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Processo nº 937/2020
(Autos de Recurso Cível e Laboral)

Data do Acórdão: 28 de Janeiro de 2021

ASSUNTO:
- Marcas
- Carácter distintivo
- Vocábulos comuns

SUMÁRIO:
- A marca tem como função servir à identificação do produto e do produtor distinguindo-o de outros da mesma espécie;
- Os vocábulos comuns ou sinais genéricos podem ser distintivos e inovadores se tiverem adquirido o que a Doutrina classifica como “secondary meaning” ou se não tiverem relação ou conexão alguma com os produtos a que se destinam e que visa distinguir;
- A expressão Zhi Hui Zhong Xin 指揮中心que traduzido para português significa “centro de comando” não tem capacidade distintiva de acordo com o disposto na al. c) do artº 199º do RJPI para produtos da classe 09 constituídos essencialmente por produtos e equipamento informático e tecnológico.


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Rui Pereira Ribeiro
















Processo nº 937/2020
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 28 de Janeiro de 2021
Recorrentes: A Inc.
Recorridas: Direcção dos Serviços de Economia
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO

A Inc., com os demais sinais dos autos,
veio interpor recurso judicial da decisão de 28 de Novembro de 2019 do Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual da Direcção dos Serviços de Economia que recusou o seu pedido de registo da marca nº N/147353 pedindo:
1. Seja revogado o despacho de recusa da DSE, sendo substituído por outro que conceda a marca objecto do presente recurso; ou
Subsidiariamente,
2. Seja revogado o despacho de recusa da DSE, sendo substituído por outro que conceda a marca objecto do presente recurso para todos os produtos constantes da lista com excepção dos relacionados com “centro de comando”; ou,
Subsidiariamente,
3. Seja revogado o despacho de recusa da DSE, sendo substituído por outro que conceda a marca objecto do presente recurso apenas para software de computadores.
Cumprido o disposto no artº 278º do RJPI veio a DSE a remeter ao tribunal o processo administrativo referente ao pedido de registo de marca a que se reportam os autos.
Pelo Tribunal recorrido foi proferida sentença negando provimento ao recurso judicial interposto.
Não se conformando com a sentença proferida veio a Requerente da marca e Recorrente interpor recurso daquela decisão apresentando as seguintes conclusões:
a. Por douta sentença datada de 28 de Maio de 2020, foi o recurso interposto pela Recorrente julgado improcedente e decidido manter o despacho da Chefe do Departamento de Propriedade Industrial da Direcção dos Serviços de Economia que recusou o registo da marca N/147353.
b. O Tribunal a quo entendeu que apesar de “” não ser uma expressão comummente usada para distinguir produtos na classe 9, é uma expressão largamente usada diariamente, pelo que não poderá funcionar como marca, visto que a concessão do registo irá conferir à Recorrente um monopólio do uso daquela expressão.
c. Ora, o Tribunal a quo interpretou erradamente os critérios de avaliação da distintividade de uma marca - a distintividade de uma marca tem de ser aferida no contexto dos bens e serviços que visa distinguir.
d. É um princípio basilar em propriedade intelectual que uma palavra comum será suficientemente distintiva para funcionar como marca se estiver a ser usada para bens ou serviços não relacionados.
e. Por exemplo, embora a palavra “A” seja descritiva de uma fruta, é distintiva para computadores e software
f. Como Tribunal a quo claramente reconheceu e aceitou que “” não é descritivo para os produtos electrónicos e de software que a marca registanda visa distinguir, o seu uso arbitrário em bens não relacionados com “” concede à expressão distintividade suficiente para funcionar como marca.
g. O facto da marca registanda se encontrar desprovida de estilização ou de cor não retira capacidade distintiva à mesma.
h. A marca registanda é claramente uma expressão fantasiosa para os produtos que distingue na Classe 9, o que, aliás, o Tribunal a quo reconhece.
i. Parece assim que o Tribunal a quo recusou a marca registanda por entender que carece de carácter distintivo simplesmente porque entende (erradamente) que é composta por uma expressão usual, sem oferecer qualquer justificação sólida do motivo porque entende que a marca não é distintiva.
j. Tanto que o Tribunal a quo nem especificou sob que fundamento de recusa previsto no artigo 199.º do RJPI recusava registo à marca registanda, mencionando apenas, em termos gerais, que a marca registanda não preenchia os requisitos para registo de acordo com o estipulado no artigo 197.º e 199.º n.º 1 do RJPI.
k. Mesmo que seja eventualmente descritivo de serviços providenciados em “centros de comando”, certamente não é descritivo de software, algo intangível, nem de produtos tecnológicos - tal como o Tribunal a quo reconheceu.
l. A avaliação da descritividade de uma marca deve-se limitar a considerar se a marca realmente descreve esses produtos, e não se as palavras são diariamente usadas na linguagem comum.
m. Por outro lado, a concessão do registo da marca registanda à Recorrente não criaria um monopólio sobre um termo descritivo e necessário ao mercado nem dificultaria a diferenciação dos produtos da Recorrente dos seus concorrentes.
n. O registo da marca registanda não irá impedir que terceiros usem o termo de modo descritivo em referência a vários tipos de centros de comando.
o. A Recorrente não poderá interromper ou impedir todo o tipo de uso de “” - apenas que terceiros não autorizados utilizem uma marca idêntica ou semelhante no curso do comércio.
p. Por este motivo foi concedido à Recorrente o registo de outras marcas semelhantes como “MISSION CONTROL” (a versão inglesa da marca registanda, com significado semelhante), “A”, “NÚMEROS”, “PÁGINAS”, “METAL”, “SAFARI”, “CABINE DE FOTOS”, entre outras.
q. Ora, visto que tais marcas foram consideradas como distintivas, e por maioria de razão, a marca registanda “” deveria também ser considerada como distintiva.
r. Os Tribunais (e a DSE) deverão aplicar uma abordagem consistente na concessão de marcas.
s. A marca registanda é definitivamente dotada de distintividade suficiente para que lhe seja concedido o registo, visto que não é uma expressão usada comummente para identificar os produtos que visa assinalar, é uma marca de fantasia, criativa, passível de concretizar as funções de marca e é recebida pelo consumidor como marca e não como uma descrição da funcionalidade do produtos.
t. A marca cujo registo ora se solicita é, no entendimento da Recorrente, distintiva e deve ser registada em Macau, uma vez que não se verificam os alegados fundamentos de recusa previstos no art. 199º do RJPI e que a marca é passível de cumprir a sua função nos termos do artigo 197.º do RJPI.
Notificado a DSE das alegações de recurso veio esta oferecer o merecimento dos autos.

Foram colhidos os vistos.

Cumpre, assim, apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

a) Factos:

Da sentença sob recurso consta a seguinte factualidade:
A) Em 30 de Novembro de 2018, a recorrente contenciosa apresentou à DSE o pedido de registo da marca n.º N/147353, destinada a assinalar produtos/serviços da classe 09, com os produtos e serviços concretamente constantes de fls. 2 a 4 do processo administrativo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
B) É o seguinte o sinal da marca pretendida:
(Centro de Comando)
C) Em 28 de Novembro de 2019, a entidade recorrida proferiu despacho que, concordando com o parecer do relatório n.º 689/DPI/2019, recusou o registo da marca n.º N/147353.
D) O supra referido despacho foi publicado no B.O. da RAEM, n.º 51, Série II, de 18 de Dezembro de 2019 (transcrito no processo administrativo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
E) Em 20 de Janeiro de 2020, a recorrente interpôs o presente recurso contencioso para este Tribunal através de telecópia.

b) Do Direito
É o seguinte o teor da decisão recorrida:
«Segundo o relatório n.º 689/DPI/2019, do qual consta o despacho recorrido, o sinal da marca pretendida, ou seja, “指揮中心” (Centro de Comando), é um termo usual na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio, não é constituído por vocábulos com carácter distintivo, nem compreende nenhuma palavra ligada à requerente, ou outros desenhos gráficos e cores com eficácia distintiva. Portanto, a falta de distintividade e exclusividade – características indispensáveis às marcas – torna o sinal inadequado a distinguir os produtos da empresa possuidora desta marca dos de outras empresas, e assim o priva da função distintiva. Razão pela qual, o registo da marca foi recusado nos termos do disposto no artigo 214.º, n.º 1, al. a) e artigo 9.º, n.º 1, al. a), conjugados com o artigo 199.º, n.º 1, al. c), todos do RJPI, aprovado pelo DL n.º 97/99/M de 13 de Dezembro.
Discordando da opinião atrás descrita, veio a recorrente contenciosa argumentar o seguinte:
- Na decisão da DSE não se especifica quais entidades estão a usar, nas actividades por elas exploradas ou nos seus produtos, as palavras chinesas constantes da marca pretendida.
- O valor que a marca em questão transmite aos consumidores não é identificar os programas informáticos, tendo a mesma em si um valor inerente de distinguir os produtos electrónicos e informáticos.
- No seu conjunto, a expressão chinesa que constitui a marca é susceptível de identificar/distinguir os produtos na classe 09 que a marca se destina a assinalar.
- O uso dessa expressão, desde que não como marca, não será proibido com o registo da marca em causa.
Concluindo, a recorrente contenciosa entende que a respectiva marca possui capacidade distintiva.
Vejamos.
Dispõe o artigo 197.º do RJPI que, Só podem ser objecto de protecção ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.
Estatui o artigo 199.º, n.º 1 do mesmo diploma que, 1. Não são susceptíveis de protecção: (…) c) Os sinais ou indicações que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio.”
Salvo o devido respeito e melhor opinião, afigura-se-nos que a DSE tomou uma decisão correcta ao recusar o registo da marca.
A marca pretendida só é constituída por 4 caracteres chineses de cor preta, isto é, “指揮中心” (Centro de Comando), sem ter outro desenho gráfico ou cor. Tal como se refere no relatório n.º 689/DPI/2019, não se vê qualquer ligação essencial entre a classe de produtos/serviços que a marca pretendida se destina assinalar e os vocábulos que constituem o seu sinal, quer a palavra “指揮” (comando/maestro) (que é genericamente interpretada como “comando militar” ou “maestro da música”, e significa “dar ordens” ou “reger uma orquestra ou banda”, ou “organizar e liderar as actividades dos subordinados”), quer a palavra “中心” (centro) (que pode ser compreendida como “ponto situado no meio”, “central”, “núcleo”, etc.), quer a própria expressão “指揮中心” (que pode significar “o centro onde se dá comandos”, “a figura nuclear que dirige uma orquestra ou coro” ou “o núcleo da direcção superior que orienta as actividades dos subordinados”). Para os consumidores médios, os adeptos dos produtos informáticos ou mesmo os utentes dos produtos da recorrente, é difícil associar essa marca aos produtos electrónicos e programas informáticos da recorrente, ou aos de qualquer outra empresa ou indivíduo.
Mesmo a própria recorrente não negou a universalidade do uso do termo “指揮中心” (Centro de Comando) na vida quotidiana. Tal como refere o atrás falado relatório, “Quando é inserida a expressão “指揮中心” (Centro de Comando) no motor de pesquisa, aparecem dezenas milhares de resultados contendo o termo, tais como Centro de Comando de Urgência, Centro de Comando Móvel, Centro de Comando do Tráfego, Centro de Comando Inteligente, entre outros”. Por conseguinte, sem qualquer outro desenho gráfico e cor, a marca em escrutínio não possui o carácter distintivo nem a natureza inerente que permite distinguir os seus produtos ou serviços dos de outras empresas.
Nesta ordem de ideias, porque é que a decisão recorrida, para recusar o pedido da recorrente, precisa de especificar as entidades que estão a usar as palavras chinesas do referido sinal nas suas actividades ou nos seus produtos?
Ultimamente, apesar de os vocábulos em causa não ter a ver com os produtos electrónicos ou produtos e serviços informáticos, nem ser um termo habitualmente usado no respectivo sector, o que, a nosso ver, afasta a possibilidade de concorrência desleal, é de salientar que o deferimento do registo da enunciada marca indubitavelmente conferirá à recorrente o direito exclusivo de usar a expressão em questão, assim obstando ao uso normal das palavras por outrem.
Face ao exposto, por a marca pretendida pela recorrente não preencher os requisitos para o registo previstos no artigo 197.º e 199.º, n.º 1 do RJPI, acorda-se neste Tribunal em julgar improcedente o presente recurso contencioso, rejeitando todos os pedidos formulados.».

Em síntese vem a Recorrente sustentar que a expressão em causa tem capacidade distintiva e é fantasiosa precisamente por não estar relacionada com os produtos a que se destina e não criaria um monopólio sobre um termo descritivo e necessário ao mercado.

A questão que se discute no presente recurso, é a de saber se ocorre o fundamento de recusa do registo da marca previsto na alínea a) do nº 1 do artº 214º conjugado com o nº 1 da al. a) do artº 9º e a alínea c) do nº 1 do artº 199º, todos do Regime Jurídico da Propriedade Industrial.
Nos termos da alínea a) do nº 1 do artº 214º do RJPI o registo da marca é recusado quando se verifique qualquer dos fundamentos gerais de recusa previsto no nº 1 do artº 9º do mesmo diploma.
De acordo com a alínea a) do nº 1 do artº 9º do RJPI devem ser recusados os direitos de propriedade industrial quando o objecto não for susceptível de protecção.
Segundo a alínea c) do nº 1 do artº 199º ambos do RJPI não são susceptíveis de protecção «os sinais ou indicações que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio».
Como é sabido a marca destina-se a distinguir a origem empresarial dos produtos ou serviços oferecidos ao consumidor, individualizando e distinguindo produtos, mercadorias ou serviços de outros da mesma espécie.
A marca para além de servir a identificação do produto/mercadoria/serviço com o produtor/fornecedor, tem vindo a assumir para além da sua função distintiva uma outra de carácter mais económico e que está directamente relacionada com a sua função publicitária e atractiva1.
Contudo, a função essencial da marca continua a ser o seu carácter distintivo.
Daí que não possam ser constituídas por expressões ou vocábulos comuns sem estarem associadas a qualquer outro sinal distintivo.
A propósito de marcas constituídas apenas por sinais genéricos veja-se Manual de Direito Industrial de Luis M. Couto Gonçalves, Almedina, pág. 171 a 173: «A marca deve, por definição e no cumprimento da sua função própria, ter capacidade distintiva o que significa que deve ser apta, por si mesma, a individualizar uma espécie de produtos e serviços.
A capacidade distintiva da marca, sendo um pressuposto essencial da função da marca, concretiza-se e garante-se, mas não se esgota, nas proibições que a lei expressamente consagra.
O legislador nas als. b), c), d) e e) do n.º 1 do art. 223.º enumera as situações mais frequentes em que o sinal carece de capacidade distintiva.
a) Sinal Genérico do Produto ou Serviço
Sinal genérico é ou o sinal nominativo que, no seu significado originário e próprio, designa exclusivamente o nome do género de produtos ou serviços marcados ou, ainda, o sinal, bi ou tridimensional, que representa, unicamente, a forma comum e ordinária do produto marcado.
Esta proibição vem referida implicitamente na al. a) do n.º 1 do art. 223.º. O sinal genérico corresponde à “antítese de uma marca”.
Ao sinal genérico devem equiparar-se, igualmente, os nomes dos produtos ou serviços incorrectamente redigidos, ou simplesmente abreviados ou, ainda, compostos de simples aditamentos, irrelevantes ou inexpressivos, dos quais não resulte qualquer significado mais sugestivo ou qualquer capacidade individualizadora e, ainda, as denominações genéricas que o sejam face a uma língua estrangeira falada em algum país da Comunidade Europeia.
Por outro lado, se um produto ou serviços tiver mais de uma designação própria a proibição alarga-se a ambas as designações.
Ao contrário dos sinais usuais, de que trataremos adiante, a qualificação jurídica de uma denominação genérica depende mais da definição linguística do que do uso por parte do público consumidor. Um sinal pode ser genérico sem ser usual. Uma denominação é genérica quando se refere ao nome próprio (ainda que não o mais usual) do produto ou serviço que assinale ou, ainda, quando designe o conceito (económico ou natural) do género a que esse produto ou serviço pertença de um modo considerado relevante no mercado.».
No caso em apreço a marca cujo registo se pretende traduzido para português significa apenas “centro de comando”, o que, mais não é do que um sinal – vocábulo – que significa um local onde se procede à direcção/gestão de algo.
Entende a Recorrente que sendo a expressão “centro de comando” genérica e nada tendo a ver com a classe de produtos - Classe 09 – a que se destina, tem carácter distintivo precisamente por não estar relacionado com os produtos em causa.
Nos termos do nº 3 do artº 214º os sinais ou indicações referidos na al. c) do nº 1 do artº 199º todos do RJPI apenas podem ser reconhecidos como marca se tiverem adquirido carácter distintivo, isto é, aquilo que a Doutrina tem vindo a chamar de “secondary meaning”.
Veja-se a propósito Acórdão deste Tribunal de 15.01.2015 proferido no processo 387/2014:
«10. Secondary meaning
Será que a marca da recorrente pode ser considerada dotada da eficácia distintiva ao abrigo do princípio“secondary meaning”?
Mesmo que uma marca não seja por natureza distintiva, existe a possibilidade de esta obter tal carácter supervenientemente, através do princípio do secondary meaning que traduza circunstância de um sinal originariamente desprovido de distintividade adquirir esta qualidade, em virtude de um seu uso maior ou menor por parte do público consumidor, na medida em que, na mente dos consumidores, esse sinal se converte na marca identificadora dos produtos ou serviços de determinado empresário. Surge aí um segundo significado da palavra em complemento ao seu sentido originário, o que é fruto de uma mudança na forma como os consumidores percepcionam o sinal. “É a esta percepção, aos resultados psicológicos que o uso do sinal propicia e a um diferente valor semântico por este alcançado, que o princípio do secondary meaning vem conceder protecção legal, permitindo a ascensão do sinal, inicialmente indistintivo, à condição de marca.” (5 -Joana Machado Barros Fernandes, Univ. Minho, O princípio do Secondary Meaning no direito de marcas.)
A questão em apreciação é análoga àquela que se verifica quando a marca adquire renome ou prestígio, ou notoriedade, ou se o sinal readquire a eficácia distintiva durante a vida da marca. (6 -Américo de Silva Carvalho, Dto de Marcas, Coimbra Editora, 2004, 256 e 257)
Naturalmente, nestes casos, o interessado tem de efectuar a prova correspondente.
Na verdade, qualquer marca constituída por palavras ou desenhos comuns e usuais não deixa de adquirir carácter distintivo por força do princípio “secondary meaning” consagrado no art. 214.º, n.º 3 do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, se a utilização da respectiva marca tiver transformado as palavras comuns e usuais que compõem a marca em palavras com carácter distintivo.».
No caso em apreço não é invocado que a expressão em causa tenha adquirido “Secondary meaning”.
Também Carlos Olavo em Propriedade Industrial, Vol. I, pág. 85/86:
«Nas alíneas c) e d) do artigo 223.º, tem-se em vista as marcas tradicionais (nominativas, figurativas ou mistas).
Visam estas alíneas evitar que sejam monopolizadas como marcas expressões ou sinais indispensáveis à identificação de mercadorias ou necessárias para a identificação das usas qualidades e funções, ou cujo uso se vulgarizou.
Assim, não servem como marca os sinais constituídos exclusivamente por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica, ou a época ou meio de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos.
Tratando-se de expressões meramente descritivas da realidade a que se reportam, devem poder ser, enquanto sinais genéricos, utilizados por qualquer um.
A simples indicação do produto ou serviço ou de características destes, como seria o caso da marca “Leite” para lacticínios, por carecer de capacidade distintiva, não pode constituir parca.
A capacidade distintiva de um sinal deve ser apreciada tendo em atenção as características próprias dos sinais distintivos em geral, e das marcas em particular.
A protecção de determinado sinal como marca não decorre da maior ou menor qualidade inventiva ou criadora desse sinal, mas sim da sua adequação para distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.
A marca não precisa de ser invenção do seu titular, nem mesmo original, pode ser uma palavra de uso corrente.
A lei não proíbe que seja adoptado como marca um vocábulo comum de uso generalizado, só sendo de afastar, como marca, sinais meramente descritivos no ramo de comércio onde se inserem os produtos ou serviços a que a marca se destina.
O facto de se tratar de palavras concretas não exclui a capacidade distintiva do sinal, pois seria absurdo que só pudessem constituir marcas nominativas expressões de fantasia.».
Alega a Recorrente que nem a expressão Zhi Hui 指揮, nem a expressão Zhi Hui Zhong Xin指揮中心 é passível de ser associada aos artigos em causa.
Ora, salvo melhor opinião uma das ideias que equipamento informático – software e/ou hardware – traduzem para o cidadão comum é precisamente a de comando/centro de comandos.
O centro de comandos era normalmente um local físico, mas com a evolução tecnológica, actualmente através de um simples computador, de um telemóvel, tablete e até já relógios é possível enviar comandos com inúmeras funções.
A expressão “centro de comandos” está inquestionavelmente associada directa ou indirectamente aos produtos da classe para a qual a marca foi reivindicada, estando contrariamente ao que se invoca na conclusão de recurso/s) associada a uma das funções destes produtos.
Pelo que, com base nas disposições legais indicadas, bem andou a decisão recorrida ao confirmar a decisão de negar a marca, não sendo de proceder, também, nenhum dos pedidos subsidiários formulados em sede de recurso judicial, seja porque, não cabe ao tribunal andar escolher para quais dos produtos pode aquele ser concedido (pedido subsidiário formulado em 2) e também porque até relativamente a software, pelas razões indicadas, o vocábulo em causa está relacionado dado que os centros de comando informáticos têm sempre subjacente um programa/software (pedido subsidiário formulado em 3).
Assim sendo, não é a marca requerida susceptível de protecção face ao disposto na al. a) do nº 1 do artº 9º, al. c) do nº 1 do artº 199º e al. a) do nº 1 do artº 214º todos do RJPI.
Em igual sentido estabelece a Convenção de Paris para a Protecção da Propriedade Industrial, concluída em 14.07.1967, no seu artigo 6º - quinquies B) 2º.
Em sentido idêntico vejam-se Acórdãos deste tribunal tirados nos processos 575/2013 e processo 346/2013 ambos de 03.07.2014 e 251/2014 de 24.07.2014, para além daquele outro já antes citado.

Destarte, bem andou o tribunal “a quo” ao confirmar a decisão da autoridade recorrida ao recusar o registo da marca em causa, pelo que, deve ser negado provimento ao recurso.

III. DECISÃO

Nestes termos e pelos fundamentos expostos, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas a cargo da Recorrente.

Registe e Notifique.

RAEM, 28 de Janeiro de 2021
  
  Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
  Lai Kin Hong
  Fong Man Chong
1 Sobre esta matéria veja-se Carlos Olavo; Propriedade Industrial, Vol. I, pág. 74/75.
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