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Processo nº 190/2020 Data: 18.12.2020
(Autos de recurso jurisdicional)

Assuntos : Autorização de residência temporária na R.A.E.M..
Manutenção da autorização.
“Residência habitual”.
Ausência.
Cancelamento da autorização de residência.



SUMÁRIO

1. Nos termos do art. 9°, n.° 3 da Lei n.° 4/2003, (sobre a “entrada, permanência e autorização de residência”), “A residência habitual do interessado na RAEM é condição da manutenção da autorização de residência”.

2. A “residência habitual”, (para efeitos de se saber se alguém tem ou não residência habitual em Macau), é um “conceito indeterminado” sindicável pelos Tribunais.

3. A mera “ausência temporária” de uma pessoa a quem tenha sido concedida autorização para residir em Macau não implica a necessária conclusão que tenha deixado de “residir habitualmente” em Macau.

4. Verificando-se porém que a mesma tem “ausências prolongadas” de Macau, e perante a sua alegação de se deverem a “razões profissionais”, cabe-lhe o ónus da prova do referido motivo para efeitos de manutenção, (ou cancelamento), da concedida autorização de residência.

O relator,

José Maria Dias Azedo


Processo nº 190/2020
(Autos de recurso jurisdicional)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por Acórdão de 30.05.2019 do Tribunal de Segunda Instância, (Proc. n.° 392/2018), negou-se provimento ao recurso contencioso que A, (甲), com os restantes sinais dos autos, interpôs do despacho do SECRETÁRIO PARA A ECONOMIA E FINANÇAS que cancelou a sua autorização de residência temporária em Macau; (cfr., fls. 69 a 76 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformada, do assim decidido a recorrente recorreu, sendo que por Acórdão desta Instância de 13.11.2019, (Proc. n.° 106/2019), se decidiu decretar a anulação do veredicto recorrido para ampliação da matéria de facto e nova decisão; (cfr., fls. 147 a 159).

*

Oportunamente, na sequência do assim decidido, pelo Tribunal de Segunda Instância veio a ser proferido novo Acórdão, datado de 16.07.2020, negando-se (novamente) provimento ao recurso contencioso interposto; (cfr., fls. 171 a 178).

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Ainda inconformada, traz a mesma recorrente o presente recurso jurisdicional.

Nas suas alegações produz as seguintes conclusões:

“A) A Recorrente reitera e dá por integralmente reproduzido tudo o anteriormente alegado em sede recursal, nomeadamente o constante do recurso contencioso e dos prévios recurso para a Segunda e Última Instâncias, e, bem assim, as respectivas conclusões.
B) Ou a Recorrente trabalhava fora de Macau, em várias regiões da Ásia, como oportunamente demonstrado, e, portanto, não poderia estar em Macau, uma vez que não detém o dom da bilocação, ou, se estivesse em Macau, estaria a violar as suas obrigações profissionais, por não estar fora em cumprimento das suas funções.
C) E se o seu trabalho fosse em Macau, como explicar que aqui não permanecesse? Se as suas funções fossem para ser exercidas fora de Macau, como explicar que aqui permanecesse? Em qualquer das situações estaria forçosamente a violar as suas obrigações profissionais!!
D) Portanto, sabendo o tribunal que a primeira e principal das suas funções era projectar os negócios da empresa internacionalmente; tendo a Recorrente demonstrado que por isso estava fora de Macau, não é razoável dizer que a recorrente não demonstrou que não permanecia em Macau por via das suas obrigações profissionais!
E) Termos em que não se julga ser de admitir a conclusão do douto Acórdão recorrido de que «a Recorrente não foi capaz de provar que a sua ausência de Macau entre o ano de 2016 e 2017 foi por causa do trabalho (…)».
F) «Tratando-se de um conceito indeterminado, em circunstâncias especiais admitem-se desvios no que toca aos padrões normalmente seguidos para densificar o conceito de residência habitual, visto que em várias situações o interessado pode ausentar-se do local por motivos variados (ex. Por motivo de reciclagem ou estudo profissional, mandado pela companhia que recrutou o requerente para frequentar qualquer curso de especialidade fora de Macau durante 6 meses ou mais tempo; ou por motivo profissional o requerente vai ser destacado para uma companhia filial situada fora de Macau para desempenhar uma função altamente técnica durante 6 meses ou mais tempo; ou por motivo de doença prolongada e hospitalização em estabelecimento fora Macau para receber tratamentos adequados durante 6 meses ou mais tempo; ou porque tem filhos menores que carecem de cuidado especial fora de Macau por causa de doença ou saúde durante 6 meses ou mais tempo), o que demonstra que a presença física prolongada de uma pessoas ou pernoitar num determinado local não são critérios únicos e exclusivos para determinar a residência habitual de uma pessoa.»
G) A decisão recorrida está inquinada de ilegalidade nomeadamente por erro nos pressupostos de facto, além de que viola os direitos adquiridos da Recorrente”; (cfr., fls. 186 a 192).

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Respondendo, diz a entidade recorrida que:

“I. Não existe contradição no facto de, como fez o acórdão recorrido, se admitir que as funções da recorrente consistiam na expansão dos negócios internacionais do seu empregador e, por outro lado, concluir que não tinha sido provado que eram razões profissionais as que explicavam a sua ausência da RAEM.
II. O mero facto de um trabalhador ser contratado por uma empresa de Macau não significa que ele tenha aqui residência habitual.
III. Na verdade, uma empresa de Macau pode contratar - para trabalhar no exterior ou não - alguém que reside habitualmente no exterior.
IV. A recorrente não provou qualquer das habituais despesas que os trabalhadores das empresas de Macau deslocados no exterior fazem com alojamento, alimentação e viagens.
V. O que resulta da prova feita é que a recorrente, tendo a sua residência habitual no exterior, se deslocava por vezes a Macau – e não que ela, tendo aqui a sua residência habitual, se deslocava em trabalho ao exterior.
VI. O tribunal recorrido apreciou correctamente a prova efectuada e não se vislumbra qualquer erro de facto.
VII. A recorrente não tinha adquirido o estatuto de residente permanente, pois este depende não apenas do decurso do prazo de 7 anos mas também da residência habitual – que não existia”; (cfr., fls. 198 a 202)

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Em sede de vista, juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:

“Nos termos previstos na norma do artigo 157.º, n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), vem o Ministério Público pronunciar-se nos termos que seguem:
1.
Inconformada com a decisão do Tribunal de Segunda Instância proferida nos presentes autos a fls. 171 a 177 que julgou improcedente o recurso contencioso que interpôs do acto do Secretário para a Economia e Finanças que declarou a caducidade da sua autorização de residência temporária em Macau veio A, melhor identificada nos autos, interpor o presente recurso jurisdicional.
2.
Parece-nos que presente recurso não pode ser objecto de apreciação por esse Tribunal de Última Instância. Por duas razões.
(i)
O acórdão recorrido foi proferido na sequência de um acórdão anulatório proferido pelo Tribunal de Última Instância nos termos do qual foi ordenada a ampliação da matéria de facto no sentido de permitir à Recorrente demonstrar que nos anos de 2016 e 2017, nos períodos em que este ausente de Macau estava a trabalhar para a sua entidade patronal de Macau.
Mais se decidiu no dito acórdão anulatório que se a Recorrente não conseguisse fazer tal demonstração, o recurso contencioso devia ser julgado improcedente.
Significa isto, que o Tribunal de Última Instância, ao abrigo da primeira parte da norma do n.º 2 do artigo 650.º do Código de Processo Civil, fixou o regime jurídico aplicável ao caso, com isso limitando a possibilidade de impugnação da nova decisão do Tribunal de Segunda Instância entretanto proferida.
Na verdade, o sentido da norma do n.º 2 do artigo 650.º é justamente esse: o de evitar que proferido o acórdão pela Segunda Instância venha a ser interposto um novo recurso para o Tribunal de Última Instância (cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Recursos no Novo Processo Civil, Coimbra, 2018, p. 437).
Nesta situação, apenas será admissível recurso do novo acórdão do Tribunal de Segunda Instância com fundamento no incumprimento por parte deste daquilo que foi determinado pelo Tribunal de Última Instância, «quer quanto à matéria de facto a ampliar, quer quanto ao regime jurídico definido» (cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal de 25 de Junho de 1992, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 418.º, p. 730, com referências jurisprudenciais e doutrinárias no mesmo sentido).
Ora, da leitura do acórdão recorrido resulta que o Tribunal de Segunda Instância, ampliando a matéria de facto, julgou como não provado que a Recorrente A, nos anos em causa, tinha de pernoitar fora de Macau por causa do seu trabalho.
Significa isto, portanto, que a Recorrente não fez a demonstração indispensável a que se pudesse considerar que a sua ausência de Macau durante os anos de 2016 e 2017 se justificava por razões ligadas ao exercício da sua actividade profissional.
Assim, faltando essa demonstração, a consequência jurídica a extrair só podia ser, nos termos já definidos por esse Tribunal de Última Instância ao abrigo da primeira parte do n.º 2 do artigo 650.º do CPC, aquela que foi extraída pelo Tribunal a quo, ou seja, a da improcedência do recurso contencioso.
Como, no recurso agora interposto a Recorrente não invoca o incumprimento por parte do Tribunal de Segunda Instância daquilo que foi determinado pelo Tribunal de Última Instância no acórdão anulatório, quer quanto à matéria de facto a ampliar, quer quanto ao regime jurídico definido, não nos parece que tal recurso seja admissível.
(ii)
Na verdade, e com isto entramos na segunda razão pela qual, a nosso ver, o recurso interposto não pode ser apreciado por esse Tribunal, a Recorrente, na sua peça impugnatória, limita-se a questionar o julgamento de facto que foi efectuado pelo Tribunal a quo relativamente à matéria que constituiu objecto de ampliação nos termos ordenados pelo Tribunal de Última Instância.
No entanto, de acordo com o artigo 152.º do CPAC, que excepciona a regra constante do n.º 1 do artigo 47.º da Lei n.º 9/1999, «o recurso dos acórdãos do Tribunal de Segunda Instância apenas pode ter por fundamento a violação ou a errada aplicação de lei substantiva ou processual ou a nulidade da decisão impugnada».
Resulta, pois, da citada norma, entre o mais, que o Tribunal de Última Instância não pode censurar a convicção formada pelas instâncias quanto à prova (neste sentido, veja-se o acórdão de 2.6.2004, Processo n.º 17/2003) e é disso que, verdadeiramente, se trata na questão suscitada pela Recorrente. Esta limita-se a questionar o juízo de facto que foi feito pelo Tribunal de Segunda Instância, como resulta inequivocamente das conclusões E) e G) das alegações do recurso.
A Recorrente não impugna a aplicação da lei que foi feita pelo Tribunal a quo aos factos que este considerou provados, mas, apenas, o julgamento sobre esses factos, imputando à decisão um «erro nos pressupostos de facto». No entanto e como referimos, essa matéria, em nosso modesto entendimento, encontra-se subtraída à cognição desse Tribunal de Última Instância.
3.
Deve ser rejeitado o presente recurso jurisdicional, ou, se assim se não entender, deve ser-lhe negado provimento.
É este, salvo melhor opinião, o parecer do Ministério Público”; (cfr., fls. 214 a 215-v).

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Corridos os vistos dos Mmos Juízes-Adjuntos, vieram os autos para decisão em conferência.

Fundamentação

Dos factos

2. Pelo Tribunal de Segunda Instância vem indicada como “provada” a seguinte matéria de facto:

«A recorrente A é titular do BIRPHK, em 2010 apresentou ao IPIM na qualidade de quadro dirigente o pedido de autorização de residência temporária.
A recorrente também pediu estender ao seu cônjuge B a referida autorização de residência temporária.
Em 17 de Junho de 2010, foi-lhes concedida pela 1ª vez a autorização de residência temporária, em 2 de Agosto do mesmo ano foi-lhes emitido pela 1ª vez o BIR não permanente de Macau, com o prazo de validade até 17 de Junho de 2016. (vide as fls. 41 e 46 do processo administrativo)
Em 15 de Março de 2016, a recorrente foi ao IPIM pedir a renovação da autorização de residência temporária dela própria e do seu cônjuge, o pedido foi deferido pela autoridade. (vide as fls. 31 a 33 do processo administrativo)
Em 6 de Março de 2018, o técnico superior do IPIM elaborou a seguinte proposta n.º 00780/AJ/2018:
“Assunto: propõe-se declarar a caducidade da autorização de residência temporária (proc. n.º 0780/2009/02R)
Proposta n.º 00780/AJ/2018
Data: 06/03/2018
Sr. Director-adjunto substituto Divisão dos Assuntos Jurídicos C,
1. Ao abrigo do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, foi concedida em 17 de Junho de 2010 à requerente A na qualidade de quadro dirigente a autorização de residência temporária, que também foi estendida ao seu cônjuge B, e depois, a autorização de residência temporária deles foi renovada até 17 de Junho de 2019, são juntados os dados de identidade dos interessados ao processo n.º 0780/2009/02R (vide o anexo 5).
2. A requerente e o seu cônjuge completaram em 17 de Junho de 2017 7 anos de residência temporária, portanto, em 11 de Outubro de 2017, a requerente entregou a declaração escrita e os documentos comprovativos para pedir ao nosso Instituto a carta de confirmação da validade da respectiva autorização de residência temporária (vide o anexo 1).
3. Para a referida matéria, por carta n.º 08079/GJFR/2017, o Instituto solicitou ao CPSP o registo de movimentos fronteiriços da requerente. Conforme a resposta do CPSP, em 2016 e de Janeiro a Novembro de 2017, permaneceu em Macau respectivamente por 31 dias e 27 dias (vide o anexo 2).
4. Ao abrigo do art.º 9.º da Lei n.º 4/2003, subsidiariamente aplicado nos termos do art.º 23.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, a residência habitual do interessado na RAEM é condição da manutenção da autorização de residência. Todavia, segundo o respectivo registo de movimentos fronteiriços, passou o mais do seu tempo fora de Macau.
5. A referida matéria pode ser desfavorável para manter a autorização de residência temporária da requerente, portanto, em 30 de Janeiro de 2018, por carta n.º 00404/DJFR/2018, o nosso Instituto realizou a audiência escrita à requerente (vide o anexo 3).
6. Em 13 de Fevereiro de 2018, a requerente entregou a resposta com o seguinte conteúdo principal (vide o anexo 4):
1) A requerente reiterou que foi empregado desde 1 de Novembro de 2011 pela [EMPRESA(1)]., desempenando a função de “gerente de desenvolvimento de negócios – zona da Ásia” e auferindo mensalmente um salário de MOP$60.000,00.
2) A requerente afirmou que, em vista da natureza da profissão, tinha de ir frequentemente ao exterior em missão oficial de serviço, embora estivesse fora de Macau, estava a trabalhar para empregador de Macau.
3) A requerente declarou que, em 2018, iria trabalhar principalmente em Macau, pediu aceitar a sua resposta.
7. No tocante à resposta e documentos apresentados pela requerente, faz-se a seguinte análise:
1) Conforme o registo de movimentos fronteiriços fornecido pelo CPSP, em 2016 e de Janeiro a Novembro de 2017, a requerente permaneceu em Macau respectivamente por 31 dias e 27 dias.
2) Segundo a resposta da requerente, embora esteja empregado pelo empregador de Macau, vai frequentemente trabalhar para fora de Macau.
3) A resposta e os documentos da requerente não justificam nem provam que ela considera a RAEM como centro de vida.
4) Tendo em conta as situações enumeradas pelo art.º 4.º n.º 4 da Lei n.º 8/1999, considera-se que a requerente não reside habitualmente em Macau.
8. Pelo exposto, a residência habitual do interessado na RAEM é condição da manutenção da autorização de residência. Todavia, conforme o registo de movimentos fronteiriços fornecido pelo CPSP, a requerente passou o mais do seu tempo fora de Macau. Após a audiência escrita, não se verifica que ela considera a RAEM como centro de vida, por isso, tendo em conta as situações enumeradas pelo art.º 4.º n.º 4 da Lei n.º 8/1999, considera-se que a requerente não reside habitualmente em Macau. Com base nisso, propõe-se ao Exmo. Secretário para a Economia e Finanças declarar a caducidade da autorização de residência temporária da interessada ao abrigo do art.º 9.º da Lei n.º 4/2003, subsidiariamente aplicado nos termos do art.º 23.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, e do art.º 24.º n.º 2 do Regulamento Administrativo n.º 5/2003.
À consideração superior.”
O Presidente substituto do IPIM proferiu o seguinte parecer em 15 de Março de 2018:
“Concordo com a proposta, à consideração do Exmo. Secretário para a Economia e Finanças.”
Em 23 de Março de 2018, o Secretário para a Economia e Finanças proferiu o seguinte despacho na referida proposta n.º 00780/AJ/2018:
“Defiro a proposta.” (vide a fls. 10 do processo administrativo)
Conforme o registo de movimentos fronteiriços fornecido pelo CPSP, em 2016 e de Janeiro a Novembro de 2017, a recorrente permaneceu em Macau respectivamente por 31 dias e 27 dias. (vide as fls. 21 e 25 do processo administrativo).
A recorrente e o seu cônjuge nunca compraram apartamento em Macau. Nos últimos anos, todas as vezes que voltaram a Macau, alojavam-se em casa de amigos ou em hotel.
Desde 2011, a recorrente foi empregada por uma companhia de materiais de construção, registada em Macau.
Segundo as informações fornecidas pela Companhia, o cargo da recorrente A é gerente de desenvolvimento de negócios da zona da Ásia, sendo responsável pelos seguintes trabalhos:
“I – Responsabilidade de marketing
A. Desenvolvimento de negócios
1. Elaborar uma nota de apresentação profissional do Companhia, com o fim de expandir os negócios internacionais e exibir, propagar e introduzir os negócios da companhia em reuniões comerciais diferentes e aos novos clientes.
2. Tomar a iniciativa de ir ter com os clientes, procurar clientes novos por diversos meios, bem como oportunidades comerciais de serviços e produtos diferentes para a Companhia.
3. Rever e recolher a situação dos negócios, de forma a oferecer espaço ou plano de melhoramento; elaborar o plano de desenvolvimento dos negócios futuros, para a referência e a discussão da Companhia.
4. Pesquisar de forma seleccionada os critérios e exigências dos outros países sobre a qualidade dos produtos da Companhia, para completar as instruções de importação dos materiais de construção dos países ou regiões.
5. Actualizar a situação de desenvolvimento da tecnologia nova relacionada aos produtos e serviços da Companhia para aumentar a competitividade.
B. Determinação das políticas de exploração e dos critérios e procedimentos
1. Fixar preliminarmente os critérios de contagem do preço proposto, modificar eficaz e sistematicamente o procedimento de propositura do preço, para cooperar com as necessidades dos clientes.
2. Fixar os critérios de treinamento, principalmente nos aspectos das técnicas e textos de apresentação e Q&A, de forma a oferecer eficientemente aos clientes as informações da Companhia.
3. Prestar assistência em elaboração do documento de concurso.
4. Fornecer o relatório de administração de projecto específico.
5. Participar em reuniões de projecto.
6. Renovar as informações dos projectos e negócios.
7. Administrar os postos de fiscalização de produção de produtos.
8. Determinar o procedimento de controlo de qualidade de produtos e o formulário de informação, para uniformizar a exploração (sic.).
II – Estratégias do mercado
1. Participar nas actividades de exposição comerciais, para procurar nova fonte de clientes.
2. Promover os negócios comerciais informáticos e plataformas de Internet, para ligar companhias de construtores, de obras e de administração de projectos.
2.1 Analisar as vantagens e desvantagens dos negócios de Internet.
2.2 Criar o website da plataforma de Internet.
2.3 Avaliar a plataforma de Internet.
2.4 Elevar a qualidade, a estabilidade e a segurança dos produtos.
III – Estudo das estratégias de globalização
Aproveitar as redes sociais para aumentar a exposição da Companhia.”»; (cfr., fls. 174-v a 177 e 5 a 12 do Apenso).

Do direito

3. O presente recurso tem como o objecto o – novo – Acórdão pelo Tribunal de Segunda Instância proferido em 16.07.2020, que confirmou a decisão do Secretário para a Economia e Finanças que cancelou a antes concedida autorização de residência temporária na R.A.E.M. da ora recorrente.

Como resulta do que se deixou relatado, em causa está o reclamado “direito de residência” em Macau da ora recorrente, para o qual, como se consignou no referido Acórdão deste Tribunal de Última Instância de 13.11.2019, interessava saber se, a mesma, nos períodos em que não permaneceu em Macau nos anos de 2016 e 2017 trabalhou para a sua entidade patronal de Macau, tendo pernoitado fora de Macau por motivos de trabalho.

Sobre a dita questão, assim se decidiu no Acórdão desta Instância de 13.11.2019:

“(…)
Afigura-se-nos que, no recurso contencioso, se deveria ter permitido que a recorrente provasse os factos alegados, tendente a justificar a sua ausência de Macau, na maior parte do tempo em 2016 e 2017, que é o período que a Administração entende que a recorrente não tinha residência habitual em Macau, demonstrando onde trabalhou e onde pernoitou. O que não foi feito.
Impõe-se, assim, a anulação do acórdão recorrido, por insuficiência da matéria de facto, que deve ser ampliada aos mencionados factos, nos termos do artigo 650.º do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente.
Para efeitos do n.º 2 do artigo 650.º do Código de Processo Civil, consigna-se o seguinte: como o ónus da prova cabe à recorrente, se ela demonstrar que trabalhou para a sua entidade patronal de Macau, nos anos de 2016 e 2017, nos períodos em que esteve ausente de Macau, no exterior e que pernoitou nesses locais, deverá o acto administrativo ser anulado.
Se não fizer essa prova, o recurso contencioso deve ser julgado improcedente.
(…)”; (cfr., fls. 158-v).

E, dando-se cumprimento ao assim deliberado, (após indicar como provada a matéria que atrás se deixou transcrita), assim ponderou o Tribunal de Segunda Instância no seu Acórdão ora recorrido:

“Segundo a exigência do TUI no acórdão n.º 106/2019, este Tribunal deve apurar se durante o período de 2016 até Novembro de 2017 a recorrente trabalhava no exterior para o seu empregador de Macau e pernoitava lá, se for sim, deve ser anulado o acto administrativo impugnado.
Após analisar todas as informações do processo administrativo e do processo jurídico, bem como os depoimentos das testemunhas prestados na audiência de julgamento, o Tribunal não pode dar assente que a recorrente A tinha que pernoitar fora de Macau por causa de trabalho.
Quanto a esta questão de facto, não obstante a recorrente e as testemunhas terem referido que aquela tinha que se deslocar frequentemente ao exterior para trabalhar, a verdade é que nenhum deles podia afirmar, de forma inequívoca, que durante todo o período em que a recorrente se encontrava fora de Macau, foi por motivos de trabalho que ela não podia pernoitar em Macau.
Como diz o Digno Procurador-adjunto, segundo as regras de experiência, se a recorrente realmente tivesse de ir trabalhar frequentemente ao exterior por longo tempo devido ao seu cargo, devia poder entregar documentos suficientes para provar a situação, mas quer no processo administrativo quer no recurso contencioso a recorrente não forneceu essas informações.
Indica o TUI no acórdão n.º 106/2019 que, no caso, é necessário julgar se, durante os 7 anos em que a recorrente estava autorizadas a residir temporariamente em Macau, nomeadamente nos 2 anos últimos em apreço, a recorrente residiu habitualmente em Macau.
O acórdão acrescenta que, se a recorrente consiga provar que, durante o período em que não estava em Macau em 2016 e 2017, estava a trabalhar no exterior para o seu empregador de Macau e pernoitava lá, o acto administrativo deve ser anulado, senão, o recurso deve ser julgado improcedente.
Como acima disse, este Tribunal não pode dar assente que, em 2016 e 2017 (excepto os 31 dias de 2016 e 27 dias de 2017), a recorrente A tinha que pernoitar fora de Macau por causa de trabalho, portanto, julga que a recorrente não residiu habitualmente em Macau naquele período, assim sendo, é rejeitado o seu recurso”; (cfr., fls. 177 a 177-v e fls. 12 a 13 do Apenso).

Aqui chegados, e percorrendo as conclusões pela recorrente apresentadas, verifica-se que a mesma não admite “a conclusão do douto Acórdão recorrido de que «a Recorrente não foi capaz de provar que a sua ausência de Macau entre o ano de 2016 e 2017 foi por causa do trabalho (…)»”, considerando também que a “decisão recorrida está inquinada de ilegalidade nomeadamente por erro nos pressupostos de facto, além de que viola os direitos adquiridos da Recorrente”; (cfr., conclusões E e G).

Apresentando-se-nos adequada uma pronúncia sobre o – mérito do – “reclamado direito de residência” da ora recorrente, a tanto se passa.

–– Começando-se pelo alegado “direito adquirido”, cabe dizer que o mesmo já foi objecto de (expressa) apreciação e decisão no referido Acórdão de 13.11.2019, tendo-se aí concluído que nenhuma violação ocorreu; (cfr., pág. 8 do dito Acórdão, a fls. 156-v destes autos).

Nenhum “elemento novo” existindo – nem a recorrendo o indicando – que justifique uma nova apreciação da questão, mais não se mostra de consignar sobre a mesma.

–– Quanto à “causa da ausência da recorrente de Macau nos anos de 2016 e 2017”.

Nos termos do art. 1° do Regulamento Administrativo n.° 3/2005 que estabelece o “Regime de fixação de residência temporária de investidores, quadros dirigentes e técnicos especializados”:

“Podem requerer autorização de residência temporária na Região Administrativa Especial de Macau, nos termos do presente diploma, as seguintes pessoas singulares não residentes:
1) Os titulares de projectos de investimento, em apreciação nos competentes serviços da Administração, que sejam considerados relevantes para a Região Administrativa Especial de Macau;
2) Os titulares de investimentos que sejam considerados relevantes para a Região Administrativa Especial de Macau;
3) Os quadros dirigentes e técnicos especializados contratados por empregadores locais que, por virtude da sua formação académica, qualificação ou experiência profissional, sejam considerados de particular interesse para a Região Administrativa Especial de Macau;
4) Os adquirentes de bens imóveis que cumpram os requisitos previstos no artigo 3.º”.

Por sua vez, regulando a matéria da “entrada, permanência e autorização de residência” preceitua o art. 9° da Lei n.° 4/2003 que:

“1. O Chefe do Executivo pode conceder autorização de residência na RAEM.
2. Para efeitos de concessão da autorização referida no número anterior deve atender-se, nomeadamente, aos seguintes aspectos:
1) Antecedentes criminais, comprovado incumprimento das leis da RAEM ou qualquer das circunstâncias referidas no artigo 4.º da presente lei;
2) Meios de subsistência de que o interessado dispõe;
3) Finalidades pretendidas com a residência na RAEM e respectiva viabilidade;
4) Actividade que o interessado exerce ou se propõe exercer na RAEM;
5) Laços familiares do interessado com residentes da RAEM;
6) Razões humanitárias, nomeadamente a falta de condições de vida ou de apoio familiar em outro país ou território.
3. A residência habitual do interessado na RAEM é condição da manutenção da autorização de residência”.

Em conformidade com o estatuído n.° 3 do transcrito artigo 1° do Regulamento Administrativo n.° 3/2005, a ora recorrente requereu e foi-lhe concedida autorização de residência temporária em Macau em 17.06.2010.

Porém, atento o preceituado no n.° 3 do igualmente transcrito art. 9° da Lei n.° 4/2003, para efeitos de renovação, (manutenção), da sua autorização de residência, houve necessidade de se aferir da sua (efectiva) “residência habitual em Macau”.

Ora, como se referiu no já citado Acórdão deste Tribunal de Última Instância de 13.11.2019, “residência habitual”, (para efeitos de se saber se alguém tem ou não residência habitual em Macau), é um “conceito indeterminado sindicável pelos Tribunais”; (sobre esta questão, vd., o Ac. do T.U.I. de 03.05.2000, Proc. n.° 9/2000 e os Acs. de 21.10.2020, Procs. n°s 84/2020 e 140/2020).

Daí, (e considerando-se que a mera “ausência temporária” de uma pessoa a quem tenha sido concedida autorização para residir em Macau não implica a necessária conclusão que tenha deixado de “residir habitualmente” em Macau), a anterior decisão no sentido de, o Tribunal de Segunda Instância, em ampliação da matéria de facto, apurar dos “motivos” das ausências da recorrente de Macau nos anos de 2016 e 2017.

Nesta conformidade, salientando-se que era à ora recorrente que cabia o “ónus da prova” de que a sua referida ausência de Macau nos anos de 2016 e 2017, tinha como causa o “exercício da sua actividade profissional”, e verificando-se que não logrou a mesma demonstrar tal “motivação”, pouco mais se mostra de consignar para se concluir que a sua pretensão quanto ao reclamado “direito de residência” (que lhe foi cancelado) não merece acolhimento.

Na verdade, constata-se que em relação à matéria em questão, mais não faz a recorrente que tentar sindicar a “livre convicção do Colectivo do Tribunal de Segunda Instância”, certo sendo que, nos termos do art. 152° do C.P.A.C., não o pode fazer.

Com efeito, e como se nos mostra adequado, em sede de “matéria de facto”, este Tribunal apenas pode censurar a decisão em questão se a mesma tiver sido o resultado de algum atropelo às “regras de produção da prova” ou respeitantes ao próprio “ónus da prova”, ou seja, sobre às “regras de direito probatório”; (cfr., entre outros, o Ac. deste T.U.I. de 02.06.2004, Proc. n.° 17/2003, pelo M.P. citado no seu Parecer, e J. Cândido de Pinho in, “Notas e Comentários ao C.P.A.C.”, Vol. II, 2018, pág. 391 e segs.).

Dest’arte, nenhuma censura merecendo a decisão do Tribunal de Segunda Instância que deu como “não provado” que a ausência da recorrente de Macau nos anos de 2016 e 2017 se justificava por razões ligadas à sua actividade profissional, vista está que igualmente acertada foi a solução a que chegou, no sentido de que o seu recurso contencioso não merecia provimento, (aliás, em perfeita sintonia com o por esta Instância considerado no Acórdão de 13.11.2019).

Decisão

4. Nos termos e fundamentos que se deixam expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente, com a taxa de justiça de 10 UCs.

Registe e notifique.

Macau, aos 18 de Dezembro de 2020


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Álvaro António Mangas Abreu Dantas

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