打印全文
Processo nº 485/2020
(Recurso Contencioso)

Data do Acórdão: 21 de Janeiro de 2021

ASSUNTO:
- Acto confirmativo
- Actos irrecorríveis
- Artº 31º do CPAC

SUMÁRIO:
- Sendo o recurso hierárquico facultativo e limitando-se a decisão nele proferida a confirmar o acto recorrido, assume a mesma – a decisão proferida no recurso hierárquico – a natureza meramente confirmativa, sendo irrecorrível nos termos do nº 1 do artº 31º do CPAC.


____________________________
Rui Pereira Ribeiro



Processo nº 485/2020
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 21 de Janeiro de 2021
Recorrente: A
Recorrido: Secretário para a Segurança
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
  
I. RELATÓRIO
  
  A, com os demais sinais dos autos,
  vem interpor recurso contencioso do Despacho proferido pelo Secretário para a Segurança de 28.02.2020 que indeferiu o recurso hierárquico interposto pela ora Recorrente da decisão do Chefe substituto do Departamento de Trânsito do CPSP que lhe aplicou duas penas de multa de MOP3.000,00 e MOP15.000,00, formulando as seguintes conclusões:
A. O acto recorrido é o despacho n.º 026/SS/2020 de 28 de Fevereiro de 2020 do Secretário para a Segurança.
B. Conforme o teor do acto recorrido, o Chefe substituto do Departamento de Trânsito entendeu que o recorrente praticou as condutas de recusar-se a transportar o passageiro ao local indicado e cobrar mais tarifa, deste modo, decidiu aplicar-lhe a medida administrativa de multa.
C. Todavia, o recorrente não se recusou a transportar o passageiro ao local indicado, mas sim foi ao seu destino do passageiro conforme a instrução dele.
D. O recorrente não cobrou mais tarifa ao passageiro, mas sim cobrou a tarifa conforme o valor indicado pelo taxímetro, só cobrou o valor indevido de 5 patacas porque o passageiro disse que não era necessário devolver o troco.
E. O recorrente não praticou as condutas ilícitas descritas no processo administrativo.
F. A entidade recorrida não pode concluir que o recorrente se recusou a transportar o passageiro ao local indicado ou cobrou mais tarifa, pelo que, os factos não estão conformes ao pressuposto factual do art.º 23.º n.º 1 alínea 5) e do art.º 22.º n.º 1 alínea 15) da Lei n.º 3/2019, assim, o acto recorrido é anulável.
  Citada a entidade Recorrida veio o Senhor Secretário para a Segurança contestar apresentando as seguintes conclusões:
1. A Comissão de Apoio Judiciário enviou ofícios à Dra. B, advogada estagiária, notificando-lhe que foram deferidos os pedidos de apoio judiciário formulados pelo recorrente em 13 de Janeiro de 2020 para os recursos contenciosos das decisões sancionatórias proferidas pelo CPSP pela recusa de transporte de passageiro para o lugar por este indicado e pela cobrança abusiva da tarifa, e para tal, nomeou-a como patrona do recorrente.
2. A Dra. B, advogada estagiária, enviou um ofício ao Comandante do CPSP, onde referiu que foi nomeada pela Comissão de Apoio Judiciário como patrona do recorrente A, pelo que, pediu a consulta dos dois processos em que o recorrente foi sancionado pela recusa do transporte de passageiro para o local por este indicado e pela cobrança abusiva da tarifa, a fim de interpor recurso contencioso.
3. Daí resulta que a patrona do recorrente, Dra. B, advogada estagiária, devia saber perfeitamente que o seu patrocínio se limita aos recursos contenciosos das decisões sancionatórias do CPSP pela recusa de transporte de passageiro para o local por este indicado e pela cobrança abusiva da tarifa, isto quer dizer que a entidade recorrida nos recursos contenciosos deve ser o CPSP, devendo os mesmos ser interpostos para o Tribunal Administrativo.
4. Assim sendo, o recorrente não pode interpor o presente recurso contencioso contra o Secretário para a Segurança para o Tribunal de Segunda Instância, isto quer dizer que o Secretário para a Segurança não é a entidade recorrida no presente recurso contencioso.
5. O recorrente e o passageiro C falam cantonês, daí pode-se provar suficientemente que ambos deviam conseguir distinguir que “Man Gor” e “Vun Kei” têm pronúncias completamente diferentes, pelo que, é impossível confundi-los.
6. O recorrente tem exercido a profissão de taxista há mais de 2 anos, devendo o recorrente conhecer onde fica o “Restaurante Vun Kei”, não sendo muito possível considerar “Vun Kei” como “Man Gor”.
7. Por ter impressão de que o “Vun Kei” fica numa rua de trás, o passageiro C não duvidou do que o recorrente lhe disse que já chegou ao destino, e depois, desceu do táxi e atravessou a estrada para procurar o “Vun Kei”.
8. O “Vun Kei” e o “Man Gor” localizam-se em dois lugares diferentes, estando muito longe um do outro, pelo que, a conduta de transporte praticada pelo recorrente constitui manifestamente a recusa de transporte de passageiro para o local por este indicado.
9. Quando o passageiro C soube que o recorrente lhe exigiu que pagasse $500,00, ele, de imediato, ficou surpreendido com isso e perguntou mais uma vez ao recorrente: “$500,00?” e o recorrente respondeu: “Sim!”.
10. Daí pode-se ver que a conduta de o recorrente não ter cobrado a tarifa conforme o valor indicado no taxímetro constitui manifestamente a cobrança abusiva da tarifa.
11. Nestes termos, nos factos referidos no recurso não existe o erro nos pressupostos de facto invocado pelo recorrente.
  
  Pelo Ilustre Magistrado do Ministério Público foi emitido parecer pronunciando-se no sentido da irrecorribilidade do acto administrativo.
  
  Foram colhidos os vistos legais.
  
II. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
  
  O Tribunal é o competente.
  O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.
  As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
  
  Da excepção da irrecorribilidade do acto.
  
  Dos elementos existentes nos autos apurou-se o seguinte:
a) Pelo Chefe substituto do Departamento de Trânsito foram aplicadas ao Recorrente duas de multas no valor de MOP3.000,00 e MOP15.000,00 ao abrigo dos artº 23º nº 1, 5) e artº 22º nº 1, 15) ambos da Lei nº 3/2019, a que correspondem as notificações TX1937XXXX e TX1937XXXX, respectivamente, as quais constam de folhas 37 a 39 da pasta 1 e a folhas 37 da pasta 2, ambas do PA apenso e aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais;
b) Relativamente aos actos de condenação referidos na alínea anterior, pelo agora Recorrente foi interposto recurso hierárquico ao qual foi negado provimento mantendo-se as decisões recorridas.
  
  Relativamente à matéria dos autos o Douto Parecer elaborado pelo Ilustre Magistrado do Ministério Público tem o seguinte teor:
  «1.
  A Entidade Recorrida suscitou na douta contestação a questão do erro na identificação do autor do acto recorrido.
  Parece-nos que sem razão.
  O acto recorrido é, nos termos expressos resultantes da petição de recurso, a decisão do Secretário para a Segurança que negou provimento ao recurso hierárquico interposto pelo Recorrente das decisões do - Chefe substituto do Departamento de Trânsito do Corpo de Polícia de Segurança Pública que lhe aplicaram as multas, respectivamente, de MOP$3.000,00 e de MOP$15.000,00.
  O autor do acta recorrido é, pois, o Secretário para a Segurança, ou seja, a Entidade Recorrida.
  Não ocorre, assim, segundo cremos, o apontado erro.
  2.
  A questão colocada pela Entidade Recorrida é outra.
  É a de saber se tendo a nomeação de patrono no âmbito do apoio judiciário sido efectuada para a interposição de recurso contencioso dos actos do Chefe do Departamento de Trânsito, ela cobre o recurso contencioso da decisão do recurso hierárquico que teve tais actos por objecto.
  Em nosso entender, sim. Na verdade, em geral, sendo o pedido de apoio judiciário feito pelo interessado não tem ele a obrigação de saber qual o meio processual ou procedimental próprio para atacar o acto. O que relevará, nesta perspectiva, é a intenção manifestada de impugnar contenciosamente o acto. Se tal impugnação depender de recurso hierárquico necessário é evidente que ao patrono competirá interpor previamente tal recurso e só depois deverá instaurar recurso contencioso.
  Neste pressuposto, cremos nada obstar a que se considere que o âmbito da nomeação do patrono cobre a impugnação contenciosa da decisão do recurso hierárquico dos actos que foram expressamente indicados no pedido de apoio judiciário e na decisão que sobre o mesmo recaiu.
  Parece-nos, por isso, que o Recorrente está devidamente patrocinado em juízo.
  3.
  Finalmente, cremos que o acto recorrido é irrecorrível por ter carácter meramente confirmativo.
  Na verdade, de acordo com o artigo 38.º da lei n.º 3/2019 ao abrigo da qual foram praticados os actos sancionatórios depois confirmados pela Entidade Recorrida, aplica-se à infracções administrativas aí previstas, subsidiariamente, o Decreto-Lei n.º 52/99/M, de 4 de Outubro.
  Nos termos do artigo 16.º deste diploma legal, «das decisões sancionatórias cabe recurso para o Tribunal Administrativo», o que significa que a decisão sancionatória é susceptível de recurso contencioso e, portanto, o recurso hierárquico é facultativo, face ao disposto no artigo 154.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo.
  Ora, é pacífico que a decisão proferida no recurso hierárquico facultativo, se nada inovar relativamente à decisão recorrida, é meramente confirmativa deste e, por isso, irrecorrível, face ao disposto no artigo 31.º, n.º 2 do Código de Processo Administrativo Contencioso.
  No caso, extrai-se da leitura do acto recorrido que o mesmo em nada inovou relativamente aos actos recorridos, tendo-os mantido com a mesma fundamentação. Daí o seu carácter meramente confirmativo.
  Parece-nos, pois, que, ocorre a excepção da irrecorribilidade do acto recorrido.».
  
  Das notificações dos actos de condenação supra referidos e ali dadas por transcritas era dada notícia das formas de impugnação possíveis, resultando evidente que o recurso hierárquico era facultativo.
  Destarte, pelos fundamentos constantes do Douto Parecer do Ilustre Magistrado do Ministério Público, com os quais concordamos integralmente a eles aderindo sem reservas e sufragando a solução ali proposta entendemos que o acto impugnado é irrecorrível nos termos do nº 1 do artº 31º do CPAC, pelo que, deve o recurso ser rejeitado.
  
  No que concerne à adesão do Tribunal aos fundamentos constantes do Parecer do Magistrado do Ministério Público veja-se Acórdão do TUI de 14.07.2004 proferido no processo nº 21/2004.
  
III. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, rejeita-se o recurso interposto.
  
  Custas pelo Recorrente fixando-se a taxa de justiça em 3UC´s sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
  
  Registe e Notifique.
  RAEM, 21 de Janeiro de 2021
  Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
  Lai Kin Hong
  Fong Man Chong
  
  O M° P°
  Álvaro António Mangas Abreu Dantas
  
  




485/2020 REC CONT 1