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Reclamação nº 7/2020/R

R, Limitada, Ré nos autos de acção de processo comum do trabalho nº LB1-19-0138-LAC, notificada do despacho, que não admitiu o recurso por ela interposto da decisão que não admitiu o pedido reconvencional, vem nos termos do disposto no nº 595º/1 do CPC, formular a presente reclamação nos termos seguintes:

R LIMITADA, R. melhor identificada nos autos à margem referenciados, no processo laboral que lhe é movido pela A. A, notificada do conteúdo do despacho constante a fls. 734 dos autos, o qual não admitiu o recurso interposto pela R. a fls. 451 e segs., vem, ao abrigo do art. 595°, n.º 1, do CPC, apresentar reclamação contra o indeferimento do recurso, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:
1. O douto despacho ora reclamado apresenta como fundamento para a não admissão do recurso interposto pela R., ora Reclamante, o disposto no art. 583°, n.º 1, do CPC, de acordo com o qual só é admissível recurso nos casos em que o valor da causa seja superior à alçada do tribunal de que se recorre e, cumulativamente, o valor da sucumbência do recorrente seja superior à metade da alçada desse tribunal.
2. No presente caso, o valor da causa é superior à alçada do tribunal de primeira instância, ou seja no valor de MOP226,043.20, pelo que se encontra preenchido o primeiro pressuposto processual exigido para a admissibilidade do recurso.
3. Quanto ao segundo requisito, o despacho ora reclamado considera que o mesmo não se verifica, tendo em vista o valor da reconvenção formulada pela R., no valor de MOP26,317.60, porquanto este montante é inferior à metade da alçada do tribunal de primeira instância, concluindo assim pelo indeferimento do recurso.
4. No entanto, com o devido respeito, a R. não concorda com a fundamentação apresentada no despacho, dado que considera, salvo melhor opinião, que o valor da sucumbência corresponde, na verdade, ao dobro do valor da reconvenção, ou seja, a MOP52,632.20.
  Senão vejamos:
5. Na presente acção, a A. vem reclamar da R., entre outros créditos laborais, a devolução das quantias deduzidas do seu salário a título de seguro de vida e de saúde, correspondentes a 20% dos respectivos prémios, no valor mencionado supra, de MOP26,3l7.60.
6. A R., por sua vez, contestou a pretensão da A., invocando que os seguros de vida e de saúde consistem em seguros adquiridos e mantidos pela R. em benefício da A., que vão para além do seguro obrigatório de acidentes de trabalho (sendo este último suportado pela R. na sua totalidade) e ainda, que a A. se comprometeu contratualmente a pagar 20% dos prémios dos seguros de vida e de saúde.
7. Mais, no caso de o tribunal considerar que os 20% dos prémios não deveriam ter sido pagos pela A. através da dedução directa do seu salário, a R. reclama, em sede de reconvenção, a condenação da A. no pagamento da referida quantia de MOP26,317.60, porquanto a A. se obrigou contratualmente a suportar 20% dos mesmos.
8. O tribunal rejeitou o pedido reconvencional no despacho saneador (fls. 401) e, tendo a R. recorrido dessa decisão, lavrou despacho de indeferimento do recurso, com os fundamentos aí invocados.
9. Contudo, entende a R. que, na verdade, caso o tribunal defira o pedido da A., condenando a R. a devolver as quantias deduzidas a título de seguro de vida e de saúde e, em simultâneo, lhe seja negado o pedido reconvencional, a decisão ser-lhe-á desfavorável no dobro do montante reclamado pela A., em MOP52,632.20, isto é, em valor superior à metade da alçada do tribunal de primeira instância.
10. Por outro lado, convém frisar que a presente acção laboral se encontra ainda na fase da instrução, sendo que o valor da sucumbência da R. poderá ser muito superior depois de proferida a sentença, na hipótese de a R. vir a ser condenada a pagar à A. outros créditos laborais que compõem a totalidade do seu pedido.
11. Ora, a R. não dispunha de outro momento processual adequado para reagir perante a decisão proferida pelo tribunal no despacho saneador - a qual determinou a inadmissibilidade da reconvenção apresentada.
12. Ou seja, na eventualidade de, na sentença final, a decisão ser desfavorável à R. em valor suprior à metade da alçada do tribunal de primeria instância, a R. já terá, nesse momento, perdido o direito a recorrer do indeferimento do pedido reconvencional.
13. De resto, o tribunal a quo deveria, no mínimo, ter proferido despacho de retenção do recurso, fixando-lhe um efeito e regime de subida diferentes, conforme previsto no art. 594º, n.º 2, do CPC, determinando o seu efeito devolutivo e subida diferida de acordo com o art. 602º do CPC, no caso de haver recurso da sentença final e a mesma ser desfavorável à R. em valor superior a MOP50,000.
14. Pelo que, a não ser admitida a hipótese de o valor da sucumbência ser considerado o dobro do pedido reconvencional, deve determinar-se que o valor da sucumbência não é determinável no presente momento, pelo que deve atender-se apenas ao valor da causa, nos termos do art. 853°, n.º 1 in fine, do CPC.
Nestes termos e nos mais de direito, ven requerer a V.Exa. se digne admitir o presente recurso nos termos acima expostos, devendo o tribunal a quo lavrar despacho em conformidade.

A única questão que se coloca na presente reclamação consiste em saber qual será o valor a atender para a aferição da recorribilidade de uma decisão.

Para o Exmº Juiz a quo, não sendo a decisão recorrida desfavorável para a recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal recorrido, o recurso não é legalmente admissível.

Ao que parece, a reclamante entende que o valor a atender para a aferição da recorribilidade deve ser o valor do pedido reconvencional, acrescido do eventual perdimento da quantia peticionada pelo Autor na acção contra ela intentada, que no seu conjunto já supera a metade do valor da alçada do tribunal recorrido.

Então vejamos se tem razão a reclamante.

Quanto à recorribilidade das decisões proferidas no âmbito de um processo laboral, o CPT reza no seu artº 110º que:

1. Sem prejuízo do disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 583.º do Código de Processo Civil, e independentemente do valor da causa e da sucumbência do recorrente, é sempre admissível recurso para o Tribunal de Segunda Instância:

1) Nas acções em que esteja em causa a discussão da subsistência ou insubsistência de justa causa de rescisão do contrato de trabalho;

2) Nas acções em que esteja em causa a validade ou subsistência do contrato de trabalho;

3) Nas acções emergentes de acidentes de trabalho ou doenças profissionais.

2. Em processo contravencional é sempre admissível recurso para o Tribunal de Segunda Instância, mas apenas da decisão final; tratando-se de recurso limitado à decisão relativa ao pedido cível, aplica-se o disposto no número anterior.

Não se integrando o caso sub judice em qualquer das situações previstas nas alíneas do nº 1 desse artigo 110º, é de aplicar portanto o artº 583º do CPC.

Ora, diz o artº 583º/1 do CPC que “salvo disposição em contrário, o recurso ordinário só é admissível nas causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre, desde que a decisão impugnada seja desfavorável à pretensão do recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal; em caso, porém, de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, atende-se somente ao valor da causa.”.

Ou seja, na matéria cível, para que o recurso seja admitido, é preciso que o valor da causa e o de sucumbência sejam superiores à alçada e à metade da alçada do tribunal de que se recorre, respectivamente.

O nosso legislador visou, com a regra da sucumbência, limitar a admissibilidade dos recursos nas causas de menor relevância económica.

A este propósito, ensina Lopes do Rego que “…tais limitações derivam, em última análise, da própria natureza das coisas, da necessidade imposta por razões de serviço e pela própria estrutura da organização judiciária de não sobrecarregar os tribunais superiores com a eventual reapreciação de todas as decisões proferidas pelos tribunais inferiores – sob pena de o número daqueles ter de ser equivalente ao dos tribunais de 1ª instância …”
- in “Acesso ao Direito e aos Tribunais”, in Estudos sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, 1993, p. 83.

Eis a razão de ser da limitação da recorribilidade com fundamento no valor diminuto da sucumbência.

Nos termos do disposto no artº 18º do LBOJM, em matéria cível e laboral, a alçada dos Tribunais de Primeira Instância é de MOP$100.000,00.

In casu, não sendo questionável o entendimento do Tribunal recorrido no sentido de que, no pedido reconvencional, a decisão recorrida lhe não é desfavorável em valor superior à metade da alçada dos tribunais de primeira instância.

Só que, a ora reclamante defende que se se acumular o valor do pedido reconvencional com o valor que a Autora pediu na acção, a soma desses valores já ultrapassa a metade de alçada.

Na acção, o que pediu a Autora é a condenação da Ré na devolução das alegadas quantias indevidamente descontadas dos seus vencimentos, correspondentes a 20% dos prémios dos seguros de life insurance e medical insurance.

A Ré, em sede de contestação, defendeu por excepção, tendo alegado que, nos termos do contrato de trabalho celebrado entre ela e a Autora e do Manual do Empregado, a Ré, enquanto entidade patronal, só é responsável pelo pagamento de 80% dos prémios dos tais seguros e o remanescente 20% é a cargo da Autora, obrigação que assumiu, e que os descontos efectuados não foram contrários ao disposto no artº 64º da Lei nº 7/2008, à luz do qual é proibido ao empregador compensar a remuneração em dívida com créditos que tenha sobre o trabalhador e fazer quaisquer descontos na remuneração, à excepção das situações expressamente previstas nas várias alíneas do seus nº 1.

Prevenindo-se contra a eventual, futura e hipotética condenação, com fundamento na violação do disposto no artº 64º da Lei nº 7/2008, na devolução dessas quantias peticionadas na acção contra ela intentada, a Ré deduziu, condicionalmente, o pedido reconvencional com fundamento naquela eventual, futura e hipotética condenação na devolução à Autora das quantias correspondentes a tais 20% dos prémios dos seguros, deduzidos nos vencimentos da Autora, que na óptica da Ré, deveriam ser da responsabilidade da Autora conforme acordado no contrato de trabalho e à luz do Manual do Empregado.

Ao que parece, a estratégia de defesa da Ré deve ser a seguinte: a eventual e hipotética condenação na devolução das tais quantias à Autora só poder ser por inobservância do disposto no citado no artº 64º da Lei nº 7/2008, e não porque a Autora não é responsável pela contribuição em 20% para o pagamento dos prémios dos seguros. Assim, o valor peticionado na reconvenção visa compensar as quantias que teria de pagar primeiro à Autora se viesse a ser condenada nos termos peticionados na acção.

O raciocínio é algo compreensível, mas a Ré não tem razão enquanto reclamante contra a não admissão do recurso.

A reclamante só teria alguma razão se o recurso tivesse por objecto a decisão que não só julgou procedente o pedido da Autora como também julgou improcedente o pedido reconvencional.

Mas não é isso que sucedeu in casu.

Antes de mais, é de frisar que o direito à compensação nos termos peticionados na ora reconvenção pode ser sempre invocado numa outra acção autónoma, se a Ré vier a ser condenada na devolução das quantias ora peticionadas pela Autora com fundamento apenas na inidoneidade dos descontos efectuados nos vencimentos do Autor, proibidos pelo artº 64º da Lei nº 7/2008, e não na responsabilidade da Ré pelo pagamento de 100% dos tais prémios, nos termos acordados no contrato de trabalho celebrado com a Autora e estipulados no Manual do Empregado.

Ora, pretendendo a Ré reagir, por via do recurso, de cuja não admissão ora reclamou, contra apenas o despacho que não admitiu o pedido reconvencional por ela deduzido e não estando nem podendo ainda recorrer também de uma decisão desfavorável, futura, incerta, meramente hipotética e não necessariamente decorrente da não admissão do pedido reconvencional, naturalmente não podemos fazer incluir o valor peticionado pela Autora na acção, cuja sorte fique ainda por decidir, no valor da sucumbência a atender para a aferição da recorribilidade da decisão que tão só não admitiu o pedido reconvencional.

Sendo de MOP$26.317,60, o valor do pedido reconvencional está longe de atingir o valor de MOP$50.000,00, correspondente à metade da alçada do tribunal de que se recorre.

Pelo exposto, é de concluir que bem andou o Exmº Juiz a quo ao não admitir o recurso interposto pela Ré, ora reclamante, do despacho que não admitiu o pedido reconvencional, cujo valor não excedeu metade da alçada dos Tribunais de primeira instância.

Tudo visto, resta decidir.

III – Decisão

São bastantes as razões acima expostas, cremos nós, para que indefiramos, como indeferimos, a reclamação deduzida, confirmando na íntegra o despacho reclamado.

Custas pela reclamante.

Fixo a taxa de justiça em 1/4.

Cumpra o disposto no artº 597º/4 do CPC, ex vi do artº 1º do CPT.

RAEM, 20OUT2020


O presidente do TSI



Lai Kin Hong
  被告在答辯狀中提出反訴,有關反訴請求的利益值為26,317.60澳門元。
  透過卷宗第401頁背頁至第402頁的批示,法庭認為,被告之反訴不符合《勞動訴訟法典》第17條第1款的規定,裁定不受理被告提出之反訴。
  被告認為,該批示於卷宗第401頁背頁最後一段的內容存在多義的地方,聲請法庭作出解釋。
  法庭作出卷宗第426頁及背頁的批示,決定駁回被告的解釋聲請,但仍根據合作原則,對被告指出的部分作出說明;但此並不是法庭不受理被告提出之反訴的唯一理由。
  根據卷宗第401頁背頁至第402頁的批示,法庭不受理被告提出之反訴的理據為該反訴不符合《勞動訴訟法典》第17條第1款的任何規定。
  被告現對卷宗第401頁背頁至第402頁不受理其反訴的批示提出上訴。
  本案不屬於《勞動訴訟法典》第110條第1款規定的情況。
  根據《民事訴訟法典》第583條第1款規定:“一、除非另有規定,僅當案件之利益值高於作出上訴所針對裁判之法院之法定上訴利益限額,且上訴所針對之裁判不利於上訴人之主張,而該裁判對其不利之利益值高於該法院之法定上訴利益限額一半者,方可提起平常上訴;然而,如在因所作之裁判而喪失之利益值方面存有合理疑問,則僅考慮案件之利益值。”
  本案中,被告喪失之利益值為26,317.60澳門元,低於本法院之法定上訴利益限額一半,不符合《民事訴訟法典》第583條第1款的規定。
  基於此,法庭決定不受理被告提出的上訴。
  訴訟費用由被告承擔。
  
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Recl.7/2020-10