Processo nº 47/2020 Data: 26.06.2020
(Autos de recurso jurisdicional)
Assuntos : Caducidade da concessão por arrendamento.
Despejo de terreno.
Omissão de factos.
Princípios de direito administrativo.
Acto vinculado.
SUMÁRIO
1. O acto administrativo que ordena o “despejo” da concessionária após declaração de caducidade da concessão é um “acto vinculado”.
2. O acto administrativo tem conteúdo “vinculado” quando o decisor não tem margem de livre decisão, tendo o acto um único sentido (possível).
3. No âmbito da “actividade vinculada”, nenhum relevo tem eventuais alegações de violação dos princípios da boa fé, da justiça, da proporcionalidade, da tutela de confiança e da igualdade.
O relator,
José Maria Dias Azedo
Processo nº 47/2020
(Autos de recurso jurisdicional)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. A (甲), cabeça de casal e herdeira de B e demais herdeiros, todos melhor identificados nos autos, vem recorrer do Acórdão pelo Tribunal de Segunda Instância proferido em 28.11.2019 que negou provimento ao seu (anterior) recurso contencioso do despacho do SECRETÁRIO PARA OS TRANSPORTES E OBRAS PÚBLICAS, datado de 31.07.2017, que ordenou o despejo (da parte) do terreno (que não está a ser utilizado pela Administração), situado na Rua dos Currais, descrito na C.R.P. sob o n.° 22 669, também identificado nos autos.
Em conclusão, afirmam que:
“1.ª Não obstante o conteúdo do artigo 430.°, n.° 1, do Código de Processo Civil, o TSI não selecionou, deixando de fora matéria de facto importante apesar de resultar, toda ela, provada documentalmente no processo instrutor.
2.ª Estão nesta circunstância os factos identificados n.° 5 destas alegações supra, provados documentalmente na PI de recurso e ainda no processo instrutor.
3.ª Neste sentido, consistindo o processo administrativo de um conjunto de documentos em que se traduzem nos actos e formalidades que integram o procedimento administrativo, o repositório cronológico e organizado de todos os actos, factos e formalidades que têm lugar ao longo do procedimento, servindo de documentador do modo como se foi formando e se manifestando a vontade da Administração num determinado caso concreto,
4.ª Todos os documentos do Processo Instrutor, tendo sido, todos eles elaborados pela própria Administração, portanto são considerados documentos autênticos, por se tratar de documentos exarados, com as formalidades legais, por autoridade pública nos limites da sua competência (art. 356.°, n.° 2 do Código Civil).
5.ª E ainda que tais documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade, oficial público ou notário respectivo (art. 365.°, n.° 1 do Código Civil).
6.ª E que os factos compreendidos nas declarações do processo instrutor consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante, como é o caso (art. 370.°, n.° 2 do Código Civi1).
7.ª Ou seja, sendo os documentos do processo instrutor qualificados como documentos autênticos fazendo prova plena, os factos constantes dos documentos do processo instrutor devem ser considerados como provados e seleccionados na matéria de facto dada como provada nos presentes autos, conforme doutrina tirada do acórdão do TUI de 23 de Abril de 2003, Processo n.º 6/2003 onde se diz que: I – Quando o Tribunal de Segunda Instância considere não provado um facto que esteja provado por meio de prova que constitua prova plena, pode o Tribunal de Última Instância alterar a decisão, nos termos do n.º 2 do artigo 649.º do Código de Processo Civil; II – O Tribunal de Última Instância, em recurso jurisdicional, não pode censurar a convicção formada pelas instâncias quanto à prova; mas pode reconhecer e declarar que há obstáculo legal a que tal convicção se tivesse formado, quando tenham sido violadas normas ou princípios jurídicos no julgamento da matéria de facto. É uma censura que se confina à legalidade do apuramento dos factos e não respeita directamente à existência ou inexistência destes.
8.ª Diz ainda o TUI que "Como é sabido, a prova plena está subtraída à convicção do julgador, constituindo uma excepção ao princípio da livre apreciação das provas, constante do art. 558.º nº 2 do Código de Processo Civil."
9.ª Isto significa, para o caso concreto, e pela doutrina do TUI, este alto Tribunal, pode alterar a decisão quantos aos factos consta E mais "pelo que o TUI pode alterar, nos termos do n.º 2, do art. 649.º do Código de Processo Civil, a decisão recorrida quanto àquele facto 3".
10.ª Isto significa, para o caso concreto, e pela doutrina do TUI, este alto Tribunal, pode alterar a decisão quantos aos factos constantes no processo instrutor referidos supra, o que desde já se requere.
II
11.ª O princípio da vocação personalizada da escolha do concessionário, prevê a transmissão não automática da posição subjectiva correspondente ao direito de executar o contrato, conforme Lei de Terras antiga (Lei nº 6/80/M), artigo 156º, e Lei de Terras nova (Lei nº 10/2013) artigo 157º.
12.ª A não automaticidade da transmissão significa que os herdeiros não entrarão na posição jurídica – contratual que o de cujus B detinha na concessão até que a Administração decida tal pedido de transmissão.
13.ª O corolário é que, se os herdeiros não têm o direito de executar o contrato porque não estão investidos nesse direito automaticamente, também não podem ser sujeitos a posições contratuais passivas decorrentes de um contrato que foram excluídos pela Lei e pela Administração.
14.ª Este princípio positivado na Lei de Terras artigo 157º, da não automaticidade da transmissão para os herdeiros, também não autoriza quaisquer transmissões de posições parciais de execução do contrato de concessão.
15.ª Ou se transmite a posição subjectiva correspondente a um direito de executar o contrato na totalidade ou não se transmite.
16.ª Como consequência as posições jurídicas activas e passivas decorrentes da execução do contrato de concessão ficam automaticamente paralisadas até à decisão final sobre o destino a dar à concessão, pelo que os herdeiros não têm acesso jurídico ao contrato de concessão nem à posse do terreno objecto do mesmo.
17.ª Acresce que, do ponto de vista material nunca os herdeiros tiveram a posse do terreno, basta ler a acta da reunião de 18 de Janeiro de 2002 onde se acordou com o concessionário a utilização temporária do terreno concedido por parte da Administração para instalação de um terminal provisório de autocarros e depósito de materiais de construção para perceber que o concessionário e os herdeiros nunca tiveram a posse e disponibilidade da dita parte remanescente.
18.ª Conforme ponto 1.1 da referida acta “a Administração pretendia ocupar, durante o prazo da execução de obra, ou seja, até Junho de 2004, o terreno, com 3.409 m2, sito na Rua dos Currais para instalação de um Terminal Provisório de autocarros e depósito de materiais de construção civil;
19.ª Isto é, a totalidade do terreno.
20.ª Diga-se ainda que, basta ver a matéria de facto atrás referida não selecionada no acórdão ora recorrido, toda ela constante do processo instrutor, sobre as ocupações ilegais (barracas) em todo a extensão da área do prédio objecto da concessão e portanto também na tal área remanescente alegadamente na posse do ex-concessionário, para se perceber que antes e depois da celebração do contrato NUNCA a parte do terreno que ora a Administração pretende despejar esteve na posse ou na disponibilidade do ex-concessionário ou dos herdeiros.
21.ª Isso mesmo é dito pela própria Administração no parecer que sustenta o despejo, ponto 6 da informação 205/DSO/2017 "Conforme as fotografias tiradas no local em 9 de Maio de 2017 e a planta cadastral n.° 768/1989 emitida em 5 de Junho de 2017, verifica-se que a maior parte do terreno em apreço (parcela "A" mencionada no ponto n.° 3) ainda se destina opera ao parque de estacionamento, e as restantes partes do terreno estavam ocupadas por várias construções. Além disso, de acordo com as imagens descarregadas da Direcção dos Serviços de Cartografia e Cadastro (DSCC) em 1988, 1998, 2009 e 2013, verifica-se que aquelas construções têm estado aí desde 1988 até à presente data (Anexo 6).
22.ª Do exposto conclui-se que a Administração está a reconhecer que existem construções, ocupações ilegais (barracas) no local remanescente, alegadamente na posse do ex-concessionário antes desde antes da celebração do contrato, situação mais que provada pelo processo instrutor.
23.ª Ora tudo isto significa, a existência dessas construções ilegais onde vive e trabalha gente desde antes da celebração do contrato até a actualidade, que o ex-concessionário nunca teve a posse ou a disponibilidade dessa alegada parcela e muito menos os ora recorrentes.
24.ª Ora, sendo causa e conhecendo a Administração todos os factos relatados supra, vir agora pretender despejar sujeitos que nunca tiveram a posse da dita parcela remanescente, quer jurídica, quer de facto, é uma expresso venire contra factum próprio e um manifesto abuso do direito positivada no artigo 326.º do Código Civil.
25.ª O recorte material do conteúdo do acto de declaração de caducidade, acto declarativo, que levou à extinção do contrato de concessão – inclusive a cláusula sexta – não comporta comandos que obriguem os recorrentes (ainda que estes tivessem legitimidade) a desocupar as mesmas construções que ocupam o terreno ex-concessionado (pertencente ao Estado) ainda antes da celebração do contrato, uma vez que tal tarefa – de polícia urbanística, de reposição e reintegração da legalidade infringida, de reposição da legalidade da ocupação, da legalidade urbanística nos terrenos – regressou automaticamente à esfera da Administração com a extinção do contrato de concessão
IV
26.ª O sentido que se retira do acto denominado de despejo que foi praticado pelo Secretário para os Transportes e Obras pública em 31.07.2017, é que, os ora recorrentes têm de desocupar ou fazer desocupar as mesmas construções que ocupam o terreno ex-concessionado ainda antes da celebração do contrato, e que estavam abrangidas pela reposição da legalidade da ocupação e reposição da legalidade urbanística prevista pela cláusula sexta do contrato de concessão extinto (veja-se ponto 6 da informação nº 205/DSO/2017 – Além disso, de acordo com as imagens descarregadas da Direcção dos Serviços de Cartografia e Cadastro (DSCC) em 1988, 1998, 2009 e 2013, verifica-se que aquelas construções têm estado aí desde 1988 até à presente data).
27.ª Pelo que, pode-se claramente retirar que o fundamento do despejo contra os ora recorrentes é uma cláusula contratual de um contrato extinto, uma vez que as medidas de reposição da legalidade são uma competência da Administração e não dos particulares ou então tal reposição exigida aos herdeiros não tem qualquer fundamento legal.
V
28.ª O TSI incorre em erro de julgamento no seu acórdão ao considerar que o acto executivo não viola os limites objectivos do acto declarativo, porquanto validou que o despejo ordenado pode obrigar os ora recorrentes a fazerem desocupar as mesmas construções que ocupam o terreno ex-concessionado ainda antes da celebração do contrato de concessão.
29.ª Segundo o acórdão do TSI, a invocação da cláusula 6º do contrato tem o fito de esclarecer a razão da exigência de entrega do terreno limpo, portanto, a razão da entrega do terreno limpo (livre de todas as construções clandestinas) é a cláusula 6º do contrato.
30.ª Isto, continua, independentemente das condições em que haja sido recebido pelo concessionário, pois era dever deste limpá-lo nos termos da invocada cláusula,
31.ª Portanto, o TS1 entende que, ainda que o ex-concessionário tenha recebido o terreno cheio de construções clandestinas, na hora do despejo, tem de entregar do terreno limpo (livre de todas as construções clandestinas) porque, cita-se, era dever deste limpá-lo nos termos da invocada cláusula.
32.ª Em suma, o que o TSI diz e confirma é que o despejo, a entrega do terreno limpo (livre de todas as construções clandestinas) tem alicerça-se no artigo 179º da Lei de Terras, mas a causa, a origem, o porquê, o motivo da entrega do terreno limpo (livre de todas as construções clandestinas) é a cláusula 6ª.
33.ª Este julgamento, do TSI viola claramente os limites objectivos do acto de declaração de caducidade uma vez que o recorte material do conteúdo do acto de declaração de caducidade, acto declarativo, que levou à extinção do contrato de concessão – inclusive a cláusula sexta – não comporta comandos que obriguem os recorrentes (ainda que estes tivessem legitimidade) a desocupar as mesmas construções que ocupam o terreno ex-concessionado (pertencente ao Estado) ainda antes da celebração do contrato, uma vez que tal tarefa – de polícia urbanística, de reposição e reintegração da legalidade infringida, de reposição da legalidade da ocupação, da legalidade urbanística nos terrenos – regressou automaticamente à esfera da Administração com a extinção do contrato de concessão.
34.ª A cláusula que autorizava o ex-concessionário a fazer desocupar as mesmas construções que ocupam o terreno ex-concessionado já não existe, caducou com a caducidade do contrato de concessão, portanto qualquer hipotético despejo de desocupação de construções que ocupam o terreno que tenha como causa essa cláusula é manifestamente ilegal.
35.ª Se se entendesse que a cláusula 6ª do contrato extinto poderia ser causa-fundamento do despejo, a desocupação das construções que ocupam o terreno, então tinha-se de admitir a possibilidade de se discutir a culpa pelo não aproveitamento do terreno e teria de perguntar-se, entre tantas outras questões;
a) Por que razão a Administração num contexto da impossibilidade de construção do edifício industrial com as características definidas no contrato de concessão, depois de alterar a finalidade da concessão. de "Indústria" para "Habitação" (ofício no. 356/795.2/DSODEP/2001) que culminou com a emissão da PAO, em 9 de Novembro de 2001, contemplando a referida finalidade de "habitação") ofício no. 438/795.2/DSODEP/2001 não reviu o contrato de concessão (tudo conforme processo instrutor)?
b) Porque não devolveu o terreno ao concessionário após 2004?
c) Porque esteve 11 anos e 11 meses sem se pronunciar sobre o pedido de transmissão mortis causa requerido em 09.08.2006 e respondido em 11.07.2017 após a declaração da caducidade?
36.ª A natureza do despejo previsto no artigo 179º da Lei de Terras visa apenas acautelar a ocupação abusiva, sem título, dos bens do domínio privado do Estado cedidos a título precário e não promover a reposição da legalidade urbanística de construções já existentes à data de celebração do contrato como vem ordenado no acto em crise.
37.ª Em suma, a execução que se pretende fazer a partir de uma cláusula de um contrato extinto vai para além dos limites jurídicos objectivos do acto declarativo de declaração de caducidade (artigo 138º nº 2 do CPA).
VI
38.ª O TSI incorre em erro de julgamento no seu acórdão ao considerar que o acto executivo não está viciado de erro nos pressupostos de facto.
39.ª Entendeu também o TSI julgar improcedente o vicio, porque os ora recorrentes teriam entrado na posse e disponibilidade do terreno com a morte de B, mas há claramente um erro de julgamento do TSI.
40.ª O despejo previsto no artigo 179º da Lei de Terras pressupõe que a posse efectiva do terreno esteja na posse de alguém, independentemente da sua qualidade, concessionário, sub-concessionário ou simplesmente possuidor, veja-se â previsão do artigo 179º nº 1 – o despejo do concessionário ou do ocupante.
41.ª É aqui que há um erro nos pressupostos do acto de execução.
42.ª Com efeito, conforme se pode ver pelos factos constantes nos autos e outros registados no processo instrutor, ainda que se considere, que por dever de patrocínio se coloca, que a Administração só ocupa parte da parcela do terreno ex-concessionado desde 2002, a outra parte, a que ora se pretende despejar é ocupada por ocupantes ilegais em construções clandestinas desde 1988, portanto antes da celebração do contrato de concessão com B.
43.ª Assim, a dita parcela de terreno que ora se pretende despejar, continua na posse de ocupantes ilegais desde antes da celebração do contrato de concessão, passou pela ocupação da Administração do terreno desde 2002 até à actualidade (Veja-se acta da reunião de 18 de Janeiro de 2002 onde se fala na ocupação total do terreno pela Administração) e resistiu à morte do concessionário até à declaração de caducidade do contrato de concessão.
44.ª Sendo que pelo meio, os ora recorrentes, para além de nunca ter chegado a terem qualquer posse efectiva do terreno, foram excluídos do contrato pela Administração como atrás já se demonstrou.
45.ª Em suma, os ora recorrentes não poderão desocupar uma parcela que não ocuparam, nem ocupam.
46.ª O acto de despejo a seguir em frente, conforme artigo 179º da Lei de Terras só poderá ser contra os ocupantes, nunca contra quem não é ocupante como os ora recorrentes.
47. ª Em conclusão, a execução que se pretende fazer é ainda ilegal por vício de erro nos pressupostos de facto (artigo 138º nº 4 do CPA) uma vez que, o despejo previsto no artigo 179º da Lei de Terras pressupõe a efectiva posse da parcela de terreno que se pretende despejar, parcela que os ora recorrentes não ocupam, nem nunca ocuparam.
48.ª O TSI incorre também em erro de julgamento no seu acórdão, quando, considera válido um despejo com base numa obrigação contratual inserta numa cláusula de um contrato extinto e não admite a possibilidade de se discutir a culpa que levou ao incumprimento dessa cláusula.
49.ª Ao considerar-se que a cláusula 6ª do contrato extinto poderia ser causa-fundamento do despejo, ressuscitando assim parte parcial do contrato, então tem de se de discutir porque é que aquela cláusula não foi cumprida e de quem é a culpa pelo não aproveitamento da terrena, tudo, tenda em canta a princípio da igualdade das partes nas condições de acesso, paridade e oportunidade do desenvolvimento do processo.
50.ª Se assim for, com base nos factos constantes na PI de recurso e no processo instrutor, os recorrentes mantem tudo o que já disseram nas alegações da recurso de contencioso.
51.ª Isto é, ordenar que os herdeiros desocupem um terreno que o seu pai, antigo concessionário, não pôde aproveitar par inteira responsabilidade da Administração é manifestamente um abuso do direito, uma vez que a Administração não cumpriu o dever de ordenar, de promover tudo o que fosse necessário ao seguimento do processo de execução do contrato, não decidiu justa e oportunamente, prolatou decisões no procedimento que prejudicaram todos os interessados ao longo do processo.
52.ª Veja-se que nos termas do artigo. 326.º da Código Civil, "é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito".
53.ª A fórmula do tu quoque é uma manifestação do abuso de direito, genericamente prevista nesta disposição do Código. Civil, que consiste na regra segundo a qual a pessoa que viole uma norma jurídica não poderá, sem abuso, exercer a situação jurídica que essa mesma norma lhe tivesse atribuída.
54.ª Ora, no caso dos autos, é manifesto que, se o concessionário e os seus herdeiros não cumpriram o contrato foi porque, manifestamente a Administração não procedeu à remoção dos impedimentos que ela própria foi criando ao longo do procedimento, não promoveu tudo o necessário ao seguimento do processo de execução do contrato, não decidiu justa e oportunamente todas questões que tinha de decidir e foi prolatando resoluções no procedimento que prejudicaram todos os interessados.
55.ª Ora, assim tendo sucedido, não pode o mesmo concedente, valendo-se do facto, a que deu origem de o aproveitamento não ter sido concluído por sua responsabilidade, vir, sem mais, exigir o cumprimento de uma cláusula contratual, sublinhe-se, contrato extinto, que obrigava o ex-concessionário à desocupação do terreno ex-concessionado, muito menos aos herdeiros que nunca foram parte do contrato”; (cfr., fls. 316 a 329 e 343 a 366-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Ao recurso respondeu a entidade administrativa pugnando pela improcedência do recurso; (cfr., fls. 371 a 376).
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Remetidos os autos a este Tribunal de Última Instância, em sede de vista, juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:
“Vem impugnado o acórdão de 28 de Novembro de 2019, do Tribunal de Segunda Instância, que negou provimento ao recurso contencioso interposto por A e outros, sucessores de B, no qual era visado o despacho de 31 de Julho de 2017, da autoria do Exm.° Secretário para os Transportes e Obras Públicas. Este despacho havia ordenado o despejo, com retirada de todos os objectos aí existentes, de parte do terreno que fora objecto de concessão àquele B.
Neste recurso jurisdicional, os recorrentes pretendem que o Tribunal de Última Instância altere a matéria de facto, mediante aditamento dos factos que dizem terem sido indevidamente omitidos na selecção da matéria de facto e que julgue procedentes os vícios que enumeram e que anteriormente haviam imputado ao acto administrativo em sede de recurso contencioso.
Deve notar-se, quanto à pretensão de alteração da matéria de facto, que está vedado ao Tribunal de Última Instância, como tribunal de recurso, alterar a matéria de facto, apenas o podendo fazer na hipótese prevista na parte final do n.° 2 do artigo 649.° do Código de Processo Civil, ou seja, se houver ofensa de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova – cf. também o artigo 152.° do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Pois bem, não se divisa, nem os recorrentes identificam, disposição legal expressa que, em matéria de vinculação e força probatória, haja sido afrontada pela selecção da matéria de facto operada pelo acórdão recorrido.
O que os recorrentes pretendem, se bem entendemos a sua alegação nesta parte, é que seja seleccionada toda a matéria que deva considerar-se provada por força da autenticidade de documentos insertos no processo administrativo. Mas afigura-se que isto não pode ser. No contencioso administrativo, o tribunal tem apenas que julgar, de entre os factos pertinentes, aqueles que tem por assentes ou provados, em vista da emissão do juízo que de si é reclamado sobre a legalidade do acto administrativo questionado. Não tem que seleccionar toda a matéria de facto que se lhe depare, quer alinhada pelas partes, quer emergente do procedimento administrativo, mesmo que a tenha por provada. É o que, salvo melhor juízo, resulta dos artigos 76.° e 65.°, n.° 3, do Código de Processo Administrativo Contencioso.
No caso em análise, a matéria seleccionada apresenta-se bastante para abordagem das questões suscitadas (vícios), não vindo aliás explicitada a medida em que os factos não seleccionados influíram na decisão da causa, nem vindo concretamente arguida qualquer nulidade.
Improcede, assim, esta pretensão impugnatória, nenhuma alteração se impondo, em matéria de facto, ao abrigo da ressalva prevista no artigo 649.°, n.° 2, do Código de Processo Civil.
Passando aos erros de julgamento, verifica-se que os recorrentes vêm, em sede de recurso jurisdicional, esgrimir e repisar motivos e argumentos que já antes utilizaram em sede de recurso contencioso, na caracterização e explicitação dos vícios do acto.
Na oportunidade, pronunciou-se o Ministério Público sobre esses vícios, fazendo-o nos moldes do parecer de fls. 310 e seguintes, que foi acolhido pelo acórdão recorrido, manifestando-se contra a tese da ilegalidade que agora volta a terreiro.
Não divisamos motivos de monta para alterar o sentido daquele nosso parecer, que ora reafirmamos, pronunciando-nos pela improcedência dos fundamentos do recurso jurisdicional, também no tocante aos aventados erros de julgamento dos vícios do acto.
Termos em que se afigura não merecer censura o acórdão recorrido, que deve ser mantido, negando-se provimento ao recurso jurisdicional”; (cfr., fls. 385 a 386-v).
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Adequadamente processados os autos, cumpre apreciar.
Fundamentação
Dos factos
2. Pelo Tribunal de Segunda Instância estão dados como “provados” os factos seguintes:
“1 - Pelo Despacho n.º 129/SAOPH/89, publicado no suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 46, de 16 de Novembro de 1989, B obteve a concessão pelo prazo de 25 anos, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, de um terreno sito na península de Macau, na Rua dos Currais, com a área de 3409 m².
2 - O terreno está descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 22669 a fls. 478 do livro B159M e o direito resultante da concessão encontra-se inscrito a favor de B sob o n.º 20245 a fls. 88 do livro F100M.
3 - B faleceu em 11 de Maio de 2006, sucedendo-lhe como herdeiros A, C, D, E, F, G, H e I.
4 - O arrendamento era válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da data da outorga da respectiva escritura, podendo o prazo ser sucessivamente renovado até 19 de Dezembro de 2049, nos termos da legislação aplicável e mediante condições a acordar.
5 - A finalidade de tal concessão era a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, compreendendo 13 pisos destinados a comercialização e apoio oficinal do parque automóvel.
6 - Conforme o estipulado no n.º 1 da cláusula quinta do contrato de concessão, o prazo global de aproveitamento foi fixado em 36 meses, contados a partir da publicação no Boletim Oficial do despacho que autoriza o contrato, ou seja, até 16 de Novembro de 1992.
7 - Em 18/01/2002, concedente e concessionário celebraram um acordo pelo qual a Administração ocuparia, durante o prazo de execução de obra, ou seja, até Junho de 2004, o terreno com a área de 3409 m2 sito na Rua dos Currais, para a instalação de um Terminal Provisório de autocarros e para depósito de materiais de construção civil, comprometendo-se ela a desocupar todas as sucatas e materiais ali existentes (doc. nº 5 junto com a p.i.).
8 - Na sequência desse acordo, o terreno foi entregue à Administração em 7/10/2002.
9 - O concessionário pagou integralmente o prémio no valor de MOP8.735.240,00.
10 - Até 24 de Junho de 2016, data em que foi declarada a caducidade do contrato de concessão pelo Exm.º Chefe do Executivo, o terreno não se mostrava aproveitado.
11 - Reunida em sessão de 25 de Fevereiro de 2016, a Comissão de Terras emitiu o seguinte parecer:
“Proc. n.º 11/2016 – Respeitante à proposta da declaração de caducidade da concessão provisória, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 3409m2, situado na península de Macau, na Rua dos Currais, a favor de B, pelo decurso do seu prazo de vigência, de 25 anos, que expirou em 15 de Novembro de 2014.
I
1. Ao abrigo do disposto no artigo 44º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), a concessão por arrendamento é inicialmente dada a título provisório, por prazo a fixar em função das suas características e só se converte em definitiva se, no decurso do prozo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas e o terreno estiver demarcado definitivamente. Nos termos do disposto no artigo 48º da mesma lei, a concessão provisória não pode ser renovada. Assim, através do despacho do Chefe do Executivo, declara-se a caducidade de concessão, por decurso do prazo de arrendamento, de acordo com o artigo 167º da mesma lei.
2. De acordo com o disposto no artigo 179º da Lei de terras e no artigo 56º do Decreto-Lei n.º 79/85/M, o despejo do concessionário ou do ocupante é ordenado por despacho do Chefe do Executivo quando se verifique a declaração da caducidade da concessão.
3. Face ao exposto, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), através da proposta n.º 349/DSODEP/2015, de 18 de Novembro, propôs autorização para dar início ao procedimento de declaração de caducidade das concessões provisórias cujo prazo de arrendamento expirou ou irá expirar, bem como dar início aos respectivos trabalhos por ordem cronológica das datas em que terminou o prazo de arrendamento de cada um daqueles processos, tendo o Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP) aprovada esta proposta por despacho de 25 de Novembro de 2015.
II
4. Pelo Despacho n.º 129/SAOPH/89, publicado no suplemento ao Boletim Oficial de Macau, n.º 46, de 16 de Novembro de 1989, foi titulada a concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 3409m2, situado na península de Macau, na Rua dos Currais, a favor de B.
5. De acordo com a cláusula segunda do contrato de concessão, o arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da data da outorga da respectiva escritura, porém, não tendo sido celebrada a escritura, por força do disposto no n.º 1 do artigo 4º da Lei n.º 8/91/M, de 29 de Julho, a concessão passou a ser titulada pelo sobredito despacho, passando o prazo de arrendamento a contar-se da data da sua publicação, ou seja, até 15 de Novembro de 2014.
6. Conforme a cláusula terceira do respectivo contrato, o terreno é aproveitado com a construção de um edifício de 13 pisos, em regime de propriedade horizontal, destinado a comércio, indústria e estacionamento, para comercialização e apoio oficinal do parque automóvel.
7. O prazo global de aproveitamento do terreno é de 36 meses, contados a partir da data de publicação do sobredito despacho, ou seja, até 15 de Novembro de 1992.
8. O prémio do contrato e os respectivos juros em prestações no valor global de $8.735.240,00 patacas foram integralmente pagos.
9. O terreno referido em epígrafe está descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 22669 a fls. 478 do livro B159M e o direito resultante da concessão encontra-se inscrito a favor do concessionário sob o n.º 20245 a fls. 88 do livro F100M.
III
10. Através da carta de 11 de Janeiro de 1990, o concessionário informou à entidade competente a impossibilidade de apresentação do projecto de obra dentro do prazo estipulado, dado que ainda não tinha sido emitida a planta de alinhamento oficial (PAO). No entanto, após a emissão em 12 de Fevereiro de 1990 da PAO, o concessionário solicitou em 9 de Dezembro de 1991 a alteração das finalidades do terreno para comércio e habitação, o qual foi indeferido pelo Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas (SATOP) por despacho de 14 de Julho de 1992.
11. Posteriormente, depois do projecto de arquitectura apresentado em 13 de Junho de 1990 ter sido considerado passível de aprovação condicionada em 26 de Agosto de 1992, através da carta de 10 de Novembro de 1992, o concessionário solicitou informações concretas das alterações relativas às condições urbanísticas do terreno, a fim de se dar seguimento ao projecto de construção.
12. Após recepção, em 2 de Março de 1993, da PAO actualizada, o concessionário solicitou em 6 de Março de 1993 a prorrogação do prazo de apresentação do projecto de arquitectura para 30 de Abril de 1993, o qual foi autorizado em 12 de Março do mesmo ano.
13. Em 22 de Agosto de 1995, ao abrigo do regime de contrato de desenvolvimento para habitação, o concessionário solicitou a alteração das finalidades do terreno de indústria e comércio para habitação. Ouvidos os pareceres das entidades competentes, o SATOP indeferiu este pedido por despacho de 8 de Janeiro de 1996.
14. Posteriormente, em 12 de Abril de 1996, o concessionário apresentou várias questões no âmbito de protecção ambiental, de segurança e em termos económicos relativos à implementação no respectivo terreno do projecto de reparação de automóveis. Para além disso, através do despacho de 10 de Dezembro de 1998, o Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica (SACE) fez saber que tendo em consideração o desenvolvimento do respectivo bairro social e os factores ambientais, considera que não é adequada a construção no bairro do edifício indicado no contrato, tendo emitido parecer viável sobre a alteração das finalidades do terreno e proposto ainda o reinício do projecto previsto no contrato noutra zona do território (Pac On).
15. Apesar disso, através dos requerimentos apresentados no Gabinete do Chefe do Executivo e na DSSOPT em 9 de Outubro de 2000 e 29 de Maio de 2001, respectivamente, o concessionário veio solicitar a devolução do prémio do contrato e compensação. Tendo o STOP indeferido o pedido de devolução do prémio, mas permitido a alteração das finalidades do terreno por despacho de 17 de Setembro de 2001.
16. Conforme a PAO e a planta cadastral emitidas em 12 de Outubro e 1 de Novembro de 2001, respectivamente, as finalidades do terreno foram alteradas para habitação, comércio/serviço, equipamentos sociais e de estacionamento.
17. Devido à execução das obras de construção do novo Posto Fronteiriço das Portas do Cerco, celebrando-se em 18 de Janeiro de 2002 um documento, o concessionário aceitou o pedido da Administração sobre a utilização temporária do respectivo terreno até 30 de Junho de 2004 para instalação de um terminal provisório de autocarros e depósito de materiais de construção civil, devendo essa entidade desocupar a sucata e materiais ali existentes. De acordo com o auto de vistoria para a recepção de 17 de Outubro de 2002, os trabalhos da desocupação do terreno ficaram concluídos.
18. Posteriormente, por Despacho do Chefe do Executivo n.º 24/2003, publicado no Boletim Oficial da Região Administração Especial de Macau (RAEM) n.º 5, I série, de 4 de Fevereiro de 2003, a parcela destinada à instalação de um parque de estacionamento, ou seja, um terminal provisório de autocarros, foi considerada como via pública para efeitos de responsabilidade civil e criminal.
19. Em 2 de Junho e 27 de Julho de 2004, o concessionário solicitou acompanhamento do assunto relativo à devolução do terreno, uma vez que o prazo de utilização temporária do terreno iria terminar em 30 de Junho de 2004.
20. Por motivo de falecimento do concessionário em 11 de Maio de 2006, através dos requerimentos de 9 de Agosto de 2006 e 4 de Maio de 2007, os seus herdeiros solicitaram a transmissão do direito resultante da concessão do terreno.
21. Através da proposta n.º 123/DSODEP/2007, de 29 de Novembro, a DSSOPT propôs que se acompanhasse o respectivo pedido, no entanto, a proposta não recebeu qualquer resposta.
22. Em 2 de Agosto de 2011, os herdeiros do concessionário apresentaram uma sentença homologatória da partilha dos bens incluindo o terreno em apreço e solicitaram, em 15 de Junho e 26 de Dezembro de 2012, o acompanhamento do assunto relativo à transmissão por morte da concessão e à devolução do terreno.
23. Dado que decorria a realização do Plano Conceptual Urbanístico da Zona das Portas do Cerco e Envolvente e se pretendia que o respectivo terreno se destinasse a instalações de bairro social e aos equipamentos desportivos, como não se encontrou nenhum terreno adequado para permuta, em 3 de Abril de 2013, a DSSOPT propôs que se considerasse a viabilidade de devolução dos prémios pagos.
24. Através do requerimento apresentado em 21 de Junho de 2013, os herdeiros do concessionário, não pretendendo receber a devolução do prémio, solicitaram a devolução do terreno ou a concessão de um outro terreno por permuta, uma vez que o prazo de arrendamento estava quase expirar.
25. Posteriormente, em 30 de Julho de 2013, através de requerimento apresentado no Gabinete do Chefe do Executivo pelo advogado dos herdeiros do concessionário, estes solicitaram autorização para a transmissão por morte da concessão do terreno e a revisão do contrato ou celebração de um novo contrato de concessão do terreno.
26. Através da proposta n.º 001/DSODEP/2014, de 7 de Julho, o Departamento de Gestão de Solos (DSODEP) da DSSOPT propôs o envio do processo ao Departamento Jurídico (DJUDEP) para efeitos de emissão de parecer. A esta solicitação, através da proposta n.º 54/DJUDEP/2014, de 26 de Setembro, o DJUDEP julga que se deveria indeferir o respectivo pedido, uma vez que o prazo de arredamento terminará em 15 de Novembro de 2014 e a concessão do terreno ainda é provisória. Ao abrigo da disposição do artigo 48º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), as concessões provisórias não podem ser renovadas, o que significa que os herdeiros do concessionário manifestamente não podem assegurar o cumprimento das obrigações estipuladas no contrato de concessão, pelo que, não pode ser deferida a transmissão, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 157º da mesma lei. Para além disso, uma vez que o concessionário faleceu em 11 de Maio de 2006 e o pedido de transmissão da concessão foi indeferido, extinguiu-se o direito resultante da concessão do terreno e os respectivos herdeiros não têm qualquer posição jurídica do direito resultante da concessão, consequentemente, não podendo ser revisto nem celebrado um novo contrato de concessão do terreno, os herdeiros têm direito de solicitar à Administração uma compensação pelo uso do terreno, entre 1 de Julho de 2004 e 11 de Maio de 2006.
27. Após o termo do prazo de arredamento, em 26 de Outubro de 2015, os herdeiros do concessionário solicitaram mais uma vez a autorização para a transmissão por morte da concessão e a revisão do contrato ou celebração de um novo contrato de concessão do terreno.
28. Mesmo que os herdeiros do concessionário apresentassem os respectivos pedidos, a realização de audiência sobre o indeferimento do pedido não afecta o seguimento do procedimento de declaração de caducidade por decurso do prazo do arredamento, de acordo com os pareceres exarados na proposta n.º 22/DJUDEP/2015, de 31 de Março. Sendo assim, através da proposta n.º 007/DSODEP/2016, de 8 de Janeiro, o DSODEP propôs o indeferimento do pedido de transmissão por morte da concessão e da revisão ou celebração de um novo contrato de concessão do terreno, propondo ainda acompanhamento do procedimento ulterior de audiência.
29. Por outro lado, de acordo com o disposto na cláusula segunda do contrato, o prazo do arrendamento terminou em 15 de Novembro de 2014. No entanto, a respectiva concessão ainda é provisória, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 48º da Lei de terras, a mesma não pode ser renovada. Nestas circunstâncias, a DSSOPT, através da mesma proposta, propôs que fosse autorizado o seguimento do procedimento relativo à declaração da caducidade da concessão por decurso do prazo de arrendamento e o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer. Na sequência do parecer concordante do director da DSSOPT, o STOP manifestou a sua concordância por despacho de 3 de Fevereiro de 2016.
30. Face ao exposto, esta Comissão, após ter analisado o processo, considera que tendo expirado em 15 de Novembro de 2014 o prazo de vigência da concessão (prazo de arrendamento), de 25 anos, fixado na cláusula segunda do contrato de concessão, sem que o aproveitamento do terreno definido neste contrato se mostre realizado, a concessão provisória em apreço encontra-se já caducada (caducidade preclusiva).
Com efeito, de acordo com o artigo 44º da Lei n.º 10/2013 (Lei de Terras), aplicável ao caso vertente por força do disposto nos seus artigos 212º e 215º, a concessão por arrendamento é inicialmente dada a título provisório e só se converte em definitiva se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas e o terreno estiver demarcado definitivamente (vide ainda artigos 130º e 131º).
Findo o seu prazo de vigência, as concessões provisórias não podem ser renovadas, a não ser no caso previsto no n.º 2 do artigo 48º da Lei de Terras, conforme estabelece o n.º 1 do mesmo preceito legal, operando-se a caducidade por força da verificação daquele facto (decurso do prazo de arrendamento).
De igual modo, resultava da Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho (Lei de Terras anterior), que no caso da concessão revestir natureza provisória em virtude do terreno não se encontrar aproveitado (cf. artigos 49º, 132º e 133º), não era possível operar a sua renovação por períodos sucessivos de dez anos porquanto a figura da renovação prevista no n.º 1 do artigo 55º era aplicável apenas às concessões definitivas.
Apesar da caducidade operar de forma automática e directa, para tornar a situação jurídica certa e incontestada e, portanto, eliminar a insegurança jurídica sobre a extinção ou não do direito resultante da concessão, deve a mesma (caducidade) ser declarada, conforme decorre do disposto no corpo do artigo 167º da Lei n.º 10/2013.
Nestas circunstâncias, esta Comissão nada tem a opor à declaração de caducidade da concessão do terreno em epígrafe pelo decurso do prazo de arrendamento, perdendo o concessionário a favor da RAEM todas as prestações do prémio e os respectivos juros já pagos, nos termos do disposto no artigo 13º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004.
IV
Reunida em sessão de 25 de Fevereiro de 2016, a Comissão de Terras, após ter analisado o processo e tendo em consideração o parecer e proposta constantes na proposta n.º 007/DSODEP/2016, de 8 de Janeiro, bem como o despacho nela exarado pelo STOP, de 3 de Fevereiro de 2016, considera que verificada a caducidade da concessão pelo termo do prazo de arrendamento em 15 de Novembro de 2014, deve esta caducidade ser declarada por despacho do Chefe do Executivo.
Comissão de Terras, aos 25 de Fevereiro de 2016.”
12 - Posteriormente, o Exm.º Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu, em 3 de Março de 2016, o seguinte parecer:
“Proc. n.º 11/2016 – Respeitante à proposta da declaração de caducidade da concessão provisória, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 3409m2, situado na península de Macau, na Rua dos Currais, a favor de B, pelo decurso do seu prazo de vigência, de 25 anos, que expirou em 15 de Novembro de 2014.
1. Pelo Despacho n.º 129/SAOPH/89, publicado no suplemento ao Boletim Oficial de Macau, n.º 46, de 16 de Novembro de 1989, foi titulada a concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 3409m2, situado na península de Macau, na Rua dos Currais, a favor de B.
2. De acordo com a cláusula segunda do contrato de concessão, o arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da data da outorga da respectiva escritura, porém, não tendo sido celebrada a escritura, por força do disposto no n.º 1 do artigo 4º da Lei n.º 8/91/M, de 29 de Julho, a concessão passou a ser titulada pelo sobredito despacho, passando o prazo de arrendamento a conta-se da data da sua publicação, ou seja, até 15 de Novembro de 2014.
3. O terreno seria aproveitado com a construção de um edifício de 13 pisos, em regime de propriedade horizontal, destinado a comércio, indústria e estacionamento, para comercialização e apoio oficinal do parque automóvel.
4. Uma vez que o prazo de arrendamento do terreno terminou em 15 de Novembro de 2014 e o aproveitamento do terreno não foi concluído, a DSSOPT propôs que fosse autorizado o seguimento do procedimento relativo à declaração da caducidade da concessão por decurso do prazo de arrendamento e o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer, o que mereceu a minha concordância, por despacho de 3 de Fevereiro de 2016.
5. Reunida em sessão de 25 de Fevereiro de 2016, a Comissão de Terras, após ter analisado o processo, tendo em consideração que o prazo de arrendamento foi terminado, sem que o aproveitamento estabelecido neste contrato se mostre realizado, e que, sendo a concessão provisória, não pode ser renovada, de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 48º da Lei n.º 10/2013 (Lei de Terras), aplicável por força dos seus artigos 212º e 215º. Deste modo, a concessão encontra-se caducada pelo termo do respeito prazo de arrendamento (caducidade preclusiva), devendo esta caducidade ser declarada por despacho do Chefe do Executivo.
Consultado o processo supra mencionado e concordando com o que vem proposto, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido terreno.”
13 - O Exm.º Chefe do Executivo proferiu a seguinte decisão em 24 de Junho de 2016:
“Concordo, pelo que declaro a caducidade da concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, a que se refere o Processo n.º 11/2016 da Comissão de Terras, nos termos e com os fundamentos do Parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 3 de Março de 2016, os quais fazem parte integrante do presente despacho.”
14 - Deste despacho foi interposto recurso contencioso para este TSI, a que coube o Processo nº 243/2017, vindo o mesmo a ser julgado improcedente por acórdão de 21/03/2019, que, em sede de recurso jurisdicional interposto para o TUI, viria a ser confirmado por acórdão de 30/07/2019”; (cfr., fls. 322 a 327).
Do direito
3. Inconformados com o decidido pelo Tribunal de Segunda Instância, trazem os recorrentes o presente recurso (jurisdicional), pedindo que (com a sua procedência) se revogue o Acórdão recorrido e se anule o “despacho de 31.07.2017 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas”.
Antes de mais, para melhor compreensão do que em causa está no presente recurso, mostra-se adequado aqui consignar que o supra referido “despacho de 31.07.2017” foi proferido na sequência de anterior despacho do Chefe do Executivo de 24.06.2016 que declarou a caducidade da concessão por arredamento do terreno em questão, (cfr., “ponto 13 da matéria de facto”, e que, como se deixou consignado, foi “confirmado” pelo Acórdão desta Instância de 30.07.2019, Proc. n.° 72/2019), tendo sido exarado na Informação/Proposta n.° 205/DSO/2017, com o teor seguinte:
“1. Por Despacho n.° 129/SAOPH/89 de 16 de Novembro de 1989, o terreno com a área de 3 409m2, situado em Macau, na Rua dos Currais foi concedido ao B por arrendamento e com dispensa de hasta pública, para a construção de um edifício com a finalidade de comércio, indústria e estacionamento, o prazo de arrendamento é até 15 de Novembro de 2014. Além disso, constituem os seus encargos especiais a desocupação do terreno e remoção do mesmo de todas as construções e materiais aí existentes (Anexo 1).
2. Na sequência do início da construção do novo posto fronteiriço sito nas Portas do Cerco em Macau, em 18 de Janeiro de 2002 o então Director, a Chefe do Departamento de Gestão de Solos destes Serviço e o concessionário assinaram um acordo sobre a aceitação de utilização temporária do referido terreno pela Administração, devendo a Administração desocupar todas as sucatas e materiais ali existentes (Anexo 2).
3. Por despacho do Chefe do Executivo n.° 24/2003, publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.° 5, I série, de 4 de Fevereiro de 2003, foi anexada a maior parte do terreno supra referido com algumas outras parcelas, criando um parque de estacionamento (parcela assinalada pela letra "A" na planta cadastral daquele despacho), abreviadamente designado por "Terminal das Portas do Cerco" (Anexo 3).
4. Posteriormente iniciou-se os trabalhos de desocupação do aludido terreno e realizou-se a vistoria em 7 de Outubro de 2002, e o aludido terreno foi entregue ao então Departamento de Tráfego desta Direcção de Serviços para a sua utilização. (vide o teor do auto da vistoria em anexo 4).
5. Por despacho do Chefe do Executivo de 24 de Junho de 2016, foi declarada a caducidade de concessão do referido terreno e publicada por despacho n.° 59/2016 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP) no Boletim Oficial da RAEM n.° 2, II Série, de 11 de Janeiro de 2017 (Anexo 5).
6. Conforme as fotografias tiradas no local em 9 de Maio de 2017 e a planta cadastral n.° 768/1989 emitida em 5 de Junho de 2017, verifica-se que a maior parte do terreno em apreço (parcela "A" mencionada no ponto n.° 3) ainda se destina ao parque de estacionamento de estacionamento, e as restantes partes do terreno estavam ocupadas por várias construções. Além disso, de acordo com as· imagens descarregadas da Direcção dos Serviços de Cartografia e Cadastro (DSCC) em 1988, 1998, 2009 e 2013, verifica-se que aquelas construções têm estado aí desde 1988 até à presente data (Anexo 6).
Análise e Conclusão
7. Enfrentando o seguimento da caducidade de concessão, deve considerar-se o seguinte:
7.1. Nos termos do artigo 117.° e do n.° 1 do artigo 136.° do «Código do Procedimento Administrativo» (CPA) aprovado pelo Decreto-Lei n.° 57/99/M de 11 de Outubro, o acto administrativo produz os seus efeitos desde a data em que for praticado e é executório logo que eficaz, não obstando à perfeição do mesmo por qualquer motivo determinante de anulabilidade, salvo os actos previstos no artigo 137.° do CPA;
7.2. Por outro lado, ao abrigo das disposições do artigo 22.° do «Código do Processo Administrativo Contencioso» aprovado pelo Decreto-Lei n.° 110/99/M de 13 de Dezembro, o recurso contencioso não tem efeito suspensivo da eficácia do acto recorrido;
7.3. Assim sendo, quer interponha o recurso contencioso quer não, a ordem emitida pela Administração tem de ser executada;
7.4. Com base no n.° 2 do artigo 179.° da Lei n.° 10/2013 «Lei de terras», o despejo processa-se nos termos e com as necessárias adaptações do Decreto-Lei n.° 79/85/M, de 21 de Agosto «Regulamento Geral da Construção Urbana» (RGCU);
7.5. Por isso, o Chefe do Executivo pode ordenar no prazo fixado, o despejo dos herdeiros incertos da ex-concessionária ou demais interessados do terreno cuja concessão foi declarada caduca nos termos do n.° 2 do artigo 55.° do RGCU;
7.6. Os objectos, materiais e equipamentos abandonados no terreno serão tratados de acordo com as disposições do artigo 210.° da «Lei de terras».
8. Face ao acima exposto, considerando que os factos referidos nos pontos n.°s 3, 4 e 6 da presente proposta, isto é, a maior parte do terreno está a ser utilizado até hoje pela Administração, e quanto às restantes partes do terreno, a remoção de todas as construções e materiais aí existentes antes de data da publicação do despacho de concessão apenas constitui encargo especial do concessionário, mas já foi declarada a caducidade de referida concessão, assim se submete a presente proposta à consideração da V. Ex.a, a fim de:
8.1. Ordenar os herdeiros do B e demais interessados no prazo de 60 dias a contar da data da notificação, o despejo da parte do terreno (parte amarela em anexo 6) que não está a ser utilizado pela Administração, situado na Rua dos Currais, descrito na CRP sob o n.° 22 669, cuja concessão foi declarada a caducidade por despacho do Chefe do Executivo de 24 de Junho de 2016, devendo retirar todos os objectos naquele terreno;
Caso não se execute no prazo de 60 dias,
8.2. A DSSOPT irá executar coercivamente o referido despejo de acordo com o artigo 56.° do RGCU, bem como remover todos os objectos se encontram no local.
(…)”; (cfr., doc. n.° 2, a fls. 49 a 51-v, pelos recorrentes junto com a sua petição de recurso).
Aqui chegados, em face do que relatado está, ponderando-se nas “questões” a apreciar e em tudo o alegado pela entidade recorrida e Ministério Público, sem esforço se mostra de concluir que carecem os recorrentes de qualquer razão.
Vejamos.
Percorrendo as – extensas – alegações e conclusões do presente recurso, verifica-se que, em bom rigor, voltam os recorrentes a colocar as mesmas questões antes já colocadas ao Tribunal de Segunda Instância.
Em síntese que se nos mostra adequada, entendem que se incorreu em “omissão de selecção de factos” e “erro de julgamento quanto à aplicação do direito”, (aqui, por razões várias).
–– Sendo que no âmbito da segunda das questões colocadas suscitam (também) a sua “ilegitimidade”, mostra-se de se começar pela sua apreciação.
Ora, o Tribunal de Segunda Instância decidiu que inexistia qualquer “ilegitimidade dos recorrentes”, acolhendo o Parecer do Ministério Público que opinava no mesmo sentido, tendo-se aí, e sobre esta matéria, consignado o seguinte:
“Os recorrentes começam por questionar a sua legitimidade substantiva na relação jurídica contratual, socorrendo-se do indeferimento da transmissão mortis causa do contrato de concessão para os herdeiros.
Crê-se que este indeferimento apenas os impediu de ingressarem na posição jurídico-contratual que o de cujus B detinha na concessão. Não teve qualquer influência na transmissão dos normais direitos e obrigações decorrentes da sucessão. E entre estas últimas conta-se a de devolver, por via da declaração da caducidade da concessão, e nos moldes previstos no DL n.° 79/85/M, ex vi do artigo 179.° da Lei de Terras, a parte do terreno não ocupada pela Administração e que permanecera na posse e disponibilidade do falecido concessionário”; (cfr., fls. 310 a 310-v).
Dada a clareza com que foi a invocada “ilegitimidade” abordada, e considerando-se integralmente adequada a solução apresentada, mais não se mostra de consignar.
Seja como for, importa não olvidar, (e não se deixa de notar) que, como “provado” está, os ora recorrentes, após o falecimento de B, por várias vezes, assumiram-se (expressamente) como “legítimos representantes deste”, e, como “interessados” do terreno em causa, por diversas vezes, apresentaram requerimentos à Administração, tendo, mesmo, interposto recurso para o Tribunal de Segunda Instância e para este Tribunal de Última Instância do aludido despacho que declarou a caducidade da concessão, (cfr., respectivamente, os Acs. de 21.03.2019, Proc. n.° 243/2017, e de 30.07.2019, Proc. n.° 72/2019), tentando inverter a referida “declaração de caducidade” da concessão do terreno, na sequência da qual se proferiu o despacho que ordenou o “despejo” que, com os presentes autos, querem (também) ver anulado, mas, em relação ao qual, agora, se dizem alheios…, sendo, desta forma, evidente que carecem de razão.
Continuando.
–– Vejamos agora da dita “omissão de selecção de factos”.
Em relação a esta questão, cabe dizer o que segue.
A “matéria” pelos recorrentes considerada em falta, diz – essencialmente – respeito à (eventual) existência de barracas e outras construções (precárias) no terreno em data anterior à da (própria) concessão, (ocorrida em 1989).
E, com a ora reclamada inclusão na matéria de facto, pretendem justificar que, por se tratar de construções já existentes ao tempo da concessão, não lhes compete a sua remoção.
Também aqui não se mostra necessária uma grande elaboração para se demonstrar da falta de razão dos recorrentes.
Com efeito, e independentemente do demais, (nomeadamente, de não estar este Tribunal de Última Instância vocacionado para se pronunciar e conhecer sobre “matéria de facto”, cfr., v.g., o Ac. de 19.02.2020, Proc. n.° 83/2018), importa atentar que o critério para a decisão de se incluir, ou não, determinada “matéria de facto”, é, como não podia deixar de ser, o da sua “relevância” e “utilidade” para a(s) decisão(ões) (de direito) a proferir; (cfr., v.g., o Ac. desta Instância de 16.10.2019, Proc. n.° 16/2017).
No caso, a atrás transcrita informação, onde foi exarado o “despacho de despejo”, já é suficientemente clara quanto ao seu “objecto”, nela se referindo, expressamente, a “construções e materiais existentes antes da data da publicação do despacho de concessão”, nenhuma relevância ou utilidade existindo assim para se elencar, (incluir), a matéria pelos recorrentes reclamada na factualidade dada como provada, visto estando assim que, na parte em questão, improcede, igualmente, o recurso.
Avancemos.
–– Prosseguem os recorrentes as suas alegações e conclusões, atacando – em síntese – o “juízo de legalidade formal e substancial” que o Tribunal de Segunda Instância atribuiu ao dito “despacho de despejo”.
Como já se deixou adiantado, e sem embargo do muito respeito devido a outro entendimento, não se mostra de ir ao encontro do pelos recorrentes considerado.
Na verdade, como constitui entendimento firme desta Instância:
“O acto que determina despejo da concessionária, após declaração de caducidade da concessão, não tem de ser precedido de audiência daquela, por se tratar de acto vinculado.
Do disposto na alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da Lei de Terras, não resulta que a Administração possa deixar de executar o acto, determinando o despejo do terreno. A lei não concede à Administração margem de livre apreciação ou decisão, para aguardar ou deixar de aguardar a impugnação do acto que declarou a caducidade ou para aguardar quaisquer outros eventos”; (cfr., v.g., o Ac. de 30.07.2019, Proc. n.° 80/2019, de 04.10.2019, Proc. n.° 11/2017 e de 18.03.2020, Proc. n.° 16/2020).
Por sua vez, dúvidas não há que o acto administrativo tem conteúdo “vinculado” quando o decisor não tem margem de livre decisão, tendo o acto um único sentido (possível).
E, como sabido é, no âmbito da “actividade vinculada”, nenhum relevo tem eventuais alegações de violação dos princípios da boa fé, da justiça, da proporcionalidade, da tutela de confiança e da igualdade; (cfr., v.g., os Acs. deste Tribunal de 31.01.2019, Proc. n.° 62/2017 e, mais recentemente, de 10.06.2020, Proc. n.° 35/2020).
Dest’arte, nenhum motivo existindo para não se ter o transcrito entendimento como adequado, à vista está a solução.
De facto, só por manifesto lapso se pode entender – como será eventualmente o que sucede com os recorrentes – que o aludido “despacho de despejo” tem como base legal uma “cláusula do contrato de concessão” já objecto de declaração de caducidade, (e por isso, inexistente), pois que como expressamente consta na referida Informação/Proposta n.° 205/DSO/2017, (que integra a sua fundamentação), invoca-se aí o “n.° 2 do art. 179° da Lei n.° 10/2013”, (“Lei de Terras”), ociosas sendo outras considerações, pois que, sendo os recorrentes “parte legítima”, e constatando-se que, tanto na sua “forma” como “substância”, legal é o despacho de despejo em causa, censura não merece o decidido no Acórdão do Tribunal de Segunda Instância que, por isso, se confirma na sua íntegra.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos que se deixam expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso, confirmando-se o Acórdão recorrido.
Custas pelos recorrentes.
Registe e notifique.
Macau, aos 26 de Junho de 2020
Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei
O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa
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