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Processo nº 639/2020
Data do Acórdão: 29ABR2021


Assuntos:

Dispensa de serviço (medida específica prevista no EMFSM)
Erro nos pressupostos de facto
Ne bis in idem
Princípios da proporcionalidade, da adequação e da justiça
Desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários


SUMÁRIO

1. Há erro nos pressupostos de facto quando os factos que sirvam de fundamento a um acto administrativo não são verdadeiros, ou apenas putativos ou erradamente reputados como verdadeiros pela Administração na prática do acto.

2. Não obstante praticados na vida privada, os comprovados comportamentos de um bombeiro, que, preenchem o tipo do crime de gravações e fotografias ilícitas, no caso concreto ofensivos do bem jurídico da reserva da vida privada e sexual de que é titular uma colega sua de trabalho, que estiveram na origem da condenação penal e punição disciplinar de que o bombeiro foi visado, pela natureza dos factos devassadora da vida privada e sexual de outrem e pelo elevado grau de gravidade e de censurabilidade ética e jurídica dos factos, tal como afirmado na condenação penal, já representam notórios desvios do mínimo dos requisitos ético-profissionais exigidos a qualquer dos elementos do Corpo de Bombeiros.

3. Pois, considerando que não poucas vezes, em situações facilmente imagináveis e por razões bem compreensíveis, a própria missão confiada ao Corpo de Bombeiros não se cumpre senão com o inevitável acesso ou intromissão na vida privada dos cidadãos, mesmo sem o seu consentimento ou até contra a sua vontade, o perfil comportamental do recorrente caracterizado pela falta da idoneidade moral, revelável pela sua conduta, comprovada nos autos, poderá frustrar gravemente a expectativa e abalar a confiança por parte dos cidadãos depositada na personalidade respeitadora da vida privada de outrem, exigível a todos os elementos do Corpo de Bombeiros, e seria catastrófico caso viesse essa confiança a ser abalada e essa espectativa a ser frustrada.


O relator



Lai Kin Hong


Processo nº 639/2020

I

Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM

A, Subchefe do Corpo de Bombeiros, devidamente identificado nos autos, vem recorrer contenciosamente do despacho do Senhor Secretário para a Segurança, que lhe determinou a dispensa de serviço, nos termos do disposto no artº 77º/1 e 5 do EMFSM, concluindo e pedindo:

I. Vem o presente Recurso interposto do despacho nº 047/SS/2020 proferido pelo Senhor Secretário para a Segurança em 15 de Maio de 2020, devidamente notificado ao Recorrente no dia 26 de Maio de 2020, que decidiu dispensar do serviço o ora Recorrente;
II. O Recorrente ingressou no Corpo de Bombeiros em 03/10/1993, portanto, há mais de 26 anos, onde ingressou na categoria de Bombeiro;
III. Em 20 de Abril de 1996 o Recorrente foi promovido a Bombeiro-Ajudante;
IV. Em 12 de Janeiro de 2010 foi promovido a Subchefe, categoria que manteve até à presente data;
V. Durante a sua carreira o Recorrente obteve sempre boas avaliações, como fica demonstrado no Registo Biográfico e bem assim dos Boletins de informação individual;
VI. No período entre 01/01/2000 e 07/07/2014, o Recorrente obteve a avaliação de "Bom"; tendo apenas obtido uma avaliação de "Sofrível" no período entre 08/07/2014 e 31/12/2015;
VII. Em 19 de Abril de 2016 encontrava-se colocado na classe de comportamento "Exemplar";
VIII. Em 07 de Junho de 2007 o Recorrente recebeu um louvor por parte do Corpo de Bombeiros;
IX. Recebeu ainda um Louvor Colectivo em 22 de Janeiro de 2008 e uma referência elogiosa em 30 de Setembro de 2012;
X. Em 02 de Maio de 2007, foi agraciado com a Medalha de Mérito Profissional de 10 anos;
XI. Em 02 de Maio de 2009 foi agraciado com a Medalha de Mérito Profissional de 15 anos;
XII. Em 23 de Abril de 2014 foi agraciado com a Medalha de Mérito Profissional dos 20 Anos;
XIII. O Recorrente sempre reuniu o respeito, estima e consideração por parte dos Colegas de Profissão e sempre teve uma boa relação com os seus colegas de profissão que o respeitam;
XIV. É um homem honrado e digno, e tem desempenhado as funções que lhe têm sido acometidas ao longo de mais de 20 anos com lealdade, dedicação e empenho;
XV. Esteve sempre disponível para desempenhar as suas funções sob quaisquer circunstâncias e tendo em mente a dignidade da sua profissão, sempre concluindo os trabalhos prontamente mesmo com o sacrifico do tempo de descanso.
XVI. O Recorrente é um funcionário zeloso e dedicado.
XVII. Por decisão proferida em 19 de Dezembro de 2013 pelo Tribunal Judicial de Base- no âmbito do processo CR4-13-0161-PCC - transitada em julgado na sequência do Acórdão proferido em 15 de Abril de 2015 pelo Tribunal de Última Instância no processo nº 128/2014, o Recorrente foi condenado pela prática de crime de gravação e fotografias ilícitas p. p. pelo artigo 191º, nº 2 alínea a) do Código Penal, na pena única de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução pelo prazo de dois anos, e ainda a indemnização à vítima no montante de MOP$100,000.00;
XVIII. Na sequência da sobredita condenação foi instaurado um processo disciplinar contra o ora Recorrente tendo-lhe sido aplicada a pena de demissão;
XIX. Por decisão proferida pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância foi anulado o despacho punitivo recorrido;
XX. Inconformado com a sobredita decisão o Secretário para a Segurança interpôs recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância que, por acórdão proferido em 27 de Março de 2019, no processo nº 8/2019, negou provimento ao recurso, mantendo a decisão do Venerando Tribunal de Segunda Instância;
XXI. Os factos que deram origem ao processo CR4-13-0161-PCC e subsequente processo disciplinar não foram praticados no seio do Corpo de Bombeiros, nada têm a ver com as suas funções, trataram-se de factos ocorridas na sua vida privada, que não produzem perturbações ao normal funcionamento do serviço nem danos concretos ao serviço, nem afectaram a imagem do Corpo de Bombeiros;
XXII. Nos mais de 23 anos ao serviço dos Bombeiros, o Recorrente não teve qualquer outro ilícito disciplinar ou criminal anterior ou posterior aos factos que deram origem aos aludidos processos;
XXIII. Em 15 de Abril de 2019, no âmbito do sobredito processo disciplinar, e na decorrência das decisões judiciais supra referidas, o Recorrente foi notificado do Despacho nº 029/SS/2019, proferido pelo Exmo. Senhor Secretário para a Segurança em 10 de Abril de 2019 que puniu o Recorrente com a pena de suspensão de funções pelo período de 240 dias;
XXIV. Em 30 de Maio de 2019, o Recorrente foi notificado que baixou para a 4.ª classe de comportamento;
XXV. Nos termos do artigo 77º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau foi instaurado o processo administrativo contra o aqui Recorrente para avaliar a adequação comportamental do Recorrente;
XXVI. O Conselho Disciplinar veio a deliberar em 17 de Março de 2020 tão só que o Recorrente não é adequado para a permanência do serviço;
XXVII. A final, o Recorrente foi dispensado do serviço por decisão do Senhor Secretário para a Segurança;
XXVIII. Não obstante a baixa à 4ª classe de comportamento resultar da aplicação de penas disciplinares, dessa descida não resulta imediata e necessariamente a dispensa ao serviço já que esta depende sempre da verificação de dois requisitos cumulativos estabelecidos no n.º 1 do art.º 77º do EMFSM: i) mau comportamento do agente e ii) inconveniência da sua permanência ao serviço;
XXIX. Com essa medida não se visa a punição de determinada conduta concreta mas antes a avaliação global da conduta do agente e a sua desadequação ao serviço em virtude, repita-se, de "mau comportamento";
XXX. Terá de se verificar um perfil comportamental que indicie desvios dos requisitos morais, éticos, técnico-profissionais ou militares que lhe são exigidos pela sua qualidade e função, e que revelem não possuir um bom comportamento;
XXXI. No caso concreto, o juízo sobre o mau comportamento do Recorrente e consequente desadequação ao serviço, teve apenas por base os mesmos factos que levaram à decisão de pena de demissão, e posteriormente à decisão de pena de suspensão de 240 dias;
XXXII. A Entidade Recorrida não fez uma avaliação comportamental do Recorrente, ou pelo menos, não fundamentou a sua decisão em qualquer desvio comportamental que implicasse a inconveniência da permanência do Recorrente ao serviço do Corpo de Bombeiros por mau comportamento;
XXXIII. O conceito indeterminado de "inconveniência de permanência ao serviço" carece de invocação, na medida em que o legislador apenas admite a medida de dispensa de serviço por mau comportamento caso o mesmo seja invocado e, consequentemente, se encontre preenchido;
XXXIV. Em momento algum a Entidade Recorrida invocou a "inconveniência de permanência ao serviço", nem, por consequência, tão pouco o conceito foi concretizado pela através de juízos de prognose;
XXXV. Era à Entidade Recorrida que competia alegar e provar que o alegado mau comportamento tornaria inconveniente a sua permanência ao serviço, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 77º do EMFSM;
XXXVI. E se a Administração aplica determinada medida que se mostra vinculada à verificação de pressupostos que não decorrem da factualidade dada como provada, então a Administração age em erro na qualificação jurídica dos factos provados;
XXXVII. Pelo que a decisão punitiva padece do vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, o que conduz à sua inevitável anulação por esse motivo;
XXVIII. Os factos que fundamentam a decisão recorrida de dispensa de serviço foram já amplamente apreciados pelo Tribunal de Segunda e Última Instância, que entenderam sem hesitação que tais factos não são susceptíveis de implicar uma pena de demissão;
XXXIX. Os factos que serviram de fundamento da decisão recorrida não se tratam de factos relacionados com as funções do Recorrente, e desse modo, não podem ser considerados para efeitos de aplicação da medida de dispensa de serviço;
XL. A Entidade Recorrida ao aplicar a medida de dispensa de serviço por mau comportamento pretendeu fazer entrar pela janela aquilo que o Tribunal de Segunda Instância impediu que entrasse pela porta ao julgarem que o comportamento do Recorrente não era bastante para a demissão;
XLI. Não obstante esse Venerando Tribunal, em decisão imaculada, devidamente confirmada pelo Tribunal de Última Instância, ter deixado claro que o Recorrente não poderia ser demitido sob pena de violação do princípio da proporcionalidade, vem a Entidade Recorrida querer puni-lo com a mesma medida, mas por outra via;
XLII. No caso concreto nenhuma outra circunstância foi encontrada ou valorada, tendo a referida decisão resultado somente do facto de o agente ter descido à 4ª classe de comportamento em virtude de anterior aplicação de sanção disciplinar;
XLIII. A Entidade Recorrida, ao fundamentar a sua decisão somente no facto de este ter descido à 4ª classe de comportamento e em factos que serviram de fundamento para aplicação de pena disciplinar, desconsiderando por completo, por exemplo, o tempo que decorreu desde a prática desses factos, o facto de ter estado em causa apenas uma única conduta infractora, de, durante mais de 20 anos, o Recorrente se ter mantido imaculadamente na classe de comportamento exemplar, e portanto, na mais elevada das classes de comportamento, desconsiderando a avaliação comportamental do Recorrente na sua globalidade, incorreu no vício de violação de lei por violação do disposto no artigo 77º do MFSM, e por erro sobre os pressupostos de facto e de direito;
XLIV. A decisão recorrida violou o princípio da legalidade plasmado no art. 3º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), segundo o qual a administração deve actuar em obediência à lei e ao direito, e violou o disposto no citado 77º do EMFSM;
XLV. Há uma manifesta discrepância entre o conteúdo ou objecto do acto e as normas jurídicas que lhe são aplicáveis, o que constitui um vício de violação de lei, vício esse assumindo in casu a vertente de erro de direito;
XLVI. Donde resulta o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e erro de Direito, o que gera a anulabilidade do acto, como resulta do artigo 124º do CPA, que aqui se invoca para os devidos efeitos legais, nomeadamente para efeitos do estabelecido na alínea d) do nº 1 do artigo 21º do CPAC;
XLVII. As conclusões sobre o mau comportamento do agente e inadequação ao serviço nunca poderão ser sustentadas nos mesmos factos concretos que serviram de base ao processo disciplinar anterior e respectiva punição;
XLVIII. Pela sua conduta antecedente, o Recorrente já foi punido em sede própria;
XLIX. O mau comportamento a que se refere o artigo 77º dos EMFP que inviabiliza a permanência do Agente no FSM não poderá ter na sua base exclusivamente factos ou juízos de valor que estiveram na aplicação da sanção disciplinar, sob pena de se verificar uma dupla valoração das mesmas circunstâncias;
L. Colhendo as bases do direito penal, conclui-se que tal dupla valoração é violadora do princípio non bis in idem, segundo o qual é proibido que o mesmo facto seja valorado mais do que uma vez em sede sancionatória, princípio este aplicável in casu;
LI. Não bastará, portanto, a valoração das mesmas circunstâncias que estiveram na base da infracção anterior cuja pena já se cumpriu para que, sem ocorrência de outras circunstâncias, a ter em conta no momento da decisão, se possa concluir pela dispensa de serviço;
LII. A decisão proferida, enquanto violadora de princípios estruturantes que regem o processo disciplinar, padece do vício de violação de lei, o que gera a sua anulabilidade que se invoca;
LIII. A conclusão de que o Recorrente padece de falta de integridade incompatível com a manutenção das fileiras das forças de segurança e que a sua conduta não poderá deixar de se reflectir no seio da corporação a que pertence, para além de partir de pressupostos de facto manifestamente errados, como vimos supra, mostra-se manifestamente injusta, desproporcional e desadequada;
LIV. O princípio da proporcionalidade, também doutrinalmente conhecido como princípio da proibição do excesso, o que visa afinal é que todas as decisões (actos) administrativas não apresentem inconvenientes excessivos para os cidadãos relativamente às vantagens que a Administração delas espera;
LV. A autonomia da função administrativa pressupõe que aos órgãos da Administração se viabilize a possibilidade de realização de juízos de proporcionalidade em sentido estrito (artigo 5.º, n.º 2, do CPA) que, desenvolvidos embora no quadro do direito, permitam a consideração do mérito e da oportunidade da aplicação das medidas regeneratórias, sob a óptica da prossecução da legalidade e do interesse público;
LVI. A entidade recorrida, ao emitir o acto administrativo recorrido, violou flagrantemente os poderes discricionários subjacentes à aplicação da medida de dispensa de serviço;
LVII. De modo a cumprir com os princípios basilares da actividade administrativa, patentes nos artigos 5.º e 7.º do CPA, bem como o da razoabilidade no exercício dos poderes discricionários, a Entidade Recorrida não poderia deixar de considerar os mais de 20 anos que o Recorrente esteve ao serviço do CB e durante os quais teve um comportamento Exemplar, em que foi agraciado com louvores individuais e colectivos, medalhas de mérito profissional,
LVIII. A Entidade Recorrida não poderia ter deixado de ponderar que esteve em causa uma única conduta infractora, que não teve qualquer repercussão no normal funcionamento da corporação, nem trouxe danos concretos ao serviço,
LIX. A Entidade Recorrida não poderia ter deixado de ponderar que os factos que estiveram na origem do processo crime no qual o aqui Recorrente foi arguido - e posteriormente desencadearam o processo disciplinar - ocorreram no seio da vida privada há quase 10 anos (Maio de 2011), tendo a decisão que os julgou transitado em julgado há mais de 5 anos;
LX. A Entidade Recorrida não poderia ter deixado de ponderar que o Recorrente é bem conceituado pelos colegas, tendo sempre manifestado disponibilidade para o serviço e para ajudar os colegas;
LXI. A decisão de dispensa de serviço mostra-se manifestamente desajustada, por excessiva e injusta, face à conduta do Recorrente;
LXII. Se ao Recorrente tivesse sido aplicada a pena de demissão - e não foi precisamente porque esse Venerando Tribunal julgou a mesma excessiva - poderia o Recorrente ter requerido a sua reabilitação, o que se mostra vedado no caso da dispensa de serviço;
LXIII. A medida de dispensa de pena deve reflectir um perfil de comportamento que implique um juízo valorativo negativo e que se converta na inconveniência da sua permanência no serviço, o que, manifestamente, não acontece na decisão recorrida;
LXIV. A dispensa de serviço não se impõe a quem seja colocado na 4ª classe de comportamento, mas antes fica reservada a aos que, por mau comportamento, se mostre inconveniente que permaneçam nas Forças de Segurança;
LXV. Há colegas da mesma Corporação dos Bombeiros que, tal como o Recorrente, foram alvo de processos disciplinares em virtude de condenações em processos crime, e que por via das punições disciplinares baixaram à 4ª Classe, e que nem por isso foram dispensados do serviço;
LXVI. O despacho da Entidade Recorrida enferma de erro grosseiro na avaliação do comportamento do Recorrente para efeitos de aplicação da medida de dispensa de serviço e de manifesta violação do princípio da proporcionalidade no exercício de poder discricionário - para além de essa dispensa de serviço implicar em si mesma uma sanção desproporcional e inadequada a factos já sancionados e aos quais este venerando Tribunal entendeu desproporcionado aplicar-lhe a sanção de demissão - vícios que se assacam ao acto recorrido;
XVII. O acto recorrido está assim inquinado pelo vício de violação de lei por violação do princípio da propcrcionalidade e adequação consagrado no art. 5º do CPA e do princípio da justiça consagrado no art. 7º do CPA;
XVIII. Mais, também se verifica uma desrazoabilidade no exercício dos poderes discricionários da Entidade Recorrida, nos termos da aI. d) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC.
Nestes termos e nos melhores de direito requer-se seja proferido Douto Acórdão por esse Venerando Tribunal que, nos termos do disposto no artigo 21º, nº 1 do CPAC, anule o acto recorrido por se mostrar inquinado de do vício de violação de lei (i) por erro nos pressupostos de facto e direito por violação do artigo 77º do EMFSM e (ii) da violação do princípio da proibição da dupla valoração, ou princípio do non bis in idem, iii) por violação dos princípios da proporcionalidade e adequação e justiça, bem como da desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, tudo nos termos dos artigos 5.º e 7.º do CPA, bem como da aI. d) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC.
Para tanto,
Requer a V. Exa. se digne ordenar a citação da Entidade Recorrida para, querendo, contestar o presente recurso contencioso no prazo legal, nos termos do disposto no artigo 52.º e seguintes do CPAC, com a indicação que deverá remeter a estes autos o respectivo processo administrativo génese destes autos, nos termos do disposto no artigo 55.º do CPAC.

Na petição do recurso, o recorrente pediu a produção das provas testemunhais.

Citado, veio o Senhor Secretário para a Segurança contestando pugnando pela improcedência do recurso.

Junta a contestação do Senhor Secretário para a Segurança e apenso o processo instrutor, prosseguindo os autos, pelo despacho do Relator, foi indeferida a inquirição das testemunhas arroladas pelo recorrente.

Cumprido o disposto no artº 68º do CPAC, vieram o recorrente e a entidade recorrida apresentar as alegações facultativas, reiterando grosso modo os mesmos argumentos já deduzidos no petitório do recurso e na contestação, respectivamente.

O Dignº Magistrado do Ministério Público opinou no seguinte parecer, pugnando pelo não provimento do presente recurso:
  Na petição inicial e nas alegações facultativas, o recorrente pediu a anulação do Despacho n.º047/SS/2020, assacando sucessivamente o erro nos pressupostos de facto e direito, a violação dos princípios do non bis in idem, da proporcionalidade e adequação, e também da justiça, bem como a total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários.
*
  A propósito de substanciar o assacado do erro nos pressupostos de facto e direito, o recorrente arrogou que o despacho em escrutínio não invocara a “inconveniência de permanência ao serviço” e desconsidera os factores aludidos no art.80.º da petição inicial, daí resultam a violação do disposto no art.77.º do EMFSM aprovado pelo D.L. n.º66/94/M e o erro nos pressupostos de facto e de direito.
  Ora, o despacho in quaestio menciona deliberadamente que uma funcionária civil da mesma corporação é vítima do crime imputado ao ora recorrente pela sentença condenatória já transitada em julgado, e essa sua conduta, tendo sido equacionada na 4ª classe de comportamento, indicia uma desadequação ética que legitima um juízo de ausência de integridade e é incompatível com a manutenção das fileiras das forças de segurança.
  Sopesando a consciente alusão à “desadequação ética” do recorrente e à consequente incompatibilidade com a manutenção das fileiras das forças de segurança, inclinamos a colher que o despacho recorrido satisfaz a exigência no n.º1 do art.77.º do EMFSM, normativo que dispõe que pode ser dispensado de serviço o militarizado cuja permanência se mostre inconveniente pelo seu mau comportamento. Pois, a “incompatibilidade” engloba categoricamente uma certa inconveniência.
  Note-se que o art.246.º do EMFSM impõe a valoração das sanções disciplinares, das recompensas e do tempo de serviço, e por sua banda, o n.º1 do art.77.º exige tão-só a inconveniência da permanência nas FSM. E no caso sub specie, o documento de fls.179 dos autos torna indubitável que a classificação que baixou o recorrente na 4ª classe de comportamento valorou, efectiva e exactamente, todos os elementos favoráveis a ele – o tempo de serviço, as recompensas, etc., daí que o despacho in quaestio não podia nem devia voltar a valorar tais elementos favoráveis.
  Nestes termos e visto que a sobredita classificação constitui caso decidido por não ser impugnada, afigura-se-nos certo que o despacho ora em crise não infringe o preceito no n.º1 do art.77.º do EMFSM, nem eiva do arrogado erro nos pressupostos de facto e direito.
*
  A douta teoria que inspirou o EMFSM e merece a nossa subscrição a título do direito comparado vem inculcando que a dispensa de serviço é uma medida estatutária que visa, não a punição duma actuação profissional concreta, mas a aferição dum perfil comportamental e caracteriológico inadequado à permanência na GNR, ou seja, a verificação pelos órgãos competentes de que o agente perdeu aquelas condições ou possui uma estrutura caracteriológica incompatível com a condição de militar da GNR (vide. Acórdãos do STA nos Processos n.º045686, n.º047525 e n.º048221).
  No ordenamento jurídico positivo da RAEM, dispõe o art.228.º do EMFSM: A pena de demissão importa a perda de todos os direitos inerentes à condição de militarizado, do seu lado, o n.º6 do art.77.º na redacção dada pelo Regulamento Administrativo n.º9/2004 prevê: A dispensa de serviço equivale à exoneração, implicando, no entanto, a impossibilidade de readmissão nas FSM, sem prejuízo da concessão da pensão de aposentação, se se mostrarem preenchidos os requisitos legais para requerer a aposentação voluntária.
  Para além disso, a disposição na a) do n.º1 do art.44.º do ETAPM leva-nos a subscrever à brilhante doutrina que reza (Paulo Veiga e Moura: Função Pública, 1º Vol., Coimbra Editora 2001, pp.457 a 458): O traço marcante da exoneração consiste na conduta voluntária do funcionário que põe termo à relação jurídica de emprego estabelecida com a Administração. …… O termo “exoneração” deve reservar-se para expressar aquelas realidades em que o factor determinante da cessação da relação de emprego seja a vontade manifestada pelo funcionário ou agente.
  Tudo isto evidencia concludentemente que a demissão se distingue da dispensa de serviço, sendo muito saliente que como pena disciplinar, a demissão determina o afastamento mais radical do que a dispensa de serviço cuja natureza é de medida estatuária.
  Importa também assinalar que a dispensa de serviço incorporada no despacho recorrido tem como pressupostos a pena disciplinar de suspensão por 240 dias aplicada ao recorrente e, de outro lado, ainda a situação de uma funcionária civil da mesma corporação ser a ofendida dos crimes dolosamente cometidos por ele. À regra do senso comum, os três crimes de gravação e fotografias ilícitas tornam bem previsível e até natural que a permanência dele nessa corporação ofende diariamente o sentimento daquela ofendida – nisto consiste a sensível inconveniência.
  Ponderando tudo isto, e ressalvado elevado respeito pelo melhor entendimento em sentido contrário, não podemos deixar de colher que o despacho impugnado nestes autos que titula a dispensa de serviço do recorrente não contende com o princípio do non bis in idem.
*
  Em último lugar, o recorrente assacou, ao despacho recorrido que se consubstancia em determinar a dispensa de serviço dele, a violação dos princípios da proporcionalidade e adequação, e também da justiça, bem como a total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários.
  Considerando as doutrinas e jurisprudências que são abundantes e quase uniformes, entendemos que o significado e significância dos princípios da proporcionalidade e da justiça são dados adquiridos; e no caso sub judice basta-nos tomar como postura as brilhantes orientações estabelecidas no Acórdão do TSI no Processo n.º5/2017 e no correspondente aresto do TUI no Processo n.º8/2019.
  Afirmou o venerando TSI no apontado Processo: Tendo em conta todas as circunstâncias do caso concreto (artigo 232º do EMFSM) – o agente ser primário, praticar ilícitos que não têm nada a ver com as funções desempenhadas, nem perturbações para o normal funcionamento do serviço, ter sempre comportamentos exemplares, obter elogios e louvores, ser bem conceituado pelos colegas de trabalho, manifestar sempre disponibilidade para o serviço e colegas, ter mais de 21 anos de serviço - Tudo isto leva-nos a considerar que aplicação de uma censura disciplinar de menor grave é o bastante e cumpria integralmente a função sancionatória que os actos praticados pela Recorrente justificam. Ou seja, e dito de outro modo, a pena aplicada ao Recorrente é, para nós, manifestamente desajustada, por excessiva e injusta, face às circunstâncias em que os factos ocorreram. Com efeito, se a pena de suspensão ou, no limite, a pena de aposentação compulsiva cumpriam o desiderato visado pela acção punitiva que os actos reclamavam, não se devia ter optado de uma pena expulsória de tanta gravidade e de tão grandes repercussões, em cumprimento do princípio da proporcionalidade.
  Confirmando o aresto do TSI em sede do recurso jurisdicional, o douto TUI apontou: Sopesando as vantagens e os inconvenientes da aplicação da pena de demissão, afigura-se-nos que esta aplicação não é necessária para atingir os fins de reposição do prestígio das Forças de Segurança abalado com a conduta do ora recorrido, tendo em conta que a experiência de um bombeiro com largos anos de serviço é certamente um bem inestimável para a população, sendo que há outras penas que podem contribuir para aquele desiderato.
  Vê-se que ambas as instâncias asseveram que a pena de demissão imposta ao ora recorrente padece da violação do corolário da necessidade como vertente do princípio da proporcionalidade, é tal violação que levou o TSI a anular o despacho da aplicação da pena de demissão e, a seguir, o TUI a negar provimento ao recurso jurisdicional.
  Em esteira das sãs inculcas supra aludidas, e com todo o respeito pelo melhor entendimento em sentido contrário, duas ordens de razões levam-nos a opinar que o despacho ora recorrido que decretou a dispensa de serviço não ofende os princípios da proporcionalidade e da justiça, nem eiva da total desrazoabilidade no exercício de poder discricionário.
  Em primeiro lugar, as disposições no art.228.º e no n.º6 do art.77.º do EMFSM revelam inequivocamente que a dispensa de serviço é mais suave e menos lesiva do que a pena da demissão. Convém realçar que a dispensa de serviço é também mais suave igualmente para os militarizados que não preencham os requisitos legais da aposentação voluntária, visto que eles ficam impedidos apenas da readmissão nas FSM, e conservam a plena capacidade do exercício quanto às demais funções públicas.
  E em segundo, a avaliação da conveniência ou inconveniência da permanência do recorrente no Corpo de Bombeiro exige não só a ponderação de dois interesses conflituantes em jogo – o interesse v o particular do recorrente, mas também a devida valoração dos legítimos interesses da ofendida dos três crimes cometidos pelo recorrente, de modo a ter em consideração e perspectiva o sofrimento que a permanência do recorrente poderá provocar no sentimento dessa ofendida.
  Com efeito, não se deve olvidar nem ignorar que o Acórdão tirado no Processo n.ºCR4-13-0161-PCC deu como provados, além de outros, os seguintes factos: 1. 嫌犯進行的偷拍事實令受害人精神上遭受極大困擾。2. 由於嫌犯與受害人在同一部工作,故在案發初期,受害人因工作關係須面對嫌犯。3. 由於害怕面對嫌犯且基於心理壓力,受害人主動向消防局副局長要求調離部門,以確保不與嫌犯接觸。4. 受害人曾因情緒問題接受心理醫生之治療。5. 受害人曾兩次就心理醫生。6. 在受害人進行例行身體檢查時,負責檢查的醫生發現受害人存有情緒問題,其建議受害人再次到心理醫生就診。7. 本案的偷拍事件對受害人構成難以磨滅的陰影,受害人的日常生活受到極大的困擾。8. 受害人至今仍擔心片段存有備份或仍有其他片段,其擔心相關片段會在網絡世界出現。(vide. fls.121 verso a 122 dos autos)
  Sem embargo do respeito pela opinião diferente, entendemos que tais factos dados por provados no sobredito Acórdão condenatório que se transitou em julgado merecem atenção e devida valoração para efeitos de avaliar se a permanência do recorrente no Corpo de Bombeiro for ou não conveniente, sob pena de acarretar a 2ª lesão à referida ofendida.
***
  Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso contencioso.
  

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

De acordo com os elementos probatórios existentes nos autos e a livre apreciação feita das provas testemunhais produzidas, é de dar como assente a seguinte matéria de facto com relevância à decisão do presente recurso:

* O recorrente desempenhava as funções de Subchefe de nomeação definitiva no Corpo de Bombeiros;

* Pela decisão penal condenatória já transitada em julgado, o recorrente foi punido na pena única de 1 ano de prisão, suspensa por 2 anos, pela prática, em autoria imediata e em concurso real e efectivo, de 3 três crimes de gravações ilícitas, p. e p. pelo artº 191º/2-a) do Código Penal, conforme se vê no Acórdão datado de 19DEZ2013, proferido nos Autos nº CR4-13-0161-PCC, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – vide as fls. 119 e s.s. dos p. autos;

* Pelos mesmos factos que estiveram na origem da condenação penal, o recorrente foi disciplinarmente punido na pena de suspensão por 240 dias, na sequência da anulação da pena de demissão que lhe foi aplicada pela prática dos mesmos factos, por decisão do Tribunal da Última Instância;

* Por o recorrente ter baixado à 4ª classe de comportamento 10MAR2009 segundo a classificação definida pelo quociente resultante da aplicação da fórmula prevista no artº 246º do EMFSM, foi, ao abrigo disposto no, organizado um processo individual a que se refere o artº 77º do mesmo Estatuto;

* Concluído e remetido ao Secretário para a Segurança o processo individual, por despacho deste, datado de 15MAIO2020, foi determinada a dispensa de serviço do recorrente*; e

* Inconformado com o despacho, veio recorrer contenciosamente para este TSI.

Atendendo ao que foi alegado e concluído no petitório do recurso e reiterado nas alegações facultativas, constituem o objecto do presente recurso as questões do erro nos pressupostos de facto e de direito; da violação do princípio ne bis in idem; da violação dos princípios da proporcionalidade, da adequação e da justiça, e da desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários.

Para nós, todas estas questões já foram exaustivamente tratadas no Douto parecer do Ministério Público emitido em sede de vista final, com que estamos inteiramente de acordo.

Portanto não se vê melhor solução do que louvar aqui o Douto parecer do Ministério Público e dar aqui por integralmente reproduzido como parte integrante da fundamentação da nossa decisão negatória da procedência do presente recurso.

Sendo assim, limitamo-nos a fazer algumas observações nos seguintes aspectos só para reforçar a improcedência do recurso.

In casu, inexiste qualquer erro nos pressupostos de facto, pois há erro nos pressupostos de facto quando os factos que sirvam de fundamento a um acto administrativo não são verdadeiros, ou apenas putativos ou erradamente reputados como verdadeiros pela Administração na prática do acto.

Em lado algum, o recorrente questionou a veracidade dos factos em que se apoiou o acto ora recorrido, nomeadamente os factos que estiveram na origem da condenação penal e da punição disciplinar.

No fundo, o que o recorrente pretende dizer é: a matéria de facto, tida por assente pela Administração e não questionada por ele, não sustenta o juízo conclusivo, vertido no acto recorrido, da verificação dos pressupostos materiais para a determinação da medida da dispensa de serviço.

Evidentemente estamos perante uma questão de erro nos pressupostos de direito, que tal dissemos supra, já foi bem tratada no Douto parecer do Ministério Público que subscrevemos.

Outro aspecto que entendemos por bem fazer uma observação é no que respeito à invocada violação pelo acto recorrido dos princípios da proporcionalidade, da adequação e da justiça e à desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários.

Para nós, não obstante praticados na vida privada, os comportamentos que estiveram na origem da condenação penal e punição disciplinar, pela natureza dos factos devassadora da vida privada e sexual da ofendida, pela elevada gravidade e pelo alto grau de censurabilidade ética e jurídica dos factos exaustivamente descritos no Acórdão condenatório penal, já representam notórios desvios do mínimo dos requisitos ético-profissionais exigidos a qualquer dos elementos do Corpo de Bombeiros.

Porquanto, considerando que não poucas vezes, em situações facilmente imagináveis e por razões bem compreensíveis, a própria missão confiada ao Corpo de Bombeiros não se cumpre senão com o inevitável acesso ou intromissão na vida privada dos cidadãos, mesmo sem o seu consentimento ou até contra a sua vontade, o perfil comportamental do recorrente caracterizado pela falta da idoneidade moral, revelável pela sua conduta, poderá frustrar gravemente a expectativa e abalar a confiança por parte dos cidadãos depositada na personalidade respeitadora da vida privada de outrem, exigível a todos os elementos do Corpo de Bombeiros, e seria catastrófico caso viesse essa confiança a ser abalada e essa espectativa a ser frustrada.

Assim sendo, os factos, que estiveram na origem na condenação penal, na punição disciplinar e na colocação do ora recorrente na 4ª classe de comportamento e em que assentou o acto recorrido, evidenciam que o recorrente não possui a personalidade respeitadora da vida privada de outrem compatível e exigível pela boa execução das tarefas de que é incumbido e denotam um grau de gravidade que torna a medida de dispensa de serviço perfeitamente proporcional, adequada, justa e razoável.


Resumindo:

4. Há erro nos pressupostos de facto quando os factos que sirvam de fundamento a um acto administrativo não são verdadeiros, ou apenas putativos ou erradamente reputados como verdadeiros pela Administração na prática do acto.

5. Não obstante praticados na vida privada, os comprovados comportamentos de um bombeiro, que, preenchem o tipo do crime de gravações e fotografias ilícitas, no caso concreto ofensivos do bem jurídico da reserva da vida privada e sexual de que é titular uma colega sua de trabalho, que estiveram na origem da condenação penal e punição disciplinar de que o bombeiro foi visado, pela natureza dos factos devassadora da vida privada e sexual de outrem e pelo elevado grau de gravidade e de censurabilidade ética e jurídica dos factos, tal como afirmado na condenação penal, já representam notórios desvios do mínimo dos requisitos ético-profissionais exigidos a qualquer dos elementos do Corpo de Bombeiros.

6. Pois, considerando que não poucas vezes, em situações facilmente imagináveis e por razões bem compreensíveis, a própria missão confiada ao Corpo de Bombeiros não se cumpre senão com o inevitável acesso ou intromissão na vida privada dos cidadãos, mesmo sem o seu consentimento ou até contra a sua vontade, o perfil comportamental do recorrente caracterizado pela falta da idoneidade moral, revelável pela sua conduta, comprovada nos autos, poderá frustrar gravemente a expectativa e abalar a confiança por parte dos cidadãos depositada na personalidade respeitadora da vida privada de outrem, exigível a todos os elementos do Corpo de Bombeiros, e seria catastrófico caso viesse essa confiança a ser abalada e essa espectativa a ser frustrada.

Tudo visto, resta decidir.

III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência julgar improcedente o recurso.

Custas pelo recorrente pela improcedência do recurso, com a taxa de justiça fixada em 10 UC.

Notifique.

RAEM, 29ABR2021

(Relator)
Lai Kin Hong

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong

(Segundo Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng


Mai Man Ieng
* Despacho n.º 047/SS/2020
Assunto: Processo Administrativo nos termos do artigo 77.º do EMFSM
Agente Averiguado: Subchefe n.º ******, A
O procedimento com vista a avaliar a adequação comportamental dos agentes das forças de segurança, é obrigatoriamente instaurado sempre que na sequência da ponderação dos factores tempo de serviço com a acção disciplinar ( punições e recompensas ), resulte a colocação de um determinado agente na 4.a. classe de comportamento - vd. artigo 77.º do EMFSM, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 66/94/M, de 30 de Dezembro-, podendo, em caso de avaliação negativa e conclusão pela definitiva não identificação com os valores que presidem à coesão interna e missão das FSM, conduzir à sua dispensa de serviço.
Como resulta dos autos, o Subchefe n.º ******, A, foi punido com a pena de suspensão de funções por 240 dias, na sequência do que desceu à 4.a classe de comportamento.
As circunstâncias que caracterizam os factos - nos quais surge como vítima uma funcionária civil da mesma corporação - que estiveram na origem de uma tão severa punição, a qual, operada a fórmula de avaliação do nível disciplinar nos termos do artigo 224.º do EMFSM, resultou na colocação do averiguado na 4.a. classe de comportamento, assumem uma especial censura que não se expia com a pena aplicada, indiciando uma desadequação ética que legitima um juízo de ausência de integridade, incompatível com a manutenção das fileiras das forças de segurança. Pese embora os factos não poderem ser trazidos ao fundamento da decisão nos termos do artigo 77.° a apreciação a que este normativo obriga sempre que um militarizado seja colocado na 4.a classe de comportamento, não pode deixar de reflectir no seio da corporação a que pertence, um juízo fortemente negativo quanto à integridade do seu comportamento.
Assim, ouvido o Conselho de Justiça e Disciplina;
O Secretário para a Segurança, no uso dos poderes executivos que lhe advêm do n.º1 da Ordem Executiva n.º182/2019, determina, nos termos dos n.os l e 5 do artigo 77.° do EMFSM, com referência, ainda, ao seu n.º 6, a dispensa de serviço do Subchefe n.º ******, A.

Gabinete do Secretário para a Segurança, aos 15 de Maio de 2020
   O Secretário para a Segurança

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639/2020-19