Processo nº 358/2020
Data do Acórdão: 14JAN2021
Assuntos:
Autorização de permanência
Trabalhador não residente
Antecedentes criminais
Princípio da legalidade
Princípio da proporcionalidade
SUMÁRIO
Os tribunais administrativos não podem sindicar as decisões tomadas pela Administração no exercício de poderes discricionários, salvo nos casos extremos de erro grosseiro ou manifesto ou quando sejam infringidos os princípios gerais que limitam ou condicionam, de forma genérica, a discricionariedade administrativa, designadamente os princípios constitucionais; o princípio da imparcialidade, o princípio da igualdade, o princípio da justiça, o princípio da proporcionalidade, o princípio da boa fé, etc..
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 358/2020
I
Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM
A, devidamente identificado nos autos, vem recorrer da decisão do Senhor Secretário para a Segurança que, em sede de recurso hierárquico necessário, manteve a decisão do Senhor Comandante da PSP que lhe recusou a autorização de permanência na qualidade de trabalhador, concluindo e pedindo:
1. 本個案中,由於香港的《罪犯自新條例》的規定(尤其是定罪被視為「已喪失時效」,所有有關該定罪的均不得對上訴人的工作帶來不利),作為上訴人刑事紀錄中的組成部份,且不可分割,故必需一併考慮及依從;
2. 上訴人的刑罰日期為2001年4月20日,距今已是19年多之久,以及上訴人的刑罰為1000元的罰金及勞教中心服刑。
3. 綜上所述,被訴行為違反《行政程序法典》第3條規定之合法性原則及第5條規定之適度原則,根據《行政程序法典》第124條之規定,被訴行為應為可予以撤銷。
Citado, veio o Senhor Secretário para a Segurança contestar pugnando pela improcedência do recurso.
Não houve lugar à produção de provas.
Tanto o recorrente e como a entidade recorrida não apresentaram alegações facultativas.
Em sede de vista final, o Dignº Magistrado do Ministério Público opinou no seu douto parecer pugnando pela improcedência do presente recurso.
Dos elementos constantes dos autos, é tida por assente a seguinte matéria de facto com relevância à decisão do presente recurso:
* O recorrente A é residente em RAEHK;
* Por despacho de 11SET2019 do Senhor Comandante da PSP, foi recusada a concessão ao recorrente da autorização de permanência na qualidade de trabalhador;
* Inconformado com essa decisão, interpôs dela recurso hierárquico necessário para o Senhor Secretário para a Segurança;
* Em sede de recurso hierárquico, o Senhor Secretário para a Segurança, por despacho de 21JAN20201, exarado sobre a informação elaborada pelo Senhor Comandante da PSP em 13DEZ20192, negou-lhe provimento e manteve a recusa; e
* Inconformado com esse despacho, o recorrente interpôs o recurso contencioso para o TSI;
Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo é o próprio e inexiste nulidades.
Os sujeitos processuais gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade.
Inexistem excepções ou questões prévias que obstam ao conhecimento do mérito do presente recurso.
Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).
Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, ex vi do artº 1º do CPAC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.
Em face das conclusões na petição do recurso, o recorrente limitou-se a imputar ao acto recorrido a violação dos princípios da legalidade e da proporcionalidade, consagrados nos artº 3º e 5º do CPA, com fundamento na errada avaliação pela entidade recorrida dos seus antecedentes criminais que se reportam aos factos praticados há mais de 19 anos em Hong Kong e pedir que fosse anulado o acto recorrido nos termos prescritos no artº 124º do CPA.
Estas questões tidas por efectivamente colocadas pelo recorrente com motivação foram analisadas no Douto parecer emitido pelo Ministério Público em sede de vista final, que é o seguinte:
Na petição inicial, o recorrente solicitou a anulação do despacho em escrutínio (cfr. fls.7 dos autos, cujo texto integral se dá por reproduzido na sua íntegra), assacando-lhe a violação dos princípios da legalidade e da proporcionalidade consa-grados nos arts.3º e 5º do CPA.
*
Antes de mais, é de frisar que interpretado em coerência com a In-formação n.º400379/STNRDARP/201P (doc. de fls.224 a 225 do P.A.), o despacho recorrido tem como base os antecedentes criminais do recorrente e o pre-ceito no n.º1 do art.15º do Regulamento Administrativo n.º8/2010 ex vi a alínea 2) do n.º2 do art.4º da Lei n.º4/2003.
A petição inicial patenteia inequivocamente que os fundamentos mais essenciais invocados pelo recorrente a propósito de abonar o pedido da anulação se traduzem na verificação da prescrição das condenações e no período de 19 anos entretanto decorrido.
Ora, nos termos da alínea 1) do n.º2 do art.4º da Lei n.º4/2003, a Administração tem que atender, para efeitos da apreciação de pedido da entrada na RAEM, os antecedentes criminais que, sendo assim, são um dos fundamentos de indeferir os requerimentos da entrada.
Repare-se que os Venerandos TUI e TSI consolidam firmemente a jurisprudência, no sentido de que o n.º2 do art.4º da Lei n.º4/2003 atribui verdadeiro poder discricionário à Administração, cuja avaliação e valori-zação de antecedentes criminais são judicialmente insindicáveis, salvo se padeçam de erro manifesto ou total desrazoabilidade.
Bem vistas as coisas, a “prescrição” invocada pelo recorrente na petição inicial é próxima da reabilitação (de direito de condenação penal) existente no ordenamento jurídico da RAEM. O que exige que se tenha presente in casu a jurisprudência constante e uniforme dos TUI e TSI que assevera que a reabilitação, judicial e/ou de direito, nunca impede a Ad-ministração de recusar pedido de autorização de permanência em Macau com fundamento em antecedentes criminais. O que nos dão a conta os acórdãos do TUI nos processos n.º36/2006, n.º76/2012 e n.º123/2014, do TSI sobretudo nos processos n.º305/2005, n.º741/2007, n.º310/2011, n.º766/2011, n.º394/2012, n.º340/2013 e n.º827/2014.
De outro banda, sufragamos a prudente inculca de que «第4/2003號法律第九條規定行政長官或經授權的司長得批給在澳門特別行政區居留的許可,且規定批給時應考慮各種因素,當中包括申請人的犯罪前科,即使上訴人的犯罪已逾若干年數,且判刑亦未見嚴厲,但該犯罪記錄仍不失為一犯罪前科,並可作為批准外地人居留澳門的考慮因素的事實性質。» (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º244/2012)
Nesta linha de consideração e atendendo aos antecedentes criminais do recorrente, inclinamos a colher que o acto recorrido é inatacável, não infringindo os princípios da legalidade e da proporcionalidade.
***
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso contencioso.
Para nós, as questões efectivamente colocadas com alegações devidamente motivadas já foram correcta e exaustivamente debatidas no Douto parecer do Ministério Público acima integralmente transcrito, com que estamos inteiramente de acordo, não nos resta outra alternativa melhor do que a de aproveitarmos integralmente esse parecer, convertendo-o na fundamentação do presente recurso para julgar improcedente o presente recurso contencioso de anulação.
Não obstante, achamos conveniente acrescentar, em relação à alegada violação do princípio da proporcionalidade.
Tradicionalmente falando, os tribunais administrativos não podem sindicar as decisões tomadas pela Administração no exercício de poderes discricionários, salvo nos casos extremos de erro grosseiro ou manifesto ou “quando sejam infringidos os princípios gerais que limitam ou condicionam, de forma genérica, a discricionariedade administrativa, designadamente os princípios constitucionais; o princípio da imparcialidade, o princípio da igualdade, o princípio da justiça, o princípio da proporcionalidade, o princípio da boa fé, etc..” – Freitas do Amaral, in Curso do Direito Administrativo, II, Almedina, pág. 392.
In casu, tendo em conta a perigosidade, demonstrada pelos comprovados antecedentes criminais do recorrente, para a segurança e a ordem públicas da RAEM que visa alcançar, a recusa ao recorrente da autorização da permanência na qualidade de trabalhador não se mostra exagerada, muito menos inaceitável e intolerável, pois os interesses públicos que a Administração pretende tutelar estão em manifesta superioridade em relação aos interesses particulares por parte de um não residente em poder trabalhar na RAEM, que, ao que parece, foram aqui reclamados pelo recorrente.
Resumindo e concluindo:
Os tribunais administrativos não podem sindicar as decisões tomadas pela Administração no exercício de poderes discricionários, salvo nos casos extremos de erro grosseiro ou manifesto ou quando sejam infringidos os princípios gerais que limitam ou condicionam, de forma genérica, a discricionariedade administrativa, designadamente os princípios constitucionais; o princípio da imparcialidade, o princípio da igualdade, o princípio da justiça, o princípio da proporcionalidade, o princípio da boa fé, etc..
Tudo visto, resta decidir.
III
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça fixada em 8 UC.
Registe e notifique.
RAEM, 14JAN2021
Lai Kin Hong
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
Mai Man Ieng
1 批示
事項:必要訴願
利害關係人:A
利害關係人針對治安警察局局長不批准其以外地僱員身份逗留的決定提起本訴願。
同意治安警察局局長於2019年12月13日報告書所作出之分析,根據《行政程序法典》第161條1款的規定,維持拒絕發出以外地僱員身份逗留的決定,但是,鑑於被訴願批示的法律依據不準確,在此作出更正,不批准利害關係人以外地僱員身份逗留決定,以第8/2010號行政法規第15條1款結合第4/2003號法律第4條2款2項規定作為其法律依據。
保安司司長
黃少澤
二零二零年一月二十一日
2 INFORMAÇÃO
Assunto: Recurso hierárquico. Indeferimento de pedido de emissão de TITNR
Recorrente: A
1. O recorrente, visitante da RAE de Hong Kong, de nome A, titular do HKIC nº XXX, vem interpôr recurso hierárquico do despacho através do qual lhe foi indeferido o pedido de emissão de autorização de permanência na qualidade de trabalhador (TITNR), invocando, em síntese, o seguinte:
2. Que, desde a altura da prática dos factos já se passaram dezoito anos, pelo que não se pode invocar uma questão tão antiga para negar o pedido; e transcreve as normas da lei das penas criminais da RAE de Hong Kong, para afirmar que dos referidos factos já não resultam efeitos, e que elimina qualquer menção no registo criminal;
3. Pedindo, pelos fundamentos acima invocados, que seja revogado o acto recorrido, e concedida a autorização de permanência pretendida.
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4. Para o indeferimento do pedido do recorrente de concessão de autorização de permanência na qualidade de trabalhador - TITNR, a corporação socorreu-se dos factos descritos na informação da Polícia de Hong Kong (a fls. 161),
5. e do conteúdo do despacho do Exmo. Secretário para a Segurança, exarado em 26 de Novembro de 2018, relativo ao indeferimento do pedido de autorização de residência (a fls. 187 e 188);
6. Considera a corporação, que uma autorização de permanência na qualidade de trabalhador, é igualmente um tipo de permanência que necessita de um elevado grau de confiança e o orgão recorrido neste momento não se sente seguro em conceder,
7. pelo que os fundamentos que prevaleceram para o referido indeferimento do pedido de autorização de residência são idênticos, e enquadram-se no diposto do nº 1 do artº 15º do RA nº 8/2010, e considerou-se necessário não deferir a pretensão do requerente.
8. Pelo exposto, considera-se que o despacho através do qual foi recusada a autorização de permanência ao recorrente na qualidade de trablhador, não sofre de qualquer vício que possa levar à sua anulabilidade, não devendo assim ser concedido provimento ao presente recurso hierárquico.
9. À superior consideração de V.Exa ..
CPSP, aos 13 de 12 de 2019.
O Comandante,
Leong Man Cheong
Superintendente Geral
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358/2020-10