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Processo nº 658/2020
(Nulidade)

Data do Acórdão: 17 de Dezembro de 2020

ASSUNTO:
- Caducidade
- Questão de conhecimento oficioso
- Nulidade
- Omissão de pronúncia

SUMÁRIO:
- Em matéria de direitos indisponíveis como ocorre no caso de liquidação de impostos, a caducidade é de conhecimento oficioso;
- O objecto e limites do recurso definem-se nas conclusões de recurso;
- Sendo proferida decisão sobre determinada questão e não se interpondo recurso da mesma, nesse segmento forma-se caso julgado, não podendo o tribunal de recurso voltar a dela conhecer ainda que fosse de conhecimento oficioso e tenha posição distinta da adoptada na instância anterior.


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Rui Pereira Ribeiro

















Processo nº 658/2020
(Nulidade)

Data: 17 de Dezembro de 2020
Reclamante: A Limited
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

  A fls. 327/330 vem a Autora e Recorrente arguir a nulidade do Acórdão alegando que o Tribunal não se pronunciou sobre questões que havia de apreciar.
  Para tanto invoca que em circunstâncias análogas às dos autos e como resulta da factualidade dada por assente no Acórdão a qual indica, este Tribunal de Segunda Instância tem vindo a entender anular o acto recorrido por a liquidação já não poder ser feita por ter já decorrido o prazo de caducidade.
  Pelo que, sendo a caducidade do conhecimento oficioso e não se tendo o Tribunal pronunciado sobre a mesma é nulo o Acórdão.
  
  Vejamos então.
  
  Como implicitamente resulta da reclamação não está em causa que o tribunal não haja apreciado questão que tenha sido invocada pelas partes.
  Em momento algum das conclusões de recurso se coloca a questão da caducidade do direito à liquidação.
  A questão que importa saber é se no caso em apreço a caducidade é de conhecimento oficioso e se havia de ser conhecida por este tribunal.
  Nos termos do nº 1 do artº 325º do C.Civ. a caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal quando estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes, o que ocorre em matéria de impostos por ser direito indisponível seja para o cidadão seja para a Administração Fiscal.
  Assim sendo, ocorrendo a caducidade do direito a praticar o acto tributário impugnado, ainda que não seja invocado pelas partes impõe-se que o tribunal conheça dessa matéria.
  Contudo, no caso em apreço a Autora e agora Recorrente nos artigos 50 a 55 da sua petição inicial invocou a prescrição do direito à liquidação nos termos do artº 55º do CICR.
  Pese embora a lei lhe chame “prescrição” estamos de acordo que o prazo que ali se fixa é um prazo de caducidade e não de prescrição, pelo que, se fosse possível dele conhecer sempre seria de conhecimento oficioso independentemente da designação que se lhe dê.
  Porém, na decisão recorrida a página 9 e 10 – cf. fls. 201 e 201v dos autos – foi apreciada a invocada prescrição da liquidação, julgando-se esse argumento improcedente.
  Nas suas sessenta conclusões de recurso a Recorrente imputa vários vícios à decisão recorrida mas em momento algum invoca o erro de julgamento quanto à questão da prescrição/caducidade.
  De acordo com o disposto no nº 3 do artº 589º do CPC «nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso».
  Segundo o artº 598º do CPC nas conclusões de Recurso deve o Recorrente invocar «os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão».
  Sobre o ónus de concluir mostra-se apropriado transcrever o que ensinava o Prof. Alberto dos Reis em Código de Processo Civil Anotado, Volume V, 3ª Edição, pág. 358/359:
  «2) Ónus de concluir. Não basta que o recorrente alegue; o art. 690.º vai mais longe: quer que a alegação apresente conclusões. Ao ónus de alegar acresce, pois, o ónus de concluir.
  Lê-se na Rev. de Leg. (84.º, pág. 230):
  A lei nova exige não só que o recorrente alegue, senão também que conclua. Para que se tome conhecimento do recurso, é indispensável:
  1.º Que o recorrente ofereça a sua alegação;
  2.º Que nela diga, em forma de conclusões, quais os fundamentos do seu recurso.
  Porquê estas exigências?
  Entendeu-se que, exercendo os recursos a função de impugnação das decisões judiciais (art. 677.º), não fazia sentido que o recorrente não expusesse ao tribunal superior as razões da sua impugnação a fim de que o tribunal aprecie se tais razões procedem ou não. E como pode dar-se o caso de a alegação ser extensa, prolixa ou confusa, importa que no fim, a título de conclusões, se indiquem resumidamente os fundamentos da impugnação (Veja-se também Rev. de Leg., 80.º págs. 341 e 342).
  Como se satisfaz o ónus de concluir?
  O texto responde: pela indicação resumida dos fundamentos por que se pede a alteração ou anulação da sentença ou despacho. Mais simplesmente: pela enunciação abreviada dos fundamentos do recurso.
  A palavra conclusões é expressiva. No contexto da alegação o recorrente procura demonstrar esta tese: Que o despacho ou sentença deve ser revogado, no todo ou em parte. É claro que a demonstração desta tese implica a produção de razões ou fundamentos. Pois bem: essas razões ou fundamentos são primeiro expostos, explicados e desenvolvidos no curso da alegação; hão-de-ser, depois, enunciados e resumidos, sob a forma de conclusões, no final da minuta.
  É claro que, para serem legítimas e razoáveis, as conclusões devem emergir logicamente do arrazoado feito na alegação. As conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação.».
  Ora, nada se invocando quanto a algum erro de julgamento na decisão recorrida quanto à questão da caducidade (nem prescrição que fosse que lhe chamassem) é porque o Recorrente aceitou a decisão recorrida nessa matéria.
  No caso em apreço não houve omissão de apreciação e decisão sobre a caducidade do direito à liquidação.
  O Tribunal “a quo” conheceu dela, julgou que não se verificava, e neste segmento da decisão recorrida não é interposto recurso.
  A apreciação oficiosa da caducidade não permite que o tribunal viole o caso julgado.
  Bem se apercebeu este tribunal que a decisão recorrida na apreciação da questão da caducidade não acompanhava aquela que tem vindo a ser jurisprudência deste tribunal no Acórdão indicado pela Recorrente e outros1, contudo, sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões deste (de recurso), não se atacando a decisão recorrida naquele vector, aquela decisão transitou em julgado nessa matéria o que equivale que no caso em apreço já se decidiu com força obrigatória geral que no caso em apreço não havia ocorrido a caducidade do direito à liquidação, não sendo possível a este tribunal voltar a conhecer desta matéria (por força do caso julgado formado).
  Repetindo-se o que já se dizia em sede de fundamentação de direito a página 19 (cf. fls. 319 dos autos) no Acórdão relativamente ao qual agora se invoca a nulidade, “Em sede de recurso o tribunal está limitado às conclusões apresentadas em sede de alegações - artº 598º do CPC “ex vi” nº 1 do artº 149º do CPAC -”, não tendo o poder de sindicar oficiosamente do acerto da decisão recorrida, se nada for invocado para o efeito.
  Pelo que, pese embora a apreciação da caducidade do direito à liquidação seja de conhecimento oficioso, tendo já havido pronuncia sobre esta matéria, sem que dessa decisão se interponha recurso, já transitou em julgado a decisão sobre a caducidade do direito à liquidação não se podendo dela voltar a conhecer em sede de recurso ainda que, eventualmente se discordasse do sentido em que se haja decidido.
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, vai indeferida a arguida nulidade.
  
  Custas a cargo da reclamante fixando-se a taxa de justiça em 2UC’s.
  
  Notifique.
  
  RAEM, 17 de Dezembro de 2020
  
  Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
  Lai Kin Hong
  Fong Man Chong
  
  Mai Man Ieng

1 Nomeadamente, Acórdãos de 24.06.2020 Procº 327/2020 e de 17.09.2020 Procº 529/2020.
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658/2020 NULIDADE 7