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Processo nº 173/2019
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo – Arguição de nulidade)

Data: 17 de Setembro de 2020

ASSUNTO:
- Excesso da pronúncia
- Nulidade da sentença/acórdão

SUMÁRIO:
- Não se verifica a nulidade da sentença/acórdão por excesso da pronúncia se o Tribunal ad quem altera a decisão da matéria de facto do Tribunal a quo em conformidade com a impugnação da Recorrente do recurso jurisdicional.
O Relator,









Processo nº 173/2019
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo – Arguição de nulidade)

Data: 17 de Setembro de 2020
Recorrente: Director dos Serviços para os Assuntos Laborais
Recorrido: A

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I. Relatório 
O Recorrido A, melhor identificado nos autos, vem arguir a nulidade do acórdão de 23/04/2020, nos termos e fundamentos seguintes:
“...
   A, Recorrido nos autos de recurso de decisões jurisdicionais em matéria administrativa supra referidos, tendo sido notificado do Acórdão que concedeu provimento ao recurso interposto pela Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (adiante designada por "Recorrente"), vem proceder à arguição de nulidade ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 571.º e artigo 633.º do Código de Processo Civil ("CPC"), aplicáveis ex vi artigo 1.º do Código do Processo Administrativo Contencioso ("CPAC"), nos seguintes termos e fundamentos:
1. O Acórdão em apreço foi muito para lá do objecto do recurso, objecto esse que é, só pode ser e foi expressamente definido de forma cristalina e manifesta pela Recorrente, não só no requerimento de recurso como nas suas alegações,
2. Pelo que o Acórdão, ao apreciar o recurso e eliminar vários factos considerados provados na sentença que não foram impugnados ou postos em causa pela própria Recorrente, extravasou completamente o que lhe era pedido e as suas funções, pecando por excesso de pronúncia, o que constitui uma nulidade.
3. A este propósito, destaca-se a boa doutrina: "[a] decisão é nula quando o tribunal conheça questões de que não podia tomar conhecimento (artº 668º, nº 1, al. D) 2.ª parte), ou seja quando a decisão esteja viciada por excesso de pronúncia. Verifica-se este excesso sempre que o tribunal utiliza, como fundamento da decisão, matéria não alegada ou condena ou absolve num pedido não formulado, em condições em que está impedido de o fazer." (negrito nosso)
4. Urge recordar que toda a acção assenta na relação material controvertida, precisamente, aquela que é definida pelas partes.
5. No que toca aos recursos, o princípio do dispositivo assume especial importância, uma vez que, os Tribunais de recurso apenas podem conhecer das questões que lhe são colocadas, rectius das questões impugnadas pelo recorrente, sendo tal limitação imposta pelo princípio da segurança jurídica, da certeza e estabilidade das decisões judiciais.
6. Por isso, se explica a máxima - também norma - de que o Tribunal de recurso está limitado pela matéria das conclusões do recorrente. Ou seja, o objecto do recurso é limitado expressa ou tacitamente pelas conclusões do recorrente, não podendo os efeitos do caso julgado, da parte não recorrida, ser prejudicados pela decisão de recurso nem pela anulação do processo, como resulta cristalino das normas dos n.ºs 3 e 4 do artigo 589.º do CPC, ex vi artigo 1.º do CPAC.
7. O douto Tribunal atentou, assim, contra o princípio do dispositivo e contra o do direito ao contraditório, entretendo-se a discutir e a decidir questões que as partes não debateram e que nem a própria Recorrente pretendia colocar em crise ou discutir.
Vejamos:
8. Como é sabido, o excesso de pronúncia - previsto como causa de nulidade na alínea d), in fine, do n.º 1 do artigo 571.º do CPC, aplicável aos acórdãos proferidos em sede de recurso nos termos do artigo 633.º, n.º 1, do CPC, todos ora relevantes ex vi do artigo 1.º do CPAC - ocorre quando o tribunal conhece questões que, não tendo sido colocadas pelas partes, também não são de conhecimento oficioso.
9. Sob este ângulo de visualização, prevê o n.ºs 2 e 3 do artigo 563.º que "[o] juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras" e "[o] juiz ocupa-se apenas das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras."
10. Neste âmbito não se olvida que têm a jurisprudência e a doutrina salientado que as "questões" a que alude o dito n.º 3 do artigo 563.º do CPC não se confundem com os argumentos e motivações produzidas pelas partes para fazer valer as suas pretensões.
11. A dificuldade está em saber, então, o que deve entender-se por questões, para efeitos do disposto nos artigos 563.º, n.º 3, e 571.º, n.º 1, alínea d), do CPC.
12. A resposta tem de ser procurada na configuração que as partes deram ao litígio, levando em conta a causa de pedir e o pedido, o que vale por dizer que questões serão apenas as "questões de fundo", isto é, as que integram matéria decisória, os pontos de facto ou de direito relevantes no quadro do litígio, ou seja, os concernentes ao pedido, à causa de pedir e às excepções.
13. Deste modo, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido.
14. Pelo que deve considerar-se nulo, por vício de ultra petita, o Acórdão em que o Tribunal invoca, como razão de decidir, um título, uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido) - cf. a título de direito comparado, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no processo n.º 07764/14, em 5 de Fevereiro de 2015.
15. O excesso de pronúncia traduz-se, a esta luz, na violação do princípio dispositivo que contende com a liberdade e autonomia das partes.
16. Em sede de recurso, cumpre adicionalmente notar que no que concerne à delimitação do objecto susceptível de pronúncia pelo Tribunal, que o julgamento nesta fase não é o da causa, mas sim do recurso e tão só quando às questões concretamente suscitadas e não quanto a todo o objecto da causa.
17. O mesmo é dizer que o Tribunal de recurso, com excepção das questões de conhecimento oficioso, tem a sua actividade balizada pelas conclusões das alegações do recurso (artigo 589.º, n.º 3, do CPC).
18. A Recorrida entende que o Acórdão proferido por este Tribunal padece de nulidade por excesso de pronúncia no que concerne à eliminação dos factos considerados provados pelo Tribunal a quo.
Ora, in casu,
19. A Recorrente discordou da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e interpôs recurso da mesma, no qual terá impugnado a decisão relativa à matéria de facto.
20. Acontece que a impugnação da decisão sobre a matéria de facto onera a Recorrente com os ónus previstos no artigo 599.º do CPC.
21. Em especial, com os ónus previstos no artigo 599.º, n.º 1, alíneas a) e b) do CPC, o qual dispõe que o seguinte:
"1. Quando impugne a decisão de facto, cabe ao recorrente especificar, sob pena de rejeição do recurso:
a) Quais os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo nele realizado, que impunham, sobre esses pontos da matéria de facto, decisão diversa da recorrida." (realce nosso)
22. Assim, o recorrente que impugna a decisão relativa à matéria de facto deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
23. Na verdade, em termos de impugnação da matéria de facto, a lei consagra um importante ónus de alegação, tendo por finalidade fundamental permitir, por um lado, o exercício eficaz do contraditório e, por outro, o julgamento adequado e seguro da impugnação da matéria de facto pelo tribunal ad quem, dando-se assim aplicação prática aos princípios da cooperação, lealdade e boa fé processuais.
24. Neste contexto, devem ser especificados ou concretizados os factos provados ou não provados considerados incorretamente julgados, sendo insuficiente a referência meramente genérica, origem de dúvidas e incertezas e a que se quis obstar.
25. Em suma, no âmbito da impugnação da matéria de facto, o recorrente está obrigatoriamente vinculado a discriminar os factos mal julgados, preenchendo as conclusões, assim como os meios de prova do processo determinantes de um julgamento diverso.
26. Trata-se, pois, de circunstâncias clarificadoras da alegação tendo por fim a obtenção de um julgamento justo, que corresponda à realidade material dos factos, numa coincidência entres estes e a verdade.
27. Ora, por qualquer motivo, que só a própria poderia explicar, a Recorrente não especificou quais os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados, nem especificou os referidos meios probatórios no seu recurso, pelo que não cumprira os requisitos consagrados no artigo 599.º, n.º 1, alíneas a) e b) do CPC.
28. Na verdade, a Recorrente não especificou, nas conclusões, que delimitam o objecto do recurso, os factos incorretamente julgados, sendo aquelas completamente omissas nessa referência.
29. Aliás, nem isso foi feito na alegação propriamente dita.
30. A Recorrente limitou-se a afirmar que "o entendimento do Tribunal a quo de que a Recorrente foi destacado pela B a Macau e só tem relação laboral com aquela é incorrecto".
31. Mais genérica que esta alegação é difícil encontrar-se, contrastando com a especificação normativa mente exigível.
32. Por outro lado, a especificação dos factos, para a sua inteira compreensão, deve ter tendencialmente por referência a decisão proferida sobre a matéria de facto, quer quanto aos factos provados, quer quanto aos factos não provados, como é prática reiterada no quotidiano judiciário.
33. Nestas circunstâncias, não pode deixar de se concluir que a Recorrente não cumpriu o ónus de alegação previsto no artigo 599.º, n.º 1, alínea a), do CPC.
34. Cumpre novamente destacar que, nesta situação, a lei prescreve que o recurso quanto à matéria de facto em causa deve ser liminarmente rejeitado, sendo a doutrina e a jurisprudência unânimes neste sentido.
35. Sendo esta rejeição imediata, sem mais, sem alternativas e sem qualquer direito a convite a aperfeiçoamento.
36. Com efeito, a Recorrente tinha o ónus de alegar concretamente os pontos da matéria de facto e os meios probatórios que pretende impugnar, nos termos do artigo 599.º, n.º 1, alíneas a) e b) do CPC.
37. A comi nação legal para o incumprimento deste ónus por parte de um recorrente é a imediata e liminar rejeição do recurso quanto à impugnação da matéria de facto, como prescreve o mesmo artigo.
38. Neste sentido, veja-se, a título de direito comparado, o que foi decidido pelo Tribunal de Relação de Lisboa:
"A impugnação da decisão relativa à matéria de facto, sendo possível, está sujeita, no entanto, à observância do cumprimento do ónus de alegação consagrado no artigo 640.º do CPC.
Sob pena de rejeição do recurso, o recorrente deve, obrigatoriamente, especificar os concretos pontos de facto incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida e ainda a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnados (art. 640.º, n.º 1, do CPC).
Trata-se, pois, de um ónus de alegação exigente, destinado, por um lado, a possibilitar o exercício eficaz do princípio do contraditório pela parte contrária e, por outro, a facilitar a compreensão do objecto do recurso e o sentido da sua decisão.
No caso vertente, desde logo, o Apelante não incluiu nas conclusões do recurso a matéria de facto impugnada, nomeadamente os concretos factos incorrectamente julgados.
Sendo a delimitação objectiva do recurso feita através das conclusões, nas quais, de forma sintética, se devem indicar os fundamentos porque se pede a alteração ou anulação da decisão (...), a impugnação da decisão relativa à matéria de facto ficou excluído do objecto da apelação.
Aliás, nem mesmo na parte da motivação da alegação, o Apelante identifica, em concreto, o matéria de facto especificamente impugnado.
Essa especificação, não existindo a base instrutória ou os temas da prova, podia fazer-se mediante, preferencialmente, a identificação dos factos provados ou não provados ou, ainda, dos factos articulados.
Sendo a decisão da matéria de facto de uma enorme e reconhecida relevância, a exigir extremos cuidados, é indispensável saber, com rigor, o âmbito da impugnação, de modo a garantir sempre a justa composição do litígio.
Por outro lado, (...) o Apelante (...), quanto à prova documental, limita-se a uma genérica alegação, sem a identificação concreta dos documentos que justificavam resposta diversa à matéria de facto (...).
Sendo tais requisitos de verificação cumulativa e o Apelante não tendo cumprido tal ónus de alegação, é de rejeitar o recurso, quanto à impugnação da decisão relativa à matéria de factos, nos termos do disposto no art. 640.º, n.º 1, do CPC.
Deste modo, tanto por exclusão do objecto do recurso, como por incumprimento do ónus de alegação, não pode conhecer-se da impugnação da decisão relativa à matéria de facto." (realce nosso)
39. Assim, na falta de especificação pelo recorrente dos concretos pontos de facto que o mesmo considera incorrectamente julgados, o Tribunal acha-se impedido de apreciar questões que, não sendo conhecimento oficioso, não se encontrem compreendidas nas conclusões da alegação do recorrente, sob pena de incorrer no vício de excesso de pronúncia e, portanto, na nulidade prevista no artigo 571.º, n.º 1, alínea d), in fine, do CPC.
40. Note-se que o tribunal não tem ele próprio o poder-dever no confronto com o ónus processual do recorrente.
41. Não tendo o recorrente cumprido o ónus de alegação, inviabiliza-se o conhecimento pelo Tribunal da parte do recurso sobre a matéria de facto.
Ora,
42. In casu, o douto Tribunal eliminou três factos provados sem que qualquer impugnação a tal respeito houvesse sido deduzida pela Recorrente, ou qualquer outra razão o justificasse,
43. Pelo que extravasou indevidamente os seus nulidade por excesso de pronúncia.
44. Manifestamente, o Acórdão em causa incorreu em excesso de pronúncia, tendo conhecido questões que não podia conhecer, porque não alegadas.
45. Pelo que o Acórdão em apreço padece de nulidade por excesso de pronúncia - a qual se argui ao abrigo do disposto na alínea d), in fine, do n.º 1 do artigo 571.º do CPC, aplicável aos acórdãos proferidos em sede de recurso nos termos do artigo 633.º, n.º 1, do CPC, todos ora relevantes ex vi do artigo 1.º do CPAC -, devendo esta ser declarada e suprida por este douto Tribunal, nos termos dos poderes que lhe são conferidos para o efeito...”.
*
Devidamente notificada, Director dos Serviços para os Assuntos Laborais, pronunciou-se nos termos constantes a fls. 226 a 229 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do pedido.
*
II. Fundamentação
Sobre a nulidade do acórdão suscitada pelo Recorrido do recurso jurisdicional, o Dignº Magistrado do Mº Pº junto deste TSI emitiu o seguinte parecer:
   “…
   Na peça de fls.211 a 220 dos autos, A assacou a nulidade por excesso de pronúncia ao Acórdão do Venerando TSI, argumentando que “39. Assim, na falta de especificação pelo recorrente dos concretos pontos de facto que o mesmo considera incorrectamente julgados, o Tribunal acha-se impedido de apreciar questões que, não sendo conhecimento oficioso, não se encontrem compreendidas nas conclusões da alegação do recorrente, sob pena de incorrer no vício de excesso de pronúncia e, portanto, na nulidade prevista no artigo 571.º, n.º1, alínea d), in fine, do CPC.” E que “42. In casu, o douto Tribunal eliminou três factos provados sem que qualquer impugnação a tal respeito houvesse sido deduzida pela Recorrente, ou qualquer outra razão o justifique.”
   Quid juris?
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   Repare-se que pese embora o recorrente contencioso A arrolasse duas testemunhas na petição (cfr. fls.23 a 37 dos autos), apenas uma prestou o depoimento no Tribunal Administrativo (vide. fls.105 e verso dos autos), cuja gravação está com estes autos.
   Bem, é sensível que as conclusões 1 a 9 das Alegações do presente recurso jurisdicional contêm impugnações sobre uns factos dados como provados pelo MMº Juiz a quo, e indicam os respectivos meios de prova para tais efeitos, sendo igualmente patente que são aquelas impugnações que levaram, a jusante, o Director da DSAL a asseverar categoricamente que “原審法院認為原上訴人由菲律賓「B有限公司」指派到澳門,並只與該公司建立聯繫或法律的從屬關係並不正確。”
   Salvo elevado respeito pela opinião diferente, inclinamos a colher que o recorrente jurisdicional Director da DSAL cumpriu cabalmente o ónus prescrito nos n.º1 e n.º2 do art.599.º do CPC, pelo que não se aplica ao caso sub judice a orientação jurisprudencial que proclama (vide. Acórdão do TUI no Processo n.º111/2019): Se o único recorrente impugna apenas uma parte da matéria de facto, não pode o TSI, a propósito de tal recurso, alterar outras partes da decisão de facto, sem que houvesse qualquer contradição com a restante decisão de facto, por não se tratar de matéria de conhecimento oficioso, violando, deste modo, o princípio dispositivo, nos termos do n.º 3 do artigo 563.º do Código de Processo Civil. Tendo o TSI alterado matéria de facto sem impugnação do recorrente, incorreu em excesso de pronúncia, nos termos dos artigos 571.º, n.º 1, alínea d), parte final e 633.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que provoca nulidade do acórdão.
   Com efeito, as conclusões 1 a 9 das Alegações do presente recurso jurisdicional legitimam plenamente o Venerando TSI a alterar a decisão do Tribunal Administrativo quanto à matéria de facto, e não há margem para dúvida de que são constantes dos autos todas as provas nas quais o TSI angulou a sua decisão de considerar como não provados os três factos dados como provados pelo MMº Juiz do Tribunal Administrativo. Pois em boa verdade, a pedra fundamental da referida decisão do TSI consiste no seu prudente juízo de que o documento de fls.41 a 42 dos autos contém em si contradição insanável e, assim, não devia ser atendido.
   Para além do exposto supra, importa assinalar que o auto de notícia n.º075/A/2016-Pº.225.48 lavrado por agentes policiais in loco demonstra seguramente que na devida altura, o indivíduo A que não era residente de RAEM estava a prestar trabalho na empresa “B de Macau”, sem possuir a autorização para tal efeito.
   Nestes termos, incumbe ao indivíduo A o ónus de provar a aplicação ao caso sub judice do regime excepcional consagrado no n.º3 do art.1º da Lei n.º21/2009. Com efeito, é regra geral que cabe ao correlativo arguido o ónus de prova respeitante às circunstâncias de exclusão da ilicitude ou da culpa, como matéria exceptiva.
   Nesta linha de raciocínio, sufragamos a sensata tese do Venerando TSI, no sentido de cabia ao referido A o ónus de prova quanto aos três factos que passaram a ser julgados não provados, em virtude de tais factos constituírem factualidade exceptiva alegada por ele.
   O que significa que infringe a regra sobre ónus de prova a seguinte conclusão do MMº Juiz do Tribunal Administrativo: No caso em apreço, na ausência de prova, não se pode ter por verificado os pressupostos do acto recorrido. E por consequência, tal acto deve ser anulado pelo erro nos pressupostos de facto. O que corrobora inabalavelmente a legitimidade do TSI para efeitos de sindicar a decisão do MMº Juiz do Tribunal Administrativo respeitante os três factos acima aludidos.
   Ora, convém ter presente que quando julgar em recurso, o TSI conhece, em regra, de matéria de facto e de direito (art.39º da Lei n.º9/1999). E não há dúvida de que se verificam in casu pressupostos consignados na alínea a) do n.º1 do art.629º do CPC.
***
   Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência da Reclamação do indivíduo A…”.
Trata-se duma posição com a qual concordamos na sua íntegra. Assim, com a devia vénia, fazemos como nossos fundamentos para julgar improcedente a arguida nulidade do acórdão.
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III. Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em julgar improcedente a arguição da nulidade.
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Custas do incidente pelo Recorrido, com 6UC taxa de justiça.
Notifique e registe.
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Macau, aos 17 de Setembro de 2020.

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Ho Wai Neng Mai Man Ieng
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Tong Hio Fong
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Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro

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