ou dispor por qualquer outra forma, em nome próprio ou de terceiro, produtos ou equipamentos adquiridos ou substituídos pelo montante exclusivamente concedido no âmbito do Plano;
4. Se surgir qualquer eventualidade que possa originar alterações significativas sobre os produtos ou equipamentos adquiridos ou substituídos pelo montante exclusivamente concedido no âmbito do Plano, a empresa notificará, atempadamente e por escrito, o FPACE;
5. A concessão do apoio financeiro poderá ser cancelada se surgir qualquer uma das situações definidas pelo artigo 17.° do Regulamento Administrativo n.° 22/2011 e a empresa deverá restituir o montante do apoio financeiro concedido, no prazo de 30 dias a contar da data da notificação; e
6. A empresa está ciente e aceita os deveres definidos pelo Regulamento Administrativo n.° 22/2011, sabendo que por quaisquer informações falsas pode incorrer em eventual responsabilidade civil e criminal, nos termos da lei para além do cancelamento da concessão de apoio financeiro. ” (conforme consta do Boletim de candidatura assinado pelos administradores da recorrente, a fls. 4 do P.A).
Porém, não é menos verdade que as cláusulas inseridas no referido boletim não integram o pressuposto legal da decisão, cuja violação por si só é insusceptível de acarretar as consequência da restituição do apoio financeiro concedido, legalmente previstas.
Nestes termos, não nos resta dúvida que o acto recorrido com o seu fundamento deve ser anulado pela violação do art.º 17.º, n.º1, alínea 2) do Regulamento Administrativo n.º 22/2011.
***
III. Decisão
Assim, pelo exposto, decide-se:
Julga procedente o presente recurso contencioso e em consequência, anula-se o acto recorrido.
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Sem custas por ser subjectivamente isenta.
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Registe e notifique.
Notificada e inconformada com a sentença, a entidade administrativa FPACE interpôs recurso jurisdicional para este Tribunal de Segunda Instância, formulando as conclusões e o pedido nos termos seguintes:
1. Constitui o objecto do presente recurso a douta decisão do Tribunal Administrativo, de 16 de Junho de 2018, a fls. 151 e seguintes dos autos, que determinou a anulação do acto recorrido do Conselho Administrativo do Funda para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética (deliberação de 22 de Agosto de 2016, exarada na Proposta n.º 1328/FPACE/2016, de 11/07/2016, do FPACE).
2. A então Recorrente, Companhia de Lembranças X Limitada (X手信有限公司), requereu a concessão de apoio financeiro para a aquisição de produtos e equipamentos no âmbito do Plano de Apoio Financeiro à Aquisição de Produtos e Equipamentos para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética, aprovado pelo Regulamento Administrativo n.º 22/2011.
3. Mediante a entrega do Boletim de Candidatura instruído com diversos documentos, conforme preceituado no artigo 10.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011.
4. Os produtos e equipamentos destinavam-se a substituir outros, conforme as finalidades da aquisição assumidas no Boletim de Candidatura, de modo a “atingir os objectivos de poupança energética e de redução de resíduosˮ (“擬更換新的LED照明系統可以達到節能減排目的ˮ), e a serem instalados e utilizados nos locais indicados nos documentos que instruíam o Boletim.
5. Em concreto:
“更換...LED 590mmTUBE比現存系統省電50%
更換...LED 1200mmTUBE比現存系統省電51%
更換...LED SUPERSTAR射燈比現存系統省電91%
更換...15W比現存系統省電46%
更換... 80W 比現存系統省電46%
從使用時間計算現存照明系統壽命短,更換LED照明后可使用最少約35000小時,減少每次更換所產生的人工成本以及廢棄垃圾。ˮ
“A substituição por LED 590mm TUBE da marca “...ˮ iria poupar 50% de energia em comparação com o sistema actual.
A substituição por LED 1200mm TUBE da marca “...ˮ iria poupar 51% de energia em comparação com o sistema actual.
A substituição por holofotes LED SUPERSTAR da marca “...ˮ iria poupar 91% de energia em comparação com o sistema actual.
A substituição por ... 15W iria poupar 46% de energia em comparação com o sistema actual.
A substituição por ... 80W iria poupar 46% de energia em comparação com o sistema actual.
Calculando o tempo de vida útil do sistema de iluminação actual é curto, a substituição pela iluminação LED pode utilizar pelo menos 35000 horas, reduzindo assim o custo da mão-de-obra resultante da sua substituição e os resíduos que daí resultam.ˮ
(Em tradução livre para a língua portuguesa)
6. Deste modo, a então requerente fixou, de forma bem expressa, os fins a que se destinava o apoio financeiro, quais eram os de adquirir produtos e equipamentos que contribuíam para a melhoria da qualidade do ambiente e o reforço da eficiência energética.
7. Assim foi também quando, no Boletim de Candidatura, indicou que “Está planeada a substituição por novo sistema de iluminação LED para atingir os objectivos de poupança energética e de redução de emissão de resíduosˮ
(“擬更換新的LED照明系統可以達到節能減排目的ˮ).
8. O despacho de concessão, exarado no Proposta n.º 577 /CA/FPACE/2012, também refere que “O Fundo para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética recebeu um pedido de financiamento no âmbito do Pano de Apoio Financeiro à Aquisição de Produtos e Equipamentos para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética (Boletim de Candidatura FP1000585) em 28 de Maio de 2012, tendo os documentos sido apresentados com o Boletim de Candidatura (ver Anexo 1, para mais detalhes)ˮ, e ainda que “Os referidos produtos e equipamentos serão utilizados em... O preço dos produtos e equipamentos foi considerado e a sua utilização está de acordo com o objectivo do Fundo para o Protecção Ambiental e a Conservação Energéticaˮ.
9. O âmbito do Regulamento Administrativo n.º 22/2011 diz-nos que “O Plano de Apoio Financeiro visa conceder um apoio financeiro a empresas comerciais e a associações para suportarem as despesas decorrentes da aquisição ou substituição de produtos e equipamentos que possam contribuir para a melhoria da qualidade do ambiente, o reforço da eficiência energética ou a poupança de águaˮ (n.º 1 do artigo 2.º).
10. Assim, quando o douto Tribunal “a quoˮ vem dizer
“... o despacho de concessão foi com sentido ambíguo quanto aos fins de concessão do apoio financeiro a(o) referir no ponto 3 da proposta que os produtos e equipamentos venham a ser utilizados nos diversos estabelecimentos pertencentes à recorrenteˮ, e
“... o despacho de concessão não fixou de forma mais expressa os fins a que se destinavam o montante deste apoio financeiro...ˮ ̶ fls. 156, dos autos de recurso contencioso.
Para concluir pela anulação do acto recorrido,
Errou no julgamento da matéria de facto em função dos elementos escritos existentes no processo administrativo, não contrariados pela Recorrente, ao não ter tido em conta a factualidade atrás referida.
11. Igualmente, a ora Recorrente, entidade recorrida, não pode conformar-se com a douta sentença do Tribunal “a quoˮ quando considera haver dificuldade em apurar “se ocorreu ou não desvio do montante do apoio financeiro para os fins distintos dos que foram anteriormente fixadosˮ (fls. 156), pois,
12. O douto Tribunal descurou matéria factual inserida no processo administrativo, incorrendo em erro na interpretação e aplicação da alínea 2) do n.º 1 do artigo 17.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011.
13. O âmbito do Plano de Apoio Financeiro é o de conceder um apoio financeiro para suportar as despesas decorrentes da aquisição ou substituição de produtos ou equipamentos que possam contribuir para a melhoria da qualidade do ambiente, o reforço da eficiência energética ou a poupança de água (n.º 1 do artigo 2.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011).
14. O que só se alcança com a 1) aquisição, 2) instalação (de novo ou em substituição de outros) e 3) utilização dos produtos ou equipamentos, nos locais pretendidos e identificados no Boletim de Candidatura ou nos documentos complementares que instruem o procedimento.
Se os produtos ou equipamentos financeiramente apoiados pelo FPACE forem adquiridos mas não forem instalados ou se forem instalados mas não nos locais ou áreas identificados no pedido, então não se alcançam os fins para os quais o apoio foi concedido devendo entender-se que o apoio não é/foi usado para os fins fixados no despacho de concessão que o concede.
Se os produtos ou equipamentos nem sequer são encontrados quando da fiscalização pela entidade competente, também o apoio financeiro não foi utilizado para os fins constantes do despacho do FPACE que o concedeu.
15. Atente-se que, de acordo o artigo 15.º do Regulamento Administrativo n.º 21/2011, junto do FPACE funciona uma Comissão de Apreciação cuja missão é a de “proceder à análise dos pedidos de apoio financeiro e emitir parecer fundamentado, sobre a concessão ou não do apoioˮ.
Esta Comissão analisa os produtos quanto à capacidade ambiental e eficiência energética, considerando inclusivamente os locais e respectivas áreas onde são instalados, para que o apoio financeiro seja utilizado nos fins para os quais é concedido e, por isso mesmo, para que os produtos e equipamentos adquiridos possam contribuir para a melhoria da qualidade do ambiente, o reforço da eficiência energética ou a poupança de água (n.º 1 do artigo 2.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011).
16. O n.º 1 do artigo 16.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011 atribui à Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental a competência para fiscalizar o cumprimento do presente regulamento administrativo, nomeadamente a aplicação por parte das beneficiárias, do montante do apoio financeiro concedido para os fins constantes do despacho de concessão.
Previsão legal também transcrita no modelo do Boletim de Candidatura (Modelo 1) ao Plano de Apoio Financeiro à Aquisição de Produtos e Equipamentos para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética, com o objectivo de alertar os requerentes para a realização de acções de fiscalização sobre a utilização do apoio financeiro.
17. Em 28 de Maio de 2015, os fiscais da Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental procederam a uma acção de fiscalização, nos estabelecimentos da Recorrente, para verificar se os equipamentos para os quais foi concedido o apoio financeiro estavam a ser utilizados conforme a finalidade indicada no despacho que aprovou a concessão de apoio - factualidade provada, conforme fls. 110 a 129 do processo administrativo instrutor.
18. Porém, parte dos produtos e equipamentos para os quais tinha sido concedido o apoio financeiro à sua aquisição não foi encontrado, ou seja produtos cuja aquisição foi financeiramente apoiada em 80% do seu custo, não estavam instalados (e por isso a não ser utilizados em qualquer das instalações da Recorrente), e nem sequer foram encontrados.
19. A acção de fiscalização foi realizada em 28/05/2015, cerca de menos de 2 anos e meio após a concessão do apoio financeiro.
Não tinha ainda sequer decorrido o prazo de cinco anos sobre a recepção do cheque com o montante do apoio financeiro concedido (11/01/2013) - fls. 107 e 110 a 129 do processo administrativo n.º FP1000585-,
E ocorreu dentro do prazo referido no artigo 37.º do Regulamento Administrativo n.º 6/2006 (Regime financeiro dos serviços e organismos da Administração pública), com as alterações introduzidas pelo Regulamento Administrativo n.º 28/2009.
20. Pelo que a ora Recorrente não se conforma com a douta conclusão do Tribunal “a quoˮ, em recurso, quando diz “uma vez que a inspecção foi efectuada mais que dois anos após a concessão do apoio financeiro, ainda que o seu resultado revelou que alguns produtos adquiridos não se encontravam instalados nos locais indicados, não é suficiente de nos demonstrar que os fins de concessão de apoio financeiro não foram cumpridosˮ e ainda quando conclui dizendo “...o despacho de concessão nunca estabeleceu nenhum limite temporal para a recorrente manter os produtos instalados, parece-nos suficientes a aquisição e a instalação destes produtos para dizer que os fins do despacho de concessão d ápio financeiro foram cumpridosˮ (fls. 156 verso).
21. Salvo o devido respeito por melhor opinião, o despacho de concessão não precisava de estabelecer um limite temporal para a Recorrente manter os produtos instalados.
Nos documentos juntos pela Recorrente ao seu Boletim de Candidatura ao Plano de Apoio Financeiro, vulgo catálogos, está indicado o tempo de vida útil dos produtos e equipamentos a adquirir e instalar para além de que é a própria Recorrente quem refere uma vida útil de pelo menos 35.000 horas (“從使用時間計算現存照明系統壽命短,更換LED照明后可使用最少約35000小時,減少每次更換所產生的人工成本以及廢棄垃圾ˮ), ou seja, uma vida útil de pelo menos 4 anos, se permanentemente em uso ‒ página 2 do Boletim.
Para além de que a então Requerente, ao submeter o seu pedido de apoio no âmbito do Plano já referido, obrigou-se a que “Sem autorização do Fundo, o requerente não pode ceder, hipotecar, penhorar ou dispor dos equipamentos subsidiados por outras formasˮ e a notificar, atempadamente e por escrito, o FPACE, no caso de “surgir qualquer eventualidade que possa originar alterações significativas sobre os produtos ou equipamentos adquiridos ou substituídos pelo montante exclusivamente concedido no âmbito do Planoˮ ‒ vide Boletim de Candidatura.
22. Ora a Recorrente não comunicou ou notificou o FPACE sobre quaisquer alterações ou cedências, cumprindo os deveres assumidos para com o Fundo.
23. A deliberação de cancelamento do apoio financeiro, do Conselho Administrativo do FPACE (exarada na Proposta n.º 1328/FPACE/2016, de 11/07/2016), também teve por fundamento o facto de a Recorrente não ter tomado a iniciativa de notificar o FPACE sobre as alterações significativas sobre os produtos ou equipamentos adquiridos pelo montante exclusivamente concedido no âmbito do Plano.
Na verdade, a decisão de cancelamento está expressamente fundamentada ao dizer “…受益人亦應按申請時之承諾及時就該等重大變動向本基金作出通知,而受益人在本基金對其進行訪查前,並沒有就有關事宜主動通知本基金,…ˮ1.
24. Também aqui o douto Tribunal “a quoˮ não valoriza os elementos existentes no processo administrativo.
Ao contrário de caso semelhante, recentemente decidido pelo mesmo Tribunal “a quoˮ.
Veja-se a propósito a Sentença de 6 de Junho de 2018, proferida nos autos de Recurso Contencioso, Proc.º n.º 1678/16-ADM, que, com fundamento em facto igual inserido no Boletim de Candidatura, concluiu: “Além do mais, sem autorização prévia do FPACE, o beneficiário não pode dispor produtos ou equipamentos adquiridos pelo montante exclusivamente concedido no âmbito do Plano, tudo conforme as cláusulas que constam do Boletim de Candidatura do Plano de Apoio Financeiro à Aquisição de Produtos e Equipamentos para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética, assinada pelo representante da recorrente, não podendo este escusar o seu desconhecimentoˮ e declarou improcedente o recurso a que se referem aqueles autos.
25. Assim, na opinião da entidade recorrida, a decisão do douto Tribunal “a quoˮ padece do vício insanável de invalidade, nomeadamente pela violação e errada aplicação da alínea 2) do n.º 1 do artigo 17.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011, e ainda pela falta e/ou insuficiência de fundamentação, contradição entre a matéria de facto e a fundamentação, erro de julgamento, violando e aplicando erradamente o disposto nas alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 571.º do Código do Processo Civil,
26. O que importam a declaração de nulidade da decisão ou a sua revogação pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância.
Nestes termos, e nos mais de direito, sempre com o mui douto suprimento de V. Exª., requer a V. Ex.ª que seja dado provimento ao recurso, proferindo decisão que revogue a sentença recorrida, com fundamento nos vícios alegados, por violação e errada aplicação da alínea 2) do n.º 1 do artigo 17.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011, ainda pela falta e/ou insuficiência de fundamentação, contradição entre a matéria de facto e a fundamentação, erro de julgamento, violando e aplicando erradamente o disposto nas alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 571.º do Código do Processo Civil, devendo por isso ser declarada nula, mantendo-se desta forma o acto recorrido.
Notificada das alegações, a particular X, ora recorrida, respondeu pugnando pela improcedência do recurso jurisdicional.
Subidos os autos a esta segunda instância e devidamente tramitados, o Ministério Público emitiu oportunamente em sede de vista o seu douto parecer, pugnando pela procedência do recurso.
Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.
II
Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).
Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, ex vi dos artºs 1º e 149º/1 do CPAC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.
In casu, não há questões que nos cumpre conhecer ex oficio.
Em face do teor das conclusões tecidas nas alegações do recurso jurisdicional, as questões tidas por efectivamente colocadas pela recorrente são as questões identificadas no Douto parecer emitido pelo Ministério Público em sede de vista final, que é o seguinte:
A Companhia de Lembranças X, Limitada, interpôs recurso contencioso da deliberação do Conselho Administrativo do Fundo para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética, de 22 de Agosto de 2016, que determinou o cancelamento da concessão de apoio financeiro e determinou a restituição parcial desse apoio no montante de 231.488,00 patacas.
Por douta sentença do Tribunal Administrativo proferida em 16 de Junho de 2018, foi o recurso contencioso julgado procedente com a consequente anulação do acto recorrido.
Inconformado com a dita sentença, o Conselho Administrativo do Fundo para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética interpôs o presente recurso jurisdicional, no qual invoca, em síntese, o seguinte:
• Erro de julgamento sobre a matéria de facto por não ter dado como provada matéria de facto pertinente e que conduziria a diferente decisão.
• Nulidade da sentença recorrida por não ter especificado fundamentos de facto e de direito que justifiquem a decisão; conter fundamentos em oposição com a decisão e por ter omitido pronúncia relativamente a questões que devia apreciar.
• Erro de julgamento sobre a matéria de direito na interpretação e aplicação da norma do artigo 17.º, n.º 1, alínea 2) do Regulamento Administrativo n.º 22/2011.
Nos termos previstos no artigo 157.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), vem o Ministério Público pronunciar-se nos termos que seguem:
1.
A primeira questão que vem suscitada no presente recurso jurisdicional é a do alegado erro de julgamento da douta sentença recorrida sobre a matéria de facto.
É sabido que a insuficiência da matéria de facto constante da sentença, por nesta não se terem considerado factos articulados pelas partes e pertinentes à boa decisão da causa, poderá constituir violação de direito probatório, na medida em seja reflexo de um erro na implícita selecção dos factos levados à sentença.
No entanto, da leitura das doutas alegações do recurso não se percebe bem quais factos é que a Recorrente entende terem sido erradamente considerados impertinentes pelo douto Tribunal a quo. Aliás, se bem que nesta concreta situação se não justificasse a estrita observância do artigo 599.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por força do artigo 1.º do CPAC, a verdade é que a ora Recorrente faz uma impugnação da matéria de facto de forma pouco rigorosa, sem uma concreta indicação dos factos por si alegados que pretendia ver levados à sentença e dos meios de prova de tais factos.
E a verdade é que, na douta sentença recorrida, se considerou o teor do despacho de concessão do apoio aqui em causa e bem assim o teor do próprio formulário da candidatura, justamente aquilo que, ao que parece, a ora Recorrente entende não ter sido ponderado.
Portanto, sem prejuízo, naturalmente, de este Venerando Tribunal de Segunda Instância poder aditar os factos que considere relevantes para a boa decisão da causa ao abrigo dos poderes resultantes da norma do artigo 629.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo l.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, parece-nos que deve improceder o invocado erro no julgamento sobre a matéria de facto.
2.
A segunda questão que vem suscitada pela ora Recorrente é a da nulidade da sentença recorrida por, em seu entender, não ter especificado fundamentos de facto e de direito que justifiquem a decisão, conter fundamentos em oposição com a decisão e ter omitido pronúncia relativamente a questões que devia apreciar.
A invocação desta nulidade, com todo o respeito, é ainda mais deficiente do que a alegação do erro no julgamento sobre a matéria de facto, uma vez que a Recorrente não desenvolveu um esforço mínimo para concretizar as causas de nulidade da sentença que, em seu entender, ocorrem, limitando-se à sua mera enunciação por referência às diversas alíneas do n.º 1 do artigo 571.º do CPC.
Cremos, em todo o caso, que a douta sentença recorrida não enferma de nenhuma das causas de nulidade que a ora Recorrente lhe imputa.
Com efeito, está absolutamente consolidado o entendimento de que a nulidade da sentença derivada da falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão só ocorre quando a falta de fundamentação seja absoluta e não quando a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. O que se considera nulidade da sentença é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. A mera insuficiência ou deficiência da motivação da sentença é susceptível de integrar erro de julgamento, mas não produz a respectiva nulidade.
Por outro lado, a nulidade por oposição dos fundamentos com a decisão a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 571.º do CPC, apenas ocorre quando os fundamentos invocados na decisão deveriam conduzir, logicamente, a uma decisão contrária àquela que foi proferida. O que, manifestamente, no caso não sucede.
Finalmente, o vício da omissão de pronúncia só acontece quando o tribunal violou o dever constante do n.º 2 do artigo 563.º do CPC de se pronunciar sobre todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação. O que, no caso em apreço, evidentemente, não sucede. Aliás, a ora Recorrente também não refere que questão é que o Tribunal a quo estava obrigado a decidir e não decidiu.
Parece-nos, por isso, que deve ser julgada improcedente a invocada
nulidade da douta sentença recorrida.
3.
3.1.
A terceira questão que a ora Recorrente quer ver apreciada no presente recurso é a daquilo que diz ser uma errada interpretação e aplicação da norma do artigo 17.º, n.º 1, alínea 2) do Regulamento Administrativo n.º 22/2011 por parte da douta sentença recorrida.
A este propósito o meritíssimo juiz a quo fundamentou a sua decisão nos seguintes termos:
«Estando em causa um acto administrativo que retira ao particular o apoio financeiro que lhe tenha sido concedido, que sendo por isso, o acto administrativo de conteúdo positivo, compete então à entidade administrativa fazer prova dos factos que integram os pressupostos do seu acto.
Por outras palavras, (...) consideramos que o ónus da prova está com a entidade administrativa, cabendo a esta provar, neste caso concreto, o uso desviado do montante de apoio financeiro para os fins diferentes dos fixados no despacho de concessão.
A entidade recorrida logrou fazer tal prova?
Desde logo, o despacho de concessão (...) foi com sentido ambíguo quanto aos fins de concessão do apoio financeiro, limitando-se a referir no ponto 3 da proposta que os produtos e equipamentos venham a ser utilizados nos diversos estabelecimentos pertencentes à recorrente.
(...)
[E]m bom rigor, o despacho de concessão não fixou de forma mais expressa possível os fins a que se destinavam o montante deste apoio financeiro. Afigura-se ser condição imprescindível para a avaliação do preenchimento do pressuposto estabelecido na previsão da norma do artigo 17.º, n.º 1, alínea 2) da mesma Lei e para fazer funcionar a sanção aí prevista.
A dificuldade surge então justamente quando precisamos de apurar se ocorreu ou não o desvio do montante do apoio financeiro para os fins distintos dos que foram anteriormente fixados.
E outra dificuldade conexa consiste em saber até que medida se pode considerar cumprido o fim da concessão do apoio financeiro sem correr o risco de voltar a perdê-lo.
Basta que a recorrente adquira os produtos? Ou ela precisa de os instalar também nos locais indicados? Ou não basta com a instalação; é ainda necessário manter instalados os produtos para um período cuja duração seria incerta?
Como se vê, a lei não especificou, relegou esta tarefa para a entidade administrativa no sentido de melhor densificar através dos fins a fixar no seu despacho de concessão.
Porém, não nos parece que a tarefa fosse bem cumprida.
(...)
[E]la não chegou a provar os pressupostos da sua actuação, uma vez que a inspecção foi efectuada mais de dois anos após a concessão do apoio financeiro, ainda que o seu resultado revelou que alguns produtos adquiridas não se encontravam instalados nos locais indicados, não é suficiente de nos demonstrar que os fins de apoio financeiro não foram cumpridos.
Aliás, (...) o despacho de concessão nunca estabeleceu nenhum limite temporal para a recorrente manter os produtos instalados, parece-nos suficientes a aquisição e a instalação destes produtos para dizer que os fins do despacho de concessão de apoio financeiro foram cumpridos.
Na ausência da prova quanto aos pressupostos do acto, deve a entidade administrativa suportar as consequências nefastas aí decorridas».
E com base nesta fundamentação, o douto Tribunal recorrido concluiu que o acto recorrido devia ser anulado por violação do artigo 17.º. n.º 1, alínea 2) do Regulamento Administrativo n.º 22/2011.
3.2.
Vejamos.
Foi objecto de impugnação contenciosa, uma deliberação da ora Recorrente que cancelou parcialmente um apoio financeiro que, anteriormente, tinha concedido à ora Recorrida ao abrigo do Plano de Apoio Financeiro à Aquisição de Produtos e Equipamentos para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética que constitui objecto do Regulamento Administrativo n.º 22/2011.
A referida deliberação fundou-se, expressamente, na norma da alínea 2) do n.º 1 do artigo 17.º do citado Regulamento Administrativo, segundo a qual, «o Conselho Administrativo do FPACE pode cancelar a concessão do apoio financeiro, quando se verifique uma das seguintes situações:
(...)
2) Uso do montante do apoio financeiro concedido para fins diferentes dos fixados no despacho de concessão;
(...)».
Como vimos, a Recorrente alega que o Tribunal a quo interpretou e aplicou erradamente esta norma.
Em nosso entendimento, esta norma tem de ser objecto de uma interpretação adequada à sua teleologia.
Ora, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º do referido Regulamento, «[o] Plano de Apoio Financeiro visa conceder um apoio financeiro a empresas comerciais e a associações para suportarem as despesas decorrentes da aquisição ou substituição de produtos e equipamentos que possam contribuir para a melhoria da qualidade do ambiente, o reforço da eficiência energética ou a poupança de água».
Daí que, ainda que os produtos e equipamentos adquiridos com recurso ao apoio financeiro sejam aqueles que o beneficiário se propôs adquirir e não outros e, portanto, neste sentido, o apoio financeiro não tenha servido para fins distintos dos constantes no despacho de concessão, parece-nos que, se os mesmos não vierem a ser utilizados pelo beneficiário nos termos em que se propôs no seu requerimento de candidatura não será atingida a finalidade que esteve na base da respectiva atribuição, independentemente do fim para que, eventualmente, estejam a ser utilizados ou até de não estarem a ser utilizados.
O apoio financeiro é concedido para a aquisição de produtos e equipamentos na perspectiva da respectiva utilização nos termos autorizados, pois que só desse modo se logrará a melhoria ambiental ou a eficiência energética que justifica a respectiva concessão. Não nos parece, por isso e salvo o devido respeito por opinião diversa, que a norma em apreço deva ser interpretada de modo a abranger apenas as situações em que o apoio financeiro é usado para fins distintos daqueles que estão fixados no despacho de concessão. Trata-se de uma leitura interpretativa restritiva que contraria a razão de ser da própria norma.
Portanto, a norma da alínea 2) do n.º 1 do artigo 17.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011 abrange todas as situações em que os equipamentos ou produtos adquiridos com recurso a apoio financeiro não foram ou deixaram de estar afectos aos fins fixados no despacho de concessão.
3.3.
Por outro lado, importa considerar que os apoios financeiros atribuídos pelo Fundo para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética, provêm de dinheiros públicos, correspondendo a sua atribuição a despesa pública. Daí que, à sua atribuição e utilização devam presidir critérios de rigor, contenção e prudência, tendo em vista a obtenção de benefícios que, de forma directa ou indirecta, possam reverter em favor da comunidade.
Por essa razão, o próprio Regulamento Administrativo n.º 22/2011 prevê mecanismos de fiscalização tendentes a permitir à Administração verificar se os apoios financeiros concedidos com uma determinada finalidade estão ou não a ser efectivamente utilizados para os fins que estiveram na base da respectiva atribuição. Assim, de acordo com o disposto no artigo 16.º, a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA) tem poderes de fiscalização nomeadamente em matéria de aplicação por parte das beneficiárias, do montante do apoio financeiro concedido para os fins constantes do despacho de concessão, tendo o direito a solicitar às beneficiárias a colaboração necessária.
No caso em apreço, a ora Recorrente, cancelou o apoio financeiro que havia atribuído à ora Recorrida por considerar, na sequência de uma acção de fiscalização levada a cabo ao abrigo do referido artigo 16.º do Regulamento, que tal apoio havia sido usado para fins diferentes dos fixados no despacho de concessão.
Concluiu a ora Recorrente desta forma porquanto na dita acção fiscalizadora apurou que parte dos produtos e equipamentos cuja aquisição foi financeiramente apoiada não estavam instalados nos estabelecimentos da ora Recorrida, nem sequer foram encontrados.
Neste contexto, parece-nos, com todo o respeito pela douta decisão recorrida, que esta incorreu no erro de julgamento que lhe vem apontado.
Não podemos deixar de acompanhar a douta sentença recorrida quando nela se afirma que é à Administração que cabe o ónus da prova dos pressupostos de facto da sua actuação quando esteja em causa a prática de actos ablativos a que correspondem, do lado do particular, posições jurídicas de conteúdo opositivo.
Mas a verdade é que, no caso, a Administração provou esses pressupostos.
A Recorrente contenciosa, ora Recorrida, requereu o apoio financeiro tendo em vista a substituição da iluminação dos seus estabelecimentos por um novo sistema de iluminação LED para atingir os objectivos de poupança energética e de redução de emissão de resíduos.
Foi para esse fim, portanto, que o apoio lhe foi concedido. Ainda que se possa dizer que o despacho de concessão é ambíguo e limita-se a referir no ponto 3 da proposta que os produtos e equipamentos venham a ser utilizados nos diversos estabelecimentos pertencentes à recorrente, como se assinala na douta sentença recorrida, parece-nos que essa ambiguidade é ultrapassável por via interpretativa, justamente por referência ao teor do requerimento de apoio financeiro formulado pela Recorrida.
Interpretada a deliberação de concessão do apoio financeiro à luz do requerimento que a mesma deferiu, estamos em crer que não podem restar dúvidas sobre os fins do apoio financeiro aqui em causa. Esse apoio destinou-se à aquisição de material de iluminação LED para ser instalado nos estabelecimentos comerciais da ora Recorrida.
Sendo esta a finalidade do apoio, será de concluir que a Administração fica habilitada a determinar o respectivo cancelamento se, na sequência de em visita de fiscalização às instalações do beneficiário do apoio, constata que parte muito significativa (80%) do material a cuja aquisição tal apoio se destinou não estava instalado ou nem sequer foi encontrado, uma vez que tal situação é subsumível à alínea 2) do n.º 1 do artigo 17.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011, dado que o equipamento não está a ser utilizado para os fins fixados no despacho de concessão.
É certo que do despacho de concessão não consta qual o período de tempo durante o qual o material adquirido tinha de estar instalado. No entanto, a ora Recorrida, na qualidade de beneficiária do apoio financeiro, comprometeu-se perante a ora Recorrente, a proceder à notificação desta, atempadamente e por escrito, caso surgisse alguma eventualidade que pudesse originar alterações significativas sobre os produtos ou equipamentos adquiridos.
Portanto, caso o material adquirido com recurso ao apoio avariasse ou fosse retirado do estabelecimento em resultado, por exemplo, da mudança de instalações, incumbia à ora Recorrida comunicar esse facto ao Fundo para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética de modo a que, em eventual acção de fiscalização, a entidade fiscalizadora pudesse fazer o confronto entre o material adquirido, o material efectivamente instalado e o material que entretanto tivesse sido inutilizado mediante a atempada e devida comunicação.
Deste modo, provando-se a existência de uma diferença entre o material adquirido e o material instalado, ainda mais uma diferença significativa, temos para nós que se justifica plenamente a conclusão de que o material faltante não está a ser usado para os fins previstos no despacho de concessão do apoio, pela simples razão de que não está instalado, como devia, nos estabelecimentos daquela beneficiária e, portanto, está demonstrado o facto constitutivo do direito da Administração de cancelar o apoio financeiro.
Deste modo, estava a beneficiária do apoio financeiro obrigada a alegar e provar as razões de facto justificativas da não utilização de parte do equipamento adquirido com recurso ao apoio financeiro, nomeadamente, a respectiva degradação, avaria ou simples desgaste, ou a sua inadequação a novos espaços comerciais utilizados pela Recorrida. É que tais razões justificativas constituem matéria de excepção, como factos impeditivos do exercício por parte da Administração do direito de cancelamento do apoio, recaindo, portanto, o ónus da respectiva prova sobre a Recorrida (artigo 335.º, n.º 2 do Código Civil).
Essa prova não foi feita e portanto, é a Recorrida quem deve suportar as consequências desfavoráveis que daí decorrem.
3.4.
Na douta sentença recorrida foi ponderado que ainda que o resultado da inspecção tenha revelado que alguns produtos adquiridos não se encontravam instalados nos locais indicados, isso não seria suficiente para demonstrar que os fins de apoio financeiro não foram cumpridos justamente porque essa inspecção foi efectuada mais de dois anos após a concessão do apoio financeiro.
Não podemos, no entanto, acompanhar a douta sentença recorrida.
Na verdade, a norma do artigo 16.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2011, atribui à Administração o poder de fiscalizar a aplicação por parte das beneficiárias, do montante do apoio financeiro concedido para os fins constantes do despacho de concessão, que deve ser exercido em obediência aos princípios fundamentais da actividade administrativa e portanto, só em situações de flagrante violação de tais princípios se poderá desconsiderar o resultado da acção de fiscalização desenvolvida ao abrigo da dita norma habilitante.
Ora, no caso, não se vislumbra que a acção de fiscalização levada a efeito pela DSPA tenha infringido tais princípios, tendo em conta que estava em causa um investimento em produtos e equipamentos que era suposto terem uma vida útil certamente superior a 2 anos.
Aliás, era muito fácil à beneficiária do apoio financeiro, ora Recorrida, demonstrar e justificar as razões para as falhas detectadas pela inspecção. Bastaria ter cumprido a obrigação de comunicação que sobre si recaía. Se não o fez, sibi imputet.
4.
Face ao exposto, salvo melhor opinião, somos de parecer de que o presente recurso jurisdicional merece provimento e de que, em consequência, deve ser revogada a douta sentença recorrida e substituída por outra que julgue improcedente o recurso contencioso.
Para nós, todas as questões efectivamente colocadas na motivação do presente recurso jurisdicional já foram correcta e exaustivamente debatidas no Douto parecer do Ministério Público acima integralmente transcrito, com que estamos inteiramente de acordo.
Na verdade, tal como observou e bem o Ilustre Magistrado do Ministério Público no seu Douto parecer, para a boa aplicação dos normativos do artº 17º do Regulamento Administrativo nº 22/2011, é preciso que se proceda a uma interpretação teleológica dos mesmos para se inteirar dos bens jurídicos que visa tutelar.
Não temos dúvidas que o bem jurídico que a norma da alínea 2) desse artº 17º visa tutelar é a boa e efectiva afectação dos recursos financeiros do erário público aos fins da protecção do ambiente.
Portanto, quem beneficia do apoio financeiro proveniente do erário público tem a obrigação de aplicar o apoio financeiro à aquisição dos produtos e à instalação dos equipamentos e manter em uso os produtos e em funcionamento os equipamentos nas suas instalações, por forma a que a finalidade da redução energética possa ser alcançada.
Assim, se mediante a fiscalização in loco do seu pessoal tiver detectado a não presença dos produtos e a não montagem dos equipamentos, adquiridos com o apoio financeiro, nas instalações nos termos definidos no acto de concessão do apoio financeiro, a entidade administrativa, a quem a lei compete fiscalizar a boa aplicação por parte dos beneficiários do montante do apoio financeiro concedido, tem toda a legitimidade de tirar do facto objectivo da ausência dos produtos e equipamentos a ilação de que o apoio financeiro obtido pelo beneficiário não é aplicado aos fins a que se destina a concessão do apoio financeiro.
Na verdade, dada a grande variedade de formas para gastar dinheiro, não é exigível à Administração o apuramento do fins concretos a que o apoio financeiro concedido foi efectivamente aplicado pelo seu beneficiário, mas sim basta a ela demonstrar os factos objectivos da inexistência ou o não uso dos produtos e equipamentos nas instalações do estabelecimento do beneficiário, que habilita a Administração a atirar a ilação para afirmar a aplicação do apoio financeiro a fins diferentes, e sobre o beneficiário deve impender o ónus de provar factos impeditivos dessa ilação.
Aliás, já no momento da apresentação da candidatura à concessão do apoio financeiro, o beneficiário assumiu expressamente o compromisso de que, sem autorização prévia do FPACE, a empresa não pode ceder, hipotecar, empenhar ou dispor por qualquer outra forma, em nome próprio ou de terceiro, produtos ou equipamentos adquiridos ou substituídos pelo montante exclusivamente concedido no âmbito do Plano – vide a declaração subscrita pela recorrida X que instruiu o requerimento da concessão do apoio financeiro, a fls. 4 dos autos de procedimento administrativo.
Dado o compromisso assumido nessa declaração, o beneficiário tinha a obrigação de justificar perante a Administração, a inexistência dos produtos e equipamentos nas instalações dos seus estabelecimentos.
Para além de não justificar, a sua iniciativa, a inexistência dos produtos e equipamentos nos seus estabelecimentos, a recorrida X nem logrou provar factos impeditivos da ilação da aplicação do financiamento aos fins diferentes.
Por isso, bem andou a Administração e não é de censurar a sua decisão do cancelamento do apoio financeiro e a sua restituição nos termos definidos na deliberação recorrida.
Pelo que, não nos resta outra alternativa melhor do que a de aproveitarmos integralmente o Douto parecer do Ministério Público, convertendo-o na fundamentação do presente recurso para julgar improcedente o presente recurso jurisdicional.
Assim, sem mais delonga, é de proceder o recurso jurisdicional.
Em conclusão:
1. O bem jurídico que o artº 17º/-2) do Regulamento Administrativo nº 22/2011 visa tutelar é a boa e efectiva afectação dos recursos financeiros do erário público aos fins da protecção do ambiente.
2. Quem beneficia do apoio financeiro proveniente do erário público tem a obrigação de aplicar o apoio financeiro à aquisição dos produtos e à instalação dos equipamentos e manter em uso os produtos e em funcionamento os equipamentos nas instalações do seu estabelecimento, por forma a que a finalidade da redução energética possa ser alcançada.
3. Assim, se mediante a fiscalização in loco do seu pessoal tiver detectado a não presença dos produtos e a não montagem dos equipamentos, adquiridos com o apoio financeiro, nas instalações nos termos definidos no acto de concessão do apoio financeiro, a entidade administrativa, a quem a lei compete fiscalizar a boa aplicação por parte dos beneficiários do montante do apoio financeiro concedido, tem toda a legitimidade de tirar do facto objectivo da ausência dos produtos e equipamentos a ilação de que o apoio financeiro obtido pelo beneficiário não é aplicado aos fins a que se destina a concessão do apoio financeiro.
Tudo visto, resta decidir.
III
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência conceder provimento ao recurso jurisdicional, revogando a sentença recorrida e mantendo o acto administrativo recorrido.
Custas em ambas as instâncias pela Companhia de Lembranças X, Limitada, ora recorrida, com taxa de justiça, em cada uma das instâncias, fixada em 6UC.
Registe e notifique.
RAEM, 28MAIO2020
Lai Kin Hong
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
Mai Man Ieng
1 Página 6 da Proposta n.º 1328/FP ACE/2016, de 11/07/2016, “... O beneficiário notificará atempadamente o Fundo em relação a essas alterações materiais, em conformidade com os compromissos no momento da apresentação do pedido, e o beneficiário não notificou voluntariamente o Fundo das questões relevantes antes de o Fundo realizar a sua visita,.. ˮ (em tradução livre).
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Proc. 1052/2018-36