Processo nº 419/2020
(Autos de Recurso Cível e Laboral)
Data do Acórdão: 15 de Outubro de 2020
ASSUNTO:
- Meios de prova.
- Matéria de facto.
- Responsabilidade do comitente.
SUMÁRIO:
- Pretendendo uma das partes que a outra preste declarações sobre determinada matéria objecto da prova tem de requerer o depoimento de parte de quem pretende obter aquelas declarações;
- Para que a decisão da 1ª instância seja alterada, haverá que averiguar se algo de “anormal”, se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes;
- Não se demonstrando que o comissário actuou no exercício das funções que lhe foram confiadas não há responsabilidade do comitente.
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Rui Pereira Ribeiro
Processo nº 419/2020
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data : 15 de Outubro de 2020
Recorrentes : Companhia de EE Internacional Limitada
A
B
C
D
F
G
Recorridas : H
JJ Internacional Sociedade Unipessoal Lda.
II Resort (Macau) S.A.
As mesmas que as Recorrentes
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
Companhia de EE Internacional Limitada, com os demais sinais dos autos,
veio instaurar acção contra,
A
B
C
D
F
H
G
JJ Internacional Sociedade Unipessoal Limitada, e,
II Resort (Macau) SA, todos com os demais sinais dos autos,
Pedindo que fossem as Rés condenadas, solidariamente, a restituir à Autora a quantia de HKD58.000.000,00, equivalentes a MOP59.856.000,00, acrescida de juros de mora vencidos, à taxa anual de 9,75%, entre os dias 28 de Janeiro de 2013 e 17 de Abril de 2015, no valor de MOP72.791.045,59, bem como os juros que se forem vencendo até ao efectivo e integral cumprimento, à mesma taxa anual.
Nestes autos foram interpostos os seguintes recursos:
A fls. 779/780 veio a Autora recorrer do despacho de fls. 755/756 que indeferiu a solicitada notificação das 8ª e 9ª Rés para informarem a que título é que a 8ª Ré operou a sala VIP JJ no Casino II durante o ano de 2013, apresentando as seguintes conclusões de recurso:
1. A Autora, ora Recorrente, não se conforma com o douto despacho do Tribunal a quo que indeferiu o requerimento para que as 8.ª e 9.ª Rés fossem notificadas para explicarem a que título é que a 8.ª Ré operou a então denominada Sala VIP JJ no Casino II durante o ano de 2013;
2. Como a 9.ª Ré declarou que não existe contrato de promoção de jogos celebrado com a 8.ª Ré, cabe à Autora, nos termos do artigo 457.º do CPC, provar, por qualquer meio, que essa declaração não corresponde à verdade;
3. O art. 457.º do CPC determina que, se o notificado declarar que não possui o documento, o requerente é admitido à provar, por qualquer meio, que essa declaração não corresponde à verdade;
4. Dúvidas não restam que o pedido de esclarecimento às 8.ª e 9.ª Rés, com base nos elementos que indicam a actividade de promoção de jogos da 8.ª Ré no Casino da 9.º Ré, é um dos meios legalmente permitidos para a finalidade de fazer contraprova e encontrar total apoio no estipulado no artigo 442.º, n.º 1 do CPC;
5. O esclarecimento requerido visa exclusivamente demonstrar que declaração da 9.ª Ré não corresponde à verdade, pelo que não se trata de um novo requerimento, nem deve ser considerado como um requerimento de depoimento de parte;
6. A Recorrente limitou-se a pedir esclarecimento sobre a razão de não existirem os documentos requeridos, quando a factualidade dos autos demonstra que a 8.ª Ré exerceu actividade de promoção de jogo no Casino II;
7. O Tribunal a quo, ao proferir o despacho ora recorrido, violou o disposto nos artigos 442.º e 457.º do CPC.
Contra alegando veio a 9ª Ré II Resort (Macau) SA apresentar as seguintes conclusões:
I. Vem o recurso sub judice do despacho que indeferiu o requerimento da Autora para notificação das 8.ª e 9.ª Rés, a fim de «explicarem a que título é que a 8.ª Ré operou a Sala de VIP JJ no Casino II durante o ano de 2013»;
II. Declarando a parte contrária que não possui o documento requerido por este não existir, cabe à parte requerente provar, por qualquer meio, que a declaração não corresponde à verdade, nos termos do n.º 1 do artigo 457.º do CPC de Macau;
III. A expressão “provar, por qualquer meio” constante do n.º 1 do artigo 457.º do CPC de Macau, refere-se aos meios de prova processualmente admissíveis, ou seja, à prova por documentos; prova por depoimento de parte; prova pericial; inspecção judicial ou prova testemunhal, únicos meios previstos na lei processual de Macau;
IV. O dever de cooperação para a descoberta da verdade, consagrado no artigo 442.º do CPC de Macau, concretizado no dever de resposta ao que lhe for perguntado; de submissão às inspecções necessárias; de facultar o que for requisitado; de praticar os actos que forem determinados; ou, ainda, de esclarecer dúvidas ou prestar informações, não é per se um meio de prova, não estando na disponibilidade das partes ou sequer sujeito a requerimento destas;
V. O dever de resposta, de esclarecimento de dúvidas e de prestação de informações, previsto no artigo 442.º do CPC de Macau, refere-se aos actos ordenados pelo Tribunal no âmbito do poder de direcção do processo conferido ao juiz;
VI. O pedido de explicações à parte contrária não configura um meio de prova, não sendo por conseguinte sequer admissível, nem constitui meio adequado a provar que a declaração por aquela anteriormente prestada não corresponde à verdade;
VII. O Tribunal não está obrigado a ordenar um pedido de explicações requerido por uma das partes contra a parte contrária, relativo um contrato/relação contratual, quando esta última declarou previamente não existir o contrato e não há registo de qualquer relação contratual junto da competente entidade reguladora;
VIII. Não merece reparo algum a decisão do Tribunal a quo que indefere um pedido de explicações à parte contrária e interpreta, no sentido em que o fez, o disposto nos artigos 457.º e 442.º, ambos do Código de Processo Civil de Macau, salvaguardando todavia a hipótese de solicitá-las oficiosamente se as entender necessárias e pertinentes, e se nisso sentir necessidade e adequação em audiência de julgamento.
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Proferida decisão veio a acção a ser julgada parcialmente procedente e em consequência decidiu-se que:
1. Absolver a 8ª Ré, JJ Internacional Sociedade Unipessoal Lda. JJ國際一人有限公司), e 9ª Ré, II Resorts Macau S.A. (II渡假村(澳門)股份有限公司), dos pedidos formulados pela Autora, Companhia de EE Internacional Lda. (EE國際有限公司);
2. Condenar solidariamente a 1ª Ré, A (A), e a 6ª Ré, H (H), a restituir à Autora a quantia de HK$20.000.000,00, acrescida de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento;
3. Condenar solidariamente a 2ª, B (B), e a 6ª Ré a restituir à Autora a quantia de HK$1.000.000,00, acrescida de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento;
4. Condenar solidariamente a 4ª, D (D), e a 6ª Ré a restituir à Autora a quantia de HK$3.000.000,00, acrescida de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento;
5. Condenar solidariamente a 3ª, C (C), a 5ª Ré, F (F), a 6ª Ré e a 7ª Ré, G (G), a restituir à Autora a quantia de HK$15.000.000,00, acrescida de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento;
6. Condenar a 6ª Ré a restituir à Autora a quantia de HK$10.000.000,00, acrescida de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento.
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Não se conformando com a sentença proferida foi interposto recurso da mesma pela Autora e 1ª a 5º e 7ª Rés.
Pela Autora foram apresentadas as seguintes conclusões e pedidos de recurso:
1. A Recorrente considera que foram incorrectamente julgados os factos mencionados nos quesitos 5.º, 40.º e 41.º da Base Instrutória, pelo que vem impugnar a decisão proferida nos termos do artigo 599.º do Código de Processo Civil;
2. Como se vê nos depoimentos da testemunha da Autora, ora Recorrente, K, Senior Vice-President of Junket Operation of II Macau, disse que, durante os anos de 2005 a 2010, foi o responsável pela operação de Junkets no Casino II Macau, nomeadamente para negociar com os promotores de jogo o estabelecimento e operação das salas VIP no casino, incluindo da 8.ª Ré. (vg. 19:30 da Gravação da audiência - Recorded on 18-0ct-2018 at 15.22.20 (2IG7LS9G02520319));
3. A testemunha disse que não sabia se a 8.ª Ré tinha uma licença emitida pela Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (“DICJ”), mas confirmou, claramente, que a 8.ª Ré era o Junket que operava a sala VIP JJ em 2010, que a 7ª Ré era a gerente da 8. Ré com quem falou e tratou os assuntos relativamente a operação da sala e que a 8.ª Ré, estava a operar a sala de jogo “JJ” com o consentimento e um proveito do casino II Macau, partilhando lucros com a concessionária, nas percentagens de 40% dos lucros para o Junket e 60% para o Casino II. Mais referiu a testemunha que estas percentagens eram igualmente aplicáveis em relação às operações da Autora e dos outros Junkets (vg. 34:50 da Gravação da audiência - Recorded on 18-0ct-2018 at 15.22.20 (2IG7LS9G02520319));
4. Por outro lado, os documentos juntos aos autos a fls. 407 e 408, registo de depósito na conta da 7.ª Ré e recibo de depósito da sala VIP operada pela 8.ª Ré, têm o cabeçalho “II JJ International” e em chinês “IIJJ國際貴賓會”;
5. As fichas retiradas da sala da Recorrente foram posteriormente transferidas da sala VIP da 8.ª Ré para o Casino LL de outra concessionária, sendo inequívoco que se tratavam de fichas de jogo para jogar tal como foi referido pela testemunha K (vg. 49:18 da Gravação da audiência - Recorded on 18-0ct-2018 at 15.22.20 (2IG7LS9G02520319));
6. Note-se que as 7.ª e 8.ª Rés confessaram expressamente na sua contestacão de fls. 289 e 292, nos artigos 1.º, 12.º a 15.º e 19.º que “A 8.ª Ré exerce na sala VIP JJ no Casino II Macau uma actividade de jogo similar à dos promotores de jogo, de modo autónomo e independentemente de quem quer seja” e que “Foi no âmbito dessa actividade de jogo que 7.ª Ré, estando ao serviço numa das salas VIP da 8.ª Co-Re, sita no Casino II, recebeu fichas e dinheiro da 6.ª Co-Ré” e que “as fichas depositadas na sala VIP da 8.ª Ré no Casino II se destinavam a ser levantadas e apostadas na sala VIP da 8.ª Ré no Casino LL”;
7. Assim, com base das confissões e nos meios probatórios produzidos, conjugando com os outros factos provados, não restam dúvidas de que “Também a 8.ª Ré exerce uma actividade de jogos em benefício da 9.ª Ré, similar ao de promoção de jogo, tendo esta, para esses efeito, concedido à 8.ª Ré a operação de uma sala VIP, sita no Casino II, em Macau, à qual foi dada a designação de “JJ” ou “JJ貴賓廳”;
8. Que “Foi no âmbito da sua actividade de promoção de jogo que a 7.ª Ré, estando ao serviço numa das salas VIP da 8.ª, sita no Casino II, recebeu fichas e dinheiro da 6.ª Ré.”, tal como foi confessado pelas 7.ª e 8.ª Rés na contestação que, conjuntamente, apresentada;
9. Foi dado como provado que parte das fichas retiradas da sala VIP da Autora, no valor de HK$25.000.000,00, foi depositada na conta aberta em nome da 7.ª Ré na Sala VIP JJ, sabendo perfeitamente a 8.ª Ré que a 7.ª Ré era sua gerente e que era titular de uma conta de jogo na sala de que era responsável;
10. Foi precisamente essa qualidade de gerente da 7.ª Ré que permitiu que as fichas retiradas ilicitamente da caixa da Autora fossem depositadas na caixa da 8.ª Ré, sem terem sido emitidos os correspondentes recibos e as declarações de proveniência dos valores depositados, tal como resulta evidente das gravações de CCTV (08:25:45 - 08:26:33 IN4532 PJ requested G on 22-Jan [007521]7521-G.MOON W1, 20V; 09:38:27 - 09:93:10 IN4532 PJ requested H on 22-Jan [007521]7521-G.MOON W1,20V; 00:43:45 - 00:44:16 IN4532 PJ requested L on 25-Jan [007522]7522-G.MOON W3,40V; 23:28:30 - 23:31:06 IN4532 PJ requested M on 26-Jan [007522]7522-G.MOON W3,40V; 01:38:19 - 01:39:30 IN4532 PJ requested O on 28-Jan [007522]7522-G.MOON W3,40V);
11. Todas as fichas retiradas da tesouraria da Autora foram depositadas na conta da 7.ª Ré, na sala VIP da JJ no Casino II Macau, tal como resulta do registo de depósitos da sala VIP da JJ na conta da 7.ª Ré, também conhecida como M, a fls. 407 dos autos;
12. O facto de na ficha da conta da 7.ª Ré se mencionar que alguns dos depósitos de fichas foram transferidos para XX, demonstra bem o facto de terem sido depois transferidas para a sala VIP da JJ no anteriormente designado XX, actualmente Casino LL, tal como foi confessado pelas 7.ª e 8.ª Rés, referido pela testemunha K e consta dos registos dos depósitos feitos pela 8.ª Ré no Casino LL - vg. fls. 618, 623, 627, 628 e 629 dos autos;
13. A testemunha, K, Senior Vice-President of Junket Operation of II Macau, no seu depoimento, disse ainda ao Tribunal que, por força da regulamentação governamental da DICJ, os Junkets são obrigados a apresentar um “roll report” para o Casino, com base da declaração preenchida com a origem dos montantes depositados quando diga respeito a valores superiores a HKD/MOP500.000; Acrescentou que a II é a responsável pela recolha dos relatórios dos Junkets e pela submissão à DICJ. (vg. 48:16 Gravação da audiência - Recorded on 18-0ct-2018 at 15.22.20 (2IG7LS9G02520319));
14. Nos registos de vídeo colhidos pelas câmaras de CCTV na sala VIP da JJ, é visível que as fichas da Recorrente foram entregues no balcão da tesouraria da 8.ª Ré, sem que fossem passados recibos ou preenchidas fichas com a origem dos montantes desses depósitos, tal como dispõe o Regulamento Administrativo n.º 7/2006 e a Instrução n.º 2/2006 da DICJ, em vigor à data dos factos, tal como se constata dos indicados registos de vídeo;
15. Foi o facto de a 7.ª Ré ser a gerente da 8.ª Ré que permitiu o depósito das fichas retiradas da caixa da Autora sem a emissão de recibos e o preenchimento das declarações de proveniência dos montantes depositados;
16. Doutro passo, esses factos ilícitos e os prejuízos verificados na esfera patrimonial da Autora só se verificaram porque a 9.ª Ré permitiu, no seu Casino, a actividade de operação de jogos pela 8.ª Ré na sala VIP denominada “JJ”;
17. As 7.ª e 8.ª Rés confessaram expressamente na sua contestação de fls. 289 e 292, no artigo 1.º,12.º a 15.º e 19.º que a 8.ª Ré exerce na sala VIP JJ no Casino II Macau uma actividade de jogo similar à dos promotores de jogo, de modo autónomo e independentemente de quem quer seja; que foi no âmbito dessa actividade de jogo que 7.ª Ré, estando ao serviço numa das salas VIP da 8.ª Co-Ré, sita no Casino II, recebeu as fichas e que essas fichas eram destinadas a ser usadas em apostas para jogo na sala VIP da 8.ª Ré no Casino LL;
18. Com os factos mencionados deve ser dado como provado que a 8.ª Ré exercia uma actividade, similar à de promoção de jogos, em benefício da 9.ª Ré, tendo esta, para esses efeito, concedido à 8.ª Ré a operação de uma sala VIP, sita no Casino II em Macau, à qual foi dada a designação de “JJ” ou “JJ貴賓廳” ;
19. Note-se que a 9.ª Ré, comunicou ao Tribunal a quo, a fls. 530 dos autos, já depois da fase dos articulados, que a II Resorts (Macau) S.A. não tem qualquer contrato de promoção de jogos com a sociedade JJ International Sociedade Unipessoal Limitada (8.ª Ré nos autos), nem possui quaisquer documentos relativos à escrita comercial da 8.ª Ré;
20. Note-se que foi inicialmente indicado pela 9.ª Ré, no início das investigações policiais sobre os referidos levantamentos das fichas de jogo da Autora e dos depósitos nas salas de jogo da 8.ª Ré, que a promotora da sala VIP denominada “JJ” era a 8.ª Ré, esse facto foi confessado pelas 7.ª e 8.ª Rés na sua contestação e a 9.ª Ré optou por só contrariar esse facto apenas após a fase articulados;
21. Por outro lado, a fls. 559 dos autos, a autoridade competente da área de jogo, a DICJ, veio, em resposta ao ofício n.º 1417/2017/CV2-LC, de 17/05/2017, do Tribunal a quo, informar que não existe qualquer relacionamento entre II Resorts (Macau) S.A. e a JJ International Sociedade Unipessoal;
22. Contudo, apesar de não ter sido emitida licença para uma actividade de jogo, é incontestável que a 8.ª Ré estava a operar uma sala VIP de jogo, denominada JJ dentro do Casino da II, com o consentimento e em benefício da 9.ª Ré;
23. Situação que configura uma clara violação do disposto no Regulamento Administrativo n.º 6/2002 (condições de acesso e de exercício da actividade de promoção de jogos de fortuna ou azar em casino);
24. Quanto à relação que a 8.ª Ré mantém com a 9.ª Ré, importa salientar que a confissão prestada pela 8.ª Ré, na sua contestação, demonstra que esta operava a sala de jogo JJ sita no Casino II, como é corroborado pela junção dos documentos de fls. 407 a 474 pela 8.ª Ré, que demonstram que se tratava de uma actividade de jogo desenvolvida pela 8.ª Ré no Casino II Macau da 9.ª Ré;
25. A actividade de promoção de jogos de fortuna ou azar em casino como está definida no artigo 2.º do Regulamento Administrativo, é aquela que visa promover jogos de fortuna ou azar ou outros jogos em casino, junto de jogadores, através da atribuição de facilidades, nomeadamente de transporte, alojamento, alimentação e entretenimento em contrapartida de uma comissão ou outra remuneração paga por uma concessionária;
26. Para apurar a responsabilidade das 7.ª, 8.ª e 9.ª Rés, não é crucial saber se foi através da celebração um contrato (formal) de promoção de jogo, ou de outro tipo de acordo ou Contrato, entre a 8.ª Ré e a 9.ª Ré, que esta concedeu à 8.ª Ré a operação de uma Sala VIP, sita no Casino II em Macau;
27. Saber se a 8.ª Ré era uma promotora de jogo licenciada, ou não, nos termos dos artigos 6.º e ss. do Regulamento Administrativo n.º 6/2002 (tal como foi inicialmente indicado a Autora e foi também confessado pelas 7.ª e 8.ª Rés) é apenas relevante para certificar a ilegalidade de uma actividade de jogo numa sala de jogo sita no Casino II de Macau com o mesmo nome da 8.ª Ré, o arrepio das normas legais;
28. Mesmo que a 8.ª não esteja licenciada para exercer uma actividade de jogo, nada impede que a natureza jurídica dessa actividade na sala de jogo sita no Casino II seja qualificada como actividade de jogo, nos termos do artigo 2,º do Regulamento Administrativo;
29. De resto, se a concessionária de exploração de jogos é responsável pelas actividade exercidas pelos promotores de jogos nos seus casinos - tal como tem sido entendimento deste Tribunal, vg. Acórdão n.º 840/2017, proferido em 11 de Julho de 2019 - também tem de ser responsável pelas actividades exercidas nos seus casinos por entidades não licenciadas mas, ainda assim, autorizadas pelas concessionárias;
30. A actividade dos promotores de jogo e dos colaboradores está preceituada no artigo 17.º sendo que o artigo 31.ºdo Regulamento Administrativo n.º6/2002, refere que as sociedades promotoras de jogos de fortuna ou azar, como era o caso da 8.ª Ré, mesmo que não licenciada, são solidariamente responsáveis com os seus empregados e colaboradores pelas actividades desenvolvidas por estes nos casinos;
31. Tal como foi referido pela testemunha K, no registo da sua inquirição acima mencionado, a 9.ª Ré Considerava que a 8.ª Ré era o Junket responsável pela actividade de promoção de jogo e a 9.ª Ré beneficiou dos depósitos realizados na sala de jogo VIP da JJ;
32. Por outro lado, a 9.ª Ré beneficiou dos depósitos realizados na sala de jogo VIP da JJ e, para isso, a 8.ª Ré fornecia informação ao Casino II sobre todos os depósitos de fichas e numerário, tal como foi confessado por aquela;
33. A 8.ª Ré desenvolveu a sua actividade sem um contrato formal de promoção de jogos com a 9.ª Ré, e o facto de a 8.ª operar a Sala VIP de jogo JJ sita neste casino, teve reflexo directo e concreto na actividade da exploração de jogo da 9.ª Ré como concessionária, nomeadamente, para efeito da divisão das receitas de jogo naquela sala VIP;
34. Nos termos previstos na Lei n.º 16/2001 e no Regulamento Administrativo n.º 6/2002, designadamente os artigos 30.º e 32.º deste último diploma, impende sobre a 9.ª Ré a obrigação legal de fiscalizar e supervisionar a actividade de jogo da 8.ª Ré no seu Casino;
35. Nos termos do artigo 29.º do Regulamento Administrativo n.º 6/2002, as Concessionárias, como é o caso da 9.ª Ré, são solidariamente responsáveis pelas actividades desenvolvidas nos casinos pelas promotoras de jogo, seus administradores e colaboradores (note-se que, mesmo que a 8.ª Ré não seja uma promotora de jogo licenciada, desenvolvia essa actividade em benefício da 9.ª Ré e no limite tem de ser considerada como colaboradora dessa actividade de promoção);
36. No que toca à responsabilidade estipula o artigo 493.º, n.º 1 do Código Civil, que o comitente responde, independentemente de culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaía também a obrigação de indemnizar;
37. Pelo que a 8.ª e 9.ª Rés são solidariamente responsáveis, com as restantes Rés, pela restituição à Autora das fichas de jogo ou do seu valor monetário equivalente a HKD$25.000.000,00, acrescidos dos juros de mora, quantia correspondente ao total do valor das fichas de jogo que foram retiradas da sala de jogo VIP que opera no Casino da 9.ª Ré, nos termos de todos os diplomas normativos acima mencionados;
e
38. O Tribunal a quo, na sua decisão em crise, de fls. 1154 a 1167, violou a Lei 16/2001 e o Regulamento Administrativo n.º 6/2002, designadamente os artigos 29.º, 30.º e 32.º deste último diploma, e o artigo 493.º, n.º 1 do Código Civil.
Nestes termos, e nos mais de Direito aplicáveis que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso, bem como, nessa conformidade, condenar as 8.ª e 9.ª Rés solidariamente com as 1.ª a 7.ª Rés, a restituir o montante de HKD$25.000.000,00 à Recorrente, acrescida dos juros legais à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento no pedido.
Relativamente ao recurso interposto pela Autora a 9ª Ré veio responder apresentando as seguintes conclusões para as suas contra alegações:
(i) O artigo 29.º do Regulamento Administrativo n.º 6/2002 não enuncia um princípio de responsabilidade das concessionárias de jogo perante terceiros por actos dos promotores de jogo;
(ii) O Regulamento Administrativo n.º 6/2002 é um regulamento complementar;
(iii) O seu artigo 29.º regulamenta o n.º 3 do artigo 23.º da Lei n.º 16/2001 e consequentemente só trata da responsabilidade das concessionárias perante o Governo, por actos praticados por promotores de jogo com os quais tem relação;
(iv) Interpretação diversa do referido artigo 29.º importa que as concessionárias respondam objectivamente perante terceiros por obrigações dos promotores de jogo, por estes contraídas no exercício da própria empresa, como se aquelas fossem suas fiadoras ope legis;
(v) Isso representaria um risco extremo e injustificado, não explicado por qualquer circunstância especial da relação que se estabelece entre concessionárias e promotores;
(vi) Os promotores de jogo são entidades autónomas, actuam em concorrência virtual com as concessionárias e estão sujeitos exames à escrita e auditorias do regulador, corporizado na DICJ;
(vii) Por conseguinte, o artigo 29.º não responsabiliza as concessionárias perante terceiros por obrigações dos promotores, contraídas no exercício da própria empresa;
(viii) Se o legislador tivesse querido instilar-Ihe esse sentido, tê-lo-ia expressado em termos inequívocos;
(ix) O Tribunal a quo não teve de citar a norma contida na alínea 5) do artigo 30.º do Regulamento Administrativo n.º 6/2002, para concluir pela absolvição da Recorrida, porque a mesma só poderia ser aplicada com apoio em matéria de facto que não se provou por não ter sido quesitada, pelo que a sua invocação pela Recorrente é desajustada e incurial.
Pela 1ª Ré foram apresentadas as seguintes conclusões de recurso:
1. A, 1ª ré nos autos, ora recorrente, está inconformada com a decisão judicial de 11 de Outubro de 2019, ou seja, a decisão recorrida, onde se lê o seguinte:
“IV – Decisão
Em face de todo o que fixa exposto e justificado, o Tribunal julga procedente parcialmente a acção e, em consequência, decide:
1. Absolver a 8ª ré, JJ Internacional Sociedade Unipessoal Lda. JJ國際一人有限公司), e 9ª ré, II Resorts Macau, S.A. (II度假村(澳門)股份有限公司), dos pedidos formulados pela autora, Companhia de EE Internacional Lda (EE國際有限公司).
2. Condenar solidariamente a 1ª ré, A, e a 6ª ré, H (H), a restituir à autora a quantia de HKD$20.000.000,00, acrescida de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento.
3. Condenar solidariamente a 2ª, B (B), e a 6ª ré a restituir à autora a quantia de HKD$1.000.000,00, acrescida de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento.
4. Condenar solidariamente a 4ª, D (D), e a 6ª ré a restituir à autora a quantia de HKD$1.000.000,00, acrescida de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento.
5. Condenar solidariamente a 3ª, C (C), e a 5ª ré, F (F), a 6ª ré e a 7ª ré, G (G), a restituir à autora a quantia de HKD$15.000.000,00, acrescida de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento.
6. Condenar solidariamente (sic) a 6ª ré a restituir à autora a quantia de HKD$1.000.000,00, acrescida de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até integral e efectivo pagamento.
50% das custas a cargo da autora pelo decaimento dos pedidos formulados contra as 8ª e 9ª rés e as restantes 50% pela 1ª a 7ª rés na proporção dos decaimentos.
Registe e notifique.”
2. A recorrente discorda do teor desta e está inconformada com o juízo de facto do Tribunal recorrido e os fundamentos deste, pelo que vem interpor o presente recurso com os seguintes fundamentos de facto e de direito.
3. No entender da recorrente, a sentença impugnada não considerou a coerência dos factos assentes nem a lógica nestes, o que conduziu ao erro no juízo de facto, pelo que deve ser revogada pela construção viciosa.
4. Primeiro: do facto ocorrido em 23 de Janeiro de 2013, pelas 18h06:
5. Segundo a decisão recorrida, a recorrente A entregou à 6ª ré, às 18h06 do dia 23 de Janeiro de 2013, fichas no valor de HKD$10.000.000,00.
6. No entanto, foi omitido, quer nos factos provados quer na convicção dos factos, um facto importante, ou seja, a falada “entrega” aconteceu no “local de trabalho”, isto é, a tesouraria da autora.
7. De acordo com o entendimento da recorrente, a 6ª ré era a pessoa com o maior poder na tesouraria da autora. Pelo que a 6ª ré tinha todo o poder funcional para dar instruções à recorrente no sentido de lhe entregar fichas no valor de HKD$10.000.000,00, ordens a que a recorrente devia obedecer.
8. Não se tratou de “colaboração”, mas antes uma “instrução de trabalho”, ou seja, um poder conferido à 6ª ré pela autora.
9. É obviamente contrário ao senso comum assertar que o facto de a recorrente ter entregue, no local e tempo acima referidos, fichas de HKD$10.000.000,00 à 6ª ré foi um acto de “colaboração”, a não ser que fique provado que a recorrente tenha beneficiado desse acto, tais como recebeu retribuição pecuniária ou outro bem de valor.
10. Refere a sentença recorrida que “Não está, porém, demonstrado que as primeira a quinta rés tenham praticados os actos em obediência a ordens e instruções dadas pela sexta ré, na qualidade de superior hierárquico.” – Vide fls. 1161v dos autos, 16ª a 18 linhas.
11. Contudo, desde que ficou provado que a 6ª ré era a superior hierárquica da recorrente e também a pessoa com o maior poder na tesouraria da autora, incluindo o de mobilizar as fichas, porque a falada actuação da recorrente, praticada consoante a ordem da 6ª ré, não podia ser considerada como uma obediência, embora presumida, à instrução de trabalho!
12. Por outro lado, as provas documentais (documentos e videogravação) mostram que a recorrente não recebeu da 6ª ré qualquer benefício. Então, porque a recorrente fez isso (entregar os fichas à 6ª ré no local de trabalho)?
13. Só pode haver uma resposta: obedecer à ordem superior. Só assim se pode explicar porque a recorrente praticou o acto acima referido.
14. Sendo legítimo e não envolvendo nenhuma fraude, ilicitude nem benefício, o referido acto não gerou qualquer dever de indemnização.
15. Acresce que, a 6ª ré foi contratada pela autora, que por sua vez anunciou publicamente, a todos os funcionários da tesouraria, que a 6ª ré, enquanto funcionária com o mais elevado poder (o mesmo poder também pertencia ao dono da autora, com certeza) na tesouraria, dispunha do pleno poder executivo em termos da coordenação e organização de pessoal e trabalho e mobilização de fichas na tesouraria.
16. Assim sendo, a referida mobilização de fichas, efectuada sob instrução da 6ª ré, devia ter sido considerada como um acto praticado consoante “ordem superior”, em vez duma “cooperação entre a 6ª ré e a recorrente” com o fim de subtrair da tesouraria da autora fichas no valor de HKD$10.000.000,00.
Isso é perfeitamente lógico, e era exactamente o que a recorrente estava a pensar ao actuar.
17. Não houve, portanto, nenhum dolo ou negligência da recorrente que tivesse causado qualquer dano à autora, nem devendo a recorrente assumir o dever de indemnização.
18. Por conseguinte, a decisão recorrida deve ser revogada nesta parte devido ao erro no juízo de facto.
19. Segundo: do facto que teve lugar em 26 de Janeiro de 2013, pelas 23h23:
20. Conforme a decisão recorrida, ficou provado que, em 26 de Janeiro de 2013, pelas 23h23, a recorrente depositou, sob instrução da 6ª ré, fichas da tesouraria da autora, no valor de HKD$10.000.000,00, na conta designada “XX JJ (XXJJ)” criada pela 8ª ré JJ Internacional Sociedade Unipessoal Lda. no mesmo estabelecimento de jogo.
21. A natureza deste episódio é semelhante à do anterior referido caso ocorrido no dia 23 de Janeiro de 2013, pelas 18h06: a ver da recorrente, a 6ª ré era a pessoa mais poderosa na tesouraria da autora, pelo que tinha o poder de dar instruções de trabalho da recorrente.
22. Na verdade, conforme depuseram várias testemunhas trabalhadoras na tesouraria em causa, elas sabiam que a 6ª ré dava instruções aos funcionários ou chefe da tesouraria para movimentos de específicas fichas entre a supra dita conta e a conta da autora.
23. Consoante alegaram as testemunhas, isso acontecia porque cada sala VIP tinha as suas próprias fichas de jogo, sendo comum a “troca/retoma das suas fichas”.
24. Por isso, é óbvio que o referido facto ocorrido em 26 de Janeiro de 2013, pelas 23h23, deveu-se a uma “ordem de trabalho” hierarquicamente superior.
25. Além disso, é manifestamente contrário ao senso comum assertar que o respectivo acto da recorrente de depositar fichas de HKD$10.000.000,00 em 26 de Janeiro de 2013, pelas 23h23, deveu-se ao dolo e negligência e causou danos à autora. A não ser que fique provado que a recorrente tenha beneficiado dessa “cooperação” com a 6ª ré, tais como recebeu retribuição pecuniária ou outro bem de valor.
26. Contudo, desde que ficou provado que a 6ª ré era a superior hierárquico da recorrente e também a pessoa com o maior poder na tesouraria da autora, incluindo o de mobilizar as fichas, porque a falada actuação da recorrente, praticada consoante a ordem da 6ª ré, não podia ser considerada como uma obediência, embora presumida, à instrução de trabalho!
27. Por outro lado, as provas documentais (documentos e videogravação) mostram que a recorrente não recebeu da 6ª ré qualquer benefício. Então, porque a recorrente fez isso?
28. A resposta não pode ser outra que obedecer à ordem superior. Só assim se pode explicar porque a recorrente praticou o acto acima referido.
29. Sendo legítimo e não envolvendo nenhuma fraude, ilicitude nem benefício, o referido acto não gerou qualquer dever de indemnização.
30. Acresce que, a 6ª ré foi contratada pela autora, que por sua vez anunciou publicamente, a todos os funcionários da tesouraria, que a 6ª ré, enquanto funcionária com o mais elevado poder (o mesmo poder também pertencia ao dono da autora, com certeza) na tesouraria, dispunha do pleno poder executivo em termos da coordenação e organização de pessoal e trabalho e mobilização de fichas na tesouraria.
31. Assim sendo, a referida mobilização de fichas, efectuada sob instrução da 6ª ré, devia ter sido considerada como um acto praticado consoante “ordem superior”, em vez duma “cooperação entre a 6ª ré e a recorrente” com o fim de subtrair da tesouraria da autora fichas no valor de HKD$10.000.000,00.
32. Isso é perfeitamente lógico do ponto de vista da experiência comum, e era exactamente o que a recorrente estava a pensar.
33. Não houve, portanto, nenhum dolo ou negligência da recorrente que tivesse causado qualquer dano à autora, nem devendo a recorrente assumir o dever de indemnização.
34. Por conseguinte, a decisão recorrida deve ser revogada nesta parte devido ao erro no juízo de facto.
Pela 2ª, 3ª e 4ª Rés foram apresentadas as seguintes conclusões e pedidos de recurso:
i. Reconhecimento incorrecto da matéria de facto
1. Consideram as recorrentes que é incorrecta a resposta dada pelo Tribunal a quo aos quesitos 31.º a 35.º, 38.º e 39.º da base instrutória, nos termos do art.º 599.º e 629.º do Código de Processo Civil, vêm impugnar a decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto, o que fazem com fundamentos seguintes:
2. Salvo o devido respeito, as recorrentes não se conformam com o entendimento do Tribunal a quo sobre a decisão da matéria de facto em causa.
3. Ficaram provados sobre os quesitos 6.º a 8.º, 14.º a 18.º, 21.º e 23.º da base instrutória que a 6.ª Ré deu instruções às três recorrentes para praticarem o acto de levantamento de fichas da sala VIP da Autora.
4. Segundo os factos indicados no quesito 1.º, os contratos de trabalho constantes nos documentos n.ºs 5 a 7 e 9 da petição inicial, as três recorrentes trabalhavam na tesouraria da recorrida, bem como a 6.ª Ré exercia funções como gerente na tesouraria da recorrida.
5. Daí podemos verificar que, perante a situação em que as três recorrentes e a 6.ª Ré, todas exerciam funções na tesouraria da recorrida, evidentemente o cargo exercido pela 6.ª Ré é mais elevado de que o das três, como superior hierárquica das mesmas.
6. Além disso, segundo os registos de transferência de fichas (vulgarmente conhecido por “livro grande”) das contas dos clientes da recorrida N e O, neles consta claramente a frase “movimentação apenas por P e Q”, bem como segundo o registo comercial da recorrida, documento n.º1 da petição inicial, pode-se provar que **, P é sócio e membro do órgão de administração da recorrida.
7. Daí podemos saber que, da supracitada frase “movimentação apenas por P e Q”, Q refere-se à 6.ª Ré H e, P refere-se a **, P, sócio e membro do órgão de administração da recorrida.
8. Em conjugação com o registo comercial, documento n.º1 da petição inicial, respeitante ao art.º 6.º, n.º6, al. a) do Estatuto da recorrida, a função de gerente da tesouraria da autora exercida pela 6.ª Ré e mais a especificação indicada no “livro grande”, pode-se saber que pode **, P, como sócio e membro do órgão de administração da recorrida, juntar com a 6.ª Ré, gerente da tesouraria, exercer o poder de movimentação das fichas dos clientes constantes do “livro grande”.
9. Ou seja, à 6.ª Ré, como gerente da tesouraria, foi-lhe atribuído o poder de movimentar directamente as fichas dos clientes constantes do “livro grande”.
10. Além disso, da expressão “movimentação apenas por P e Q” indicada no “livro grande”, evidentemente a palavra “apenas” significa que podem **. P e a 6.ª Ré movimentar as fichas dos clientes constantes do “livro grande”, e outra pessoa não tem tal poder para movimentar as fichas dos clientes constantes do “livro grande”.
11. Daí pode-se verificar que a 6.ª Ré, como superior hierárquica das três recorrentes, no exercício das funções, tinha o poder para mandar as três recorrentes para dispor as fichas dos clientes constantes do “livro grande” (art.º 11.º, n.º1, al. 4) e n.º2 da «Lei das Relações de Trabalho»).
12. Quer dizer, mesmo que as três recorrentes tenham praticado os actos indicados nos quesitos 6.º a 8.º, 14.º a 18.º, 21.º e 23.º da base instrutória, as três só os fizeram em obediência às instruções e ordens dadas pela 6.ª Ré, superior hierárquica das mesmas, não tendo as três conseguido procurar saber junto da 6.ª Ré, nem tido a percepção se a 6.ª Ré tinha feito acto ilícito.
13. Além do mais, segundo as regras de experiência, podemos saber que, como um “trabalhador”, normalmente não se recusa a receber as instruções de trabalho dadas pelo superior hierárquico, também não vai procurar saber junto do superior hierárquico qual a finalidade das instruções de trabalho, mas sim vai fazê-lo conforme as instruções dadas pelo superior hierárquico.
14. Por outro lado, tanto nos factos provados como nos factos indicados nos quesitos de base instrutória, neles não se indicou que as três recorrentes, pela prática dos actos em causa, tivessem obtido qualquer benefício, ou seja, se tivessem aproveitado das fichas em causa. O valor envolvido nos autos é um valor bastante elevado, se as mesmas não tivessem simples e meramente praticado os actos em obediência às instruções de trabalho dadas pela 6.ª Ré, mas sim tivessem intenção de colaborar com esta, não era possível que as três não tivessem obtido qualquer benefício.
15. Sintetizado tudo o que acima foi exposto, segundo os contratos de trabalho, documentos n.ºs 5 a 7 e 9 da petição inicial, o certificado do registo comercial e o estatuto, documento n.º1 da petição inicial, bem como o “livro grande”, documento n.º7 da petição inicial, feita análise nos termos das regras de experiência, podemos retirar a conclusão de que as três recorrentes só praticaram os actos em obediência às instruções de trabalho dadas pela 6.ª Ré, bem como a 6.ª Ré, gerente da tesouraria, cabe-lhe o poder para movimentar as fichas dos clientes constantes do “livro grande”.
16. É de salientar que, todos os documentos acima indicados são provas documentais, sendo, evidentemente a sua força probatória mais alta de que a prova testemunhal, pelo que as recorrentes acreditam que qualquer cidadão normal, após analisado os dados existentes nos autos, pode verificar que o Tribunal a quo, na apreciação da prova, violou as regras gerais de experiência social de que as provas documentais são mais elevadas de que as provas testemunhais.
17. Tendo em consideração que as provas documentais e testemunhais em que se baseou a decisão da matéria de facto constam dos autos, nos termos do art.º 629.º, n,º1, al. a) do Código de Processo Civil, deve-se modificar a decisão da matéria de facto tomada pelo Tribunal a quo, dando como provados os factos indicados nos quesitos 31.º a 35.º, 38.º e 39.º da base instrutória.
ii. Errada interpretação e aplicação do art.º 477.º do Código Civil
18. Nos termos do art.º 477.º, n.º1 do Código Civil e do n.º1 do sumário do acórdão n.º92/2014 desse Tribunal, a responsabilidade civil não contratual deve reunir simultaneamente os cinco requisitos seguintes, sendo nenhum deles dispensável: 1) Facto, ou seja, acto voluntário ou omissão; 2) Ilicitude do acto, ou seja, violação dos direitos de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios; de terceiros; 3) Culpa, composta por culpa dolosa e culpa negligente; 4) Existência de dano, isto é, dano patrimonial e não patrimonial; 5) Existe um nexo de causalidade entre o acto ilícito e o dano.
19. As três recorrentes consideram que o caso em causa não reúne os dois requisitos de culpa e de dano, quanto ao seu pormenor é o seguinte:
i) Quanto à culpa
20. Salvo o devido respeito, as três recorrentes não se conformam com o entendimento do acórdão recorrido, a fls. 16.
21. Em primeiro lugar, se forem procedentes as razões da parte I do presente recurso, ou seja, se forem considerados como provados os factos indicados nos quesitos 31.º a 35.º, 38.º e 39.º da base instrutória, segundo o sentido contrário do entendimento do Tribunal a quo, as três recorrentes não têm culpa.
22. Contudo, caso não sejam procedentes as razões da parte I do presente recurso, entendem as três que o caso delas também não reúne o requisito de culpa.
23. Nos autos, segundo os factos indicados no quesito 27.º da base instrutória, ficou provado que nos dias 22 e 28 de Janeiro de 2013, a 6.ª Ré era gerente da tesouraria da sala VIP da recorrida, e segundo os factos indicados nos quesitos 31.º e 33.º da base instrutória, ficou provado que o cargo da 6.ª Ré, enquanto trabalhadora da recorrida, era mais elevado de que o das 2.ª e 4.ª Rés.
24. Daí podemos verificar que, segundo as experiências diárias, a 6.ª Ré, na qualidade de superior hierárquica das três recorrentes, tinha direito a dar instruções de trabalho às três, enquanto as mesmas tinham que cumprir as instruções de trabalho dadas pela 6.ª Ré.
25. Segundo os factos indicados no quesito 34.º da base instrutória, ficou provado que consta do registo de transferência das fichas (vulgarmente conhecido por “livro grande”) das contas dos clientes da autora N e O, a frase expressa “movimentação apenas por P e Q”. Nela, evidentemente, “Q” refere-se à 6.ª Ré H.
26. Em conjugação com as experiências diárias, podemos saber que a 6.ª Ré, na qualidade de gerente da tesouraria e na situação em que podia movimentar as fichas dos clientes da autora N e O, segundo a expressão constante do “livro grande”, cabe-lhe dar instruções de trabalho aos seus subordinados sobre a movimentação das respectivas fichas.
27. Ficaram provados nos quesitos 6.º a 8.º, 14.º a 18.º, 21.º e 23.º da base instrutória que a 6.ª Ré tinha dado instruções às três recorrentes para levantarem fichas da sala VIP da recorrida.
28. Daí podemos saber que nos quesitos só ficou provado que as três recorrentes praticaram os actos em obediência às instruções dadas pela 6.ª Ré, na qualidade de superior hierárquica das três recorrentes e gerente da tesouraria da recorrida, as três recorrentes só praticaram os actos em obediência das instruções dadas pela 6.ª Ré.
29. Por outro lado, tanto nos factos provados como nos factos indicados nos quesitos de base instrutória, neles não se indicou que as três recorrentes, pela prática dos actos em causa, tivessem obtido qualquer benefício, ou seja, tivessem se aproveitado das fichas em causa. O valor envolvido nos autos é um valor bastante elevado, se as mesmas não tivessem simples e meramente praticado os actos em obediência às instruções de trabalho dadas pela 6.ª Ré, mas sim tivessem intenção de colaborar com ela, não era possível que as três não tivessem obtido qualquer benefício.
30. De acordo com o critério de culpa abstracta, podemos verificar caso a situação das três recorrentes seja substituída por qualquer pessoa normal, como um “trabalhador normal”, normalmente não vai recusar-se das instruções de trabalho dadas pelo seu superior hierárquico, nem procurar saber, junto do superior hierárquico, qual a finalidade das instruções de trabalho, mas sim vai fazê-lo conforme as instruções do superior hierárquico.
31. Daí podemos verificar que, de maneira nenhuma, as três recorrentes não tinham culpa nos respectivos actos.
32. A partir de um outro ponto de vista, nos termos do art.º 480.º, n.º1 do Código Civil, nos autos deve caber à recorrida provar que as três recorrente tinham culpa nos actos, contudo, tal como acima foi indicado, feita uma análise sistemática, nos termos dos factos provados conjugados com as regras gerais de experiência, de maneira nenhuma, não se pode seguramente concluir que as três tenham culpa, pelo que, perante a situação de in dubio pro reo, deve ser tomada uma decisão desfavorável à parte que lhe cabe fazer prova, ou seja decisão desfavorável à recorrida.
33. Com base nisso, fundamentalmente a situação das três recorrentes não reúne o requisito de culpa.
ii) Quanto ao dano
34. Na contestação, as três recorrentes alegaram que de acordo com os contextos da petição inicial, as fichas em causa devem ser levantadas das contas dos clientes da sala VIP da recorrida, pelo que devem os clientes da sala VIP da recorrida quem sofrem os prejuízos resultantes dos actos, mas não a recorrida.
35. As três recorrentes estão de acordo com o entendimento do despacho, a fls. 344 dos autos, segundo as experiências diárias, podemos saber que há duas situações sobre o levantamento das fichas dentro da sala de jogo, uma é que o cliente desloca-se pessoalmente à sala de jogo para adquirir fichas de jogo, a fim de jogar, a outra situação é que o cliente tem uma conta na sala de jogo e na sua conta própria já há fichas, e basta o cliente dirige-se à sala de jogo para levantar fichas da sua conta, a fim de jogar.
36. Nos autos, existe uma diferença entre as duas situações, se for a primeira situação, ou seja, se as 1.ª a 6.ª Rés tivessem falsificado os registos de clientes de terem adquirido fichas junto da sala de jogo para jogar, e levantado as fichas da sala de jogo, seria a sala de jogo (ou seja, a recorrida) quem sofre directa e verdadeiramente os prejuízos;
37. Se for a segunda situação, ou seja, se as 1.ª a 6.ª Rés tivessem falsificado os registos de clientes de terem levantado das contas próprias existentes na sala de jogo, e levantado as fichas das contas de clientes, seriam os clientes quem sofrem directa e verdadeiramente os prejuízos, razão por que, tais clientes têm contas próprias na sala de jogo com fichas, o direito de propriedade das fichas pertence aos clientes, e o levantamento das fichas das contas não requer o consentimento da sala de jogo, mas sim o consentimento dos clientes. Caso as fichas tenham sido levantadas das contas sem que os clientes tivessem autorizado, evidentemente, isto viola o direito de propriedade dos clientes sobre as fichas, mas não viola o da sala de jogo (ou seja a recorrida), os prejuízos eventualmente sofridos pela recorrida são os prejuízos resultantes da indemnização por si paga aos clientes.
38. Face ao despacho de fls. 344, a recorrida deu a resposta, a fls. 347 e 348, bem como sanou os factos dos art.ºs 28.º a 31.º da petição inicial.
39. Os respectivos factos constam nos quesitos 22.º, 24.º e 25.º da base instrutória, do despacho saneador, contudo, realizada a audiência de julgamento, tais factos não foram provados.
40. Pelo que, não foi provada a alegada alteração dos registos de levantamento de fichas, das contas dos clientes da recorrida por partes das 1.ª a 6.ª Rés.
41. Na realidade, os factos dos quesitos 6.º a 8.º, 14.º a 18.º, 21.º e 23.º da base instrutória só provaram que a 6.ª Ré deu instruções às três recorrentes para praticar o acto de levantamento das fichas, da sala VIP da recorrida.
42. Tal como acima foi indicado, há duas situações sobre o levantamento das fichas da sala de jogo, os factos provados, de nenhuma maneira, não podem mostrar claramente se as fichas que tenham sido levantadas directamente da sala de jogo da recorrida, pertencessem à recorrida, ou as fichas que tenham sido levantadas das contas abertas pelos clientes na sala de jogo da recorrida, pertencessem aos clientes.
43. Ou, se calhar podemos dizer que os factos provados, de nenhuma maneira, não podem mostrar claramente se as fichas em causa pertencem à recorrida ou aos clientes da recorrida.
44. Tal como acima foi indicado, há diferença entre as duas situações, caso as fichas tenham sido levantadas da conta do cliente, que pertencem ao cliente, é o cliente quem sofre verdadeiramente os prejuízos mas não a recorrida, segundo os factos provados, não há facto que a recorrida tenha indemnizado os respectivos clientes, ou os respectivos clientes, através de via qualquer, tenham exigido a indemnização da recorrida.
45. A partir de um outro ponto de vista, nos autos deve caber à recorrida provar se as fichas que pertencessem à recorrida, tivessem sido levantadas directamente da sala VIP da recorrida ou, se as fichas que pertencessem aos clientes, tivessem sido levantadas das contas abertas pelos clientes na sala de jogo da recorrida, bem como, se as fichas em causa pertencem à recorrida ou se pertencem aos clientes da recorrida. Contudo, tal como acima foi indicado, os factos provados, de nenhuma maneira, não podem mostrar claramente as situações, pelo que perante a situação de in dubio pro reo, deve ser tomada uma decisão desfavorável à parte que lhe cabe fazer prova, ou seja decisão desfavorável à recorrida.
46. Com base nisso, a situação das três recorrentes fundamentalmente não reúne o requisito de dano.
47. Sintetizado tudo o que acima foi exposto, uma vez que não se verificam os requisitos de culpa e dano constituintes da responsabilidade civil não contratual, evidentemente o acórdão recorrido erradamente interpretou e aplicou o art.º 477.º, n.º1 do Código Civil.
Caso V. Ex.as assim não entendam,
iii. Violação da jurisprudência do acórdão do TUI n.º69/2010
48. Sobre a responsabilidade por indemnização, o Tribunal a quo condenou as três recorrentes a pagar juros de mora, à taxa legal, contados a partir de 28 de Janeiro de 2013 até seu efectivo e integral pagamento.
49. Salvo o devido respeito, as três recorrentes não se conformam com o entendimento do acórdão recorrido, a fls. 26 a 27.
50. Em primeiro lugar, tal como foi indicado pelo Tribunal a quo, a responsabilidade por indemnização resulta de actos ilícitos, contudo, entende o Tribunal a quo que os juros de mora devem ser calculados a partir da data em que foram praticados os actos ilícitos.
51. Contudo, indicou também a uniformização de jurisprudência do TUI no processo n.º69/2010 que, a indemnização pecuniária por facto ilícito, por danos patrimoniais ou não patrimoniais, vence juros de mora a partir da data da decisão judicial que fixa o respectivo montante, nos termos dos artigos 560.º, n.º 5, 794.º, n.º 4 e 795.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil, seja sentença de 1.ª Instância ou de tribunal de recurso ou decisão na acção executiva que liquide a obrigação. (sublinhado pelas três recorrentes)
52. A supracitada jurisprudência foi publicada no Boletim Oficial da RAEM, n.º12, de 21 de Março de 2011, I Série, Suplemento.
53. Nos termos do art.º 652.º -C do Código de Processo Civil, é aplicável ao presente caso a supracitada jurisprudência.
54. Isto quer dizer, a responsabilidade de indemnização por dano pecuniário causada à recorrida pelos actos ilícitos praticados pelas três recorrentes, cujos juros de mora devem ser calculados a partir da data da decisão de primeira instância que fixe o respectivo montante.
55. Além disso, tal como foi indicado pela recorrida no art.º 30.º da petição inicial, tendo a recorrida apresentado, junto do Ministério Público, denúncia dos actos ilícitos de todas as rés nos autos, se for deduzia a acusação contra os respectivos casos criminosos, podem as três recorrentes envolver no crime de abuso de confiança.
56. Na realidade, segundo os casos de abuso de confiança julgados pelo tribunal, no processo civil enxertado no processo criminal, quanto à indemnização resultante dos actos ilícitos, sempre foi condenado o pagamento dos juros de mora calculados a partir da data da decisão, mas não a partir da data em que foi praticado o acto ilícito.
57. Com base nisso, quanto à parte da decisão que condenou as três recorrentes ao pagar juros de mora, a qual, evidentemente, violou a uniformização de jurisprudência indicada no acórdão n.º69/2010 do TUI.
iv. PEDIDO
Pelo acima exposto e contando com o douto entendimento de V. Ex.as, deve-se julgar procedente o presente recurso e em consequência,
- Nos termos do art.º 629.º, n.º1, al. a) do Código de Processo Civil, alterar a decisão da matéria de facto tomada pelo Tribunal a quo, dando como provados os factos indicados nos quesitos 31.º a 35.º, 38.º e 39.º da base instrutória e, segundo todos os factos provados já alterados e a lei aplicável, tomar uma decisão justa:
- Pelo que, nos termos do art.º 629.º, n.º2 do Código de Processo Civil, requer-se a apreciação de novo de todas as provas documentais nos autos;
- Revogar a decisão recorrida e absolver as três recorrentes do pedido, razão por que erradamente interpretou e aplicou o art.º 477.º, n.º1 do Código Civil;
- Caso assim não se entenda,
- Revogar a parte da decisão que condenou as três recorrentes ao pagar os juros de mora, razão por que tal parte violou a jurisprudência do TUI proferida no processo n.º69/2010.
Pela 5ª Ré foram apresentadas as seguintes conclusões e pedidos de recurso:
1. Nos autos, o acórdão recorrido condenou a recorrente, as 3.ª, 6.ª e 7.ª Rés a restituir solidariamente à Autora HK$15.000.000,00, acrescido de juros calculados à taxa de 9,75% ao ano, desde 28 de Janeiro de 2013 até seu integral e efectivo pagamento.
2. Em suma, a interposição do presente recurso tem como fundamento o seguinte: Não é correcta a apreciação feita pelo acórdão recorrido quanto aos factos abaixo indicados e parte das filmagens constante dos autos pode conduzir um outro julgamento da matéria de facto diferente do julgamento do acórdão recorrido;
- Pela prática do acto, a recorrente abusou da sua qualidade de empregada da Autora;
- Os poderes atribuídos à 6.ª Ré não incluem a disposição das fichas da Autora existentes na tesouraria e a movimentação dos fundos da conta de clientes que à recorrente foram solicitadas.
3. Por um lado, o acórdão recorrido considerou que os poderes atribuídos pela Autora à 6.ª Ré não eram ilimitados, mas em conjugação com os depoimentos prestados pelas testemunhas, o acórdão recorrido admitiu que, segundo os poderes atribuídos pela Autora à 6.ª Ré, na observação de determinado procedimento e formalidades, as empregadas da tesouraria retiraram as fichas para fora da tesouraria da Autora conforme as instruções e ordens dadas pela 6.ª Ré.
4. Por outro lado, o acórdão recorrido acabou por considerar que, na contratação da 6.ª Ré, a Autora não atribuiu à última o poder para solicitar as primeiras cinco Rés para disporem as fichas da tesouraria da Autora e movimentarem os fundos existentes nas contas de clientes, bem como deu como provado que os actos praticados pelas seis primeiras Rés abusaram das qualidades de empregadas da Autora.
5. O supracitado fundamento do acórdão recorrido baseou-se nas imagens do vídeo onde foi filmado que as Rés, utilizavam folha de papel, envelope ou envelope de papel Kraft para servir de encobrimento, bem como trataram as fichas na gaveta e depois levaram-nas para fora da tesouraria da Autora, daí resultou a convicção de que as Rés tinham intenção de evitar que os seus actos fossem captados pelas câmaras.
6. Feita análise das imagens do vídeo publicadas na audiência que respeitam à recorrente, quanto ao acto de tratamento das fichas feito pela recorrente, mesmo que tenha praticado sob as instruções e ordens dadas pela 6.ª Ré, o acórdão recorrido só geralmente considerou que o acto da recorrente tinha intenção de evitar a captação da câmara, e pelo que considerou que o acto abusou da qualidade da empregada da Autora.
7. O acórdão recorrido omitiu a análise de uma série de actos praticados pela recorrente antes e depois.
8. Caso tenham sido analisados todos os actos da recorrente, é capaz provar que a recorrente não tinha qualquer intenção de evitar a captação da câmara, caso contrário, tal entendimento está contra as regras de experiências.
9. Devido a esta omissão, é inevitável que o conteúdo do acórdão tem deficiência e contradição.
10. Uma vez que o acórdão recorrido apresentou julgamento incorrecto previsto no art.º 599.º, n.º1, als. a) e b) do Código de Processo Civil e impôs, sobre a parte concreta da matéria de facto, decisão diversa da recorrida, pede-se a V. Ex.as que seja alterada a decisão do acórdão recorrido sobre a matéria de facto e absolvida a recorrente do pedido.
Pedido
1. Pede-se que seja admitida a alegação em causa;
2. Pede-se que sejam julgados procedentes todos os factos e fundamentos jurídicos expostos na alegação;
3. Para os devidos efeitos, nos termos do art.º 629.º, n.º1 do Código de Processo Civil, deve-se alterar a decisão da matéria de facto tomada pelo acórdão recorrido, e nos termos das disposições seguintes, proceder, ou ordenar proceder a todas as medidas que considere necessários; e
4. Deve ser absolvida a recorrente do pedido; e
5. Deve a Autora suportar as custas judiciais e respectivos encargos; e
6. Tendo em consideração a insuficiência da capacidade financeira da recorrente, pede-se a V. Ex.as que se dignem dispensar a recorrente do pagamento de eventuais custas judiciais resultantes do presente recurso.
Relativamente aos recursos interpostos pelas 1ª a 5ª Rés a Autora veio responder apresentando as seguintes conclusões para as suas contra alegações:
i) As ora Recorrentes (as 1.ª a 5.ª Rés) não se conformam com a douta decisão datada de 11 de Outubro de 2019, nas suas alegações, as ora Recorrentes tentam contrariar a fundamentação vertida no acórdão, com base na interpretação que fazem da prova produzida;
ii) Não é verdade, como pretende a 1.ª Ré, que tenha ficado provado que “a 6.ª Ré era a superior hierárquica máxima da tesouraria da Autora e podia ela instruir a movimentação das fichas na tesouraria da Autora”;
iii) Consequentemente, é errado concluir que os actos da 1.ª Ré devem ser considerados como actos de obediência a instruções de trabalho, ainda que seja presumida.
iv) Importa fazer notar que o quesito 38.º - “Quando a autora contratou a 6.ª Ré, conferiu-lhe poderes para dar ordens às primeira a quinta rés relativamente a levantamento e depósito de fichas de jogo da sala VIP da própria autora” e o quesito 39º - “A Autora concedeu poderes à 6.ª ré para movimentar as contas de clientes”, não foram dados como provados;
v) A não obtenção de benefícios nunca é desculpa para justificar a prática de actos ilícitos;
vi) Não é possível defender que os actos de levantamentos praticados pela 1.ª Ré foram realizados em obediência a ordem e instruções de trabalho da 6.ª Ré, quando, é fácil constatar, através do visionamento das gravações de CCTV realizadas na sala VIP da Autora, que as fichas de jogo foram retiradas da gaveta da tesouraria da Autora de forma oculta e dissimulada, pelo que a Rés sabiam, bem que os levantamentos não correspondiam, de certeza, a legitimas instruções de trabalho;
vii) A frase “movimentado apenas por P e Q”, nas fichas de registo dos movimentos da conta do cliente, invocada pelas 2.ª a 4.ª Rés, não significa, obviamente, que a 6.ª Ré, pudesse fazer o que quisesse em relação às ditas contas dos clientes, sem obter consentimento destes para movimentar as fichas de jogo, por escrito ou através de instrução telefónica que teria de ficar gravada no sistema informático, para segurança não só da Autora como também dos funcionários, de forma a demonstrar que procederam por instrução dos clientes;
viii) Conforme resulta das gravações de vídeo e dos depoimentos das testemunhas não foram recebidas instruções escritas nem foram recebidos ou feitos telefonemas para Clientes confirmar a validade dos levantamentos;
ix) As 2.ª a 4.ª Rés não podem ignorar que os valores movimentados, nomeadamente os referidos nos quesitos 6º a 8º, 14º a 18º, 21º e 23º, envolveram fichas de jogo com valores correspondentes a vários milhões de dólares de Hong Kong;
x) Não é normal que os levantamentos e depósitos de fichas de valores tão elevados, até no valor de HK$10.000.000,00, tenham sido realizados de maneira sorrateira, com as fichas escondidos em papel higiénico e sacos como se vê nas gravações de CCTV;
xi) Não é essa a experiência diária das operações de caixa de uma sala de jogo e a desculpa de “os trabalhadores não actuarem normalmente contra as instruções do superior hierárquico” não justifica nem iliba as Rés da evidente ilicitude da sua conduta;
xii) Ao contrário do que as Rés alegaram, as fichas foram retiradas na gaveta da tesouraria da Autora, sem cumprir as formalidades normais, porque as 1.ª a 5.ª Rés estavam a actuar de forma coordenada e em colaboração com a 6.ª Ré para subtrair fichas sem o consentimento e autorização da Autora, com perfeita consciência de estarem a praticar actos ilícitos e culposos;
xiii) As fichas foram retiradas directamente pelas Rés na gaveta de fichas de jogo negociáveis da Autora, e em momento posterior foram simulados como tratando-se de movimentos realizados por clientes em dias e horas que os registos de vídeo de CCTV facilmente demostram não ter existido;
xiv) As gravações de CCTV demonstram bem que as fichas de jogo foram retiradas da caixa da Autora e não de movimentos feitos em contas de clientes nenhuma das horas registadas como levantamentos nas contas dos clientes N (N) e O (O) corresponde a algum movimento feito nesse dia e hora;
xv) Assim, dúvidas não restam que as fichas de jogos pertencem de facto à Autora;
xvi) o Acórdão da fixação de jurisprudência do Tribunal de Última Instância, proferido no Proc. n.º 69/2010, publicado no Boletim oficial no dia 21 de Março de 2011, regula situação em que a obrigação de indemnização pecuniária por facto ilícito é ilíquida;
xvii) A regra de o devedor não pode cumprir enquanto não se apura o objecto da prestação, não se aplica nos presentes autos, pois a obrigação de restituição da quantia certa é líquida, uma vez que as Rés sabem, desde início, quanto devem restituir à Autora;
xviii) Nos presentes autos, que não ficou provado que os funcionários da tesouraria da sala de jogo da Autora podiam levar fichas para fora da sala em obediência a ordens e instruções da 6.ª Ré;
xix) A este respeito, a testemunha, R, funcionária da Autora, foi inquirida directamente pelo Juiz Presidente do Tribunal Colectivo na audiência de julgamento, e disse que, é absolutamente vedado aos funcionários da Autora transportarem fichas para fora da sala de jogo mesmo que seja a pedido do próprio cliente; a Autora não permite fazer isto. (vg. 39:56 - 40:58 da Gravação da audiência - Recorded on 24-0ct-2019 at 10.02.37 (2IO(%DOWN02520319));
xx) Se ocasionalmente isso sucedeu naquele Casino noutras circunstâncias, não significa que a prática de um acto em desobediência às regras de proibição dos funcionários transportarem fichas para outras salas passe a justificar os actos ilícitos cometidos pelas Rés;
xxi) O que foi tomado em consideração pelo Tribunal a quo, na pág. 12 da decisão da matéria de facto, é a necessidade de cumprir as formalidades dentro da sala de jogo da Autora;
xxii) A 5.ª Ré errou na leitura dos fundamentos dados pelo Tribunal a quo quanto a competência e poderes conferidos à 6.ª Ré, nomeadamente, na pág. 13 da decisão da matéria de facto, “Ora, se a Autora tivesse dado poderes ilimitados à 6.ª Ré, como sugerem os quesitos 38.º e 39.º, os actos acima referidos não teriam que ser praticados nos termos referidos no parágrafo anterior.”;
xxiii) A correcta leitura deve ser, em síntese, o seguinte: o Tribunal quer dizer que: caso a Autora tivesse dado poderes ilimitados à 6.ª Ré para dispor as fichas, os levantamentos não precisam de seguir as formalidades estabelecidas para o manuseamento de fichas. Mas não foi isto que aconteceu, portanto, o Tribunal a quo não incorreu em confusão na formação da sua convicção;
xxiv) A explicação da 5.ª Ré, que alega o manuseamento dissimulado das fichas na sala da Autora (nos quesitos 9.º e 10.º) não tinha por fim ocultar a que os actos fossem captados pelas CCTV, mas sim garantir a segurança no transporte das fichas, fora da sala da Autora, para a sala da JJ operada pela 8.ª Ré, é completamente incoerente;
xxv) A 5.ª Ré colocou duas tiras de papel higiénico em cima de cadeira dentro da tesouraria e usou-as para embrulhar as fichas antes de as levar para fora da tesouraria da sala da Autora, este manuseamento só foi capturado por uma das câmaras colocadas dentro da tesouraria da sala da Autora, que a visão da outra câmara, foi bloqueada no preciso momento de a 5.ª Ré embrulhar as fichas, a imagem está em causa só aparece no canto inferior esquerdo do vídeo, deste modo, para quem não está a prestar muita atenção no visionamento do vídeo, é mais difícil de distinguir o manuseamento da 5.ª Ré;
xxvi) A 5.ª Ré não contava e manuseava as fichas em cima do balcão da tesouraria, onde os seus movimentos podiam ser captados com clareza pelas câmaras de CCTV e optava por embrulhar e esconder as fichas em cima da cadeira, actuava por razões de segurança;
xxvii) A 5.ª Ré manuseou as fichas às escondidas, embrulhou-as com papel higiénico e guardou-as dentro da carteira porque sabia perfeitamente que não estava a actuar em obediência a ordens e instruções de trabalho dada pela 6.ª Ré e que era proibido levar fichas para fora da sala da Autora;
xxviii) O tribunal a quo não ignorou os actos subsequentes e foi manifesta a intenção da 5.ª Ré de escapar a que os seus actos fossem captados pelas câmaras de CCTV, pelo que o Tribunal a quo não violou nenhum princípio de experiência, nem incorreu em qualquer falta ou contradição na decisão de matéria de facto;
e
xxix) Assim, deve ser negado provimento aos recursos interpostos pelas 1.ª, 2.ª a 4.ª e 5.ª Rés.
Pela 7ª Ré foram apresentadas as seguintes conclusões de recurso:
1. Não existe qualquer prova ou sequer indiciação de conluio ou de conspiração por parte da recorrente face a quaisquer das demais co-rés, designadamente face às 3.ª, 5.ª e 6.ª rés, a fim de enganar, defraudar e causar qualquer prejuízo à recorrida.
2. Não existe por parte da recorrente a confissão de qualquer acto ilegal, desonesto ou prejudicial à recorrida.
3. A recorrente era efectivamente gerente da sala vip JJ e tinha nesse contexto uma conta de gerente aberta na mesma sala vip JJ, sendo que com base nesses simples e naturais factos não se pode como que saltar para a formulação de um juízo de convicção judicial quanto à existência de uma actuação concertada e fraudulenta por parte da aqui recorrente com uma ou mais das co-rés com o animus de prejudicar a recorrida.
4. Por parte do Tribunal recorrido, estão apenas em causa simples juízos conclusivos e insubstanciados que se reduzem a nada mais que à enunciação das duas seguintes expressões: “envolvida”; e “comunhão de esforços”.
5. Nada se alegou e, pois, nada se provou quanto a conseguir saber-se que concretos e específicos actos ou omissões teriam sido planeados e colocados em prática entre a recorrente e qualquer uma das demais co-rés com o fim de causar um prejuízo patrimonial à recorrida.
6. Nada se pode apreender ou depreender da matéria levada à base instrutória nem das respostas dadas aos quesitos acerca de quais teriam sido os factos ou omissões em que se baseia ou sustenta esse juízo meramente conclusivo de “comunhão de esforços”.
7. A resposta dada ao quesito 26.º encerra um flagrante e ostensivo juízo conclusivo, meramente concludente e sem qualquer substanciação.
8. Para mais quando se atenda a que nas respostas dadas aos demais quesitos meramente se deu por provado que certas quantias teriam sido depositadas na conta da gerente da sala VIP JJ: ou seja, um depósito numa sala gerida pela recorrente, sendo e permanecendo inescrutinável em que termos é que tal factualidade poderia caracterizar e dar corpo a uma actuação conspiratória entre a recorrente e as demais co-rés a fim de defraudar e prejudicar patrimonialmente a recorrida.
9. Em nenhum artigo da base instrutória ficou quesitado que a recorrente porventura soubesse que as quantias depositadas nessa conta aberta na sala por si gerida teriam ou não origem ilícita e desonesta.
10. Também em nenhum artigo da base instrutória ficou quesitado que a conta aberta em nome da recorrente na sala VIP em que era COMPROVADAMENTE gerente servia ou se destinava à prática pela recorrente de quaisquer seus fins pessoais ou particulares - designadamente, fins ilícitos ou desonestos - nem também que, in concretum, tal conta profissional teria servido ou se teria destinado afinal, nos casos aludidos na decisão recorrida, a qualquer fim ilegal ou desonesto, designadamente os de defraudar e prejudicar patrimonialmente a recorrida.
11. Não se pode forçar a mão fazendo derivar o que seria um “envolvimento” - seja isso o que isso concretamente possa ser - para um grave e sério juízo de imputação de uma “comunhão de esforços” - seja isso o que concretamente possa ser.
12. A recorrente nunca foi sequer constituída arguida durante a investigação desencadeada nos autos de inquérito-crime instaurados em 2013 em virtude da queixa-crime apresentada pela recorrida, nos quais os factos em apreciação por parte da Polícia Judiciária e do Ministério Público ao longo de mais de 6 anos foram exactamente os mesmos que os constantes dos vertentes autos cíveis.
13. Nesses autos-crime foi já deduzido despacho de acusação contra as aqui 1.ª a 5.ª co-rés - que não também contra a 6.ª co-ré - por um crime de abuso qualificado de confiança, sendo que a recorrente e 7.ª co-ré nunca foi meramente constituída arguida e, pois, nem se trata sequer de um juízo de simples arquivamento proferido relativamente a si pelo Ministério Público mas, sim, diferentemente, de um juízo de não indiciação mínima.
14. Segundo a análise e ponderação elaboradas pelo Ministério Público e pela Polícia Judiciária ao longo de 6 anos nunca surgiu relativamente à aqui recorrente a «(…) fundada suspeita de crime por ela cometido (...)» pois, a não ser assim, teria a mesma sido de imediato sido constituída arguida, tal qual se dispõe no n.º 1 do art. 48.º do C.P.P.
15. A livre apreciação das provas não significa a ausência de regras e critérios, as quais, pois, serão as regras da vida e da experiência, as regras comuns da lógica, da razão e dos conhecimentos científicos que já entraram no conhecimento comum.
16. Deverá, assim sendo, ser modificada a resposta dada ao quesito 26 nos seguintes termos, devendo ser expurgados os dois segmentos em que se refere “em comunhão de esforços com a 7.ª ré”: Quesito 26 - PROVADO que as 1.ª a 6.ª rés, abusando da sua qualidade de empregadas da Autora, praticaram os actos referidos nas respostas aos quesitos 6.º a 21.º e 23.º, tendo as 3.ª, 5.ª e 6.ª rés feito os depósitos referidos nas respostas aos quesitos 9.º e 10. na conta aberta em nome da 7.ª ré na Sala VIP JJ e as 2.ª e 6.ª rés feito o depósito referido na resposta ao quesito 16.º
17. Nos termos e para os efeitos da al. a) do n.º 1 do art. 599.º e da primeira parte da al. a) do n.º 1 do art. 629.º, ambos do C.P.C., recorrente impugna a decisão de facto do Tribunal a quo e requer que o T.S.I. modifique tal decisão nos termos atrás apresentados pela recorrente (ou noutros, substancialmente equivalentes).
18. Uma vez modificada a decisão recorrida nos termos acima suscitados, deverá a acção ser julgada improcedente quanto à recorrente e, por conseguinte, ser a recorrente absolvida de todos os pedidos contra si formulados pela recorrida.
Relativamente ao recurso interposto pela 7ª Ré pela Autora contra alegando foram apresentas as seguintes conclusões:
i) a 7.ª Ré, para além de ser a gerente da sala de jogo operada pela 8.ª Ré JJ Internacional Sociedade Unipessoal, Limitada dentro do Casino II em Macau era, também, em 2013 (data da prática dos actos ilícitos em comunhão de esforços com as 1.ª a 6.ª Rés), sócia e administradora da SS (Internacional) Limitada, sociedade que alegadamente serviria como promotora de jogo daquela sala, para efeitos de mera aparência formal;
ii) Facto reconhecido pelo Tribunal a quo desvalorizou a tardia revelação feita pelas 7.ª a 9.ª Rés, identificando a 8.ª Ré como a sociedade que exercia a actividade de promoção de jogo naquela sala VIP do Casino II Macau; e
iii) Nos artigos 14.º e ss. da contestação conjunta das 7.ª e 8.ª Rés, a fls. 289 e 292, é mencionado que a 7.ª Ré recebeu as fichas de jogo retiradas da caixa da Autora (e só de fichas se tratava), como resulta do visionamento dos registos de vídeo dos levantamentos e depósitos feitos nas sala de jogo da Autora e da 8.ª Ré no Casino II Macau, para serem creditadas a favor de uma terceira pessoa para apostas de jogo, e que esta pessoa as iria levantar noutra sala de jogo da 8.ª Ré no Casino LL;
iv) Contudo, resulta das folhas dos depósitos realizados na sala de jogo operada pela 8.ª Ré no Casino II Macau, a fls. 407 e 408, e da prova produzida em julgamento, que os depósitos foram creditados numa conta titulada pela 7.ª Ré e não numa conta de outra pessoa;
v) Apesar de o Tribunal recorrido ter entendido, a fls. 1163v. da douta sentença, que “nada indica que a abertura dessa conta e a utilização da mesma para depósito daquelas fichas de jogo faziam parte das funções de gerente da sala de jogo”, a 7.ª Ré vem acrescentar e esclarecer, no ponto 11 das suas alegações de recurso, a que ora se responde, que se tratava de uma conta de gerente e que a abertura dessa conta estava ligada precisamente àquelas funções;
vi) As 8.ª e 9.ª Rés sabiam que a 7.ª Ré era titular de uma conta de gerente na sala VIP da 8.ª Ré, tanto mais que no artigo 16.º da contestação das 7.ª e 8.ª Rés é confessado que os registos dos depósitos de fichas de jogo foram entregues à 9.ª Ré, nos termos do Regulamento Administrativo n.º 6/2000;
vii) Como se refere na decisão recorrida a fls. 1162, o Tribunal formou a sua convicção com base nas respostas aos quesitos 9.º, 10.º, 16.º, 17.º, 23.º, 26.º e 43.º, com a que consta da fundamentação na decisão da matéria de facto, a fls. 1106v e 1107, pois foi dado como provado que fichas de jogo no montante de, pelo menos, HKD25.000.000,00 foram retiradas da caixa da Autora para serem depositadas na conta da 7.ª Ré na sala de jogo operada pela 8.ª Ré no Casino II Macau;
viii) Tendo a 7.ª e 8.ª Rés permitido, para além dos depósitos, que fossem levantadas fichas no valor de HKD10.000.000,00 para serem colocadas de volta na caixa da sala da Autora, para simular, obviamente, a apropriação ilícita das fichas de jogo da Autora;
ix) Nenhum dos depósitos de fichas de jogo feitos na sala da 8.ª Ré ficou sujeito ao preenchimento das declarações de proveniência dos fundos, tal como obriga o Regulamento Administrativo n.º 7/2006 e a Instrução n.º 2/2006 da DICJ, em vigor à data dos factos, tal como se constata dos registos de vídeo recolhidos na sala de jogo VIP da 8.ª Ré (08:25:45 - 08:26:33 IN4532 PJ requested G on 22-Jan [007521]7521-G.MOON W1,20V; 09:38:27 - 09:93: 10 IN4532 PJ requested H on 22-Jan [007521]7521-G.MOON W1,20V; 00:43:45 - 00:44:16 IN4532 PJ requested L on 25-Jan [007522]7522-G.MOON W3,40V; 23:28:30 - 23:31:06 IN4532 PJ requested M on 26-Jan [007522]7522-G.MOON W3,40V; 01:38:19 - 01:39:30 IN4532 PJ requested O on 28-Jan [007522]7522-G.MOON W3,40V);
x) Foi o facto de a 7.ª Ré ser a gerente da 8.ª Ré e de ambas agirem em sintonia, tal como é confessado na contestação, que permitiu o depósito das fichas retiradas da caixa da Autora sem emissão de recibos e das declarações obrigatórias de proveniência dos montantes depositados, sendo que estas servem, precisamente, para eliminar dúvidas idênticas às colocadas pela Recorrente nos pontos 24 e 25 das suas alegações;
xi) Acresce que as 7.ª e 8.ª Rés confessaram, expressamente, na sua contestação conjunta, de fls. 289 e 292, nos artigos 1.º, 12.º a 15.º e 19.º que exerciam na sala VIP JJ no Casino II Macau uma actividade de jogo similar à dos promotores de jogo, de modo autónomo e independentemente de quem quer seja; que foi no âmbito dessa actividade de jogo que a 7. ª Ré, estando ao serviço na sala VIP da 8.ª Co-Ré no Casino II Macau, recebeu as fichas e que essas fichas eram destinadas para apostas para jogo na sala VIP da 8.ª Ré no Casino LL;
xii) Na ficha da conta de gerente da 7.ª Ré está mencionado que alguns dos depósitos de fichas foram transferidos para a sala VIP da JJ no anteriormente designado XX, actualmente Casino LL, tal como foi confessado pelas 7.ª e 8.ª Rés, referido pela testemunha K e consta dos registos dos depósitos feitos pela 8.ª Ré no Casino LL - vg. fls. 618, 623, 627, 628 e 629 dos autos;
xiii) As actividades desenvolvidas pela 7.ª e 8.ª Rés, nomeadamente de receber depósitos de jogadores, correspondem às mencionadas no artigo 2.º do Regulamento Administrativo n.º 6/2002, e devem ser, por isso, consideradas como actividades de promoção de jogos de fortuna ou azar em casino;
xiv) A actividade dos promotores de jogo e dos colaboradores está preceituada no artigo 17.º, sendo que o artigo 31.º do referido Regulamento Administrativo, determina que as sociedades promotoras de jogos de fortuna ou azar, como era o caso da 8.ª Ré, mesmo que não licenciada, são solidariamente responsáveis com os seus empregados e colaboradores pelas actividades desenvolvidas por estes nos casinos; e
xv) No que respeita ao procedimento criminal aberto contra as 7 primeiras Rés, importa esclarecer que foi requerida a abertura da instrução, precisamente para incluir a 7.ª Ré, como arguida no processo, tendo o Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal deferido o pedido de abertura, estando os autos a aguardar os termos subsequentes.
Foram colhidos os Vistos.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
Nestes autos foram vários os recursos interpostos, a saber:
I. Recurso interlocutório:
1. Recurso interposto pela Autora do despacho de fls. 755;
II. Recursos interpostos da sentença:
1. Recurso interposto pela Autora da sentença proferida nos autos;
2. Recurso interposto pela 1ª Ré;
3. Recurso interposto pelas 2ª, 3ª e 4ª Rés;
4. Recurso interposto pela 5ª Ré;
5. Recurso interposto pela 7ª Ré.
II. FUNDAMENTAÇÃO
*
RECURSO INTERLOCUTÓRIO
É o seguinte o teor do despacho recorrido:
«Fls. 753:
A autora requereu que se solicitasse à DICJ que enviasse documentos aos autos. Convidada a autora a dizer quais os documentos pretendidos, veio requerer que se notificassem as 8ª e 9ª rés para “explicarem a que título” a 8ª ré operou uma sala VIP no Casino II.
Vai indeferido o agora requerido porquanto as informações pretendidas cabe ao tribunal solicitá-las oficiosamente se as entender necessárias e pertinentes, o que não deixará de fazer se nisso sentir necessidade e adequação em audiência de julgamento (art.s 6º, nº 1 e 442º do CPC). Não cabe às partes requerer tais informações da parte contrária, uma vez que àquelas cabe requerer depoimento de parte.
Por outro lado, no caso de se tratar de documentos em poder da parte contrária e esta negar a sua posse, não cabe à parte interessada pedir explicações, mas fazer prova de que não é verdadeira a declaração da parte contrária (art. 457º, nº 1 do CPC).».
O que a Autora requeria a fls. 753 era que as 8ª e 9ª Rés “explicassem” a que título é que a 8ª Ré operou a sala VIP JJ no Casino II durante o ano de 2013.
Para fundamentar a sua posição alega que tendo a 9ª Ré declarado que não existe contrato de promoção de jogos celebrado com a 8ª Ré, cabendo-lhe a si Autora provar por qualquer meio que aquela declaração não corresponde à verdade, o meio porque o pode fazer é através do pedido de esclarecimento às indicadas Rés, tudo nos termos do artº 457º e 442º nº 1 do CPC.
Dispõe o nº 1 do artº 457º que «1. Se o notificado declarar que não possui o documento, o requerente é admitido a provar, por qualquer meio, que a declaração não corresponde à verdade.».
O nº 1 do artº 442º manda que «1. Todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspecções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os actos que forem determinados.».
Do comando contido no nº 1 do artº 442º do CPC resulta que todas pessoas devem responder ao que lhes for perguntado, o que na disciplina do processo corresponde aos depoimentos de parte, aos depoimentos das testemunhas e esclarecimentos de peritos.
Cabe às partes no âmbito do princípio do dispositivo indicar os meios de prova que entendam adequados para demonstrarem os factos que invocam ou fazer a contra-prova dos factos invocados pela parte contrária, contudo a audição da parte contrária ou dos compartes tem de ser requerida nos termos dos artº 477º e seguintes do CPC.
Assim sendo, notificada uma das partes a pedido da parte contrária para apresentar um documento e respondendo aquela que não o tem, a quem o requereu cabe demonstrar que a declaração não corresponde à verdade podendo no uso de meios de prova para o efeito requerer o depoimento de parte, como aliás se diz no despacho recorrido, para demonstrar que tal declaração não corresponde à verdade.
Mas, já não há qualquer fundamento para que se venha pedir que a parte “venha justificar” o que fazia ou deixava de fazer e respectiva razão.
Inclusivamente, nos termos do nº 1 do artº 477º do CPC ao tribunal apenas é permitido, se o tiver por necessário, ouvir as partes em depoimento, mas nunca notificá-las para virem apresentar justificações.
Destarte, bem andou o tribunal “a quo” ao indeferir o requerido, sendo de negar provimento ao recurso interlocutório.
*
RECURSOS INTERPOSTOS DA SENTENÇA
a) Factos
Da sentença recorrida consta a seguinte factualidade:
Da Matéria de Facto Assente:
- A Autora é uma sociedade comercial sob a forma unipessoal promotora de jogos de fortuna ou azar em Casino na Região Administrativa Especial de Macau (alínea A) dos factos assentes).
- A 8.ª Ré, JJ Internacional Sociedade Unipessoal Limitada, é, tal como a Autora, uma sociedade comercial promotora de jogos de fortuna ou azar em Casino exercendo a sua actividade na Região Administrativa Especial de Macau (alínea B) dos factos assentes).
- A 9.ª Ré, II Resort (Macau) S.A., é uma sociedade comercial anónima e uma das concessionárias autorizadas a explorar Jogos de Fortuna e Azar e Outros Jogos em Casino na Região Administrativa Especial de Macau (alínea C) dos factos assentes).
*
Da Base Instrutória:
- Entre 22 e 28 de Janeiro de 2013, as 1ª a 6ª Rés trabalhavam para a Autora (resposta ao quesito 1º da base instrutória).
- A 7ª, também conhecida por “......姐” era, à data, a gerente da Sala VIP JJ operada pela 8ª Ré dentro do Casino II em Macau (resposta ao quesito 2º da base instrutória).
- A Autora desenvolveu a sua actividade nos termos que acordou com 9ª Ré (resposta ao quesito 3º da base instrutória).
- Ao abrigo do acordo de promoção de jogo com a 9ª Ré, celebrado em 28 de Agosto de 2006 e sucessivamente renovado, a Autora comprometeu-se a exercer a actividade de promoção de jogos, tendo-lhe sido concedida pela 9ª Ré para a sua actividade a operação de uma sala VIP, sita no Casino II, em Macau, à qual foi dada a designação de “EE貴賓會” (resposta ao quesito 4º da base instrutória).
- Em 22 de Janeiro de 2013, por volta das 3H59 da manhã, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 2ª Ré para retirar da sala VIP da Autora fichas de jogo no valor de HK$2.000.000,00 (resposta ao quesito 6º da base instrutória).
- De seguida, a 2ª Ré entregou essas fichas à 6ª Ré H num dos corredores do Hotel II (resposta ao quesito 7º da base instrutória).
- Em 22 de Janeiro de 2013, por volta das 5H44 da manhã do dia 22 de Janeiro de 2013, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 2ª Ré para retirar da sala VIP da Autora fichas de jogo no valor de HK$8.000.000,00 para, de seguida, as entregar à 6ª Ré (resposta ao quesito 8º da base instrutória).
- Em 22 de Janeiro de 2013, por volta das 8H22 da manhã, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 5ª Ré para retirar da sala VIP da Autora fichas de jogo no valor de HK$5.000.000,00 para, de seguida, as depositar numa conta aberta em nome da 7.ª Ré na sala VIP JJ (resposta ao quesito 9º da base instrutória).
- Em 22 de Janeiro de 2013, por volta das 9h36 da manhã, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 5ª Ré para retirar da sala VIP da Autora fichas de jogo no valor de HK$10.000.000,00 para, de seguida, as depositar na conta aberta em nome da 7.ª Ré na na sala VIP JJ (resposta ao quesito 10º da base instrutória).
- Em 23 de Janeiro de 2013, cerca da 00H04 da madrugada, em colaboração com a 4ª Ré nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 4ª Ré para retirar da sala VIP da Autora fichas de jogo no valor de HK$13.000.000,00 e para, de seguida, as entregar à 6ª Ré (resposta ao quesito 11º da base instrutória).
- Em 23 de Janeiro de 2013, por volta das 18H06, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 1ª Ré para retirar fichas de jogo no valor de HK$10.000.000,00 da sala VIP da Autora e para, de seguida, as entregar à 6ª Ré (resposta ao quesito 12º da base instrutória).
- No dia 24 de Janeiro de 2013, por volta da 0H27 da madrugada, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré entregou fichas de jogo no valor de HK$10.000.000,00 à 2.ª Ré para que esta, de seguida, as colocasse na Sala VIP da Autora (resposta ao quesito 13º da base instrutória).
- Em 23 de Janeiro de 2013, por volta das 2H26, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 2ª Ré para retirar da sala VIP da Autora ficha ou fichas de jogo de valor não concretamente apurado mas não inferior a HK$1.000.000,00 e entregou-a ou entregou-as à 6ª Ré (resposta ao quesito 14º da base instrutória).
- No dia 24 de Janeiro de 2013, por volta de 7H16 em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré entregou à 2.ª Ré fichas de jogo no valor de HK$10.000.000,00 para que esta, de seguida, as colocassena sala VIP da Autora (resposta ao quesito 15º da base instrutória).
- No dia 25 de Janeiro de 2013, por volta da 0H41 da madrugada, em colaboração Ré nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 2ª Ré para retirar da sala VIP da Autora fichas de jogo no valor de HK$10.000.000,00 para, de seguida, as depositar na conta aberta em nome da 7.ª Ré na sala VIP JJ (resposta ao quesito 16º da base instrutória).
- No dia 25 de Janeiro de 2013, cerca das 4H13, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 2ª para levantar fichas no valor de HK$10.000.000,00 da conta aberta em nome da 7ª Ré na sala VIP JJ para, de seguida, as colocar na sala VIP da Autora (resposta ao quesito 17º da base instrutória).
- No dia 25 de Janeiro de 2013, por volta das 16H40, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré entregou fichas de jogo de valor não superior a HK$10.000.000,00 à 4.ª Ré para que esta, de seguida, as colocasse na Sala VIP da Autora (resposta ao quesito 18º da base instrutória).
- Em 26 de Janeiro de 2013, pelas 23H23, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 1ª Ré para retirar fichas de jogo no valor de HK$10.000.000,00 da sala VIP da Autora para, de seguida, as depositar numa conta aberta em nome de XXJJ na sala VIP JJ (resposta ao quesito 19º da base instrutória).
- No dia 27 de Janeiro de 2013, pelas 18H30, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré retirou da sala VIP da Autora fichas de jogo no valor de HK$10.000.000,00 (resposta ao quesito 20º da base instrutória).
- Em 28 de Janeiro de 2013, por volta das 01H35 da madrugada, em colaboração nos termos referidos na resposta ao quesito 23º, a 6ª Ré deu instruções à 2ª Ré para retirar fichas de jogo no valor de HK$10.000.000,00 da sala VIP da Autora para, de seguida, as depositar numa conta aberta em nome deXXJJ na sala VIP JJ (resposta ao quesito 21º da base instrutória).
- Entre 22 de Janeiro de 2013 e 28 de Janeiro de 2013 a 6ª Ré, em colaboração com (resposta ao quesito 23º da base instrutória):
* as 2ª e 4ª Rés, deu instruções para que fossem praticados os actos referidos nas respostas aos quesitos 6º a 8º;
* as 3ª e 5ª Rés, deu instruções para que fossem praticados os actos referidos nas respostas aos quesitos 9º, 10º tendo a 3ª Ré prestado auxílio à 5ª Ré quando as fichas aí referidas foram retiradas da sala VIP da Autora;
* a 1ª Ré, deu instruções para que fossem praticados os actos referidos nas respostas aos quesitos 12º 19º 20º tendo a 1ª Ré prestado auxílio à 6ª Ré quando as fichas referidas na resposta ao quesito 20º foram retiradas da sala VIP da Autora;
* a 2ª Ré, deu instruções para que fossem praticados os actos referidos nas respostas aos quesitos 13º 14º 15º e 16º 17º 21º;
* a 4ª Ré, deu instruções para que fossem praticados os actos referidos nas respostas aos quesitos 11º e 18º,
fazendo com que, no total, fichas correspondentes a valor não inferior a HK$89.000.000,00 tivessem sido retiradas da sala VIP da Autora das quais fichas no valor de HK$25.000.000,00 tivessem sido depositadas na conta aberta em nome da 7ª Ré na Sala de VIP JJ.
- As 1ª a 6ª Rés, abusando da sua qualidade de empregadas da Autora, praticaram os actos referidos nas respostas aos quesitos 6º a 21º e 23º, tendo as 3ª, 5ª e 6ª Rés, em comunhão de esforços com a 7ª Ré, feitos os depósitos referidos as respostas aos quesitos 9º e 10º na conta aberta em nome da 7ª Ré na Sala de VIP JJ e as 2ª e 6ª Rés, em comunhão de esforços com a 7ª Ré, feito o depósito referido na resposta ao quesito 16º (resposta ao quesito 26º da base instrutória).
- Entre 22 e 28 de Janeiro de 2013, a 6ª Ré era gerente da tesouraria da sala VIP da Autora (resposta ao quesito 27º da base instrutória).
- A 6ª Ré era, enquanto trabalhadora da Autora, superior hierárquica da 1ª Ré (resposta ao quesito 28º da base instrutória).
- O que consta das respostas aos quesitos 12º, 19º, 20º, 23º e 26º (resposta ao quesito 30º da base instrutória).
- A 6ª Ré era, enquanto trabalhadora da Autora, superior hierárquica da 2ª Ré (resposta ao quesito 31º da base instrutória).
- O que consta das respostas aos quesitos 6º, 7º, 8º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 21º, 23º e 26º (resposta ao quesito 32º da base instrutória).
- A 6ª Ré era, enquanto trabalhadora da Autora, superior hierárquica da 4ª Ré (resposta ao quesito 33º da base instrutória).
- Nas fichas de registo dos movimentos da conta do cliente da Autora, N (N), e na conta do cliente da Autora, O (O), (vulgarmente conhecido por “~~~~”) consta expressamente a frase “movimentado apenas por P e Q (resposta ao quesito 34º da base instrutória).
- O que consta das respostas aos quesitos 6º, 7º, 8º, 11º, 18º, 23º e 26º (resposta ao quesito 35º da base instrutória).
- A 6ª Ré era, enquanto trabalhadora da Autora, superior hierárquico da 5.ª Ré (resposta ao quesito 36º da base instrutória).
- O que consta das respostas aos quesitos 9º, 10º, 23º e 26º (resposta ao quesito 37º da base instrutória).
- A 7ª Ré acedeu que fossem depositas fichas na sua conta aberta na Sala de VIP JJ nos termos referidos na resposta ao quesito 23º (resposta ao quesito 43º da base instrutória).
*
b) Do Direito
1. Recurso interposto pela Autora da sentença proferida nos autos;
Nas conclusões de recurso vem a Autora impugnar a decisão sobre os quesitos 5º, 40º e 41º da Base Instrutória os quais na sua opinião deviam ter sido dado como provados.
Nas suas contra-alegações a este recurso a 9º Ré não se pronunciou sobre esta matéria.
É o seguinte o teor dos itens 5º, 40º e 41º da base instrutória:
«5º
Também a 8.ª Ré exerce a sua actividade de promoção de jogos em benefício da 9.ª Ré ao abrigo de um acordo de promoção de jogo similar, tendo esta, para esse efeito, concedido à 8.ª Ré a operação de uma sala VIP, sita no Casino II, em Macau, à qual foi dada a designação de “JJ” ou “JJ貴賓廳”?
40º
Foi no âmbito da sua actividade de promoção de jogo que a 7.ª ré, estando ao serviço numa das salas V.I.P. da 8.ª ré, sita no Casino II, recebeu fichas e dinheiro da 6.ª ré?
41º
A 6.ª ré ao entregar tais fichas e dinheiro na sala V.I.P. da 8.ª ré no Casino II, disse à 7.ª ré que tais fichas e dinheiro seriam para ser creditados para apostas para jogo a favor de uma terceira pessoa que iria reclamar e levantar na outra sala V.I.P. da titularidade da 8.ª ré sita no Casino LL, as referidas fichas e dinheiro?»
Entre tudo quanto alega, invoca a Autora que a matéria do item 5º foi confessada pelas 7ª e 8ª Rés na sua contestação.
A matéria do quesito 5º é a reprodução integral do artº 8º da p.i. e, efectivamente, as 7ª e 8ª Rés confessaram esta matéria no artº 1º da sua contestação.
A matéria dos quesitos 40º e 41º é alegada nos 13º e 14º da contestação das 7ª e 8ª Rés.
Tal como já se dizia no despacho que decidiu a reclamação da base instrutória – cf. fls. 395 – havendo uma Ré que é revel face ao disposto no artº 406º al. b) do CPC impede o efeito comunitário dos factos invocados pela Autora.
Contudo, a impossibilidade do efeito cominatório não é impeditiva da confissão no que esta concerne à parte (sujeito) confessório.
Destarte, face ao disposto na 1ª parte do nº 1 do artº 349º do C.Civ., havia de se ter essa matéria – do artº 8º da p.i. e 13º e 14º da contestação - por confessada nos articulados na parte em que as 7ª e 8ª Rés o podiam fazer, isto é, na parte que apenas a si respeita1, mas nunca no que respeita às 6ª e 9ª Rés.
Aqui chegados cabe apreciar a resposta possível ao quesito 5º.
A 9ª Ré na sua contestação não faz qualquer referência à sua relação com a 8ª Ré, isto é, não confessa nem impugna.
A Autora nas suas alegações e conclusões de recurso invoca que a testemunha K que trabalhou para a 9ª Ré entre 2005 e 2010 disse que a 8ª Ré operava uma das salas VIP do Casino.
Mas os factos são de Janeiro de 2013, data em que aquele já não desempenhava as mesmas funções para o Casino II.
Os documentos de fls. 407 a 474 são, também, emitidos apenas pela 8ª Ré.
Na decisão da matéria de facto a fls. 1105 último parágrafo e 1105v. primeiro parágrafo, justifica-se e bem a razão porque não pode a matéria do item 5º ser dada como provada no que concerne à 9ª Ré.
Assim sendo, a única resposta possível para o quesito 5º seria «Provado apenas que 8.ª Ré exerce a sua actividade de promoção de jogos numa sala VIP, sita no Casino II, em Macau, à qual foi dada a designação de “JJ” ou “JJ貴賓廳”».
Relativamente à matéria dos quesitos 40º e 41º limita-se a Autora nas suas alegações de recurso a invocar que foi confessado pelas 7ª e 8ª Rés.
Da decisão sobre a matéria destes quesitos consta que não foi feita prova – último parágrafo fls. 1107v. -.
Destarte, tal como o anterior apenas pode ser dado como provado aquilo que respeita às 7ª e 8ª Rés, porque confessado.
Deste modo a resposta possível para o quesito 40º seria «Provado apenas que foi no âmbito da sua actividade de promoção de jogo que a 7ª Ré, estando ao serviço numa das salas V.I.P. da 8ª ré, sita no Casino II, recebeu fichas e dinheiro.». Quanto a ter sido da 6ª Ré à míngua de prova nada se pode dar como provado.
Relativamente ao quesito 41º a única resposta possível é a que foi dada uma vez que respeita à intenção da 6ª Ré e nessa parte a confissão das 7ª e 8ª Rés é irrelevante.
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, no que concerne ao recurso da decisão sobre a matéria de facto quanto aos quesitos 5º, 40º e 41º, procede parcialmente, passando a resposta a dar aos quesitos 5º e 40º a ser seguinte:
Quesito 5º:
«Provado apenas que 8.ª Ré exerce a sua actividade de promoção de jogos numa sala VIP, sita no Casino II, em Macau, à qual foi dada a designação de “JJ” ou “JJ貴賓廳”.».
Quesito 40º:
Provado apenas que foi no âmbito da sua actividade de promoção de jogo que a 7.ª ré, estando ao serviço numa das salas V.I.P. da 8.ª ré, sita no Casino II, recebeu fichas e dinheiro.».
Aqui chegados cabe apreciar do remanescente do recurso da Autora.
Pretende a Autora que a actuação da 7ª Ré quando recebeu as fichas das demais Rés, o foi enquanto gerente da sala VIP explorada pela 8ª Ré.
Porém não é o que resulta da matéria de facto.
A 8ª Ré tem conhecimento que a 7ª Ré tinha aberta uma conta na sua (da 8ª Ré) sala mas essa conta em nada se relaciona com as funções que a 7ª Ré ali desempenhava.
Quanto à relação entre a 8ª e a 9ª Ré nada se provou.
Não estando os depósitos feitos na conta da 7ª Ré conexos com as funções de gerente, por falta de factualidade adequada caem os fundamentos invocados que visam imputar responsabilidade à 8ª Ré.
Da mesma sorte caem os argumentos que visam responsabilizar a 9ª Ré.
Acompanhando-se nesta matéria a decisão recorrida nos seus precisos termos, não têm acolhimento as conclusões de Recurso da Autora uma vez que nada as sustenta, pelo que, para além da alteração a dar às respostas dos quesitos 5º e 40º da base instrutória em tudo mais é de negar provimento ao respectivo recurso.
2. Recurso interposto pela 1ª Ré;
Assenta este recurso essencialmente que as duas entregas de fichas no valor de HKD10.000.000,00 foram realizadas no local de trabalho da 1ª Ré, onde a 6ª Ré tinha o poder de dar ordens e instruções à 1ª Ré, sem que esta tenha retirado qualquer benefício, pelo que, se impõe concluir que o fez segundo as ordens e instruções da 6ª Ré sua superior hierárquica não envolvendo a actuação da 1ª Ré ilicitude alguma e consequentemente não gerando a obrigação de indemnizar.
Sobre esta matéria consta a pág. 16 da sentença sob recurso o seguinte:
«Dos factos provados acima elencados conclui-se que as 1ª a 6ª Rés, ao retirarem fichas de jogo pertencente à sala de jogo onde a Autora exerce a sua actividade, praticaram actos ilícitos contra o património da Autora.
Para afastar a culpa pelos actos praticados, as 1ª, 2ª, 4ª e 5ª Rés alegam os actos foram levados a cabo em mera obediência hierárquica às ordens e instruções dadas pela 6ª Ré, gerente da sala de jogo da Autora e sua superior hierárquica.
Consta da matéria assente que as 1ª a 6ª Rés eram trabalhadoras da Autora sendo a 6ª Ré gerente da tesouraria da sala de jogo da Autora e superior hierárquico das 1ª, 2ª, 4ª e 5ª Rés.
Não está, porém, demonstrado que as 1ª, 2ª, 4ª e 5ª Rés tenham praticados os actos em obediência a ordens e instruções dadas pela 6ª Ré, na qualidade de superior hierárquico.
Quanto aos motivos por que essa matéria não foi dada como provada, o tribunal colectivo deu a conhecer os respectivos fundamentos a fls 1107 dos autos.
Assim, estando demonstrado que tais actos foram efectuados abusando da sua qualidade de empregadas da Autora, as 1ª a 6ª Rés actuaram com culpa.».
Por sua vez no Acórdão sobre as respostas à base instrutória a fls. 1107 consta o seguinte:
«Quanto à razão por que as 1ª, 2ª, 4ª e 5ª Rés praticaram os actos acima elencados, das filmagens consegue ver-se que as mesmas agiram grande parte das vezes tentando camuflá-los evitando ser captadas pelas câmaras como foi já referido mais acima na página 13 do presente Acórdão. Por força dessa forma de actuação, não entendeu o tribunal que as mesmas actuaram por mera obediência hierárquica porque a 6ª Ré lhes deu ordens sem que as mesmas pudessem desobedecer. Por isso, grande parte dos factos alegados por essas Rés constantes dos quesitos 27º a 37º não foi dada como provada.
Relativamente à razão por que foram colocadas fichas de jogo na sala de joga da Autora, não afigurou ao tribunal demonstrado que o foi para dificultar a descoberta. É que, pareceu ao tribunal ser meros actos de reposição das fichas que foram retiradas temporariamente para serem usadas pelas 1ª a 6ª Rés em actos que poderia trazer-lhe qualquer proveito.».
Da decisão sobre as respostas dadas à base instrutória resulta suficiente e objectivamente fundamentado a razão porque não foi dada como provada a matéria do item 30º da base instrutória, o que no caso, se atendermos ao fundamento da razão da resposta não provado acabamos por concluir que não só não se provou como o contrário até resulta da prova produzida.
Destarte, vir agora aqui a 1ª Ré, com argumentos meramente teóricos tentar invocar que o tribunal por efeito da lógica havia de concluir o que não se provou, carece totalmente de fundamento.
Assim sendo, mais uma vez, porque a decisão sob recurso se encontra suficientemente fundamentada quanto às razões de onde emerge a responsabilidade da 1ª Ré, não se tendo provado a factualidade subjacente à argumentação da 1ª Ré agora recorrente, mantém-se a decisão recorrida negando-se provimento ao recurso.
3. Recurso interposto pelas 2ª, 3ª e 4ª Rés;
No seu recurso vêm as 2ª, 3ª e 4ª Rés impugnar a resposta dada pelo tribunal a quo à matéria dos quesitos 31º a 35º, 38º e 39º da base instrutória, entendendo que os mesmos haviam de ser dado como provados na totalidade.
No essencial as razões que se invocam no recurso destas Rés quanto à matéria de facto assente são idênticas ao recurso interposto pela 1ª Ré já antes analisado e reconduzem-se a que, segundo as 2ª, 3ª e 4ª Rés estas teriam actuado apenas de acordo com o dever de obediência para com a 6ª Ré sua superior hierárquica e no âmbito da relação laboral que tinham para com a Autora não lhe sendo autorizado que discutissem as ordens de um superior hierárquico.
Ora, vale aqui a argumentação usada supra.
Com base na parte já transcrita do Acórdão sobre as respostas à base instrutória a fls. 1107 o que se pode concluir é que não só não se provou que as 2ª, 3ª e 4ª Rés actuaram no âmbito do dever de obediência a um superior hierárquico, como, bem antes pelo contrário, com base na fundamentação constante da decisão sobre a base instrutória e reproduzida o que resulta é que se percebe que tinham perfeita consciência que estavam a lesar os interesses da Autora e actuar de forma que não lhes era permitida, tudo fazendo para ocultar os seus actos e a retirada de fichas dos registos das câmaras de segurança.
Tal como vem sendo entendimento deste Tribunal «para que a decisão da 1ª instância seja alterada, haverá que averiguar se algo de “anormal”, se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes» - Ac. do TSI de 09.05.2019, processo nº 240/2019 -.
Ora, no caso em apreço as Rés limitam-se a apresentar os seus argumentos, meramente teóricos, de que segundo a lógica e uma vez que a 6ª Ré era hierarquicamente superior das demais Rés, entendem que a conclusão do tribunal haveria de ser diferente, escamoteando e ignorando a forma como os actos foram praticados e que foi observada pelo tribunal “a quo” no visionamento das imagens, as quais por si só exigem conclusão diversa da das recorrentes, pois quem actua no simples cumprimento do seu dever funcional de trabalhador obedecendo a ordens de um superior hierárquico não precisa de o fazer de forma a ocultar-se das câmaras de vigilância e segurança, bem pelo contrário, por razões de segurança tudo deveria ter feito para que fosse visto e filmado, mas assim não foi.
Destarte, na parte em que impugna a decisão sobre a base instrutória carece o recurso destas Rés de fundamento, sendo de negar-lhe provimento.
Em sede de fundamentação de direito vêm estas Rés invocar que não estão verificados os requisitos do artº 477º do C.Civ. porquanto as Rés Recorrentes não actuaram como culpa, não está provado o direito e segundo a Jurisprudência do Acórdão do TUI nº 69/2010 os juros de mora são devidos apenas a contar da data da decisão.
Vejamos então.
No que concerne à alegação da ausência da culpa, toda a argumentação invocada perde fundamento quando se nega provimento ao recurso interposto sobre a decisão da base instrutória.
Não ficando demonstrado que as Rés actuaram enquanto funcionárias e em obediência a um superior hierárquico, mas sim em conjugação de esforços nos quais a 6ª Ré assumia uma posição de liderança mas que nada tinha a ver com as funções que todas desempenhavam na Autora, falece toda a argumentação da ausência de culpa.
Bem se andou na decisão recorrida em face da factualidade apurada em concluir que as 2ª, 3ª e 4ª Rés actuaram com culpa, pelo que, nesta parte é também de negar provimento ao recurso.
Quanto aos danos vêm estas Rés e Recorrentes invocar que ficou por apurar se o prejuízo foi da Autora se dos clientes de cujas contas foram retiradas as fichas.
Porém, mais uma vez, trata-se de argumentação meramente especulativa uma vez que o que se deu como provado foi que as fichas foram retiradas da sala VIP da Autora nada se dizendo que hajam sido levantadas por débito em contas de clientes.
Destarte, tendo as fichas sido retiradas e não tendo sido repostas está verificado o prejuízo, como, e bem, se aprecia na sentença recorrida.
Assim sendo, improcedem as conclusões de recurso no que concerne à erada interpretação e aplicação do nº 1 do artº 477º do C.Civ..
Quanto aos juros de mora, decidiu-se na sentença sob recurso que os mesmos eram devidos desde 28 de Janeiro de 2013 data em que foi praticado o último dos factos ilícitos.
As recorrentes invocam que resultando a condenação da prática de actos ilícitos a decisão recorrida viola o Acórdão de uniformização de Jurisprudência do TUI no processo nº 69/2010.
Salvo melhor opinião mas entendemos que as Recorrentes não têm razão.
A questão que está subjacente ao Acórdão de fixação de jurisprudência do TUI de 02.03.2011, proferido no processo nº 69/2010 é distinta daquela que nos ocupa no caso em apreço.
A questão subjacente àquele acórdão é uma situação em que a obrigação de indemnizar é ilíquida, vindo a ser fixada nos termos dos artigos 560º nº 5 e 794º nº 4, isto é, sendo determinada no momento mais recente possível.
Ou seja, o quanto indemnizatório só é apurado no momento da decisão.
Sendo apurado o “quanto” da indemnização nos termos das disposições legais citadas entra em aplicação o artº 795º do C.Civ. quanto aos juros.
A oposição de acórdão que motivou o Acórdão de fixação de jurisprudência tem a ver com o momento a partir do qual entra o devedor em mora quando até à decisão a obrigação era ilíquida, tendo-o definido na data em que esta – a decisão – é proferida e não no do seu trânsito em julgado.
Porém, no caso em apreço o quanto já era conhecido.
Pese embora a indemnização no caso em apreço seja emergente de facto ilícito, sempre foi uma obrigação pecuniária – restituir o valor monetário das fichas que foram retiradas da sala VIP da Autora – e liquida, não havendo que fixar o montante da indemnização.
A situação destes autos cabe na al. b) do nº 2 do artº 794º e 795º ambos do C.Civ..
Destarte os juros são devidos desde a prática do facto ilícito, isto é, desde o momento (data) em que as fichas foram retiradas da sala VIP, pelo que, tendo-se pedido juros a contar da data da prática do último facto bem andou a decisão recorrida ao fixar que os juros eram devidos a contar dessa data.
Termos em que, não sendo a indemnização destes autos fixada nos termos dos artº 560º nº 5 e 794º nº 4 do C.Civ. não tem aplicação no caso dos autos a jurisprudência fixada no invocado Acórdão, sendo, nesta parte, também, de negar provimento ao recurso.
Assim sendo, deve a final ser negado provimento ao recurso das 2ª, 3ª e 4ª Rés.
4. Recurso interposto pela 5ª Ré;
O recurso da 5ª Ré versa integralmente sobre matéria já apreciada nos recursos interpostos pela 1ª Ré e 2ª, 3ª e 4ª Rés, quanto a terem as 1ª a 5ª Rés actuado sob as ordens da 6ª Ré enquanto sua superior hierárquica e no âmbito das suas funções enquanto funcionárias da Autora não lhes sendo imputável qualquer responsabilidade porquanto se limitaram a cumprir ordens.
Torna-se desnecessário voltar aqui a transcrever tudo quanto já se disse supra no que concerne ao acerto da decisão recorrida no que respeita à decisão sobre a base instrutória e a falta de fundamento deste e daqueles recursos na parte em que impugnam a decisão da matéria de facto, limitando-se a querer convencer de uma realidade que manifesta e objectivamente não se provou mas que era conveniente à defesa desta e daquelas Rés.
Pelo que, dando aqui por reproduzido tudo quanto já se afirmou supra quando à correcção da decisão sobre a matéria de facto provada e não provada, tal como os anteriores também a este recurso é de negar provimento, uma vez que, para além do desacordo quanto à matéria de facto nada mais se invoca.
5. Recurso interposto pela 7ª Ré.
No seu recurso vem a 7ª Ré insurgir-se contra a resposta dada pelo tribunal recorrido ao quesito 26º da Base instrutória no sentido de que não se podia dar como provado que o que ali se diz ocorreu em comunhão de esforços entre as 2ª, 3ª, 5ª, 6ª Rés e a 7ª Ré, uma vez que a “comunhão de esforços” com a 7ª Ré não se provou nem nada resulta dos autos nesse sentido.
Quanto a esta matéria o que consta da fundamentação do Acórdão sobre a base instrutória é o seguinte:
«Quanto à 7ª Ré, o tribunal teve em conta a confissão da própria 7ª Ré e as declarações da 1ª testemunha da Autora acerca do nome em inglês (M) por que a 7ª Ré é também conhecida. Da confissão da 5ª Ré resulta que as fichas de jogo referidas nos quesitos 9º e 10º foram depositadas na conta aberta na sala de jogo JJ em nome da M. Do documento junto a fls 407 e das filmagens vê-se que as fichas referidas nos quesitos 9º, 10º e 16º foram depositadas numa conta aberta na sala de jogo JJ em nome de M. Da prova testemunhal conclui-se que a 7ª Ré era a gerente da sala JJ. A isso acresce que a 7ª Ré nunca impugnou negando que essa conta era sua. Articulando os factos acima elencados, o tribunal entendeu que a conta a que o documento junto a fls 407 se refere pertence à 7ª Ré.
Ora, tendo em conta que desse documento constam os depósitos referidos nas respostas aos quesitos 9º, 10º e 16º bem como o levantamento referido na resposta ao quesito 17º, ficou o tribunal convencido que a 7ª Ré estava envolvida nos casos e nos termos indicados nos quesitos 9º, 10º, 16º, 17º, 23º, 26º e 43º.».
Ao lermos as alegações de recurso da 7ª Ré somos quase tentados a pensar que tem razão.
Porém, o que resulta da fundamentação da decisão recorrida é que em 22.01.2013 e 25.01.2013 (quesitos 9º, 10º e 16º) foram depositados na conta da 7ª Ré HKD25.000.000,00, sem que haja alguma tentativa de explicar o porquê, como se fosse a coisa mais natural depositar uma quantia destas na conta de outrem, sem que o dono da conta ao menos se inteirasse da proveniência do dinheiro uma vez que os depositantes são também elas funcionárias de uma sala VIP vizinha.
Ora, se as fichas são depositadas na conta da 7ª Ré, se não há qualquer outra justificação para o efeito, a única conclusão possível é aquela que o tribunal “a quo” retirou de que esta estaria envolvida e conluiada com as Rés que fizeram os depósitos.
É exigível a um ser médio que ao aceitar que valores tão elevados sejam depositados na sua conta – ainda que se tratem de contas abertas em salas VIP em que se movimentam quantias elevadas – que saiba e indague no mínimo a proveniência dos mesmos. Dever esse acrescido pela responsabilidade de ser uma pessoa com uma posição de responsabilidade numa sala VIP e que tem consciência das normas e das regras de segurança quanto às obrigações para evitar fraudes e lavagem de dinheiro.
A conclusão que o tribunal recorrido retira de que a actuação destas Rés foi em comunhão de esforços é a única possível face à receptação na sua conta (da 7ª Ré) dos valores que as outras Rés se apropriaram, sem, reitera-se, qualquer justificação minimamente plausível.
Assim sendo, também, ao recurso da 7ª Ré quanto à resposta dada ao quesito 26º da base instrutória terá de ser negado provimento.
III. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, decide-se:
- Negar provimento ao recurso interposto do despacho interlocutório de fls. 755;
- Conceder provimento parcial ao recurso da Autora e em consequência alterar as respostas dadas aos quesitos 5º e 40º da base instrutória as quais passam a ser as seguintes:
Quesito 5º:
«Provado apenas que 8ª Ré exerce a sua actividade de promoção de jogos numa sala VIP, sita no Casino II, em Macau, à qual foi dada a designação de “JJ” ou “JJ貴賓廳”.».
Quesito 40º:
«Provado apenas que foi no âmbito da sua actividade de promoção de jogo que a 7ª Ré, estando ao serviço numa das salas V.I.P. da 8ª Ré, sita no Casino II, recebeu fichas e dinheiro.»;
- Negar provimento ao recurso da Autora na parte restante;
- Negar provimento aos recursos interpostos pelas 1ª a 5ª e 7ª Rés.
Custas a cargo da Autora Recorrente quanto ao recurso interlocutório e na proporção de 4/5 quanto ao recurso por si interposto da decisão final dado que em parte obteve vencimento, e a cargo das 1ª a 5ª e 7ª Rés quanto aos recursos por si interpostos.
Registe e Notifique.
RAEM, 15 de Outubro de 2020
(Relator)
Rui Carlos dos Santos Pereira Ribeiro
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Lai Kin Hong
(Segundo Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong
1 Quanto à validade da confissão feita nos articulados ainda que o mandatário não tenha poderes para o efeito veja-se em jurisprudência comparada Acórdão do STJ de 03.06.2004, Proc. 04B1849 citado por João Gil de Oliveira e José Cândido de Pinho em Código Civil de Macau Anotado e Comentado Vol. V, pág. 277.
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419/2020 CÍVEL 1