Processo nº 123/2020 Data: 18.11.2020
(Autos de recurso civil e laboral)
Assuntos : “Acção de revisão de decisões do exterior de Macau”.
Acórdão do Tribunal de Segunda Instância.
Nulidade.
Revisão formal.
SUMÁRIO
1. Não ocorre “nulidade” – por omissão, ou excesso de pronúncia, do art. 571°, n.° 1, al. d) do C.P.C.M. – se com a sua decisão o Tribunal não deixou de apreciar todas as “questões” colocadas (e pertinentes), tendo, a final, conhecido do pedido que lhe tinha sido deduzido.
2. No que toca ao “reconhecimento de decisões do exterior” perfilam-se duas orientações: uma, no sentido de se tratar de uma “revisão de mérito”, o que implica que quase se ignore o aresto de origem, proferindo-se, a final, uma “decisão de mérito”, e, na segunda, a da chamada “aceitação plena”, advogando-se o acolhimento amplo e total das decisões.
3. O sistema da R.A.E.M. está mais próximo de uma “revisão (meramente) formal”, (ou de simples deliberação), em que o Tribunal se limita a verificar se a decisão do exterior satisfaz certos “requisitos”, (os do art. 1200° do C.P.C.M.), não conhecendo do mérito ou fundo da causa.
O relator,
José Maria Dias Azedo
Processo nº 123/2020
(Autos de recurso civil e laboral)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. “A”, (“甲”), propôs, e fez seguir no Tribunal de Segunda Instância, acção de revisão e confirmação de decisão proferida no exterior de Macau contra “B”, (“乙”), C (丙) e D (丁); (cfr., fls. 2 a 75 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Conclusos os autos ao Exmo. Juiz Relator, e constatando-se que a dita “B”, 1ª requerida, já se encontrava extinta, foi a mesma absolvida da instância, ordenando-se a citação dos restantes (2ª e 3°) requeridos para contestar; (cfr., fls. 79).
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Oportunamente, após contestação do 3° requerido pedindo a improcedência da acção e resposta da requerente insistindo no pedido, (cfr., fls. 145 a 149 e 161 a 162), proferiu o Tribunal de Segunda Instância Acórdão, (Proc. n.° 369/2019), concedendo a peticionada revisão; (cfr., fls. 171 a 176-v).
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Inconformado, o 3° requerido recorreu, pedindo a revogação do assim decidido; (cfr., fls. 183 a 190-v)..
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Após contra-alegações da requerente, ora recorrida, (cfr., fls. 197 a 199), vieram os autos a esta Instância.
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Adequadamente processados, e nada parecendo obstar, cumpre decidir.
A tanto de passa.
Fundamentação
Dos factos
2. Na sua decisão sobre a “matéria de facto”, o Tribunal de Segunda Instância considerou como “provado” que:
“1. A requerente é uma empresa com sede na Cidade de Zhuhai da Província de Guangdong da China.
2. A 1ª requerida é uma empresa de Macau, estabelecida a 14 de Janeiro de 2009 e destinada às obras de remodelação interior e exterior e comércio de materiais de construção.
3. Em 8 de Outubro de 2012, celebrou-se, entre a requerente e a 1ª requerida, o «contrato de venda» (contrato n.º JD20121006-1) relativamente ao tratamento de ductos de ar e venda a preço unitário de acessórios do Terminal Marítimo de Passageiros da Taipa.
4. E (戊) (do sexo masculino, de nacionalidade chinesa, maior, titular do BIRM n.º XXXXXXX(X)) assinou, em representação da 1ª requerida, o respectivo contrato onde apôs o carimbo desta última.
5. O montante de mercadorias em dívida pela 1ª requerida à requerente foi de RMB ¥1.056.696,65 no período compreendido entre Janeiro e Outubro de 2013; e de RMB ¥8.645 e HKD$1.900.991 no período compreendido entre Abril e Outubro de 2015.
6. De acordo com a cláusula 8ª do supramencionado contrato, cumpre aos órgãos arbitrais de Zhuhai a realização de arbitragem relativamente a todas as controvérsias decorrentes do contrato, sendo finais as decisões arbitrais.
7. A 1ª requerida não efectuou o pagamento em dívida conforme o acordado.
8. Pelo que a requerente requereu a arbitragem junto da Comissão de Arbitragem de Zhuhai contra a 1ª requerida e E.
9. Tendo-se realizado, mediante dois anúncios públicos, a entrega da notificação de admissão do processo e dos elementos pertinentes, a 1ª requerida e E não compareceram em audiência nem apresentaram contestação escrita.
10. Por decisão arbitral (Zhuzhongwaizi (2017) n.º 3) de 8 de Outubro de 2018 proferida pela Comissão de Arbitragem de Zhuhai da RPC, onde a aqui 1ª requerida é a primeira solicitada e a ora requerente solicitante, foi decidido o seguinte: (documento 2, aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais)
(I) A primeira solicitada deve efectuar à solicitante o pagamento de RMB ¥1.065.342 e de HKD$1.900.991.
(II) Quanto à quantia de RMB ¥1.056.696,65 que a primeira solicitada deve à requerente (montante em dívida entre Janeiro e Outubro de 2013), os juros de mora são calculados com base no valor de RMB ¥1.056.696,65, à taxa diária de 1%, e contados desde 1 de Janeiro de 2016 até integral pagamento.
(III) Quanto às quantias de RMB ¥8.645,00 e HKD$1.900.991 (montantes em dívida em 2015) que a primeira solicitada deve à requerente, os juros de mora são calculados com base no valor de cada prestação, à taxa diária de 1%, e contados desde um mês posterior à data da última expedição de mercadorias descrita de cada factura, até integral pagamento. Veja a tabela seguinte para detalhes:
Dólares de Hong Kong:
N.º
Valor em dívida da prestação (HKD)
Data do início da contagem dos juros
1
148285,36
30 de Julho de 2015
2
144336,01
28 de Julho de 2015
3
297000,06
29 de Agosto de 2015
4
2897,5
5 de Agosto de 2015
5
192799,71
1 de Setembro de 2015
6
436976,38
10 de Setembro de 2015
7
173708,16
4 de Outubro de 2015
8
116452,12
7 de Outubro de 2015
9
64402,16
8 de Outubro de 2015
10
126911,03
13 de Outubro de 2015
11
197222,18
9 de Novembro de 2015
Total:
1900991
RMB
N.º
Valor em dívida da prestação (HKD)
Data do início da contagem dos juros
1
6125
30 de Julho de 2015
2
2520
28 de Julho de 2015
3
8645
(IV) A primeira solicitada deve pagar, numa prestação única, o valor supra arbitrado à solicitante no prazo de 10 dias a contar da data da realização da notificação da presente decisão arbitral. Em caso de pagamento extemporâneo, é aplicável o disposto no artigo 253.º da Lei de Processo Civil da RPC.
11. Dispõe o atrás referido artigo que, se o executado não tiver cumprido a obrigação de prestação pecuniária no prazo fixado em sentença, decisão ou outros instrumentos legais, são duplicados os juros de mora; Quando se trate de falta de cumprimento de outras obrigações no mesmo prazo, deve ser paga a multa pelo cumprimento retardado.
12. Por outras palavras, devido ao pagamento extemporâneo, por parte da 1ª requerida, dos montantes atrás arbitrados, os respectivos juros moratórios devem ser calculados à taxa diária de 2% (1% duplicado).
13. A respectiva decisão arbitral começou a produzir efeitos jurídicos no dia da sua prolação, sendo ela a decisão final.
14. Em 19 de Dezembro de 2018, a 1ª requerida procedeu ao registo de dissolução e extinção pelo encerramento da liquidação.
15. Os 2ª e 3º requeridos eram sócios da 1ª requerida antes da sua extinção.
16. Conforme a conta final aprovada no 17 de Dezembro de 2018 e a deliberação tomada na assembleia de sócios realizada em 18 de Dezembro de 2018, a 2ª requerida e o 3º requerido partilharam, na proporção das quotas respectivamente detidas, os activos e passivos da 1ª requerida.
17. Ao fazerem o dito registo de dissolução e extinção da 1ª requerida, o órgão de administração desta e o liquidatário não tomaram em consideração o direito de crédito da requerente nem liquidaram esse crédito”; (cfr., fls. 171-v a 172-v e 45 a 50 do Apenso).
Do direito
3. O presente recurso tem como objecto a decisão ínsita no Acórdão do Tribunal de Segunda Instância que, em sede da aí proposta “acção de revisão (e confirmação)” da decisão arbitral da Comissão de Arbitragem de Zhuhai, (R.P.C.), datada de 08.10.2018, julgou-a procedente.
Percorrendo as alegações do ora recorrente, (na referida acção, 3° requerido), verifica-se que o mesmo imputa ao Acórdão recorrido o vício da “nulidade do art. 571°, n.° 1, al. d) do C.P.C.M.”, considerando (também) que reunidos não estavam os pressupostos legais para se decidir da forma como se decidiu.
Da análise e reflexão que nos foi possível efectuar sobre os termos da decisão proferida, e ponderando nas questões colocadas, cremos que carece o ora recorrente de razão, afigurando-se-nos que o seu inconformismo assenta em deficiente compreensão e equívoco sobre o (verdadeiro) sentido do decidido pelo Tribunal de Segunda Instância.
Vejamos.
Para cabal compreensão do que em causa está no presente recurso, vale a pena atentar nos motivos que levaram a Instância recorrida a decidir pela procedência da acção de revisão aí apresentada, passando-se a transcrever o excerto da fundamentação que se apresenta relevante:
“(…)
No caso dos autos, apesar da 1ª requerida ter-se extinguido no momento da instauração, pela requerente, da presente acção especial junto do TSI, a mesma não se dissolveu nem se extinguiu pelo encerramento da liquidação durante a pendência do processo arbitral e no momento da tomada da decisão arbitral em questão. Além disso, o Tribunal Arbitral já procedeu à citação da 1ª requerida de acordo com o domicílio da pessoa colectiva descrito no seu registo comercial.
Preceitua o artigo 325.º, n.º 1 do Código Comercial que, Registado o encerramento da liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem solidariamente pelo passivo da sociedade que não tenha sido considerado na liquidação até ao montante que tenham recebido em partilha do saldo de liquidação, sem prejuízo do disposto quanto a sócios de responsabilidade ilimitada.
De acordo com esta norma, pese embora a extinção da sociedade comercial condenada na decisão arbitral a efectuar a prestação obrigacional, os antigos sócios da mesma ainda são civilmente responsáveis até certo ponto.
Trata-se exactamente de uma das eficácias que a referida decisão arbitral pode ter na ordem jurídica de Macau.
Logo, não assiste razão ao 3º requerido quando se opõe à confirmação.
Resolvidas as questões prévias, cumpre então agora debruçar-se sobre a decisão arbitral.
No que tange à revisão e confirmação de decisões proferidas por tribunais ou árbitros do exterior de Macau, o artigo 1200.º do CPC institui o seguinte:
1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida;
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública.
2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.
Vejamos se o pedido preenche os requisitos gerais consagrados no diploma supra aludido.
Após a apreciação, afigura-se-nos que não há dúvida sobre a autenticidade da decisão arbitral objecto da revisão e confirmação, nem sobre a inteligibilidade do seu teor, que é muito claro e fácil de compreender.
A respectiva decisão tem como objecto a arbitragem de obrigação civil, processo que também existe no sistema jurídico de Macau, pelo que não é violada a ordem pública da RAEM.
Conforme evidenciam os documentos de fls. 62 a 74 dos autos, o órgão competente pertinente já tomou a decisão final.
Por conseguinte, encontra-se preenchido o disposto no artigo 1200.º, n.º 1, al.s a), b) e f) do CPC.
No tangente aos requisitos previstos nas alíneas c), d) e e), não tendo sido apresentada contestação pela parte requerida, nem se tendo visto, após a apreciação oficiosa, insatisfeitos tais requisitos, deve presumir-se que se verificam os mesmos.
Logo, este Tribunal deve confirmar a decisão arbitral em causa após a ter revisto meramente formalmente.
(…)”; (cfr., fls. 175 a 176 e 59 a 61 do Apenso).
Aqui chegados, e tendo presente os referidos motivos da decisão recorrida, vejamos.
Nos termos do art. 571°, n.° 1, al. d) do C.P.C.M., a sentença é nula “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Comentando idêntico preceito legal diz J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre que:
“Devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (…), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da sentença, que as partes hajam invocado (…).
Não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de excepções não deduzidas na exclusiva disponibilidade das partes (…), é nula a sentença em que o faça.
É também nula a sentença que, violando o princípio do dispositivo na vertente relativa à conformação objectiva da instância (…), não observe os limites impostos pelo art. 609-1, condenando ou absolvendo em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso do pedido.
A nulidade da sentença pode ser total. Mas é meramente parcial quando o vício apenas em parte a afecte. Assim acontece quando, havendo vários pedidos, o vício respeite apenas à apreciação de um deles”; (in “C.P.C. Anotado”, Vol. 2°, 4ª ed., 2019, pág. 737).
Porém, no caso, não se verifica nenhuma “nulidade”.
Nem por “omissão”, nem por “excesso de pronúncia”, (e seja ela total ou parcial), muito não se mostrando necessário consignar para se demonstrar este nosso ponto de vista.
Pois bem, a (verdadeira) questão, na opinião do ora recorrente, está numa alegada omissão de apreciação relativamente à falta da sua citação, o mesmo sucedendo com a 2ª requerida, (C), no âmbito da “instância arbitral”.
Porém, em face do que se consignou no Acórdão recorrido, (cfr., a “primeira parte” do segmento decisório atrás transcrito, em especial, o 1° §), adequado não se mostra de considerar que o Tribunal de Segunda Instância nada disse a tal respeito.
Pelo contrário, pronunciou-se (e resolveu tal “questão prévia”), afirmando – expressamente – que na dita instância arbitral, (regularmente) citada tinha sido a “sociedade” (1ª) requerida, o que se apresentava adequado (e suficiente) para que a acção de revisão proposta pudesse prosseguir para efeitos de apreciação do pedido de confirmação da sentença arbitral revidenda; (cfr., art. 1200°, n.° 1, al. e) do C.P.C.M.).
E censura não merece o assim considerando.
Na verdade, o ora recorrente, (e a 2ª requerida), não eram partes – sujeitos processuais – na aludida “causa arbitral”, e, como tal, necessária (ou justificada), não era a sua citação para nela intervir(em).
Por sua vez, o mesmo sucede com o que, na opinião do ora recorrente, constitui (aquilo que considera) um “excesso de pronúncia” e “falta de pressupostos para a decisão proferida”.
Com efeito – em síntese – diz o mesmo que com o Acórdão recorrido declarou-se o recorrente e a 2ª requerida como os “responsáveis pelas dívidas da 1ª requerida”, (entretanto extinta e absolvida da instância).
Porém, não foi o que sucedeu.
Não sendo de esquecer que a condenação proferida na “decisão arbitral” (revista) tinha, tão só, como destinatária, a “B”, (aí, 1ª requerida), importa atentar também que na “acção de revisão” – que correu termos no Tribunal de Segunda Instância – se considerou que “os sócios devem suceder nos direitos e deveres da sociedade”, apenas para, com a sua intervenção nos autos, se poder prosseguir para conhecimento do “pedido de confirmação” deduzido; (cfr., em situação com alguma semelhança processual, o Ac. deste T.U.I. de 19.10.2011, Proc. n.° 26/2011).
Na verdade, e como (cremos que) se alcança do teor da decisão proferida e ora recorrida, com a mesma não se alterou a decisão (condenatória) arbitral revidenda, substituindo-se a parte condenada, (a “sociedade”, 1ª requerida), pelo ora recorrente e 2ª requerida.
Veja-se pois que o Tribunal recorrido consignou expressamente que “Resolvidas as questões prévias, cumpre então agora debruçar-se sobre a decisão arbitral”, passando a apreciar (somente) da conformidade da decisão arbitral em relação aos pressupostos da sua revisão, concluindo, (após tal aferição), pela decisão de “confirmar a decisão arbitral em causa após a ter revisto meramente formalmente”, sem esboçar, (ou sugerir sequer), qualquer raciocínio no sentido da atrás referida “substituição” no que toca à condenação da “sociedade”, 1ª requerida; (cfr., o segmento decisório atrás transcrito).
Cabe aliás salientar que mal se compreende a razão do equívoco do ora recorrente, dado que a pretensão em questão foi pela própria recorrida, (requerente da acção de revisão), claramente esclarecido ao afirmar, em sede da sua resposta à contestação da ora recorrente que, a “satisfação do seu pedido pelo TSI não leva à alteração do conteúdo substancial da decisão arbitral e, sobretudo não faz com que os 2ª e 3º requeridos se tornem directamente os sujeitos da obrigação”, acrescentando que “mesmo que o TSI tenha decidido a confirmação total da decisão arbitral em apreço, não se pode requerer a execução coactiva contra os 2ª e 3º requeridos directamente com base nesta decisão de confirmação”; (cfr., pontos 6° e 8° da dita resposta, a fls. 161 a 162 e fls. 55 do Apenso).
Nesta conformidade, (e estando também tais “afirmações” integralmente transcritas no próprio Acórdão ora recorrido; cfr., fls. 174), inviável se mostra de considerar que nas mesmas se não tenha atentado, extravasando-se, (aí sim, indevidamente), o pedido deduzido, em frontal colisão com o regime na legislação processual vigente fixado em matéria de competência do Tribunal na “acção de revisão de decisões do exterior”; (cfr., art°s 1199° e segs. do C.P.C.M.).
Com efeito, não se pode olvidar que no que toca ao “reconhecimento de decisões do exterior” perfilam-se duas orientações (extremas): uma, no sentido de se tratar de uma “revisão de mérito”, o que implica que quase se ignore o aresto de origem, proferindo-se, a final, uma “decisão de mérito”, e, na segunda, a da chamada “aceitação plena”, advogando-se o acolhimento amplo e total das decisões, estando, porém, o sistema da R.A.E.M., mais próximo de uma “revisão (meramente) formal”, (ou de simples deliberação), em que o Tribunal – como foi o caso dos autos – se limita a verificar se a decisão do exterior satisfaz certos “requisitos”, (os do art. 1200° do C.P.C.M.), não conhecendo do mérito ou fundo da causa; (cfr., sobre o tema e de forma desenvolvida, o Ac. deste T.U.I. de 11.02.2010, Proc. n.° 43/2009, podendo-se também ver Luís Lima Pinheiro in, “Direito Internacional Privado”, Vol. III, “Competência Internacional e Reconhecimento de Decisões Estrangeiras”; B. Machado in, “Lições de Direito Internacional Privado”, 1982, pág. 259 e segs.; A. dos Reis in, “R.L.J.”, Ano 87, pág. 369 e segs.; e Botelho de Sousa in, “Rev. Ordem dos Advogados”, Ano 9, n°s 1 e 2, pág. 330 e segs.).
No caso dos presentes autos, como se viu, o próprio Tribunal de Segunda Instância consignou que confirmava a decisão revidenda “após a ter revisto de forma meramente formal”, o que torna bem demonstrativo que não ocorreu a pelo recorrente receada “substituição”.
E, desta forma, (prejudicadas se apresentando quaisquer outras questões), cabe pois decidir no sentido da confirmação do Acórdão recorrido e consequente improcedência do presente recurso.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos que se deixam expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente com a taxa que se fixa em 10 UCs.
Notifique.
Macau, aos 18 de Novembro de 2020
Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei
Proc. 123/2020 Pág. 18
Proc. 123/2020 Pág. 17