Processo nº 1319/2019
(Autos de Recurso Contencioso)
Data do Acórdão: 17 de Dezembro de 2020
ASSUNTO:
- Aceitação tácita do acto
- Requerimento para o pagamento em prestações
- Legitimidade para recorrer
- Pressuposto da aplicação da pena de multa
- Vício de violação de lei
SUMÁRIO:
- O pedido de pagamento da multa em prestações pode não corresponder a uma aceitação tácita do acto sancionatório;
- Sendo nos termos do artº 235º do EMFSM pressuposto da aplicação da pena da multa a existência de prejuízo para o serviço, para a disciplina ou para o público, a falta deste requisito implica que a decisão sancionatória enferma do vício de violação de lei.
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Rui Pereira Ribeiro
Processo nº 1319/2019
(Autos de Recurso Contencioso)
Data: 17 de Dezembro de 2020
Recorrente: A
Recorrido: Secretário para a Segurança
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
A, com os demais sinais dos autos,
vem interpor recurso contencioso do Despacho proferido pelo Secretário para a Segurança de 12.11.2019 que indeferindo o Recurso Hierárquico por si interposto, segundo o qual, alterou a sanção aplicada para multa de 15 dias, formulando as seguintes conclusões e pedidos:
1. No acto administrativo ora recorrido, o recorrente exerceu funções de XXXX do Conselho da Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia sem autorização, violou os “outros deveres” previstos no art.º 16.º al. b) do Estatuto”, assim, a entidade recorrida aplicou ao recorrente a multa de 15 dias.
2. A “Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia” foi iniciada e estabelecida por um grupo de agentes policiais em serviço em 1999. São objectivos da “Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia": a manutenção e promoção da amizade entre os agentes policiais e os membros de secções de outros países; a promoção de intercâmbio de conhecimentos; a prestação de apoio aos membros; a promoção de actividades juvenis para melhor conhecer e aceitar o espírito do trabalho policial, etc..
3. O recorrente ingressou na Secção em reconhecimento aos seus objectivos, esperando que possa unir a amizade entre os agentes policiais, compartilhar e promover o intercâmbio de conhecimentos profissionais, aprimorar a compreensão e o apoio entre os membros e promover a compreensão e a aceitação dos jovens pelo trabalho policial.
4. O legislador consagra aos residentes de Macau a liberdade de associação e o direito e liberdade de organizar e participar em associações sindicais tanto no art.º 27.º da Lei Básica como no art.º 22.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, aplicável por remissão do art.º 40.º da Lei Básica. E no nosso caso, o recorrente apenas exerceu o seu direito de participação livre na associação consagrado pela Lei Básica.
5. Não vemos que a participação do entra em conflito com o seu trabalho, a sociedade e a manutenção da segurança pública ou nacional, a ordem pública, a protecção de saúde ou moral públicas ou com os direitos e liberdades de terceiros.
6. Portanto, quando a entidade recorrida, ao interpretar os “outros deveres” previstos no art.º 16.º al. b) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, deve combinar com o art.º 11.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública, isto é, os trabalhadores devem recusar a exercer funções ou actividades incompatíveis com o desempenho das suas funções, no entanto, não se verifica a incompatibilidade no caso em causa.
7. O acto administrativo ora recorrido violou manifestamente o disposto no art.º 27.º da Lei Básica e no art.º 22.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, aplicável pelo art.º 40.º da Lei Básica e interpretou e aplicou erradamente os “outros deveres” previstos no art.º 16.º al. b) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.
8. A entidade recorrida não considerou a circunstância dirimente da responsabilidade disciplinar de “exercício de um direito ou de cumprimento de um dever” prevista no art.º 202.º al. d) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau
9. A situação do recorrente preenche o pressuposto previsto no art.º 202.º al. d) do Estatuto, portanto, o acto desvalioso do recorrente devia ser uma circunstância dirimente da responsabilidade disciplinar.
10. O recorrente apresentou o pedido por escrito em 28 de Janeiro de 2019 para que possa exercer funções do membro da direcção da Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia (desde 1 de Janeiro de 2019 até 31 de Dezembro de 2019).
11. Antes disso, em 14 de Junho de 2013, o recorrente foi autorizado pelo então comandante do CPSP para participar nesta Secção como membro até 31 de Dezembro de 2017.
12. Em 21 de Março de 2019, o comandante do CPSP não autorizou o pedido do recorrente.
13. Porém, o CPSP não emitiu notificação por meio escrito, o recorrente apenas ouviu dos colegas que o superior não recomendava a ingressão na Secção, o recorrente entendeu subjectiva e objectivamente que “o comandante ainda não tomou decisão” e nenhuma decisão foi publicada na ordem de serviço.
14. O recorrente não teve conhecimento da decisão do comandante do CPSP e do seu teor. O recorrente não teve conhecimento de não autorização, nem sequer violou os “outros deveres” constantes do art.º 16.º al. b) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.
15. Salvo o devido respeito, os agentes policiais precisam de solicitar a autorização ao CPSP se comparecerem à reunião de pais da escola, participarem na actividade pessoal patrocinada pela escola e participarem na reunião de pais como membro da estrutura, ou participarem na reunião dos proprietários e participarem como membro na reunião dos proprietários?
16. Na Secção das “penas que não inviabilizam a relação funcional”, as penas de repreensão verbal e repreensão escrita são aplicáveis por faltas leves de que não resulte prejuízo para o serviço ou para o público por força do art.º 234.º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.
17. O espírito legislativo do art.º 234.º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau visa dar primeiramente a repreensão verbal ou escrita aos militarizados para lhes dar uma oportunidade de correcção e, se recusarem a correcção após repetidas advertências, devem ser punidos.
18. Nos termos do art.º 277.º do Estatuto dos Trabalhadores da Associação Pública de Macau e do Direito Penal de Macau, aplicáveis pelo art.º 256.º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, a repreensão verbal ou escrita basta realizar as finalidades da prevenção geral e da prevenção especial da punição.
19. Não obstante a aplicação da repreensão ou da medida da multa fica no âmbito do poder discricionário da entidade recorrida, este poder não é totalmente livre sem limite, mas sim deve ser fundamentado. De facto, quer no despacho do Comandante quer no do Secretário, não se verifica a fundamentação do “prejuízo manifesto para o serviço, para a disciplinar ou para o público” nos termos do art.º 235.º.
20. Por outro lado, tal como se referiu o Secretário no Despacho, não se verifica a produção efectiva de resultados prejudiciais por parte do recorrente ao serviço, à disciplina, ao interesse geral ou a terceiros, portanto, não existe circunstância agravante, assim, a entidade recorrida alterou a pena para a multa de 15 dias, mas não analisou a circunstância atenuante.
21. O recorrente começou a dedicar-se às actividades policiais desde 2004 e tem prestado serviços a favor de Macau por mais de 15 anos. O recorrente foi elogiado pelo Chefe do Departamento Policial de Macau em 10 de Novembro de 2008.
22. Portanto, ao aplicar a pena ao recorrente, deve considerar-se as três circunstâncias atenuantes previstas no art.º 200.º n.º 2 do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, designadamente, a al. a) (a prestação de serviços relevantes ao Território), a al. b) (o bom comportamento anterior) e a al. f) (a falta de intenção dolosa).
23. Além de falta de consideração das circunstâncias atenuantes, a multa de 15 dias aplicada ao recorrente ainda violou o princípio da proporcionalidade.
24. Face ao exposto, o acto administrativo ora recorrido enferma de vários vícios de nulidade e anulabilidade por violação das normas jurídicas citadas, devendo ser revogado.
Face ao exposto e com douta opinião dos MM.ºs Juízos, solicita-se aos MM.ºs Juízes que:
1. Revoguem o acto sancionatório aplicado ao recorrente uma vez que o acto recorrido enferma de vários vícios de nulidade ou anulabilidade;
2. Revoguem o acto recorrido e substitue a sanção por uma repreensão mais justa.
Citada a entidade Recorrida veio o Senhor Secretário para a Segurança apresentar a seguinte contestação:
1) O acto recorrido baseou-se em que o recorrente, sem autorização, exerce as funções de XXXX da Direcção Geral da “Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia”, o que violou os “outros deveres” previstos no artigo 16.º alínea b) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.
2) Em 21 de Novembro de 2019, o Corpo de Polícia de Segurança Pública notificou o despacho objecto do presente recurso ao recorrente. Depois de tomar conhecimento do referido despacho, o recorrente pediu, no mesmo dia, o desconto da multa no seu vencimento em 4 prestações e tal pedido foi deferido pelo Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública em 2 de Dezembro.
3) Ao abrigo do artigo 242.º n.º 4 do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, não é necessário que o recorrente decidiu imediatamente o pagamento da multa.
4) Assim sendo, no mesmo dia em que recebeu a notificação, o recorrente pediu imediatamente o pagamento da multa em prestações sem declaração de reserva por escrito, o que, nos termos do artigo 34.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, deve ser considerado que o recorrente aceitou tacitamente o acto recorrido.
5) Pelo que, ao abrigo do artigo 34.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, o recorrente não tem legitimidade para interpor o presente recurso contencioso.
6) O acto recorrido não incorreu em “erro na aplicação da lei, com consequente violação dos direitos fundamentais”.
7) No regime jurídico de Macau, o direito de associação pode ser restringido por lei.
8) Ao abrigo do artigo 40.º n.º 2 da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau, os direitos e as liberdades de que gozam os residentes de Macau podem ser restringidos nos termos legais, porém, as restrições não podem contrariar as disposições, que sejam aplicáveis a Macau, do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, do Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, bem como das convenções internacionais de trabalho.
9) Por força do artigo 22.º n.º 2 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, a liberdade de associação pode ser restringida por lei.
10) Tal restrição pressupõe principalmente os interesses públicos da segurança pública, os quais devem prevalecer sobre os interesses pessoais do recorrente, e isto é permitido pela Lei Básica e pelo Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.
11) Nos termos do artigo 16.º alínea b) e do artigo 32.º n.º 2 alínea b) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, sendo militarizado do Corpo de Polícia de Segurança Pública na efectividade de serviço, o recorrente, antes de fazer parte do corpo directivo da referida associação, deve obter a autorização da entidade competente, de forma que a entidade competente verifique previamente se as funções directivas da referida associação a exercer pelo recorrente são ou não compatíveis com as suas próprias funções.
12) Já que o referido direito é restringido nos termos da lei e o recorrente não obteve a autorização prévia, pelo que, o recorrente invocou que o exercício do direito constitui a circunstância dirimente da responsabilidade disciplinar, tese essa não pode ser procedente.
13) O recorrente apresentou, em 28 de Janeiro de 2019, o pedido de inscrição na Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia e de exercício de funções no órgão de direcção desta Associação. Em 21 de Março de 2019, o Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública proferiu o despacho de “indeferimento”.
14) Porém, conforme a acta da Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia, de 23 de Fevereiro de 2019, o recorrente faz parte do corpo directivo da referida Associação na efectividade de serviço, cujo cargo é XXXX da Direcção Geral, com a duração do mandato de 3 anos.
15) Ao abrigo do artigo 102.º n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo, presume-se tacitamente indeferido o pedido do recorrente caso o Corpo de Polícia de Segurança Pública não profira a decisão final no prazo de 90 dias após a apresentação do pedido, pelo que, só se pode presumir indeferido o pedido quando decorrido o prazo de 90 dias após a apresentação do pedido sem que o recorrente tenha recebido a notificação.
16) Em 21 de Março de 2019, o Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública proferiu o despacho quanto ao pedido do recorrente.
17) O recorrente declarou que o colega do seu serviço lhe disse verbalmente que o superior não sugeriu a sua inscrição naquela associação (mas não se lembrou quem e quando). Conforme o entendimento do recorrente, o que lhe foi dito implica que o seu pedido ainda não foi deferido pelo superior. Daí, pode-se ver que o recorrente também sabia perfeitamente a referida situação ---- não recebeu a notificação porque a decisão ainda não foi feita.
18) Pelo que, o Corpo de Polícia de Segurança Pública não violou o dever de notificação.
19) Ao abrigo do artigo 235.º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, “a pena de multa é aplicável em caso de negligência ou má compreensão dos deveres funcionais de que resulte prejuízo manifesto para o serviço, para a disciplina ou para o público”.
20) O recorrente havia apresentado um pedido de exercício de funções directivas da referida Associação e tal pedido foi deferido, pelo que, o recorrente bem sabia que deve obter a autorização prévia do superior, e apesar de saber perfeitamente que ainda não obteve a referida autorização, o recorrente já começou a exercer as funções directivas da referida Associação.
21) Além disso, não é a primeira vez que o recorrente foi disciplinarmente punido pelo acto do mesmo género.
22) Assim sendo, a pena de multa aplicada ao recorrente por incumprimento doloso dos deveres funcionais de que resulta prejuízo manifesto para a disciplina é adequada.
23) O acto recorrido já considerou todas as circunstâncias atenuantes do recorrente. O recorrente não milita as circunstâncias atenuantes previstas no artigo 200.º n.º 2 alíneas a), b) e f) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.
24) O facto de ter sido concedido louvor ao recorrente já foi considerado como circunstância atenuante prevista no artigo 200.º n.º 2 alínea h) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau. Com excepção de ter louvor, não se verifica nos referidos registos que o recorrente prestou quaisquer serviços relevantes, pelo que, o recorrente não milita a circunstância atenuante prevista no artigo 200.º n.º 2 alínea a) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.
25) Conforme os registos disciplinares do recorrente, o recorrente não preenche a circunstância atenuante de bom comportamento anterior preceituado no artigo 200.º n.º 2 alínea b) e n.º 3 do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.
26) Conforme as circunstâncias fácticas mencionadas nos pontos 21 a 27, o recorrente agiu, sem dúvida, com perfeito conhecimento e com dolo.
27) A petição inicial imputou que o acto recorrido violou gravemente o princípio da proporcionalidade, porém, nenhum fundamento foi suscitado.
28) Conforme as referidas circunstâncias fácticas, o acto recorrido satisfaz os artigos 232.º e 235.º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, não violando o princípio da proporcionalidade.
Pelos acima expostos, o acto recorrido satisfaz os dispostos legais, não enfermando do vício gerador de invalidade invocado na petição inicial. Solicita que os MM.ºs Juízes julguem improcedentes os fundamentos do recurso, rejeitando o recurso contencioso interposto pela recorrente.
Pelo Recorrente foi apresentada resposta à matéria da excepção invocada pela entidade Recorrida pugnando pela sua improcedência.
Dada vista ao Ministério Público pelo Ilustre Magistrado foi proferido o seguinte parecer:
Na sua contestação, a entidade recorrida suscitou matéria de excepção que, a proceder, obsta ao prosseguimento e conhecimento do recurso, pelo que sobre ela passamos a pronunciar-nos.
Foi invocada a aceitação do acto e a inerente perda do direito de recurso ou de legitimidade para recorrer. Para tanto, o contestante alega que o recorrente, logo que tomou conhecimento do acto, pediu imediatamente o desconto da multa no seu vencimento, em 4 prestações, o que significa que aceitou tacitamente o acto recorrido, ficando assim sem legitimidade para interpor o presente recurso, nos termos do artigo 34º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Vejamos.
Em matéria de legitimidade para a impugnação contenciosa, o artigo 34º do Código de Processo Administrativo Contencioso dispõe que não pode recorrer quem, sem reserva, total ou parcial, tenha aceitado, expressa ou tacitamente, o acto, depois de praticado. E esclarece, no que toca a aceitação tácita, que esta é a que resulta da prática espontânea de facto incompatível com a vontade de recorrer. Não tendo havido aceitação expressa, que aliás não vem invocada, importa indagar se a conduta do ora recorrente, substanciada no pedido de pagamento da multa em 4 prestações, integra um caso de aceitação tácita.
Como se viu, à luz do ordenamento jurídico de Macau, aceitação tácita é aquela que se traduz na prática espontânea de facto incompatível com a vontade de recorrer. É também esse o alcance que a doutrina e a jurisprudência portuguesas, com ordenamento jurídico similar ao de Macau, geralmente fixam à aceitação tácita, enquanto causa excludente do direito ao recurso – cf., entre outros, os acórdãos do STA, de 25.09.2001 e 17.01.2002, prolatados respectivamente nos processos 047538 e 047033, com sumários acessíveis através de www.dgsi.pt, onde se enfatiza que a aceitação tácita relevante para efeitos de exclusão do direito ao recurso exige uma conduta livre do administrado (recorrente), que tenha o significado unívoco, sem margem para dúvidas, do propósito de não recorrer, por acatamento do acto administrativo.
Ora, não se crê que, no caso em análise, o pedido de pagamento em prestações possa ter esse significado.
O recorrente, perante a hipótese de vir a ter que pagar a multa – que nos termos do artigo 242º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, será descontada no vencimento, caso não seja paga no prazo de 30 dias, podendo até ser objecto de execução fiscal – requereu que lhe fosse permitido pagá-la em 4 prestações. E fê-lo em impresso timbrado da própria PSP, no mesmo dia da notificação do acto, e provavelmente no próprio acto da notificação e em observância de um procedimento costumeiro em casos semelhantes. Acresce que, tempestivamente, o recorrente requereu a suspensão da eficácia do acto, que aliás lhe foi concedida, sem que então a entidade recorrida tenha interpretado aquele pedido de pagamento em prestações como uma forma de aceitação tácita do acto.
Atendendo a este circunstancialismo, cremos que não houve aceitação tácita do acto, impediente do direito de recurso contencioso, pelo que nos pronunciamos no sentido da improcedência desta questão exceptiva.
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Ademais, verifica-se que, no final da sua petição de recurso, para além do normal pedido de anulação do acto impugnado, por via dos vícios que lhe imputa – assim deve ser entendido o pedido impropriamente designado por revogação -, o recorrente pediu que a sanção disciplinar aplicada fosse substituída por uma repreensão mais justa.
Como é sabido, em Macau, o recurso contencioso é, por regra, de mera legalidade – artigo 20º do Código de Processo Administrativo Contencioso. O que quer dizer que o tribunal se limita a apreciar a legalidade do acto e a retirar as devidas consequências invalidantes, caso o repute desconforme com o bloco de legalidade, não podendo substituir-se à Administração para ditar a decisão que, no caso, porventura se impusesse, pois tal colidiria com a separação de poderes.
Este pedido de substituição da sanção disciplinar apresenta-se, pois, ilegal pelo que deve ser objecto de rejeição ou levar, nessa parte, à absolvição da entidade recorrida da instância.
Relegando-se para final a apreciação das questões suscitadas, foram as partes notificadas para apresentarem alegações facultativas, tendo estas silenciado.
Pelo Ilustre Magistrado do Ministério Público foi emitido parecer.
Foram colhidos os Vistos.
II. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
O Tribunal é o competente.
O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária.
Da legitimidade do Recorrente.
Invoca a entidade Recorrida que ao pedir o desconto da multa em quatro prestações no seu vencimento o Recorrente renunciou ao direito de recorrer, perdendo, em consequência, legitimidade para recorrer, uma vez que, não havia necessidade de o fazer dado que nos termos do artº 242º nº 4 do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau aprovado pelo Decreto-Lei nº 66/94/M se o pagamento não fosse efectuado em 30 dias a multa seria descontada no seu vencimento.
Reza o preceito em causa o seguinte:
Artigo 242.º
(Início de execução)
1. Não sendo a decisão definitiva, as penas começarão a ser cumpridas na data em que a mesma se tornar irrecorrível.
2. Se a decisão for definitiva, originariamente ou sobre recurso, o início da execução terá lugar no dia seguinte ao da sua notificação ao arguido ou 15 dias após a publicação do aviso referido no n.º 2 do artigo 275.º, tendo em atenção o disposto no n.º 1 do artigo 285.º
3. O elemento punido deverá apresentar-se às 9 horas do dia do início do cumprimento ao superior a quem estiver directamente subordinado ou, sendo aposentado, no secretariado do comando da respectiva corporação.
4. Se o arguido condenado em multa não pagar a respectiva importância no prazo de 30 dias, contado da data em que a decisão se tornou executória, ser-lhe-á descontada no vencimento ou pensão que haja de receber.
5. A pedido do interessado e mediante despacho da entidade que julgar o processo, o pagamento da multa poderá ser feito em prestações, no máximo de quatro.
6. O disposto nos n.ºs 4 e 5 não prejudica a execução, quando seja necessária, a qual seguirá os termos do processo de execução fiscal, servindo de título executivo a certidão do despacho punitivo.
A falta de razão do fundamento invocado resulta da própria letra do artigo citado, uma vez que, se nada for requerido, a multa será descontada no vencimento do militarizado e para que possa ser paga em prestações até um máximo de 4 depende de requerimento deste.
Logo, tendo-se tornado a decisão definitiva para efeito de execução, não era inócuo para o militarizado ora Recorrente pedir o desconto em prestações.
Neste sentido veja-se José Cândido de Pinho em Notas e Comentários ao Código de Processo Administrativo Contencioso, pág. 261: «7 – Deve acrescentar-se que, Segundo alguma jurisprudência, não produzem efeito preclusivo do recurso as aceitações ditadas por situações de necessidade ou de premência, como, por exemplo, acontece quando estão em causa custos adicionais que o pagamento imediato consegue evitar (juros de mora, custas processuais em execução fiscal, etc.). Neste sentido, por exemplo, na RAEM, ver o Ac. TSI, de 28/02/2013, P. 172/2012, 15/05/2014, Proc. nº 101/2012; de 29/05/2014, Proc. nº 298/2013; em Portugal, o Ac. do STA/Pleno, de 5/05/2005, P. 01002/02
Nós pensamos, efectivamente, que nesse caso haverá que dar oportunidade à parte de poder invocar e provar em tribunal que a sua atitude se deveu a uma causa concreta que não pode ser interpretada como vontade livre de aceitar o acto.».
Igualmente relevante se mostra também a anotação nº 5 ao artº 34º no Código de Processo Administrativo Contencioso Anotado de Viriato Lima e Álvaro Dantas: «Nos termos que resultam da própria letra do preceito contido no n.º1 do artigo sob anotação, a aceitação pode ser expressa ou tácita, sendo que esta última é a que deriva da prática espontânea e sem reserva de facto incompatível com a vontade de recorrer. Uma vez que está em causa matéria atinente à garantia de acesso à Justiça Administrativa que encontra acolhimento no artigo 36.º da Lei Básica, importa interpretar restritivamente o preceito em análise de modo que “só uma aceitação livre, incondicionada e sem reservas poderá ser entendida como impeditiva do direito de acção”. Estando em causa a aceitação tácita, importa referir que “a incompatibilidade com a vontade de recorrer decorre da qualificação jurídica que se efectue a partir de um facto ou conjunto de factos dos quais se possa depreender uma declaração tácita de aceitação do acto”. Constitui, por isso, uma questão de direito.».
Destarte, acompanhando o parecer do Ilustre Magistrado do Ministério Público não se pode ver no requerimento do militarizado para pagar a multa no maior número de prestações possível – por oposição ao desconto no vencimento – um comportamento livre e unívoco que sem margens para dúvidas nos permita concluir ter tacitamente aceite o acto quando, para além disso, no requerimento de recurso vem pedir a substituição da pena por “uma repreensão mais justa”.
Assim sendo, impõe-se concluir que não houve aceitação do acto e consequentemente serem as partes legítimas, improcedendo a invocada excepção.
Não existem outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer.
Cumpre assim apreciar e decidir.
III. FUNDAMENTAÇÃO
a) Dos factos
É o seguinte o teor do despacho Recorrido:
DESPACHO N.º 094/SS/2019
Assunto: Recurso hierárquico
Requerente: Guarda do CPSP n.º 2*****, A
Autos n.º: Processo Disciplinar do CPSP n.º 130/2019
O requerente interpôs recurso hierárquico do despacho proferido em 14 de Outubro de 2019 pelo Comandante do CPSP no âmbito do processo disciplinar em epígrafe que, aplicou ao requerente uma pena de 20 dias de multa, pelo motivo de que o requerente, sem autorização prévia, exerceu o cargo de XXXX da Direcção Geral da “Sessão de Macau da Associação Internacional de Polícia” e, participou na actividade desta Associação, o que viola os “outros deveres” previstos no art.º 16.º, n.º 2, al. b) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.
Examinados os autos, apura-se que o requerente exerceu o cargo de XXXX da Direcção Geral da “Sessão de Macau da Associação Internacional de Polícia” sem autorização e, esse acto viola os “outros deveres” previstos no art.º 16.º, al. b) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau. Mas, verifica-se uma falha no fundamento do despacho recorrido.
Por outro lado, de acordo com os elementos constantes dos autos, não se verifica que o acto do requerente produz efectivamente os resultados prejudiciais ao serviço, à disciplina, ao interesse geral ou a terceiros, pelo que não se verificam as circunstâncias agravantes previstas no art.º 201.º, n.º 2, al. f) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.
Pelos expostos, no uso das competências delegadas pela Ordem Executiva n.º 111/2014 e, nos termos do art.º 292.º, n.º 3 do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau e art.º 161.º do Código do Procedimento Administrativo, o Secretário para a Segurança vem modificar o fundamento do acto recorrido para: “o requerente exerceu o cargo de XXXX da Direcção Geral da “Sessão de Macau da Associação Internacional de Polícia” sem autorização, o que viola os “outros deveres” previstos no art.º 16.º, al. b) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.” e, alterar a pena aplicada para 15 dias de multa.
Gabinete do Secretário para a Segurança da RAEM, aos 12 de Novembro de 2019.
b) Do Direito
Sobre o mérito dos autos pelo Ilustre Magistrado do Ministério Público foi emitido o seguinte parecer:
«Nos termos previstos na norma do artigo 69.º, n.º 2, alínea b) do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), vem o Ministério Público emitir parecer nos termos que seguem:
A, melhor identificado nos autos, interpôs recurso contencioso do acto do Secretário para a Segurança, datado de 12 de Novembro de 2019, praticado no âmbito do recurso hierárquico do acto do Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública de 14 de Outubro de 2019, que, deferindo em parte tal recurso, lhe aplicou a pena disciplinar de 15 dias de multa por violação do dever a que se reporta a alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º, alínea b) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau aprovado pelo Decreto-Lei n.º 66/94/M, de 30 de Dezembro, imputando ao acto recorrido, em síntese, os seguintes vícios:
• Violação do direito fundamental de associação previsto no artigo 27.º da Lei Básica;
• Violação de dever de notificar a decisão que não autorizou o Recorrente a assumir o cargo na Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia e do princípio da boa-fé;
• Erro na aplicação da lei na escolha da sanção disciplinar aplicada;
• Desconsideração de circunstâncias atenuantes;
• Violação do princípio da proporcionalidade.
2.
2.1.
Alega o Recorrente que a decisão punitiva que contenciosamente impugna violou o disposto no artigo 27.º da Lei Básica e no artigo 22.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, uma vez que limitou a sua liberdade de associação garantida por essas normas.
Considera, ainda, que a sua conduta consubstancia o exercício de um direito pelo que ocorre uma circunstância dirimente da respectiva responsabilidade disciplinar.
Parece-nos que não tem razão.
O Recorrente foi punido disciplinarmente por ter violado a norma do artigo 16.º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau (EMFSM) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 66/94/M, de 30 de Dezembro, nos termos da qual constitui dever dos militarizados, «recusar a nomeação para qualquer cargo, comissão, função ou emprego, sem prévia autorização da entidade competente, enquanto na efectividade de serviço».
Isto porque, de acordo com a factualidade que emerge dos autos e que foi tida em consideração pela decisão punitiva recorrida:
(i) O Recorrente apresentou ao Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), no dia 28 de Janeiro de 2019, um pedido de autorização de exercício de funções de direcção na Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia;
(ii) Por despacho de 21 de Março de 2019, o Comandante do CPSP indeferiu esse pedido do Recorrente;
(iii) No entanto, desde 23 de Fevereiro de 2019 que o Recorrente integra como XXXX a direcção da Secção de Macau daquela Associação exercendo um mandato com a duração de 3 anos.
Face a esta factualidade, que não é controvertida, parece-nos claro que o Recorrente infringiu o dever funcional imposto pela alínea b) do artigo 16.º do EMFSM e que, por isso, incorreu na prática de infracção disciplinar nos termos que decorrem do n.º 1 do artigo 196.º do mesmo Estatuto.
Coloca o Recorrente a questão de saber se essa punição afronta a norma do artigo 27.º da Lei básica e o artigo 22.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, na medida em que importaria uma restrição à liberdade de associação que nessas normas se consagra.
Não nos parece.
Desde logo, em nome do rigor, importa referir que o acto recorrido se limitou a aplicar a lei em estrita obediência ao princípio da legalidade que se consagra no artigo 3.º do Código do Procedimento Administrativo, como, aliás, não podia deixar de ser. A Administração não pode deixar de aplicar a lei com fundamento em desconformidade dessa lei com norma de hierarquia superior.
A questão que o Recorrente coloca é a da eventual desconformidade da lei ordinária com a Lei Básica e com o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos que, a verificar-se se reflectiria na (i) legalidade do acto na medida em que o feriria do vício de violação de lei.
Não vemos, no entanto, que tal desconformidade exista. A lei não impede em absoluto o exercício da liberdade de associação. Limita-se a estabelecer uma restrição a essa liberdade numa das suas concretas dimensões que é a que se prende com o exercício de cargos em associações, exigindo que o exercício de tais cargos por parte dos militarizados das Forças de Segurança de Macau dependa de prévia autorização da entidade competente.
Ora, em nosso modesto entendimento, uma tal restrição tem fundamento material que a justifica derivado da natureza das funções dos militarizados. Com efeito, atenta essa natureza, aceita-se e compreende-se que a lei possa estabelecer um mecanismo de controlo que permita à hierarquia aferir da compatibilidade e da conveniência de um certo militarizado exercer funções directivas em determinada associação.
Além disso, a referida restrição não se nos afigura excessiva ou desproporcionada nem atentatória do núcleo essencial da liberdade em questão porque, como referimos, a liberdade de fazer parte da associação como simples membro mantém-se intocada e a liberdade de integrar os respectivos corpos directivos não é eliminada, mas apenas sujeita uma autorização prévia.
Deste modo, não nos parece que a norma da alínea b) do artigo 16.º do EMFSM contrarie a norma do artigo 27.º da Lei Básica ou a norma do artigo 22.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos nem que, portanto, o acto recorrido esteja, por esse motivo, ferido de violação de lei.
Por outro lado, também não se pode dizer, ao contrário do que sustenta o Recorrente, que este se limitou a exercer um direito e que, por isso, se verifica a circunstância dirimente a que alude o artigo 202.º, alínea d) do EMFSM.
Na verdade, só constitui circunstância dirimente o exercício de um direito nos termos da lei e, como vimos, esta restringe legitimamente o exercício do direito de associação na concreta dimensão visada pelo acto punitivo impugnado, pelo que resulta infundada, estamos em crer, a invocação da dita circunstância dirimente.
Parece-nos, pois, que deve ser julgado improcedente este fundamento do recurso contencioso.
2.2.
Em segundo lugar, alega o Recorrente que o acto recorrido violou o dever de notificar a decisão que não o autorizou a exercer o cargo associativo em causa e também o princípio da boa-fé.
Em seu entender, uma vez que tinha sido autorizado pelo anterior Comandante do CPSP em 14 de Junho de 2013 a participar na Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia até 31 de Dezembro de 2017, devia ter sido notificado da decisão de 21 de Março de 2019 que indeferiu o seu pedido apresentado em 28 de Janeiro de 2019 antes de lhe ser aplicada qualquer pena disciplinar.
Também neste ponto o Recorrente não tem razão.
Vejamos.
Em Janeiro de 2019 o Recorrente não estava autorizado a exercer qualquer cargo directivo na Secção de Macau da Associação Internacional de Polícia. Pretendendo assumir tal cargo, o Recorrente, como se lhe impunha, pediu autorização para o efeito ao Comandante do CPSP. No entanto, antes de esta entidade ter decidido tal pedido, o Recorrente aceitou o dito cargo e passou a exercê-lo, em contravenção, como vimos, ao disposto na alínea b) do artigo 16.º do EMFSM.
Neste quadro, parece-nos óbvio que o Recorrente estava impedido de aceitar o cargo antes de ser notificado da decisão do Comandante do CPSP, não se podendo dizer que a decisão punitiva só podia ser proferida depois de tal notificação. Parece-nos, pois, despropositada a invocada violação do princípio da boa-fé na actuação administrativa impugnada.
Sem maiores considerações, cremos que também nesta parte o recurso não deve merecer acolhimento.
2.3.
Em terceiro lugar, o Recorrente invoca a violação da norma do artigo 235.º do EMFSM. Em seu entender, do acto recorrido não resulta ter havido prejuízo manifesto para o serviço, para a disciplina ou para o público a que essa norma se refere e por isso não deveria ter-lhe sido aplicada a pena disciplinar de multa, mas antes a de repreensão.
Parece-nos que tem razão.
Com efeito, de acordo com o disposto no artigo 235.º do EMFSM, «a pena de multa é aplicável em caso de negligência ou má compreensão dos deveres funcionais de que resulte prejuízo manifesto para o serviço, para a disciplina ou para o público».
É, pois, pressuposto legal da aplicação da pena disciplinar de multa o de que da conduta disciplinarmente relevante do militarizado resulte prejuízo manifesto para o serviço, para a disciplina ou para o público.
No caso, resulta expressamente da decisão recorrida (versão em língua portuguesa constante de fls. 20 do apenso «traduções») que, e citamos, «(...) não se verifica que o acto do requerente produz efectivamente os resultados prejudiciais ao serviço, à disciplina, ao interesse geral ou a terceiros». Falta, portanto, o indispensável pressuposto legal para a aplicação da pena disciplinar de multa antes referido, pelo que se impõe concluir no sentido de que o acto impugnado enferma do vício de violação de lei, concretamente de violação da norma do artigo 235.º do EMFSM, que o Recorrente arguiu no seu recurso contencioso.
Parece-nos, assim, que com este fundamento, deve proceder tal recurso com a consequente anulação do acto recorrido, ficando prejudicada a apreciação dos demais vícios invocados, por isso que os mesmos são atinentes à matéria da concreta medida da pena disciplinar de multa aplicada (cfr. artigo 74.º, n.º 5 do CPAC).
3.
Face ao exposto, salvo melhor opinião, parece ao Ministério Público que o recurso contencioso deve ser julgado procedente com a consequente anulação do acto recorrido.».
Concordando integralmente com a fundamentação constante do Douto Parecer supra reproduzido à qual integralmente aderimos sem reservas, sufragando a solução nele proposta, entendemos que o acto impugnado enferma do vício de violação de lei, pelo que, nos termos do artº 124º do CPA é o mesmo anulável, sendo de proceder o recurso com a consequente anulação do mesmo, ficando prejudicada a apreciação dos demais vícios e pedidos invocados.
No que concerne à adesão do Tribunal aos fundamentos constantes do Parecer do Magistrado do Ministério Público veja-se Acórdão do TUI de 14.07.2004 proferido no processo nº 21/2004.
IV. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, concedendo-se provimento ao recurso, anula-se o acto impugnado.
Sem custas por delas estar isenta a entidade recorrida.
Registe e Notifique.
RAEM, 17 de Dezembro de 2020
(Relator)
Rui Carlos dos Santos Pereira Ribeiro
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Lai Kin Hong
(Segundo Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong
Mai Man Ieng
1319/2019 REC CONT 1