--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------------
--- Data: 10/02/2021 --------------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Chan Kuong Seng.--------------------------------------------------------------------------
Processo n.º 24/2021
(Recurso em processo penal)
Recorrente:
Ministério Público
Recorridos:
1.o arguido A
2.o arguido B
DECISÃO SUMÁRIA NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA
1. Inconformado com o acórdão proferido a fls. 176 a 186v do ora subjacente Processo Comum Colectivo n.º CR3-20-0089-PCC do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, condenatório do 1.o arguido A e do 2.o arguido B, como co-autores materiais, na forma consumada, de um crime continuado de usura para jogo, p. e p. pelos art.os 13.o, n.o 1, e 15.o, da Lei n.o 8/96/M, de 22 de Julho, em conjugação com o art.o 219.o, n.o 1, do Código Penal (CP), na pena de um ano de prisão para o 1.o arguido e na pena de nove meses de prisão para o 2.o arguido, com suspensão, para ambos, da execução da prisão pelo período igual de dois anos, e com igual aplicação da sanção acessória de proibição de entrada em todos os casinos de Macau pelo período de dois anos, veio o Digno Delegado do Procurador recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para rogar, na motivação apresentada a fls. 196 a 203v dos presentes autos correspondentes, a condenação, com nova medida da pena, dos dois arguidos nos termos legais inicialmente por que vinham acusados pelo Ministério Público, segundo os quais o 1.o arguido deveria ser condenado como co-autor material de um crime consumado de usura para jogo e como co-autor material de outros dois crimes consumados de usura para jogo, e o 2.o arguido deveria ser condenado como co-autor material de dois crimes consumados de usura para jogo, porquanto, alegadamente, errou o Tribunal recorrido ao decidir aplicar aos dois arguidos a figura de crime continuado.
Ao recurso, responderam os dois arguidos, na resposta una apresentada a fls. 207 a 210 dos presentes autos, no igual sentido de não provimento do recurso.
Subido o recurso, a Digna Procuradora-Adjunta emitiu parecer a fls. 220 a 221 dos autos, pugnando pela procedência do recurso.
Cumpre decidir sumariamente do recurso, dada a simplicidade da questão a decidir, nos termos permitidos pelos art.os 619.o, n.o 1, alínea g), e 621.o, n.o 2, do Código de Processo Civil, ex vi do art.o 4.o do Código de Processo Penal.
2. Do exame dos autos, sabe-se o seguinte:
O texto do acórdão ora recorrido consta de fls. 176 a 186v dos autos, cuja fundamentação fáctica se dá por aqui integralmente reproduzida, como fundamentação fáctica da presente decisão sumária do recurso.
Conforme a factualidade aí descrita como provada, na concessão de cada um dos empréstimos em causa para jogo, houve sempre estipulação consensual concreta de condições e cláusulas de empréstimo (cfr. o facto provado 3, o facto provado 9 e o facto provado 16, respectivamente).
O Tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de aplicação da figura de crime continuado, com invocação, mormente, da circunstância fáctica de todos os empréstimos em causa terem sido concedidos a pedido do jogador ofendido, por iniciativa deste.
3. No caso concreto dos autos, ficou provado que na concessão de cada um dos empréstimos em causa para jogo, houve sempre estipulação consensual concreta de condições e cláusulas de empréstimo. Por isso, ainda que (1) os empréstimos em questão tenham sido todos concedidos ao mesmo jogador ofendido (2) dentro do espaço de tempo muito curto entre si, (3) com condições e cláusulas de empréstimo semelhantes, e (4) sempre a pedido do mesmo jogador, por iniciativa dele próprio, não é de aplicar a figura de crime continuado prevista no n.o 2 do art.o 29.o do CP, que prevê que “Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”.
É que essas quatro circunstâncias (1 a 4) acimas referidas, por si só ou mesmo conjugadas entre si, não têm a virtude de fazer diminuir consideravelmente a culpa do 1.o arguido e do 2.o arguido no cometimento da conduta delitual penal de usura para jogo (cfr. o critério material postulado na norma do n.o 2 do art.o 29.o do CP, para efeitos de aplicação, ou não, da figura de crime continuado).
Assim sendo, é de passar a condenar mesmo os dois arguidos nos seguintes termos legais jurídico-penais por que vinham inicialmente acusados, com respectiva medida concreta da pena feita agora aos padrões designadamente dos art.os 40.o, n.os 1 e 2, 65.o, n.os 1 e 2, e 71.o, n.os 1, 2 e 4, do CP, com consideração de toda a factualidade fáctica já provada e tendo em conta as prementes exigências da prevenção geral do crime de usura para jogo:
– o 1.o arguido, como co-autor material de um crime consumado de usura para jogo, na pena de nove meses de prisão, com dois anos de interdição de entrada em todos os casinos de Macau, e como co-autor material de outros dois crimes consumados de usura para jogo, na pena de nove meses de prisão por cada, com dois anos de interdição de entrada em todos os casinos de Macau por cada, e, finalmente, em cúmulo jurídico dessas três penas parcelares de prisão, na pena única de um ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por dois anos, com interdição efectiva, pelo período total de seis anos, de entrada em todos os casinos de Macau;
– e o 2.o arguido, como co-autor material de dois crimes consumados de usura para jogo, na pena de nove meses de prisão por cada, com dois anos de interdição de entrada em todos os casinos de Macau por cada, e, finalmente, em cúmulo jurídico dessas duas penas parcelares de prisão, na pena única de um ano e três meses de prisão, suspensa na sua execução por dois anos, com interdição efectiva, pelo período total de quatro anos, de entrada em todos os casinos de Macau.
4. Nos termos expostos, decide-se em julgar sumariamente provido o recurso do Ministério Público, com consequente condenação do 1.o arguido e do 2.o arguido nos termos acima especificados.
Custas do recurso pelos dois arguidos recorridos, com uma UC de taxa de justiça individual, devendo cada um deles pagar mil patacas de honorários à sua Ex.ma Defensora Oficiosa.
Macau, 24 de Fevereiro de 2021.
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Chan Kuong Seng
(Relator do processo)
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