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Processo nº 658/2020
(Autos de Recurso Jurisdicional em Matéria Fiscal)

Data: 5 de Novembro de 2020
Recorrente: A Limited
Recorrida: Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos da Direcção dos Serviços de Finanças
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO

A Limited, com os demais sinais dos autos,
  vem interpor recurso contencioso da Deliberação da Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos de 1 de Fevereiro de 2019 que rejeitou a reclamação da agora Recorrente, mantendo o rendimento colectável desta para o ano de 2012 no montante de MOP323.942.395,00 e aplicou o agravamento a título de custas de 0.005% sobre a colecta, contra
  Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos da Direcção dos Serviços de Finanças.
  Foi proferida sentença na qual foi julgado improcedente o recurso contencioso e mantido o acto recorrido.
  Não se conformando com a sentença proferida veio a Recorrente interpor o presente recurso, concluindo que:
1. A Recorrente aceitou para efeitos de confissão da entidade recorrida que foi proferido um despacho do Sr. Director dos Serviços de Finanças através do qual “foi sancionado o entendimento mediante o qual as remunerações [...] não deverão ser tributadas em qualquer sede de imposto da RAEM, porquanto terão as mesmas sido colectadas a montante do acto de pagamento pela prestação de serviços e ocupação e uso de espaços.”
2. A sentença recorrida violou as disposições conjugadas do artigo 76º do CPAC e 562º/3 do CPC por não ter especificado nos factos provados, aqueles que ficaram provados por documentos e que resultaram de confissão reduzida a escrito.
3. No mínimo, deveria ter ficado consignado na sentença recorrida que em casos semelhantes, anteriormente, a Recorrida teve um entendimento em relação à matéria em causa nos presentes autos que é favorável à pretensão da Recorrente, através da confissão que:
a. as remunerações não devem ser tributadas em qualquer sede de imposto;
b. Com base na fundamentação: “foram colectadas a montante do acto de pagamento pela prestação de serviços e ocupação e uso de espaços.”
c. Os serviços da Recorrida tratam os casos dos contribuintes de maneira diferente - ou seja, existe alguma margem de discricionaridade.
4. Estes factos são essenciais para a procedência dos argumentos avançados pela Recorrente, nomeadamente de que a invocação do princípio da legalidade esconde alguma margem de discricionaridade ou de interpretação que a Recorrida exerce em relação a outros contribuintes.
5. Os artigos 76º do CPAC e 562º/3 do CPC devem ser interpretados no sentido de que na sentença devem ser mencionados todos os factos com interesse para a causa que que tenham sido admitidos por acordo das partes, provados por documentos, por confissão reduzida a escrito e os restantes factos tribunal deu como provados.
6. Nas suas alegações facultativas, a Recorrente alegou “factos supervenientes” em virtude dos factos alegados pela própria Recorria nas suas contra-alegações e da junção por esta de um documento.
7. Nessas alegações facultativas, a Recorrida acrescentou, entre outras, as Conclusões H), Q), R), S), T), U), AA), e CC).
8. Por lapso nas suas Conclusões a Recorrente mencionou a ofensa ao caso julgado quando se referia à ofensa ao caso decidido.
9. Pois, desde o início do processo instrutor, a entidade recorrida defendeu o entendimento que não tem margem de discricionaridade, bem como que a decisão de não tributação dos rendimentos provenientes do contrato de serviços com a concessionária de jogo B não foi sua.
10. Porém, o que se verifica é que existe um Despacho do Director da Recorrida a corroborar a posição defendida pela Recorrente mas que esse despacho não se encontra no Processo Administrativo.
11. Após proferido o acto administrativo, não pode a Administração modificar, alterar ou corrigir a sua fundamentação, muito menos já em sede de contra-alegações do recurso contencioso.
12. A fundamentação do acto administrativo deverá ser bastante para que se-compreendam todos os fundamentos de facto e de direito do acto.
13. As quatro funções do dever de fundamentar os actos administrativos são: (1) a Defesa do particular; (2) o Controlo da Administração; (3) a Pacificação das relações entre a Administração e os particulares - posto que estes últimos tendem a aceitar melhor as decisões que lhes sejam desfavoráveis se as correspondentes razões lhes forem comunicadas de forma completa, clara e coerente; e (4) a Clarificação e prova dos factos sobre os quais assenta a decisão.
14. O objectivo essencial e imediato da fundamentação é, portanto, esclarecer concretamente a motivação do ato, permitindo a reconstituição do iter cognoscitivo que levou à adoção de um ato com determinado conteúdo.
15. Donde decorre que a douta sentença recorrida não deveria aceitar a “nova fundamentação” do acto, por estar esgotado a legalidade do acto administrativo tem que ser aferida à luz dos fundamentos que dele constam expressamente e não sobre conjecturas que o Tribunal possa aventar ou com base em fundamentos que não foram tidos em conta pela Administração Tributária e que não são contemporâneos do acto.
16. A douta sentença recorrida deveria ter conhecido este vício invocado pela Recorrente nas suas alegações facultativas, aceitando-as como supervenientes.
17. Durante o procedimento, designadamente desde a fase da instrução, a Recorrente sempre pediu que fosse atendida a sua situação especial face à existência de casos decididos anteriormente pela Administração que concederam isenção fiscal de Imposto Complementar à Recorrente (até ao ano 2008) e a sociedades concorrentes da Recorrente (até ao presente).
18. Invocou, entre outros argumentos, que a situação jurídica se manteve, que houve violação do princípio da igualdade, que a decisão não estava fundamentada.
19. Só com a sua Contestação, a Recorrida não só veio confessar ter decidido casos semelhantes da forma que a Recorrente pretende, como vem confessar que a decisão partiu do próprio Director da Recorrente, e não do Exmo. Senhor Chefe do Executivo.
20. Os documentos juntos com a sua Contestação vieram revelar que na verdade, a questão já teria sido resolvida anteriormente, de forma que seria favorável à Recorrente.
21. O acto recorrido padece do vício de omissão de pronúncia, invocado pela Recorrente nas suas alegações facultativas, por não ter decidido sobre a matéria da reclamação com base na hipotética não-discricionaridade do acto e sua vinculação ao princípio da legalidade,
22. O que veio a ser contraditado pela junção de novo documento, no qual a Recorrida confessa poder decidir de outra forma, que seria mais favorável à Recorrente.
23. A douta sentença recorrida deveria ter aceite a matéria como superveniente, bem como deveria ter-se pronunciado sobre esta questão.
24. Os pressupostos mencionados na decisão recorrida e que foram absorvidos pela sentença - designadamente os parágrafos 1, 2, 3, 4 e 15 do acto recorrido - não sofreram qualquer alteração entre 4 de Julho de 2013 (data da apresentação da declaração do Imposto de Complementar de Rendimentos) e 12 de Maio de 2016 (data da nova fixação de rendimento colectável pela Recorrida),
25. E esses parágrafos não explicam minimamente quais foram as operações matemáticas, financeiras ou outras que levaram à alteração do montante do lucro tributável de MOP52.002.304,00 declarado pela Recorrente para MOP323.942.395,00 fixado pela Recorrida
26. Além disso, o parágrafo 15 do acto recorrido é meramente conclusivo e despido de conteúdo quando desacompanhado dos parágrafos precedentes.
27. O segmento decisório: “Pese embora não chegou a apurar do acto recorrido a análise sobre o contrato ou acordo celebrado entre a recorrente e a “B”, em particular, como se conclui dos respectivos clausulados que se não respeitam ao alegado acordo de associação/colaboração ou contrato como lido por epígrafe, ou em que termos se avaliou a situação da recorrente com as situações de outros contribuintes que detêm contrato celebrado com a “B” e autorizado pela Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), nem se pode aceitar a autorização como suporte bastante para se distinguir dos outros contribuintes(7), “…estando assegurada a validade substantiva do acto recorrido por alguns dos fundamentos invocados, sempre será inoperante, caso exista, a ilegalidade derivada da motivação superabundante”[…]», aceita parcialmente os fundamentos do acto recorrido,
28. Mas fá-lo através da escolha cirúrgica de parte da fundamentação, eliminando outros pontos da mesma, ficando aquele parágrafo 15 órfão de conteúdo.
29. O que determina que seja esvaziado o conhecimento do iter cognoscitivo que conduziu ao acto recorrido.
30. No caso dos autos, o vício apontado à fundamentação do acto era que esta é contraditória.
31. Quando a fundamentação é contraditória não pode ser o Tribunal a escolher quais os termos da fundamentação que acha preferíveis para salvar o acto - A fundamentação do acto deveria ser bastante para resolver este conflito.
32. A correcção à base de tributação efectuada pela Recorrida têm subjacente determinada fundamentação, que conduziu à qualificação da operação tributária para efeitos de Imposto Complementar de Rendimentos, e com base na qual, a ora Recorrente exerceu a sua defesa, e que alicerçaram a delimitação do acervo probatório que despoletou a decisão judicial, subjazendo, pois à decisão recorrida a imposição de fundamentação dos actos plasmada no art. 114º e 115º do Código do Procedimento Administrativo e no artigo 41º/1 do RICR, princípio da vinculação temática e o direito à prova.
33. Se não é lícito à Recorrida, em momento posterior, tentar colmatar um lapso, erro de procedimento, ou erro de interpretação, alterando a conclusão a que chegou e cuja decisão já produziu efeitos na esfera de actuação do sujeito passivo, e com base na qual, exerceu a sua defesa - por maioria de razão também ao tribunal será vedado corrigir as deficiências do acto.
34. Decorre inequivocamente da fundamentação do acto tributário em sindicância que a A.T. qualifica o contrato celebrado entre a Recorrente e a B “como situações diferentes” da de outros contribuintes, mais ali se dizendo que o acto é vinculado, pese embora haver nos autos prova de que a decisão da A.T. é diferente para outros casos.
35. Praticado um acto com determinada fundamentação, a apreciação contenciosa da sua legalidade tem de se fazer em face dessa mesma fundamentação.
36. Os factos e fundamentos de direito enunciados no na Deliberação da Comissão de Revisão são contraditórios entre si e não cabe ao Tribunal escolher ou optar pelo fundamento que mais lhe convém. Esse papel pertence inevitavelmente ao autor do acto. É a ele e apenas a ele quem cabe apresentar todos os fundamentos que subjazem à prática do acto.
37. Os fundamentos de facto e de direito invocados pela A.T. não apontam de forma congruente no sentido de que a decisão constitui uma decisão lógica e necessária dos motivos invocados como justificação.
38. O artigo 21º do CICR quando dispõe que «Consideram-se custos ou perdas imputáveis ao exercício os que tiverem de ser suportados para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a impostos e para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes: [...] f) Encargos fiscais e parafiscais a que estiver sujeito o contribuinte, sem prejuízo do disposto na alínea b) do artigo 29º.», é um afloramento do princípio da proibição da dupla tributação, aplicável à Recorrente.
39. A questão que se coloca nos autos é que a Recorrente não pagou, por si, o Imposto Especial sobre o Jogo, quem o fez foi a sua parceira de negócios - a B.
40. Ora, no âmbito do contrato de prestação de serviços e de cedência de espaços, a retribuição da Recorrente seria uma percentagem calculada sobre o rendimento líquido anual proveniente de actividades de jogo.
41. Ou seja, do rendimento do jogo obtido pela B uma parcela é entregue directamente à RAEM a título de imposto sobre o jogo, o remanescente é dividido entre B e Recorrente.
42. Supondo que a actividade que a Recorrente desenvolve fosse executada só e directamente pela Concessionária, a mesma actividade estaria sem qualquer dúvida isenta do pagamento de imposto complementar.
43. Mas pelo facto de a Recorrida desenvolver esta actividade em colaboração com a Concessionária em regime de sua associada - a sociedade Reclamante terá um prejuízo patrimonial correspondente a um esforço fiscal injusto, injustificado e inesperado para a Administração Fiscal- pois conforme se disse, caso a B não recorresse a prestadores de serviços externos e desenvolvesse a actividade por si própria estaria isenta do imposto complementar.
44. A invocação do princípio da legalidade tem apenas por função esconder que na realidade a fundamentação por trás do acto praticado foi que a Recorrente tem mesmo um tratamento diferente do prestado pela Recorrida às empresas suas concorrentes.
45. Através do Despacho do Chefe do Executivo nº 333/2007, foi concedida à B a isenção do pagamento do imposto complementar de rendimentos, “relativamente aos lucros gerados pela exploração de jogos de fortuna ou azar ou outros jogos em casino”.
46. A Direcção de Serviços de Finanças reconhece a outras sociedades nas mesmas circunstâncias da Recorrente que o seu rendimento “relacionado com o jogo não está sujeito a imposto complementar durante o termo efectivo do Contrato de Serviços, dado que os honorários recebidos no âmbito do Contrato de Serviços derivam do rendimento do jogo da B, que se encontra isento nos termos do disposto no no. 2 do artigo 28° da Lei 16/2001 e da isenção concedida pelo despacho no 30/2004 de 23 de Fevereiro de 2004 e depois pelo despacho no 378/2011.”
47. Além disso, a Direcção dos Serviços de Finanças confirmaram que “o rendimento relacionado com o jogo a respeito de salas VIP não está sujeito a imposto complementar dado que os impostos são pagos directamente pela B. A B paga imposto especial sobre o jogo, taxas especiais e prémios sobre o jogo ao Governo de Macau através da sua parte do rendimento bruto gerado pelos Casinos.”
48. Desde que a recorrente iniciou a sua actividade nos termos do contrato com a B não houve qualquer alteração legislativa no âmbito do imposto complementar de rendimentos aprovado pela Lei nº 21/78/M, e cuja última alteração data de 1 de Outubro de 2003 (Lei nº 12/2003)
49. O regime jurídico da exploração de jogos de fortuna ou azar em casino tem como objectivos, em especial, assegurar que o interesse da Região Administrativa Especial de Macau na percepção de impostos resultantes do funcionamento dos casinos é devidamente protegido.
50. Supondo que a actividade que a Recorrente desenvolve fosse executada só e directamente pela Concessionária, a mesma actividade estaria sem qualquer dúvida isenta do pagamento de imposto complementar.
51. O acto em crise é ilegal porque obriga a Recorrente a repercutir as perdas com o Imposto Complementar na sua cliente Concessionária - nos termos do contrato de prestação de serviços - o que vai contra o espírito da isenção concedida por S. Exa. Chefe-do Executivo.
52. Tem sido prática corrente e entendimento pacífico ao longo dos anos que a totalidade dos rendimentos (sobre as receitas brutas) sobre os quais é calculado o honorário da Reclamante foram já sujeitos a tributação (especial sobre o jogo).
53. O acto em crise viola o artigo 28º da Lei 16/2001, o Despacho do Chefe do Executivo 333/2001, os Princípios da Igualdade, da Proporcionalidade, da Justiça e da Imparcialidade, bem como os artigos 2º e 3º do Regulamento do Imposto Complementar de Rendimentos.
54. O acto recorrido viola ainda os princípios da justiça tributária e da proporcionalidade, bem como os princípios da legalidade, da equidade e da boa-fé.
55. Quando o mesmo facto tributário é base de incidência de tributos diferentes, existe dupla tributação.
56. Diz-se que o imposto especial sobre o jogo incide sobre as receitas brutas de exploração de jogo e que o imposto complementar incide sobre o rendimento global auferido.
57. O rendimento global das pessoas colectivas é o lucro líquido anual derivado do exercício de actividade comercial ou industrial e calculado nos termos deste regulamento e no caso de o rendimento de uma pessoa colectiva resultar da exploração do jogo, pode dizer-se que esse rendimento são as “receitas brutas da exploração do jogo”
58. A adopção de fundamentos obscuros, contraditórios ou insuficientes que não esclareçam concretamente a motivação do acto equivale à falta de fundamentação.
59. O acto é anulável por vício de forma por falta de fundamentação.
60. O acto em crise padece do vício de violação de lei, por violação dos princípios da justiça e igualdade tributária e da imparcialidade, da igualdade, da proporcionalidade e das normas dos artigos 2º, 3º, 19º da Lei no. 21/78/M e artigo 27º da Lei 16/2001.
  Admitido o recurso foi a entidade Recorrida notificada para os termos do mesmo, vindo esta apresentar as suas contra-alegações, concluindo que:
I. O presente recurso tem por objecto a douta sentença de 23 de Março de 2020, a qual julgou totalmente improcedente o recurso apresentado pela recorrente na sequência da deliberação da CRIC que negou provimento a reclamação relativa à fixação do seu rendimento colectável do exercício de 2012 em sede de Imposto Complementar de Rendimentos.
II. Segundo a recorrente, a sentença encontra-se viciada por violação de lei por falta de especificação dos factos provados, violação do dever de fundamentação e errada interpretação do artigo 3º do RICR, insistindo ainda nos erros sobre os pressupostos de facto e de direito do acto administrativo recorrido e não devidamente apreciados pela sentença em crise.
III. Alega ainda o tratamento discriminatório da recorrente em relação às suas congéneres comerciais, sendo que, tudo somado, deveria dar lugar à revogação e substituição da sentença recorrida, proferindo-se “outra que anule o acto administrativo recorrido”.
IV. O Tribunal a quo decidiu desatender os fundamentos invocados pela recorrente em sede de alegações facultativas relativos ao despacho de fls. 159 dos autos, que se consubstancia num despacho proferido pelo Director dos Serviços de Finanças em que a posição da recorrida era alegadamente coincidente com a que a recorrente tem defendido.
V. Com efeito, o seu pedido de ampliação objectiva da instância feito nas alegações facultativas, onde acrescentou novos fundamentos invalidantes do acto resultantes de um suposto conhecimento superveniente de um despacho do Sr. Director da DSF, foi indeferido pelo Tribunal a quo uma vez que entendeu que esse fundamento invalidante não era de conhecimento superveniente, violando pois o nº 3 do artigo 68º do C.P.A.C.
VI. Desatendidos os fundamentos invocados pela recorrente em sede de alegações facultativas, não existe qualquer violação da lei processual, quer quanto aos factos provados, quer quanto à inadmissibilidade de novos fundamentos do recurso.
VII. O acto administrativo recorrido encontra-se devidamente fundamentado dado que da deliberação da CRIC constam as razões de facto e de direito da tributação dos rendimentos da recorrente, tudo em obediência ao artigo 115º do CPA.
VIII. A exigência de fundamentação visa efectivamente permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação.
IX. A Ora, a recorrente, após ter sido notificada da fixação, apresentou reclamação, (e até o presente recurso) daquele acto em moldes tais que dúvidas não restam quanto à clareza dos fundamentos para tributação das actividades em sede de imposto de complementar de rendimentos.
X. No entanto, a discordância do particular com os fundamentos não significa que haja violação do dever de fundamentação. De- facto, o que o dever de fundamentação do acto administrativo exige é que a Administração baseie a sua decisão num discurso lógico-formal, sem contradições nem ambiguidades independentemente da veracidade das fundamentos.
XI. Do circunstancialismo assente, a Administração Tributária esclareceu o contribuinte do itinerário cognoscitivo e valorativo, permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a tributação.
XII. É inteligível a ratio decidendi da Administração Tributária.
XIII. Segundo a recorrente, a sentença encontra-se viciada por não ter apreciado devidamente o erro nos pressupostos de facto e de direito, desconsiderando o tratamento discriminatório da recorrente em relação aos seus concorrentes comerciais, violando por isso os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade.
XIV. Tratamento discriminatório por não ter um regime fiscal idêntico ao das suas concorrentes, em idênticas posições contratuais de associação em participação com a B, pelo que deveria beneficiar da isenção fiscal que a Administração Fiscal já tinha concedido a favor das outras que se encontram em situação idêntica.
XV. A recorrente poderia ter impugnado os pressupostos legais do acto, dizendo que aquele pressuposto de incidência não se verificou no caso, ou demonstrar, não obstante a verificação do pressuposto, ser beneficiária da isenção fiscal legalmente concedida, mas a verdade é que continua a -não invocar a seu favor nenhuma norma fiscal respeitante à previsão da isenção fiscal.
XVI. O regime da Lei nº 16/2001 prevê expressamente duas situações em que é possível o enquadramento de isenção fiscal relativo ao Imposto Complementar de Rendimentos: o artigo 28º, que se refere às concessionárias, e o artigo 29º, que se refere aos promotores de jogo.
XVII. Defende a recorrente que os seus rendimentos não se enquadram em nenhuma das situações uma vez que os rendimentos não são seus nem podiam ser porque decorrem directamente do exercício da actividade concessionada: são rendimentos da B que por eles deve o devido imposto mas que do respectivo pagamento fica isenta.
XVIII. Tudo depende da avaliação que a DICJ, no exercício das suas competências exclusivas, faz das circunstâncias materiais que rodeiam cada caso, sendo que a Administração Fiscal apenas faz reflectir, como consequência, a decisão da DICJ na fixação ou revisão da matéria colectável desses contribuintes. O acto de fixação da matéria colectável e a sua posterior revisão, quando esta exista, é, nestes casos, um acto vinculado da Administração Fiscal ao acto que lhe é prévio, no âmbito da DICJ, que autoriza ou não o contrato celebrado.
XIX. O Princípio da Igualdade (e os aqui consequentes Princípios da Justiça e da Imparcialidade) pressupõe que a situações iguais seja dado tratamento igual; mas também exige que a situações diferentes seja dado tratamento diferente.
XX. Foi, pois, pela aplicação do Princípio da Igualdade que a Administração Fiscal tratou de maneira diferente a recorrente relativamente a outras concorrentes comerciais, já que estas obtiveram aquilo que a recorrente falhou em conseguir: a aprovação da tutela para o seu contrato.
XXI. Na verdade, quer no processo tributário, quer agora em sede de recurso, a pretensão da recorrente baseia-se, como já se disse, não em qualquer norma que pudesse invocar para que lhe fosse reconhecida a isenção dos seus rendimentos mas apenas na isenção que foi concedida aos rendimentos da sua co-contratante, a B, sustentando a sua pretensão no relatório dos auditores mas escusando-se a invocar qualquer das normas de isenção da Lei nº 16/2001 para corroborar a fundamentação contabilística daqueles.
XXII. Como bem define a sentença em crise: “em véspera de reserva absoluta da lei inserida no princípio da legalidade, todos os tributos são obrigações ex legis cuja regulamentação necessita ser por forma expressa e é matéria fora da dispositiva por vontade ou discricionariedade da administração. Neste sentido, na falta da lei habilitante não é permitida quer a imposição de incidência objectiva ou subjectiva quer a respectiva alteração ou mesmo isenção.”
XXIII. Ora, aqui chegados, facilmente se conclui, como na sentença recorrida, que não cabendo os rendimentos da recorrente em norma que os isente, estão os mesmos sujeitos a tributação “sobre os lucros liquidados derivados do exercício de actividade comercial e calculado nos termos legais do ano económico em causa.”
XXIV. Existe uma situação de dupla tributação quando, sobre o mesmo rendimento, se faz incidir o Imposto Especial sobre o Jogo e o Imposto Complementar de Rendimentos. Mas não é o caso da recorrente que não tem - nem poderia, sem que para tal estivesse autorizada - rendimentos provenientes da exploração do jogo: o que a recorrente aufere é de uma contraprestação mensal que lhe é devida pelo contrato de prestação de serviços e de uso de espaço que celebrou com a B, sociedade esta que, titular de uma concessão, aufere de rendimentos dessa natureza.
XXV. Para além de que não é de forma alguma ilegal a dupla tributação resultante da aplicação ao mesmo facto fiscal objectivo do Imposto Especial do Jogo e do Imposto Complementar de Rendimentos, já que essa é uma prerrogativa que assiste ao legislador fiscal que é, no caso da RAEM, a Assembleia Legislativa.
XXVI. Que o legislador quis que fosse exactamente assim é indubitável face ao teor do artigo 28º da Lei nº 16/2001, onde se regulamentou especificamente a questão da dupla tributação.
  Dada vista dos autos ao Ilustre Magistrado do Ministério Público por este foi opinado no seu Douto parecer que:
  “A Limited” impugnou contenciosamente a deliberação de 01 de Fevereiro de 2019, da autoria da Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos, que mantivera o rendimento colectável que lhe havia sido fixado pela administração tributária para o exercício de 2012, vindo o Tribunal Administrativo a julgar improcedente o respectivo recurso contencioso por sentença de 23 de Março de 2020.
  Recorre agora de tal sentença, à qual imputa violações de lei processual e violações de lei substantiva, nos moldes explicitados na sua alegação de recurso e respectivas conclusões.
  Na sua contraminuta de recurso, a entidade demandada rebate as teses da recorrente, pronunciando-se pela improcedência do recurso.
  Vejamos quanto às alegadas violações de lei processual.
  Nesta sede, a recorrente verbera o facto de o tribunal não haver especificado como provado o facto de em situações anteriores a Recorrida teve um entendimento em relação à matéria em causa nos presentes autos que é favorável à pretensão da Recorrente, para evitar a cobrança a qualquer título de imposto sobre determinadas quantias porque as mesmas já foram pagas a montante, porquanto, em seu modo de ver, se trata de matéria com interesse para a decisão da causa e fora alegada validamente, a coberto da possibilidade de invocação de novos fundamentos do recurso de conhecimento superveniente.
  Ora bem, como a Mm.ª Juiz explicou, de forma clara e com minuciosa fundamentação, em despacho que precedeu a sentença, a ampliação objectiva da instância almejada pela recorrente nas suas alegações facultativas, a coberto do artigo 68.º, n.º 3, do Código de Processo Administrativo Contencioso, não podia ser aceite, pela razão simples de que não se estava perante vício ou fundamento de conhecimento superveniente. Foi, pois, indeferida a pretendida ampliação objectiva da instância.
  Perante um tal indeferimento, cujo julgamento a recorrente, em bom rigor, não questiona, é óbvio que não havia lugar à especificação daquele “facto”. Na verdade, em homenagem ao princípio da utilidade, apenas haverá que especificar, de entre os factos que estejam provados, aqueles que sejam pertinentes e relevantes para a decisão da causa, como decorre dos artigos 76.º e 65.º, n.º 3, do Código de Processo Administrativo Contencioso. Ora, não tendo sido admitida a ampliação, onde estava englobado esse suposto facto, não podia ele ser especificado.
  De resto, aquilo que a recorrente pretende sobrelevar como sendo um entendimento genérico da administração tributária sobre a matéria em questão, não passa de uma definição casuística para um determinado sujeito passivo, “C, SA”, cujo nome a recorrente truncou nas suas alegações facultativas e também não menciona agora nas suas alegações de recurso jurisdicional.
  Improcede este fundamento do recurso relativo a violações de lei processual.
  Em matéria de violações de lei substantiva, a recorrente dirige a sua alegação de recurso jurisdicional contra o julgamento, que reputa errado, de alguns dos vícios que imputara ao acto administrativo escrutinado contenciosamente, trazendo à liça motivos e argumentos que já antes utilizara em sede de recurso contencioso.
  Na oportunidade, pronunciou-se o Ministério Público sobre os vícios atribuídos ao acto impugnado, fazendo-o nos moldes do parecer de fls. 192 e seguintes, manifestando-se contra a tese da ilegalidade sustentada nesses vícios que agora voltam a terreiro.
  Temos por pertinente e correcta a posição avançada pelo Ministério Público no recurso contencioso, que sufragamos, coincidente, ao cabo e ao resto, com o sentido decisório adoptado na sentença recorrida.
  Daí que, reafirmando o sentido do aludido parecer, nos pronunciemos pela improcedência dos fundamentos do recurso jurisdicional, também no tocante aos aventados erros de julgamento dos vícios assacados ao acto.
  Termos em que se afigura não merecer censura a decisão recorrida, que deve ser mantida, negando-se provimento ao recurso jurisdicional.
  Foram colhidos os vistos legais.
  
  Cumpre assim apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO
  
a) Factos

  Da sentença recorrida e dos elementos constantes dos autos, apurou-se a seguinte factualidade:
  1.º - Por ofício com n.º de referência: 55/CONF/2012 datado de 18/01/2012, à solicitação da Direcção dos Serviços de Finanças (D.S.F.), a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (D.I.C.J.) deu resposta quanto às informações solicitadas sobre a lista das sociedades autorizadas a celebrar contratos de prestação de serviço com as concessionárias de jogos de fortuna ou azar, nela se incluem C S.A. (Sociedade de Investimento Predial C, S.A.), Grupo de Entretenimento D (Macau) S.A. e Sociedade E Lda. (cfr. sentença proferida a fls. 181 a 187 dos autos do recurso contencioso fiscal do processo n.º 2441/17-CF deste Tribunal, a fls. 103 a 109 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  2.º – Pelo despacho de “concordância” do Senhor Secretário para a Economia e Finanças exarado sobre o relatório n.º 051/DIR/2012, de 09/01/2013, foi determinado a manutenção do entendimento exposto no ofício com n.º de referência: 123/NAJ/JJ/06, emitido pela D.S.F., de que os lucros da Sociedade de Investimento Predial C, S.A. provenientes das actividades de jogos e referidos no contrato de prestação de serviço celebrado com a Sociedade de Jogos de Macau, S.A., não serão considerados para efeitos do imposto complementar de rendimentos (cfr. fls. 159 e 166 a 167 e verso dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  3.º - Em 04/07/2013, a recorrente apresentou a declaração de rendimentos do imposto complementar de rendimentos – Grupo “A”, modelo M/1, respeitante ao exercício de 2012, tendo declarado como lucro tributável líquido no valor de MOP52,002,304.00, com a junção dos documentos comprovativos (cfr. fls. 1 e verso a 21 e verso do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  4.º - Em 12/05/2016, a Comissão de Fixação da D.S.F. fixou o rendimento colectável do imposto complementar de rendimentos – Grupo “A” da recorrente referente ao exercício de 2012, no valor de MOP323,942,395.00, e em 12/08/2016, o Director da D.S.F. procedeu à respectiva liquidação da colecta no montante de MOP38,846,088.00 (cfr. fls. 88 e 90 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  5.º - Em 15/08/2016, o Director da D.S.F. emitiu à recorrente a notificação de fixação de rendimento do imposto complementar de rendimentos (cfr. fls. 92 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  6.º - Em 02/09/2016, a recorrente apresentou a reclamação contra a decisão de fixação junto da Comissão de Revisão, com a junção dos documentos comprovativos (cfr. fls. 44 a 65 e verso do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  7.º - Pela deliberação datada de 17/10/2016, a entidade recorrida deliberou negar provimento à reclamação, mantendo o rendimento colectável da recorrente para o exercício de 2012 no valor de MOP323,942,395.00, com a aplicação do agravamento de 0.005% sobre a colecta de MOP32,632,810.00 (cfr. fls. 66v do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  8.º - Por ofício com n.º de referência: 104/DAIJ/CRIC/16, foi a recorrente notificada da deliberação da entidade recorrida de 17/10/2016 (cfr. fls. 66 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  9.º - Em 26/06/2017, a recorrente apresentou o recurso contencioso fiscal contra a supradita deliberação junto deste Tribunal, autuado sob o processo n.º 2441/17-CF. Em 23/10/2018, foi julgado procedente o respectivo recurso contencioso com a consequente anulação da deliberação recorrida (cfr. sentença acima referida a fls. 103 a 109 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  10.º - Pela deliberação datada de 01/02/2019, a entidade recorrida voltou a negar provimento à reclamação da recorrente, mantendo o rendimento colectável da recorrente para o exercício de 2012 no valor de MOP323,942,395.00, com a aplicação do agravamento de 0.005% sobre a colecta de MOP32,632,810.00 (cfr. fls. 25 a 27 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  11.º - Por ofício com n.º de referência: 001/DAIJ/CRIC/19, foi a recorrente notificada da deliberação da entidade recorrida de 01/02/2019 (cfr. fls. 24 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
  12.º - Em 22/03/2019, a recorrente interpôs o presente recurso contencioso fiscal contra a supradita deliberação da entidade recorrida de 01/02/2019 (cfr. fls. 2 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).

b) Do Direito

  Em sede de recurso o tribunal está limitado às conclusões apresentadas em sede de alegações - artº 598º do CPC “ex vi” nº 1 do artº 149º do CPAC -.
  As conclusões de recurso de 1) a 10) imputam à decisão recorrida erro de julgamento uma vez que não foram indicados nos factos provados a matéria que indica e que resulta segundo a Recorrente de confissão da entidade Recorrida por si aceite.
  Ora, não assiste razão à Rcorrente.
  O despacho a que a Recorrente se refere na conclusão 1 consta da matéria de facto assente sob o nº 2º.
  O que não se deu como provado foram as conclusões que a Recorrente indica na conclusão 3 mas estas precisamente porque se tratam de conclusões, não são factos que houvessem de ser dados como provados.
  Pelo que, não violou a sentença recorrida o artº 76º do CPAC nem o artº 562º nº 3 do CPC.
  Por outro lado estes factos estão relacionados, como a própria Recorrente admite – conclusões 6 e 7 -, com a ampliação das suas conclusões nas alegações facultativas, alegando como factos novos e supervenientes o conhecimento do ofício referido em 2º dos factos assentes.
  Porém, sobre esta matéria pronunciou-se o tribunal “a quo” no seu despacho de 195 e 196, prévio à sentença, o qual não foi atacado em sede de recurso e onde não se admitiu que fossem invocados novos fundamentos invalidantes do acto porquanto os mesmos já eram do conhecimento da Recorrente na p.i..
  Assim sendo, no que concerne à matéria das conclusões 1 a 10 nenhuma razão assiste à Recorrente, não havendo quanto a esta matéria vício ou irregularidade a apontar à sentença recorrida.
  
  Das conclusões 11 a 37 vem a Recorrente invocar a falta de fundamentação do acto recorrido e que esta é contraditória, bem como, que há omissão de pronúncia, atacando a sentença recorrida por decidir em sentido contrário.
  Do acto impugnado – cuja cópia por facilidade de análise consta de fls. 25 a 27 – constam dezoito parágrafos, dados por reproduzidos na sentença recorrida de onde resultam as razões que levaram à prática do acto.
  A ausência de fundamentação não se confunde com a discordância da fundamentação.
  Ao longo das suas extensas alegações a Recorrente debate-se a tentar fundamentar que em anos anteriores não houve alteração ao rendimento declarado pela Recorrente e que os rendimentos provenientes da mesma fonte que os agora tributados não foram sujeitos a imposto, situação que aconteceu com outras sociedades que exercem actividade similar à da Recorrente.
  A fundamentação constante do acto impugnado é clara, não havendo que reproduzi-la aqui mais uma vez, sendo que dali resulta que a isenção de imposto complementar de rendimentos apenas pode ser concedida pelo Chefe do Executivo às concessionárias, pelo que, não sendo a Recorrente concessionária não lhe pode ser concedida a mesma isenção e como a Recorrente subjectivamente não pode beneficiar da isenção não há aqui qualquer poder discricionário – que seria o de atribuir ou não a isenção – pelo que, não estando no âmbito de poderes discricionários carece de fundamento a invocação da violação dos princípios da justiça, da imparcialidade e da proporcionalidade.
  Isto é, não podendo a Recorrente ser subjectivamente beneficiária da isenção por não ser uma concessionária a administração não actua no âmbito de poderes discricionários – quanto à Recorrente – mas vinculados.
  Estando os rendimentos em causa sujeitos a imposto complementar de rendimentos no âmbito da actividade vinculada e sujeita ao princípio da legalidade a administração inclui-os na matéria colectável.
  A fundamentação do acto impugnado não é contraditória, é clara, objectiva e suficiente para se entenderem as razões e fundamentos que estão na base da prática do acto impugnado.
  Aliás a prova disso é que a Recorrente bem os entendeu porque os ataca, refutando-os porque com eles não concorda querendo sustentar que como a concessionária com a qual é parceira de negócio está deles isenta a Recorrente também deveria estar porque os rendimentos são os mesmos e já foram sujeitos a impostos especial sobre o jogo.
  Assim sendo improcedem também estas conclusões de recurso quando pretendem imputar ao acto recorrido a falta de fundamentação e omissão de pronúncia, não tendo o tribunal “a quo” recorrido a qualquer outra argumentação que não aquela que consta do acto recorrido, bem andando a sentença recorrida ao concluir que os indicados vícios não se verificam.
  
  Nas suas conclusões 38 a 60 a Recorrente vem sustentar a ilegalidade do acto recorrido uma vez que os rendimentos objecto da tributação foram já sujeitos a imposto especial sobre o jogo pela concessionária a qual está isenta do imposto complementar sobre os rendimentos, havendo também dupla tributação.
  Sobre esta matéria é esclarecedora a sentença recorrida cujos fundamentos sufragamos.
  Face aos artigos 26º e 27º da Lei nº 16/2001 não há dúvida que foi intenção do legislador sujeitar os rendimentos provenientes da exploração de jogos de fortuna ou azar a imposto especial de jogos e imposto complementar de rendimentos.
  Daquele artigo 28º resulta que as concessionárias – e apenas estas e não outras entidades que com estas contratem e possam até nos termos da legislação aplicável ser beneficiárias daqueles rendimentos, como é o caso da Recorrente – podem ser isentas de imposto complementar de rendimentos.
  Há que não confundir entre isenção subjectiva e os rendimentos não estarem sujeitos a imposto o que se pode traduzir na ausência de norma de incidência ou na existência de uma norma que estabelece a isenção em termos objectivos, por exemplo não tributando rendimentos provenientes desta ou daquela actividade.
  A isenção subjectiva por sua vez consiste em determinados sujeitos estarem por força da lei isentos do pagamento do imposto ou poderem vir a estar porque a lei atribui a alguém o poder discricionário de os isentar do pagamento do imposto.
  A situação dos autos é de uma isenção subjectiva que pode apenas ser concedida às concessionárias, mas os rendimentos estão sujeitos a imposto.
  Logo, nunca a Recorrente poderia beneficiar da alegada isenção porque não é concessionária.
  A invocada dupla tributação não se confunde com a situação da mesma realidade poder ser objecto de tributação com base em várias normas legais.
  Nos termos do artº 3º da Lei nº 21/78/M o imposto complementar de rendimentos incide sobre os rendimentos da actividade comercial e industrial.
  Mas nada impede que esses rendimentos em função da sua característica sejam sujeitos a impostos especiais tal como acontece com os provenientes da exploração de jogos de fortuna e azar.
  Em momento algum se proíbe que em termos de política fiscal o mesmo facto possa ser objecto de incidência de mais do que uma norma fiscal.
  A dupla tributação é uma realidade distinta e está relacionada com a tributação simultânea do mesmo facto por ordenamentos jurídicos distintos, o que ainda assim não sendo proibido, é evitado através de acordos entre jurisdições distintas com vista a afastar a dupla tributação.
  
  Destarte, não procedendo nenhum dos vícios imputados à sentença recorrida a qual se mantém nos seus precisos termos, impõe-se negar provimento ao recurso.
  
III. DECISÃO
  
  Termos em que pelos fundamentos, negando-se provimento ao recurso se mantém a sentença recorrida nos seus precisos termos.
  
  Custas a cargo da Recorrente fixando-se a taxa de justiça em 10 Uc´s.
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 5 de Novembro de 2020.
  Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
  Lai Kin Hong
  Fong Man Chong
  
  Álvaro António Mangas Abreu Dantas
658/2020 ADM 27