Processo n.º 914/2020
(Autos de recurso cível)
Data: 29/Abril/2021
Recorrente:
- A (recorrente)
Recorrida:
- Direcção dos Serviços de Economia
Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
Inconformada com a sentença proferida pelo Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base que julgou improcedente o recurso judicial interposto por A, com sinais nos autos (doravante designada por “recorrente”), recorreu a mesma jurisdicionalmente para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“a. Por douta sentença datada de 11 de Maio de 2020, foi o recurso interposto pela Recorrente julgado improcedente e decidido manter o despacho da Chefe do Departamento de Propriedade Industrial da Direcção dos Serviços de Economia que recusou o registo da marca N/135XXX.
b. O Tribunal a quo entendeu que a marca “ ” não é dotada de capacidade distintiva, sendo constituída pelas características dos serviços que assinala, entendendo também que o consumidor médio não seria capaz os produtos da Recorrente dos produtos de outra empresa.
c. No entender da Recorrente, “ ” não identifica as características dos produtos que distingue, nem se tornou um elemento comum na linguagem comercial, não tendo o Tribunal a quo (tal como a DSE) apresentado qualquer exemplo de tal situação que fundamente o argumento apresentado.
d. Gozando assim de capacidade distintiva para identificar no mercado os produtos que visa assinalar.
e. Uma expressão genérica e usual é uma expressão que é vulgarmente utilizada para designar um determinado produto ou serviço, como “bica”, “prego” ou “galão”, “carioca”, “fino” e “imperial”. Este não é o caso de “ ”.
f. “ ” não transmite informação suficiente sobre os produtos da Recorrente para ser considerada descritiva: perante tal expressão os consumidores não dariam imediatamente um significado descritivo à marca no contexto de hardware e software. Tal inferência não é nem óbvia nem natural, e não ocorreria salvo através de um processo de associação mental e, nessa medida, deve considerar-se que goza de capacidade distintiva para identificar no mercado esses produtos.
g. Com efeito, ao deparar-se com a marca, é mais provável que o consumidor pense imediatamente numa máquina ficcional para viajar no tempo, ao invés de uma funcionalidade de produtos inseridos na classe 9 utilizados para registar e medir o tempo.
h. A questão fulcral em termos de registo é se “ ” é uma expressão comum usada para descrever os produtos informáticos solicitados.
i. “” não é um termo descritivo necessário e utilizado normalmente no comércio porque outras empresas do sector tecnológico não usam “ ” em conexão com seus próprios produtos.
j. Num caso em tudo semelhante, o Tribunal Judicial de Base revogou a decisão de recusa de registo da marca “” (que significa máquina do tempo em movimento) concedendo a mesma à Recorrente.
k. Aplicando a ratio desta decisão ao presente caso, é claro que o sinal “” não é utilizado na actividade comercial para significar algo de próprio do comércio.
l. “ ”, máquina do tempo, é um aparelho que não existe na realidade, é algo fictício, e o consumidor não irá utilizar, no seu dia-a-dia, a expressão “máquina do tempo em movimento” para identificar produtos e equipamento electrónicos.
m. Do mesmo modo, é uma expressão que não pertence, obviamente, à linguagem comum ou comercial para desrever algum produto.
n. A marca cujo registo ora se solicita é assim, no entendimento da Recorrente, distintiva e deve ser registada em Macau, uma vez que não se verificam os alegados fundamentos de recusa previstos no art. 214º número 3 e no art.º 199º, N.º 1, al. c) todos do RJPI.
Nestes termos e contando com o douto suprimento de Vossas Excelências, Venerandos Juízes, requer-se, muito respeitosamente, seja considerado procedente o presente Recurso e, em consequência a sentença recorrida ser revogada, dessa forma se concedendo a marca registanda à Recorrida, como é de JUSTIÇA!”
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Ao recurso respondeu a recorrida, oferecendo o merecimento dos autos.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
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II) FUNDAMENTAÇÃO
Realizado o julgamento, foi dado como provado a seguinte factualidade pertinente para a decisão da causa:
Do despacho n.º 663/DPI, de 15 de Novembro de 2019, da Exma. Senhora Chefe do Departamento de Propriedade Intelectual dos Serviços de Economia que recusou à Recorrente registo da marca
que tomou o número N/135XXX, para assinalar produtos incluídos na classe 9ª.
O despacho de recusa da marca número N/135XXX, objecto do presente recurso, foi proferido a 15 de Novembro de 2019.
A marca registanda destina-se a assinalar produtos incluídos na classe 9º, a saber:
計算機;計算機硬件;便攜式計算機;平板電腦;電訊設備及儀器;電話機;移動電話;智能手機;傳送聲音、數據、影像、音頻、視頻和多媒體內容用無線通訊器;網絡通訊設備;傳送、接收及儲存電話、電子郵件及其它數碼數據用可連接互聯網的手提數碼電子設備;穿戴式計算機硬件;能連接互聯網的用作傳送、接收及儲存電話、電子郵件及其它數碼數據的穿戴式數碼電子器具;智能手錶(數據處理);智能眼鏡(數據處理);智能戒指(數據處理);穿戴式行動追蹤器;聯機手環(測量儀器);電子圖書閱讀器;計算機軟件(已錄製);安裝、配置、操作或控制計算機、計算機外圍設備、移動器具、移動電話、智能手錶、智能眼鏡、穿戴式器具、耳機、頭戴式耳機、電視機、機頂盒、視頻和音頻播放及記錄器、家庭影院系統和娛樂系統用計算機軟件(已錄製);計算機應用開發軟件;計算機遊戲軟件;可下載的已錄製的音頻、視頻和多媒體內容;計算機外圍設備;計算機、移動電話、移動電子器具、穿戴式電子器具、智能手錶、智能眼鏡、耳機、頭戴式耳機、電視機、機頂盒和視頻和音頻播放及記錄器用外圍設備;計算機、移動電話、移動電子器具、智能手錶、智能眼鏡、智能戒指、耳機、頭戴式耳機、電視機、機頂盒、和視頻和音頻播放及記錄器用穿戴式外圍設備;生物感應識別和鑒定裝置;加速計;高度計;測距設備;距離記錄儀;計步器;測壓儀器;壓力顯示器;與計算機、智能手機、移動電子器具、穿戴式電子器具、智能手錶、智能眼鏡、電視機、機頂盒、視頻和音頻播放及記錄器連用的監視器、顯示屏、頭戴式顯示屏和耳機;虛擬和增強真實性的顯示器、護目鏡、控制器和耳機; 3D眼鏡;眼鏡;太陽鏡;眼鏡片;光學玻璃;光學品;光學器械和儀器;照相機(攝影);閃光燈(攝影);計算機鍵盤;鼠標(計算機外圍設備);鼠標墊;與計算機連用的打印機;計算機用磁盤驅動器;計算機用硬盤;錄音裝置;聲音複製裝置;數碼音頻和視頻播放機;數碼音頻和視頻錄製機;音響擴音器;音頻放大器;音頻接收器;汽車音響設備;錄音和語音辨認裝置;耳機;頭戴式耳機;麥克風;電視機;電視接收器;電視顯示器;機頂盒;無線電設備;無線電發射器;無線電接收器;汽車隨載計算機和電子器,即電子控制盤、監控器、接觸屏、遙控器、插坐、連接器、開關和聲音啟動控制器用戶接口;全球定位系統(GPS)設備;導航儀器;運載工具用導航儀器(隨載計算機);控制計算機、移動電話、移動電子器具、穿戴式電子器具、智能手錶、智能眼鏡、耳機、頭戴式耳機、視頻和音頻播放及記錄器、電視機、機頂盒、擴音器、放大器、家庭影院系統和娛樂系統用遙控裝置;控制計算機、移動電話、移動電子器具、智能手錶、智能眼鏡、耳機、頭戴式耳機、視頻和音頻播放及記錄器、電視機、機頂盒、擴音器、放大器、家庭影院系統和娛樂系統用穿戴式器具;數據存儲裝置;計算機芯片;電池;電池充電器;與計算機、移動電話、便攜式計算機、計算機外圍設備、移動電子器具、穿戴式電子器具、智能手錶、智能眼鏡、耳機、頭戴式耳機、視頻和音頻播放及記錄器、電視機、機頂盒連用的電氣和電子連接器、耦合器、電線、電纜、充電器、插坐、電子擴充基座及電源轉換器;互動式觸屏;計算機、計算機屏幕、移動電話、移動電子器具、穿戴式電子器具、智能手錶、智能眼鏡、電視機、機頂盒和視頻和音頻播放及記錄器用接口;計算機屏幕專用保護膜;移動電話屏幕專用保護膜;智能手錶屏幕專用保護膜;計算機、計算機外圍設備、移動電話、移動電子器具、穿戴式電子器具、智能手錶、智能眼鏡、耳機、頭戴式耳機、視頻和音頻播放及記錄器、電視機、機頂盒用部件和附件;計算機、移動電話、移動數碼電子器具、穿戴式電子器具、智能手錶、智能眼鏡、耳機、頭戴式耳機、機頂盒和視頻和音頻播放及記錄器用外罩、袋、外殼、套、帶和掛繩;自拍杆(手持單腳架);電子香煙用充電器;訓練動物用電子項圈;電子記事器;郵戳檢查裝置;收銀機;投幣啟動設備用機械裝置;口述聽寫機;衣裙下擺貼邊標示器;投票機;商品電子標簽;搖獎機;傳真機;衡量器具;量具;電子公告牌;測量裝置;集成電路用晶片;集成電路;放大器;熒光屏;遙控裝置;光導纖維(光學纖維);工業遙控操作用電氣設備;避雷器;電解裝置;滅火器;工業用放射設備;救生器械和設備;汽笛報警器;動畫片;照蛋器;叫狗哨子;裝飾磁鐵;電柵欄;便攜式遙控阻車器;控制操作消費電子器具和住宅系統用電子語音發指令和辨認裝置;個人數字助理;熱調節裝置;空調、加熱和通風器具和系統用監視器;空調、加熱和通風器具和系統用傳感器;空調、加熱和通風器具和系統用控制器;電動調節裝置;調光器(電);照明控制裝置;電源插座;電氣及電子開關;報警器;報警感應器;報警監視系統;煙霧探測器;二氧化碳探測器;恒溫器;門和窗用電氣和電子鎖及閂;住宅保安和監視警報系統。
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Está em causa a seguinte decisão de primeira instância ora em apreço:
“A questão a decidir reconduz-se a saber se ocorre motivo de recusa de registo da marca supra assinalada:
(Máquina do tempo).
Louva-se a DSE no disposto no artº 199 nº1 al. c), por via do artº 9º nº 1 al. a) ex vi artº 214º nº 1 al. a) do RJPI, para fundar a sua decisão de recusa do registo da marca supra descrita.
Vejamos então.
Nas palavras de Coutinho de Abreu “as marcas são signos (ou sinais) susceptíveis de representação gráfica destinados sobretudo a distinguir certos produtos de outros produtos idênticos ou afins” – Cfr. A. cit. in Curso de Direito Comercial, VI., 4ª ed., pag. 348.
Esta noção reconduz-se, ao fim ao resto, à noção de marca que se pode retirar do enunciado artº 197 do RJPI.
Dispõe este preceito que “só podem ser objecto de registo ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou a respectiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas”.
Emerge destes enunciados, doutrinário e legal, pois, que a marca deve, sendo a “pedra de toque” da mesma, por definição e no cumprimento do seu escopo, ter relevantes capacidades distintivas, deve ser idónea, per si, de individualizar uma espécie de produtos ou serviços.
Note-se que essa capacidade distintiva deve ser perscrutada também na relação da composição da marca com os produtos ou serviços que visam identificar, no caso referentes a produtos da classe 9ª.
Por se exigir a dita capacidade distintiva, nega-se o registo às situações contempladas no nº 1 al. a) a d) do artº 199 RJPI, e para o que releva e a benefício da decisão, “os sinais (….) que se tenham tornado usuais na linguagem corrente (….)” (al.c).
Nas palavras de Américo Carvalho, “pretende-se com esta disposição que não seja atribuído o exclusivo a alguém, de sinais ou denominações, cuja livre disponibilidade é necessária para que os empresários actuem eficientemente no mercado”.
Adianta ainda.
“Na verdade, os sinais que se tenham tornado correntes na linguagem ou nos hábitos leais e constantes, não diferem das marcas compostas exclusivamente por sinais que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade do produto. Estes sinais têm de ser acessíveis a todos os comerciantes e dos quais nenhum pode ter o exclusivo” – Cfr. Autor cit., in Direito de Marcas, pág. 253 e 254.
No caso vertente a DSE refere a marca registanda é composta por vários caracteres em língua chinesa, sem qualquer elemento gráfico ou reivindicação de cor, mencionando que significa “máquina do tempo”, dando-lhe o significado de um mecanismo utilizado para calcular as horas do relógio ou um veículo ficcional utilizado para viajar no tempo.
Cremos acertada esta afirmação.
A expressão vertente é daquelas que qualquer empresa (do ramo daquelas que comercializa ou produz os produtos que com a marca registanda se pretende assinalar) pode usar para designar um produto do seu comércio ou indústria, assim o designando, correspondendo, portanto a expressão genérica, usual e comum, que se usa no comércio específico.
Diremos ainda que, numa certa perspectiva, porque a expressão está ligada ao tempo e à sua passagem, que existe conexão entre a marca com alguns produtos que visa identificar – Classe 9ª. Cfr. Código de Propriedade Industrial Anotado, coordenação de António Campinos e Luís Couto Gonçalves, 2010, pág. 437: “… o registo (de sinais ou figuras comummente utilizados no mercado) deve ser negado apenas quando os sinais ou indicações de que a marca for exclusivamente composta se tiverem efectivamente tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio em relação aos produtos ou aos serviços para que tiver sido requerido o registo da referida marca (….)»
Logo, aceitar o registo do sinal objecto destes autos ante a sua natureza comum, assim garantindo um “exclusivo”, um “monopólio” no seu uso, corresponderá a negar que os demais agentes económicos usem uma expressão que será vulgar ver-se “lançada” em relação à promoção e identificação de certo produto (relógios e outros artefactos correlacionados).
Corresponderá a negar o uso de uma expressão que é “património” do mercado e nele deve estar disponível para ser usado legitimamente por qualquer agente económico, em concreto para aqueles que actuam no mesmo segmento da recorrente em relação aos produtos da classe em causa.
Estamos, pois, perante um sinal banal, sem conteúdo diferenciador visto o uso genérico e indiscriminado em relação a um produto concreto.
A marca registanda consubstancia, de resto, uma expressão fantástica, com muita força, apelativa, designadamente se ligada a produtos como relógios e outros artefactos com eles relacionados.
E em relação a expressões desta natureza, como referem António Campinos e Luís Couto, “deve excluir-se também (…) o registo” e por corresponderem a “expressões mediante as quais vulgarmente se publicita e promove bens ou prestações no mercado. - Cfr. Código de Propriedade Industrial Anotado, coordenação de António Campinos e Luís Couto Gonçalves, 2010, pág. 436.
Diríamos em defesa do registo da marca que “… o registo (de sinais ou figuras comummente utilizados no mercado) deve ser negado apenas quando os sinais ou indicações de que a marca for exclusivamente composta se tiverem efectivamente tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio em relação aos produtos ou aos serviços para que tiver sido requerido o registo da referida marca, podendo ser concedido se não existir essa relação (….) ou se a marca incluir outros elementos que lhe forneçam suficiente capacidade distintiva” – Cfr. Código de Propriedade Industrial Anotado, coordenação de António Campinos e Luís Couto Gonçalves, 2010, pág. 437.
No caso a composição da marca com dois sinais – banais e usuais - não logra atingir o pretendido carácter distintivo ainda que através da respectiva análise global dos elementos que a compõem. Como diz a DSE, e já referido, “a marca registanda é composta por vários caracteres em língua chinesa, sem qualquer elemento gráfico ou reivindicação de cor …».
Portanto, reiterando, encaixando a expressão posta em crise na previsão do artº 199º n1 al. c) do RJPI, não pode ser de uso exclusivo.
Conclui-se que não se está perante uma marca susceptível de registo.
III - DECISÃO
Pelo exposto, decide-se julgar improcedente o recurso interposto pela A, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da recorrente.
Registe e notifique.
Oportunamente cumpra o disposto no art. 283º do RJPI.”
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Analisada a supra douta sentença que antecede, sem necessidade de delongas considerações, louvamos a acertada e perspicaz decisão com a qual concordamos e que nela foi dada a melhor solução ao caso, pelo que, considerando a fundamentação de direito aí exposta, cuja explanação sufragamos inteiramente, remetemos para os seus precisos termos ao abrigo do disposto o artigo 631.º, n.º 5 do CPC.
Isto posto, há-de negar provimento ao recurso.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso interposto pela recorrente A, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Para efeitos de custas, fixa-se o valor da causa em 500 U.C.
Registe e notifique.
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RAEM, 29 de Abril de 2021
Tong Hio Fong
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
Lai Kin Hong
Recurso Cível 914/2020 Página 11