Processo nº 5/2021 Data: 26.05.2021
(Autos de recurso jurisdicional)
Assuntos : Recurso contencioso.
Prazo.
Suspensão do prazo.
Nulidade do acto recorrido.
Omissão de pronúncia.
SUMÁRIO
1. A matéria do(s) “prazo(s) do recurso contencioso” vem regulada no art. 25° do C.P.A.C., sendo que (apenas) o “direito de recurso de actos nulos”, (ou juridicamente inexistentes), não caduca, podendo ser exercido a todo o tempo; (cfr., n.° 1).
2. Assim, com excepção da situação supra referida, o decurso do prazo legalmente previsto para o recurso de “actos meramente anuláveis”, que no caso de o recorrente residir em Macau é de 30 dias, (cfr., n.° 2, al. a) – e nenhum motivo legal existindo para a sua “suspensão” – torna o “recurso extemporâneo”.
3. Se o recorrente alegou que o acto administrativo recorrido era “nulo”, incorre-se em “omissão de pronúncia” se no Acórdão em que se declarou o recurso extemporâneo nada se disse sobre tal “vício”.
O relator,
José Maria Dias Azedo
Processo nº 5/2021
(Autos de recurso jurisdicional)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. Aos 08.10.2020 proferiu o Colectivo de Juízes do Tribunal de Segunda Instância o Acórdão seguinte:
“I – RELATÓRIO
A, Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando do despacho da Secretária para os Assuntos Sociais e Cultura, datado de 14/01/2020, dela veio, em 05/05/2020 interpor o presente recurso contencioso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 2 a 22, tendo formulado as seguintes conclusões:
A) O Júri e o Despacho recorrido violaram o Anúncio de Abertura do Concurso nº A17/CF/FIS/2019 e os critérios e formas de avaliação aí previstas - pontos 3.1.1 e 6.1;
B) Tendo, ademais, violado o aí constante no sentido de serem aqueles, apenas, os documentos necessários à Candidatura ao Concurso, na medida em que se não exigiu a entrega de um Projecto ou Investigação, nem na data da candidatura, nem em data anterior às Provas de Conhecimento a fim de serem aferidos e questionado o Candidato Recorrente;
C) Foram violados os arts. 3°, alínea 4) em conjugação com a alínea 2), 5°, 6°, 10° e 13 do Despacho nº 131/2012 do Exmº Chefe do Executivo;
D) Foram, obviamente, violadas as expectativas legítimas e jurídicas no que concerne às Provas Concursais e ao Aviso de Abertura de Concurso;
E) As Provas foram ilegais, pois consistiram em perguntas teóricas fora do escopo da especilidade e área funcional a que o Candidato Recorrente concorreu;
F) Foi violado o âmbito concreto das previsões normativas relativas à Progressão da Carreira Médica, designadamente os arts. 14° e 15° da Lei nº 10/2010, uma vez que para progredir na Carreira Médica, o específico e especial requisito é a área funcional em que se exerce e a que se concorre;
G) A fundamentação do Acto não foi nem congruente, nem exacta em violação dos dispostos nos arts. 113° e 115° do C.P.A.;
H) A fundamentação do Acto não demonstra a subsunção dos factos ao quadro legal, às regras e normas que o regem, que foi claramente violado com a consequência prevista nas alíneas f) e d) do art. 122° do C.P.A.;
I) A Actuação do Júri, sufragada no Despacho recorrido, violam os Princípios da Igualdade e Proporcionalidade, o da Justiça e Imparcialidade - arts. 5° e 7° do C.P.A.;
J) A Actuação do Júri e o Despacho recorrido, violam, ainda e mormente, o Princípio da Legalidade, por violação de todas as normas invocadas e por violação do constante do Aviso de Abertura do Concurso - art. 3° do C.P.A.;
K) Por força da violação dos arts. 3º, 5° e 7° do C.P.A., o Acto recorrido enferma de Nulidade;
L) Por mera cautela de Patrocínio, e subsidiariamente, a Violação de Lei determina sempre a Anulação do Acto - art. 124° do C.P.A.
M) Todos os Vícios ora assacados ao acto recorrido constituem fundamento de recurso contencioso - art. 21° do C.P.A.C.
* * *
Citada a Entidade Recorrida, a Senhora Secretária para os Assuntos Sociais e Cultura veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 464 a 484, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. Foi a Secretária para os Assuntos Sociais e Cultura do Governo da Região Administrativa Especial de Macau citada pelo TSI para contestar, querendo, o recurso contencioso interposto por A, do acto de 14 de Janeiro de 2020, que negou provimento ao recurso hierárquico necessário apresentado pelo ora Recorrente da classificação por si obtida no Concurso n.º A17/CS/FIS/2019.
2. Nos termos da alínea a) do n.º 2 artigo 25.° do CPAC, o direito de recurso de actos anuláveis caduca no prazo de 30 dias quando o recorrente resida em Macau, o que é o caso.
3. A contagem do prazo para interposição de recurso contencioso inicia-se, no presente caso, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 26.º do CPAC, ou seja, a contar da notificação da decisão, face ao disposto na alínea a) do artigo 68.º do CPA.
4. O Recorrente, caso preencha os requisitos do n.º 2 do artigo 27.º do CPAC, nomeadamente no que se refere à notificação, pode beneficiar da suspensão do prazo para interposição de recurso contencioso, desde que aquela notificação omita as indicações previstas no artigo 70.° do CPA.
5. O prazo de 10 dias previsto no n.º 2 do artigo 27.° do CPAC é um prazo procedimental e a sua contagem faz-se nos termos do artigo 74.º do CPA.
6. O Recorrente foi notificado da decisão recorrida no dia 20 de Janeiro de 2020, pelo ofício n.º 01/OF/CS/FIS/2020, no qual consta, bem como dos respectivos anexos, todas as indicações previstas no artigo 70.° do CPA e, por isso, ainda que peça qualquer certidão não a pode pedir para se prevalecer da suspensão de prazo prevista no n.º 2 do artigo 27.° do CPAC.
7. Mais ainda, para se poder prevalecer da suspensão de prazo de recurso ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 27.° do CPAC, o Recorrente teria de requerer a notificação dos elementos em falta ou a certidão a que aquele normativo se refere, no prazo de 10 dias a contar da notificação.
8. O Recorrente foi notificado no dia 20 de Fevereiro de 2020 e apenas requereu a certidão, ao abrigo e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 27.° do CPAC, no dia 3 de Março de 2020, ou seja, ao fim de 12 dias a contar da notificação.
9. Em ambos os casos não estão preenchidos os requisitos vertidos no n.° 2 do artigo 27.° do CPAC, porquanto a notificação contém todas as indicações previstas no artigo 70.° do CPA e o requerimento foi entregue já depois de decorrido o prazo de 10 dias fixado naquele normativo.
10. Não havendo lugar à suspensão do prazo para interposição de recurso contencioso prevista na supracitada norma legal, o presente recurso contencioso, que teria de ser interposto no prazo de 30 dias a contar de 20 de Fevereiro de 2020, e apenas foi apresentado na Secretaria do TSI no dia 4 de Maio de 2020, deve ser considerado extemporâneo, por ter caducado o direito de recurso.
11. E, a caducidade do direito de recurso por parte do Recorrente, nos termos da alínea h) do n.º 2 do artigo 46.° do CPAC, implica que o recurso interposto deva ser liminarmente rejeitado, pelo que o Venerando Tribunal deverá julgar procedente a presente excepção e absolver da instância a Entidade Recorrida.
12. Impugnando a petição de recurso é factual que, na sequência do despacho de 12 de Abril de 2019 do então Senhor Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura foi aberto concurso de acesso, condicionado, de prestação de provas, para o preenchimento de um lugar de chefe de serviço, 1° escalão, da carreira médica, área funcional hospitalar, área profissional de medicina física e reabilitação, do quadro de pessoal dos Serviços de Saúde, tendo o anúncio sido publicado no Boletim Oficial, n.º 19, II Série, de 8 de Maio de 2019.
13. Foram admitidos ao concurso, condicionalmente, 3 candidatos, tendo sido 2 os aprovados na prova de conhecimentos, entre eles o ora Recorrente que, em avaliação final, obteve a notação de 6,07 valores, numa escala de 0 a 10, tendo ficado posicionado em segundo lugar na escala classificativa.
14. Não se conformando com a classificação obtida, o ora Recorrente interpôs recurso hierárquico necessário para a Secretária para os Assuntos Sociais e Cultura e, vendo tal recurso improceder, interpôs da respectiva decisão o presente recurso contencioso, no qual pede a anulação ou declaração de nulidade do acto recorrido.
15. A classificação atribuída pelo Júri do concurso a cada um dos candidatos resultou da aplicação dos métodos de selecção fixados no aviso do concurso, bem como nos métodos de selecção e sistema de classificação constantes dos Critérios de avaliação utilizados, que reproduzem aqueles, e consistiram em provas de conhecimentos e análise curricular.
16. Conforme os Critérios de avaliação e, também, o aviso do concurso, "as provas de conhecimentos destinam-se a avaliar a capacidade do candidato para resolver problemas e actuar, assim como reagir, em situações no âmbito da respectiva área funcional, através da apresentação e discussão de um projecto de gestão clínica de um serviço ou unidade ou de um trabalho de investigação”.
17. Por seu turno, "a análise curricular consiste na apreciação e discussão do currículo profissional do candidato, e tem por objectivo analisar a sua qualificação para o desempenho de determinada função, atendendo, designadamente à sua competência profissional e científica. Tem por referência o perfil profissional, genérico e específico do lugar a ocupar, assim como o percurso profissional, a experiência adquirida e a formação realizada, o tipo de funções exercidas e a avaliação de desempenho anteriormente obtida pelo candidato".
18. O Recorrente discorda da pontuação que lhe foi atribuída nas provas de conhecimentos, porquanto lhe teriam sido colocadas questões teóricas no âmbito da "reabilitação cardíaca" em vez da discussão de um "projecto" ou de uma "investigação", o que, em seu entender, teria influenciado negativamente a sua classificação final no concurso, sendo este o fundamento do recurso interposto.
19. Em matéria de direito, e nos termos do disposto no artigo 20.º do CPAC, "Excepto disposição em contrário, o recurso contencioso é de mera legalidade e tem por finalidade a anulação dos actos recorridos ou a declaração da sua nulidade ou inexistência jurídica”.
20. Contudo, o Recorrente não consegue provar a existência de qualquer ilegalidade na decisão tomada, focando-se em hipotéticas considerações de errada utilização de critérios, que reflectem apenas uma sua mera versão fáctica das coisas, mas que, na verdade, assentam em bases erradas.
21. Com efeito, o Júri do concurso fez uma rigorosa e adequada aplicação dos Critérios de avaliação do concurso face à não apresentação, pelos candidatos, de um projecto de gestão clínica de um serviço ou unidade ou de um trabalho de investigação, em favor dos candidatos e do próprio procedimento concursal, donde o acto recorrido não enferma de qualquer ilegalidade.
22. Alega erradamente o Recorrente que o acto administrativo enfermaria de ilegalidade, o que o tornaria inválido, dizendo que apresentou no concurso todos os documentos que lhe foram exigidos, e que não consta do aviso de abertura do concurso ou que o Júri tivesse determinado ser dever dos candidatos apresentar um projecto de gestão ou um trabalho de investigação para posterior discussão.
23. Mas, da leitura dos Critérios do concurso, efectuada por um "bonus pater familiae", conclui-se que seria dever dos candidatos entregar tal projecto de gestão ou trabalho de investigação para permitir que o Júri do concurso pudesse, nessa base, avaliar devidamente os candidatos.
24 Citando um trecho dos fundamentos do acto recorrido, constante do parecer a ele anexo e que dele faz parte integrante, é de concluir lapidarmente que, "Tal parece decorrer do texto dos Critérios de avaliação e do próprio Regulamento concursal. Com efeito utilizando-se a expressão "apresentação e discussão de um projecto" e colocando-se no mesmo patamar de abrangência um "trabalho de investigação", parece ser intuito de que cabe aos concorrentes tal tarefa e não ao Júri. Certamente que não seria o Júri a fazer um projecto de gestão clínica a ser posteriormente apresentado pelo candidato pois a apresentação está directamente ligada à sua feitura; por seu turno também não seria o Júri a fazer um trabalho de investigação uma vez que seria por via desse mecanismo que o Júri iria avaliar as capacidades e competências do candidato".
25. Acrescentando-se que, "Entende-se na verdade que outra leitura não pode ser feita por via da própria razão de ser da norma (ratio legis), tendo em conta a letra e o texto como limite de interpretação e, bem assim, que no processo interpretativo, aqui agora tido, se atém a factores jurídicos, sociais e até morais objectivos e compartilháveis que permitem a um leigo entender o alcance do dispositivo em causa, sendo que a "interpretação não deve cingir-se (apenas) à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo", havendo que atender à "ocasio legis", à "ratio legis" e à unidade sistémica".
26. Na Acta n.º 5 do concurso consta que, "de acordo com o entendimento do júri sobre o respectivo regulamento, o projecto de gestão clínica de um serviço ou unidade ou de um trabalho de investigação deve ser entregue e apresentado por iniciativa do candidato (...) durante o período de apresentação da candidatura ou na participação na prova de conhecimentos".
27. Não estando fixado no aviso do concurso que o projecto de gestão ou o trabalho de investigação deveria ser um dos documentos a entregar logo com a candidatura, seria do entendimento de um "bonus pater familiae" que, havendo que o discutir para a avaliar as capacidades e competências do candidato no âmbito do lugar posto a concurso, poderia o candidato fazer a sua entrega até ao momento da realização das provas de conhecimentos.
28. Uma vez que o candidato não entregou tal projecto de gestão ou trabalho de investigação para servir de base de discussão sobre as suas capacidades e competências no âmbito do lugar posto a concurso, haveria o Júri, tal como o fez, de incidir a avaliação do candidato sobre as mais diversas questões que se prendem com o bom exercício das funções atinentes ao cargo a desempenhar.
29. Sendo lícito ao Júri ter colocado ao Recorrente questões sobre "reabilitação cardiopulmonar", porquanto essa é uma área de intervenção clínica que integra a Medicina Física e Reabilitação, sem que com isto se tenha violado as legítimas expectativas do candidato, pese embora poder não estar preparado para responder a questões sobre aquela matéria.
30. De facto, o cargo posto a concurso, de chefe de serviço, está previsto no artigo 9.° da Lei n.º 10/2010, estando o respectivo conteúdo funcional plasmado no artigo 15.° da mesma Lei, o qual é de grande abrangência, complexidade e responsabilidade, para cujo exercício devem ser escolhidos os médicos com mais e melhor preparação na respectiva área.
31. As funções de um chefe de serviço integram as funções dos profissionais de saúde nas categorias de médico geral (artigo 12.°), médico assistente (artigo 13.°) e médico consultor (artigo 14.°) constantes da Lei 10/2010 e correspondem ao topo da carreira médica, esperando-se e exigindo-se que o candidato a tal lugar tenha não só conhecimentos gerais de medicina, mas também um grau de especialização que comporte conhecimentos vastos na área de especialidade da unidade que irá gerir.
32. A aferição da capacidade do candidato para o cabal desempenho de funções de chefe de serviço na gestão de uma unidade de Medicina Física e Reabilitação comporta "a colocação de questões relativas a casos/situações de quadros clínicos (e) permite apurar a capacidade/competência para resolver problemas e actuar, assim como reagir em situações relacionadas com o âmbito da respectiva área funcional”.
33. Logo, "entende-se como oportuno e adequado que sejam colocados casos pertinentes em função da especialidade no âmbito da Medicina Física e Reabilitação com todas as vertentes que esta encerra e tendo em conta o que está respectivamente definido a nível académico".
34. Vertentes em que se contam a reabilitação neurológica, a reabilitação muscular, a reabilitação geriátrica, a reabilitação cardíaca e pulmonar, a reabilitação cognitiva, entre outras.
35. Os serviços relativos à área profissional de medicina física e reabilitação têm "doentes que são frequentemente influenciados por diversas doenças, que requerem um vasto leque de conhecimentos e experiência de profissionais da área de reabilitação para serem tratados de forma eficaz e segura''.
36. Seria redutor e insensato deixar de fora do âmbito da função uma vertente daquela área profissional, apenas porque o ora Recorrente não exerce e nunca exerceu, não consta do seu currículo formativo e não constará, naquela matéria, do "scope of practice" do CHCSJ.
37. Quanto ao "scope of practice" dir-se-á que, mesmo que num momento não sejam prestados cuidados de saúde em termos de reabilitação cardíaca e pulmonar, isso não impede que noutro momento não tenham de ser prestados, ou implica que nunca venham a ser prestados, porquanto o hospital público deve estar preparado para prestar cuidados de saúde à população em todas as valências, que os cidadãos assim o esperam e exigem e a Administração tem o dever de os prover.
38. Contudo, consta literalmente do referido "scope of practice" a vertente cardiopulmonar, em termos de "Treat patients of all ages afflicted with function limiting and/or painful conditions involving: central and peripheral nervous system, cardiopulmonary and musculoskeletal systems", pelo que o Recorrente continua a não ter razão.
39. As necessidades dos doentes que recorrem a cuidados de saúde na área da Medicina Física e Reabilitação não se compadecem com as limitações sentidas pelo Recorrente, pelo que não lhe é lícito arguir que as perguntas teóricas que lhe foram colocadas em sede de avaliação de conhecimentos estariam fora do escopo da especialidade e área funcional, porquanto as mesmas abrangem uma vertente daquela área médica e fazem parte do "scope of practice" da especialidade.
40. Não se confirma, portanto, a violação dos princípios jurídicos plasmados nos artigos 3.°, 5.° e 7.° ou outros preceitos do CPA pelo acto recorrido, nem as violações que o Recorrente também imputa ao Despacho do Chefe do Executivo n.º 131/2012 ou à Lei n.º 10/2010, pelo que também não se verifica qualquer causa de anulabilidade do acto ou que o mesmo seja nulo.
41. A avaliação do Recorrente no concurso pautou-se pelo estrito cumprimento dos Critérios fixados para o concurso e no respectivo aviso, em consonância com os princípios da legalidade, da prossecução do interesse público, da certeza e da segurança jurídicas, da igualdade e da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade, da transparência, da boa fé e da decisão.
42. Em suma e em rigor, não só a avaliação efectuada pelo Júri do concurso não enferma de qualquer invalidade, como a decisão administrativa tomada pela Entidade Recorrida se pautou pela estrita observância dos princípios aplicáveis aos concursos de pessoal para a Administração Pública, às leis aplicáveis em vigor na RAEM e, em particular, às normas do procedimento administrativo em vigor, sendo de manter vigente na ordem jurídica o acto administrativo recorrido, não atendendo, pois, ao pedido do Recorrente.
* * *
O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls. 495 e 496):
Na sua contestação, a entidade recorrida suscitou matéria de excepção que obsta ao prosseguimento e conhecimento do recurso, sobre a qual passamos a pronunciar-nos.
Está em causa a caducidade do direito de recurso.
Constata-se que o recorrente foi notificado do acto recorrido em 20 de Fevereiro de 2020 - fls. 592 a 595 do processo instrutor - e apenas interpôs o presente recurso em 4 de Maio de 2020. Igualmente se apura que, de permeio, em 3 de Março de 2020, requereu a emissão de uma certidão para conhecimento de certos elementos procedimentais, invocando o disposto no artigo 27.°, n.º 2, do Código de Processo Administrativo Contencioso, a qual lhe viria a ser entregue, conforme sua própria alegação, não contestada, em 15 de Abril de 2020.
A entidade recorrida diz que a certidão não se destinou a obter os elementos cuja omissão, na notificação do acto, permite lançar mão do pedido previsto naquele artigo 27.°, n.º 2, com a inerente suspensão do prazo de interposição do recurso, e acrescenta que a certidão também não foi solicitada no prazo de 10 dias previsto na mesma norma. Daí que, não podendo o recorrente beneficiar da suspensão do prazo prevista nesse normativo, o recurso tenha dado entrada em juízo extemporaneamente.
Afigura-se-nos que assiste razão à entidade recorrida.
Na verdade, a suspensão do prazo prevista no artigo 27.°, n.º 2, do Código de Processo Administrativo Contencioso, só ocorre quando a notificação do acto tenha omitido os elementos aí previstos e o interessado requeira o fornecimento dos elementos em falta, no prazo de 10 dias.
Pois bem, vistos os elementos fornecidos ao recorrente com a notificação (cf. fls. 592 a 595-52 do processo instrutor), constata-se que continham todas as indicações e dados previstos naquele inciso, cuja omissão habilita a desencadear o mecanismo do artigo 27.°, n.º 2, do Código de Processo Administrativo Contencioso, com o efeito útil da suspensão do prazo para interposição do recurso. Ou seja, o recorrente não estava em condições de se socorrer daquela norma e do seu efeito útil, embora pudesse evidentemente solicitar a certificação doutros elementos que tivesse por pertinentes para melhor apreender as circunstâncias e incidências do acto, mas aqui sem o efeito suspensivo aludido.
Por outro lado, igualmente se constata que o pedido de certidão formulado a coberto do referido artigo 27.°, n.º 2, do Código de Processo Administrativo Contencioso, não observou o prazo de 10 dias imposto nesse normativo. E certo é que a objecção suscitada quanto a este ponto pelo recorrente, que invoca as orientações difundidas pelos SAFP a coberto da Comunicação OFC 2002070001/DRTSP-DERP, não tem razão de ser, já que se trata de orientações relativas ao período de 8 a 16 de Fevereiro, lapso temporal que em nada interfere com a prática dos actos subsequentes à notificação de 20 de Fevereiro de 2020, que levou o acto administrativo ao conhecimento do recorrente.
Em suma, procede a excepção de caducidade do direito de recurso, que importa a rejeição deste e a absolvição da entidade recorrida da instância, indo nesse sentido o meu parecer.
* * *
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
* * *
II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
III – FACTOS
São os seguintes elementos, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
DESPACHO
Assunto: Recurso Hierárquico (Concurso nº A17/CS/FIS/2019)
Recorrente: A
Conforme resulta do processado, o Recorrente A, candidato aprovado no concurso de acesso, condicionado para o preenchimento de um lugar de chefe de serviço, 1° escalão, da carreira médica, área funcional hospitalar, vertente de medicina física e reabilitação, do quadro de pessoal dos Serviços de Saúde, veio interpor Recurso Hierárquico solicitando a anulação do referido concurso.
Analisados todos os elementos fornecidos pelos autos, tal como resulta do posicionamento assumido pelo Júri, da Proposta nº 721/SS/P/2019, de 27 de Dezembro de 2019 do Exmo. Senhor Director e do Parecer elaborado por este Gabinete, nada ressalta que permita dar acolhimento às alegações constantes do recurso apresentado pelo Recorrente e, nessa medida, revogar a lista classificativa da prova de conhecimentos e proceder-se à realização de nova prova.
Com efeito, não houve qualquer desrespeito pelo princípio da legalidade, ou outro, como pretende o Recorrente, tendo havido cabal cumprimento do regime decorrente das regras insertas nos Pontos 6.1 do Aviso do Concurso e 3.1.1. dos Critérios de avaliação.
Nestes termos, face ao exposto, e atendendo a todo o invocado pelo Júri nas Actas nºs 5 e 6, pelo Exmo. Director dos Serviços de Saúde na Proposta nº 721/SS/P/2019, de 27 de Dezembro de 2019 e no parecer elaborado neste Gabinete com os quais se concorda e se seguem como fundamentação (artigo 115°, nº 1 CPA), cujos conteúdos se dão por integral e inteiramente reproduzidos, para todos os efeitos legais, nos termos do plasmado no artigo 161° CPA confirmo a lista classificativa da prova de conhecimentos relativa ao Concurso nº A17/CS/FIS/2019, negando, consequentemente provimento ao recurso hierárquico interposto por A.
Aos Serviços de Saúde, enviando o original do processo, para notificação do Recorrente, entregando cópias deste despacho, das Actas do Júri com os nºs 5 e 6, da Proposta n° 721/SS/P/2019, de 27 de Dezembro de 2019 do Exmo. Senhor Director (traduzidos) e do Parecer elaborado por este Gabinete, os quais fazem parte integrante deste Despacho decisório.
No acto de notificação deve ser o Recorrente informado de que desta decisão pode, no prazo de 30 (trinta) dias interpor recurso contencioso para o Tribunal de Segunda Instância - artigos 25°, nº 2 alínea a) do CPAC e 36°, 8) alínea (2) da Lei n° 9/1999, alterada em último pela Lei nº 4/2019 (LBOJ).
Arquive-se em dossier neste Gabinete o original do Parecer aqui emitido e, bem assim, cópia de todo o processado.
Gabinete da Secretária para os Assuntos Sociais e Cultura, aos 14 de Janeiro de 2020
* * *
IV – FUNDAMENTOS
Na contestação foi suscitada uma excepção: o presente recurso foi proposto fora do prazo legalmente fixado.
O Recorrente veio a replicar com os argumentos constantes de fls. 489 a 493, alegando como motivo justificativo o despoletar da Pandemia e o encerramento temporário da parte dos serviços públicos, não tendo juntado nenhum elemento probatório para este efeito.
Ora, importa calendarizar os factos relevantes neste domínio:
- Em 20/02/2020 (fls. 595) o Recorrente foi notificado do despacho que decidiu improcedente o recurso hierárquico por ele interposto, por ofício n.º 01/OF/CS/FIS/2020 com os respectivos anexos (fls. 592 a 595 do PA):
a) O texto integral do acto administrativo, incluindo a respectiva fundamentação, de facto e de direito, consubstanciado no despacho da Secretária para os Assuntos Sociais e Cultura, que integra as Actas do Júri do concurso com os n.os 5 e 6, a Proposta n.º 721/SS/P/2019 e o Parecer elaborado no respectivo Gabinete, conforme previsto no n.º 1 do artigo 115.° do CPA;
b) A identificação do processo administrativo, incluindo a indicação do autor do acto e a data deste (tanto no ofício como no despacho impugnado);
c) O órgão competente para apreciar a impugnação do acto e o prazo para esse efeito (tanto no ofício como no despacho impugnado);
d) A indicação de o acto ser susceptível de recurso contencioso (tanto no ofício como no despacho impugnado).
- Em 03/03/2020 o Recorrente formulou um novo pedido, requerendo junto da DSS a passagem de uma certidão de certos elementos, tendo invocado o artigo 27º/2 do CPAC (fls. 596 do PA).
São estes factos que importa analisar e decidir, antes de avançarmos para o mérito.
Ora, o artigo 27º (Suspensão da contagem dos prazos do recurso) do CPAC dispõe:
1. A contagem do prazo para interposição do recurso suspende-se nos períodos em que, por decisão administrativa, o acto se torne ineficaz.
2. Quando a notificação omita as indicações previstas no artigo 70.º do Código do Procedimento Administrativo ou a publicação não contenha os elementos enunciados no artigo 113.º e no n.º 4 do artigo 120.º do mesmo Código, pode o interessado requerer no prazo de dez dias à entidade que praticou o acto a notificação das indicações ou dos elementos em falta ou a passagem de certidão ou fotocópia autenticada que os contenha, ficando nesta hipótese suspenso, a partir da data da apresentação do requerimento e até à daquela notificação ou passagem, o prazo para interposição do recurso cuja contagem se tenha iniciado.
Ora, perante o quadro factual acima transcrito, podemos concluir com toda a clareza o seguinte:
1) – Dos elementos citados ressalta claramente a ideia de que o pedido de certidão formulado a coberto do referido artigo 27°/ 2 do CPAC não observou o prazo de 10 dias fixado nesse normativo. Pois, o último dia terminou em 02/03/2020. É certo que, neste ponto, o Recorrente invocou as orientações difundidas pelos SAFP a coberto da Comunicação OFC 2002070001/DRTSP-DERP, mas sem razão, já que se trata de orientações relativas ao período de 8 a 16 de Fevereiro, lapso temporal que em nada interfere com a prática dos actos subsequentes à notificação de 20 de Fevereiro de 2020, que levou o acto administrativo ao conhecimento do Recorrente.
2) – Observados os elementos fornecidos ao Recorrente com a notificação (cf. fls. 592 a 595-52 do processo instrutor), constata-se que tal notificação continha todas as indicações e dados previstos naquele inciso, cuja omissão habilita a desencadear o mecanismo do artigo 27°/2 do CPAC, com o efeito útil da suspensão do prazo para interposição do recurso. Ou seja, o Recorrente não estava em condições de se socorrer daquela norma e do seu efeito útil, embora pudesse sempre solicitar a certificação doutros elementos que tivesse por pertinentes para melhor apreender as circunstâncias e incidências do acto, mas aqui sem o efeito suspensivo aludido.
Pelo que, como o presente recurso foi interposto neste TSI em 05/05/2020, ele foi intempestivamente interposto, pois, já caducou o seu direito de atacar a decisão em causa, o que determina a rejeição do recurso nos termos do disposto no artigo 46º/2-h) do CPAC e absolver a Entidade Recorrida da instância (artigo 230º/1-e) do CPC, ex vi do disposto no artigo 1º do CPAC).
*
Síntese conclusiva:
O efeito de suspensão do prazo para interposição do recurso contencioso para atacar um acto administrativo, fixado pelo artigo 27º/2 do CPAC, só opera quando se verifica a falta dos elementos referidos nos artigos 70º, ou, 113º ou 120º/4, todos do CPA, e o pedido da passagem de certidão ou de fotocópias autenticadas destes elementos em falta tem de ser apresentado no prazo de 10 dias contados a partir da data da recepção da notificação, tal como prescreve o artigo 27º/2 do CPAC, sob pena de caducar o direito a recorrer da decisão administrativa desfavorável (quando o recurso contencioso vier a ser posposto no tribunal fora do prazo de 30 dias contados a partir da primeira notificação).
*
Tudo visto, resta decidir.
* * *
V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em rejeitar o recurso(artigo 46º/2-h) do CPAC), por ele ser interposto extemporaneamente e absolver a Entidade Recorrida da instância (artigo 230º/1-e) do CPC, ex vi do disposto no artigo 1º do CPAC).
*
Custas pelo Recorrente que se fixa em 3 UCs.
*
Notifique e Registe.
(…)”; (cfr., Ac. do T.S.I. proferido nos Autos de Recurso Contencioso n.° 404/2020, a fls. 500 a 507-v, que como as que se vierem a referir dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
*
Inconformado com o assim decidido, traz o mesmo recorrente o presente recurso (jurisdicional), insistindo na “tempestividade” do recurso (contencioso antes) apresentado no Tribunal de Segunda Instância; (cfr., fls. 515 a 520).
*
Respondendo, e em conclusões, diz a entidade administrativa recorrida que o Acórdão recorrido não merece reparo; (cfr., fls. 530 a 538).
*
Admitido que foi o recurso com o efeito e modo de subida adequadamente fixados, vieram os autos a esta Instância, onde, após despacho preliminar, foram a vista do Exmo. Magistrado do Ministério Público.
*
Em douto Parecer que juntou aos autos, considera o Exmo. Representante do Ministério Público que o presente recurso merece provimento; (cfr., fls. 547 a 553).
*
No prosseguimento da devida tramitação processual, foram os autos aos vistos dos Mmos Juízes-Adjuntos.
*
Merecendo o recurso conhecimento, vejamos se merece provimento.
Fundamentação
2. Como resulta do que até aqui se deixou relatado, o presente recurso (jurisdicional) tem como objecto o Acórdão pelo Tribunal de Segunda Instância prolatado (e atrás transcrito) que considerou “extemporâneo” – porque tardio – o anterior recurso (contencioso) que o ora (também) recorrente aí apresentou.
E, como igualmente se colhe das alegações e conclusões pelo dito recorrente produzidas em sede da presente lide recursória, em bom rigor, (apenas) duas são as “razões” pelo mesmo invocadas para a sua pretensão no sentido de obter a revogação e inversão do decidido pelo Tribunal de Segunda Instância, e que, desta forma, traz à apreciação e decisão deste Tribunal.
A primeira, assacando à decisão recorrida “erro na contagem do prazo para o recurso”, (mais concretamente, em resultado do que considera terem sido “efeitos” que a “Pandemia do COVID-19” terá provocado, e que, em seu entender, deu lugar à “suspensão/interrupção do funcionamento” dos Serviços da Administração Pública, no caso, dos “Serviços de Saúde de Macau”, cujos dias, deviam, assim, ser – adequadamente – descontados do referido prazo; cfr., “conclusão A”).
A segunda, dado que entende que em sede da sua petição de recurso (contencioso) invocou também a “nulidade do acto administrativo” (então) impugnado, o que, por aplicação do estatuído no art. 25°, n.° 1 do C.P.A.C., implica, necessariamente, a conclusão de que “caduco” não está o seu “direito ao recurso” em questão, pois que em tal caso, o mesmo pode ser exercido “a todo o tempo”, considerando, também, que sobre tal questão nada se disse no Acórdão recorrido; (cfr., “conclusão B”).
Ora, da análise aos autos, e da reflexão que sobre o decidido no Acórdão recorrido assim como em relação às colocadas “questões” pudemos efectuar, eis o que se nos mostra de consignar.
–– Atento o estatuído no art. 74° do C.P.A.C., e, começando, assim – como para o caso dos autos até se nos apresenta mais lógico – pela “segunda questão”, temos para nós que se impõe reconhecer razão ao ora recorrente.
Com efeito, pelo mesmo foi efectivamente alegado que o “acto administrativo objecto do recurso para o Tribunal de Segunda Instância padecia de nulidade”; (cfr., v.g., o alegado no ponto 35° e 53° da sua petição de recurso, e a alínea K da conclusão aí a final produzida).
E – independentemente do demais, e – como de uma leitura ao veredicto em questão se mostra de constatar, sobre esta dita (invocada) “nulidade” nada foi dito no Acórdão recorrido, necessária sendo desta forma a consideração de que, com tal “omissão de pronúncia” se incorreu na “nulidade” a que diz respeito o art. 571°, n.° 1, al. d) do C.P.C.M., aos presentes autos aplicável por força do estatuído no art. 1° do C.P.A.C., (que dita a aplicação subsidiária da lei de processo civil ao presente processo de contencioso administrativo).
Apresentando-se-nos o que se deixou consignado como o adequado e incontroverso, à vista está a solução para a questão, (sendo, porém, de notar, que não se acolhe a argumentação da entidade recorrida no sentido de que o Tribunal a quo não deixou de declarar que “não haviam nulidades”, pois que o assim consignado, dada até a sua “localização” no veredicto recorrido, em sede de pronúncia sobre os “pressupostos processuais”, [cfr., pág, 8 deste aresto], para além de se apresentar meramente “tabelar”, não se pode ter como apreciação e decisão relativamente ao concreto vício de “nulidade” pelo recorrente assacado ao acto administrativo recorrido).
*
Aqui chegados, óbvio e imperativo se apresenta o sentido da decisão que a este Tribunal de Última Instância cabe adoptar e proferir.
Contudo, e sem prejuízo do que se deixou consignado, “duas considerações (adicionais)” se nos mostram oportunas e adequadas.
–– A primeira, para se consignar que labora o recorrente em manifesto equívoco quanto às – suas – “razões” pelas quais entende que se incorreu em “erro na contagem do prazo de recurso” e que, (por este motivo), se deveria assim considerar que tempestivo foi o recurso contencioso que apresentou.
Vejamos.
Diz – insiste – o recorrente, afirmando que “Reitera-se que os Serviços Públicos estiveram encerrados entre 30 de Janeiro de 2020 e 02 de Março de 2020, inclusivamente a Secretaria Administrativa da DSS”; (cfr., ponto 11 da sua motivação, a fls. 518).
Pois bem, cabe desde já notar que nos termos do art. 96° do C.P.C.M. (para a situação também aplicável):
“1. Considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto.
2. A parte que alegar o justo impedimento deve oferecer logo a respectiva prova; o juiz, ouvida a parte contrária, admite o requerente a praticar o acto fora do prazo, se julgar verificado o impedimento e reconhecer que a parte se apresentou a requerer logo que ele cessou”.
Ora, em face da redacção e ratio do transcrito preceito, razoável e mais adequado seria que a alegação de (eventual) “justo impedimento” – pela parte que dele pretende beneficiar – seja feita no mesmo e exacto “momento da prática do acto”, e não, tão só após arguida estar a sua extemporaneidade, como em face do que se deixou relatado se mostra de concluir ser o que, in casu, sucedeu.
Porém, seja como for, (e independentemente do demais), em sede desta questão um outro aspecto se apresenta de aqui ponderar e clarificar.
Com efeito, a afirmação pelo recorrente efectuada quanto ao “período de encerramento dos Serviços Públicos” não corresponde à verdade, pois que em face do que os presentes autos demonstram, (e como também cremos ser público e notório), razão tem a entidade recorrida quando diz que “Com efeito, basta uma simples consulta ao sítio da Direcção dos Serviços de Administração e Função Pública (SAFP) na Internet para se verificar no separador Documentos orientadores / Ofício Circulares Orientadores, onde constam todas as orientações do Governo relativas à crise Pandémica, que os serviços públicos deveriam manter a prestação dos serviços essenciais ao público e garantir o seu próprio funcionamento a partir de 17 de Fevereiro de 2020 (orientações dos SAFP de 14 e 21 de Fevereiro de 2020)” e que “(…) a Secção de Expediente dos Serviços de Saúde nunca encerrou os serviços ao público durante a Pandemia, tendo estado a funcionar no citado período de 30 de Janeiro a 2 de Março de 2020, o que é um facto público e notório”; (cfr., ponto 11 e 13 da sua resposta ao recurso, a fls. 533 a 534).
Continuemos.
–– A segunda consideração que se mostra oportuna e adequada tem a ver com o pelo Exmo. Magistrado do Ministério Público opinado no seu douto Parecer, onde pugna pela “tempestividade do recurso” pelo recorrente então interposto no Tribunal de Segunda Instância com base em “razões” que, em virtude do “efeito” que pode produzir na tramitação e decisão a proferir nos presentes autos se tem como integrantes do poder de cognição desta Instância.
Dest’arte, vejamos.
Na parte em questão, (que vale a pena aqui atentar), assim ponderou o Exmo. Magistrado do Ministério Público:
“(…)
De acordo com o disposto no artigo 110.º, n.º 1 do CPAC, «o pedido de prestação de informação, consulta de processo ou passagem de certidão dirigido a órgão administrativo, quando se destine a permitir ao interessado o uso de meios procedimentais administrativos ou processuais contenciosos, determina, a partir da data da sua apresentação, a suspensão da contagem dos respectivos prazos».
Trata-se, como é bom de ver, de uma norma que, do ponto de vista sistemático, está deslocada. É uma norma puramente procedimental que, no entanto, está prevista na lei de processo. Na verdade, o que naquela norma se prevê é a consequência da apresentação, perante a Administração, de um pedido de prestação de informação, consulta de processo ou passagem de certidão ao abrigo das normas dos artigos 63.º a 67.º do CPA, quando esteja em curso um prazo para a utilização de um meio procedimental administrativo ou processual contencioso, em momento anterior, portanto, ao da existência de qualquer processo de natureza contenciosa. Daí o seu evidente carácter procedimental.
Da dita norma resulta, para o que agora releva, que, quando o interessado efectuar um pedido de prestação de informação, consulta de processo ou passagem de certidão que se destine a permitir-lhe fazer uso de um meio processual contencioso ou procedimental administrativo (por exemplo, um recurso contencioso ou recurso hierárquico), tal pedido suspende a contagem do prazo desse meio processual contencioso ou procedimental gracioso.
Esta norma do artigo 110.º n.º 1 do CPAC, na previsão do efeito suspensivo sobre o prazo, concorre, num certo sentido, com a do n.º 2 do artigo 27.º do CPAC. Todavia, uma e outra têm, naturalmente, âmbitos de aplicação diferentes. A norma do n.º 2 do artigo 27.º do CPAC reporta-se exclusivamente às situações em que a notificação do acto não foi acompanhada dos chamados elementos não essenciais a que se reporta o artigo 70.º do CPA e apenas opera sobre o prazo do recurso contencioso; já a norma do artigo 110.º, n.º 1 do CPAC abrange as demais situações em que esteja em causa um pedido de prestação de informação, consulta de processo ou passagem de certidão que se destine a permitir ao interessado o uso de um qualquer meio processual contencioso e procedimental administrativo não apenas do recurso contencioso.
Não resulta expressamente da norma do n.º 1 do artigo 110.º do CPAC, ao contrário do que sucede em relação à do n.º 2 do artigo 27.º do CPAC, uma resposta à questão de saber em que momento cessa o efeito suspensivo que decorre da apresentação do requerimento de pedido de prestação de informação, consulta de processo ou passagem de certidão.
De acordo com uma certa interpretação, que parte da norma do n.º 2 do mesmo artigo, a suspensão deveria manter-se até que se esgote o prazo de 20 dias a que se refere o artigo 109.º do CPAC. E então, uma de duas: ou o interessado instaura a acção de intimação e a suspensão mantém-se até que cesse por alguma das razões referidas no n.º 2 do artigo 110.º ou o interessado não instaura a acção de intimação e nesse caso, uma vez decorridos aqueles 20 dias, cessaria o efeito suspensivo (assim, JOSÉ CÂNDIDO DE PINHO, Notas e Comentários ao Código de Processo Administrativo Contencioso, Volume II, 2018, p. 102 e, em sentido aproximado, VIRIATO LIMA – ÁLVARO DANTAS, Código de Processo Administrativo Contencioso Anotado, 2015, p. 96).
Relendo a norma em causa não nos parece que seja esta a melhor interpretação.
A nosso ver, a suspensão da contagem do prazo que resulta do pedido de pedido de prestação de informação, consulta de processo ou passagem de certidão cessa quando tal pedido for objecto de decisão expressa, seja no sentido do seu deferimento total, seja no sentido do seu deferimento parcial, seja, finalmente, no sentido da recusa expressa de satisfação da pretensão.
O que acontece é que, nas situações de recusa expressa e de satisfação parcial da pretensão, caso o interessado venha a deduzir intimação judicial nos termos do artigo 108.º do CPAC, a lei, no n.º 2 do artigo 110.º do mesmo diploma, como que ficciona a manutenção do efeito suspensivo no período que decorreu entre a decisão do pedido de passagem de certidão e a apresentação do pedido de intimação judicial, de forma que não haja qualquer solução de continuidade no que à suspensão concerne.
Porém, se o pedido de intimação não vier a ser deduzido, é evidente, pelo menos para nós, que tem de se considerar que o efeito suspensivo cessou no momento da notificação da recusa expressa da passagem de certidão ou da satisfação parcial da pretensão do interessado já que não se vislumbra qualquer fundamento para manter o efeito suspensivo por mais 20 dias, que é o prazo para a dedução da intimação judicial, caso o interessado não venha a lançar mão de tal meio processual. Para nós, a cessação do efeito suspensivo ocorre, pois, com a decisão expressa do pedido de passagem de certidão. Os efeitos dessa cessação ficam, no entanto, no caso de indeferimento total ou parcial do pedido, sujeitos, eles próprios, a uma condição que é a da não apresentação do pedido de intimação judicial.
De mais difícil resposta é a questão de saber o que acontece nas situações em que a Administração não passa a requerida certidão nem se recusa expressamente a fazê-lo, ou seja, nas situações de inércia da Administração.
Temos para nós que, mesmo nessas situações, o efeito suspensivo não cessa enquanto a Administração não passar a certidão ou enquanto não recusar, expressamente a sua passagem. É o que decorre expressamente da parte final da norma do n.º 2 do artigo 27.º do CPAC que, neste ponto, deve ser aplicada às demais situações em que tenha sido efectuado um pedido de passagem de certidão que se destine a permitir o uso de meios processuais contenciosos, por força da assimilação de regime que decorre do n.º 2 do artigo 108.º do CPAC ou, quando não, por manifesta analogia.
Assim, em nosso modesto entendimento, o regime legal sobre a matéria que resulta da interpretação conjugada das diversas normas, é o seguinte: apresentado um pedido de passagem de certidão, seja nos termos especificamente previstos no artigo 27.º, n.º 2, seja nos termos gerais do artigo 108.º, n.º 1 do CPAC, mas tendo em vista permitir ao interessado o uso de meios procedimentais administrativos ou procedimentais contenciosos, ocorrerá a suspensão dos prazos de impugnação que estiverem em curso. Tal suspensão cessará se e quando a Administração passar a requerida certidão, dando satisfação total ou parcial ao pedido, ou recusar expressamente tal passagem.
Acaso a Administração, no prazo de 10 dias úteis a que se refere o n.º 4 do artigo 63.º do CPA, não passe a requerida certidão nem profira decisão expressa de recusa, incumprindo, assim, o dever legal de decisão, fica aberta ao interessado a possibilidade de requerer a intimação judicial nos termos do artigo 108.º, nºs 1 e 2 do CPAC. Trata-se, no entanto, na perspectiva da manutenção do efeito suspensivo resultante da apresentação do requerimento, de uma faculdade e não de um ónus de cuja observância fique dependente a manutenção da suspensão do prazo de impugnação administrativa ou contenciosa. O interessado só terá esse ónus de deduzir o pedido de intimação judicial com vista à manutenção do dito efeito suspensivo nas situações de decisão expressa do pedido de passagem de certidão que total ou parcialmente desfavorável.
É certo que, face à infeliz redacção da norma do artigo 109.º do CPAC, a não dedução do pedido de intimação nas situações de inércia da Administração preclude a possibilidade de o interessado o fazer posteriormente, mesmo que haja acto expresso de recusa, porquanto de acordo com aquela norma, a intimação deve ser pedida no prazo de 20 dias contado da ocorrência do primeiro dos factos previstos nas diversas alíneas do referido artigo 109.º do CPAC, mas a verdade é que, face à letra da norma do n.º 2 do artigo 27.º do mesmo diploma legal, não existe fundamento para considerar que o efeito suspensivo do prazo de impugnação cessa pelo mero decurso do prazo do n.º 4 do artigo 63.º do CPA.
E também não vemos que se possa invocar o n.º 2 do artigo 110.º do CPAC para sustentar que dele decorre o efeito suspensivo apenas se mantém se for deduzida intimação, sendo que esta, de acordo com a alínea a) do artigo 109.º do CPAC, tem de ser deduzida no prazo de 20 dias a contar do termo do prazo do n.º 4 do artigo 63.º do CPA.
Na verdade, daquela norma do n.º 2 do artigo 110.º do CPAC o que resulta é apenas o seguinte: se o interessado apresentar intimação judicial esta também tem efeito suspensivo que se mantém, sem solução de continuidade, desde a apresentação do pedido perante a Administração. É apenas esse o sentido normativo dessa norma e, portanto, dele não se pode extrair a imposição de um ónus ao interessado no sentido de ter de deduzir intimação judicial assim que ocorre o «indeferimento tácito» do seu pedido para poder manter o efeito suspensivo deste (sempre se diga que essa norma corresponde à que, no âmbito da anterior legislação processual administrativa, se encontrava no artigo 85.º da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos e nos termos da qual o efeito suspensivo sobre os prazos para os meios administrativos ou contenciosos só ocorria com a apresentação da intimação judicial e prolongava-se até ao trânsito em julgado da decisão que indeferisse o pedido ou da que o deferisse e não, ao contrário do actual regime resultante do artigo 110.º, n.º 1 do CPAC, com o pedido feito perante a Administração. O que com esta nota queremos salientar é que o alcance normativo do n.º 2 do artigo 110.º do CPAC não difere do artigo 85.º da antiga LPTA: num e noutro o legislador apenas visou regular o efeito da intimação judicial sobre os prazos dos meios impugnatórios contenciosos ou graciosos).
Aliás, sempre se diga que, do ponto de vista material, esta nossa proposta interpretativa nos parece traduzir um maior equilíbrio entre as posições da Administração e do particular. A Administração tem um dever legal de decidir sobre o pedido de passagem de certidão no prazo fixado no referido n.º 4 do artigo 63.º do CPA e se o não faz isso representa uma violação flagrante desse dever que, em princípio, e como bem se compreende não deve reverter em prejuízo do particular.
Finalmente, uma última nota para salientar que a lei não deixar de prever um mecanismo para prevenir abusos. Com efeito, de acordo com o n.º 3 do artigo 110.º do CPAC, «não se verifica o efeito suspensivo quando o tribunal competente para o conhecimento do meio processual contencioso que venha a ser usado pelo interessado julgue que o pedido constituiu expediente manifestamente dilatório».
(…)”; (cfr., fls. 548-v a 552).
Pois bem, antes de mais, mostra-se de salientar que a “solução” em questão – se outro mérito não tivesse, (e, decididamente, tem) – representa, em nossa opinião, e tanto quanto julgamento saber, uma abordagem inovadora no que toca ao tratamento da matéria da “(suspensão da) contagem dos prazos” para efeitos de se decidir da tempestividade, (ou não), de um recurso em contencioso administrativo; (aliás, e do que nos foi possível apurar, consigna-se, desde já, que a dita “questão da suspensão da contagem dos prazos” para o recurso contencioso tem sido objecto de solução diversa; podendo-se, cfr., v.g., o Ac. do T.S.I. de 18.01.2018, Proc. n.° 933/2016, onde, por unanimidade, se entendeu, nomeadamente, que o “interessado que lança mão do pedido de intimação de informação, nos termos dos artigos 63.º e seguintes do CPA, pode beneficiar da suspensão do prazo de utilização de meios procedimentais administrativos ou contenciosos, a partir da dedução do pedido junto da Administração, ao abrigo do n.º 1 do artigo 110.º do CPAC.
O efeito suspensivo apenas se mantém caso a intimação judicial for feita ao abrigo dos artigos 108.º e 109.º do CPAC, no prazo de 20 dias contado da ocorrência do primeiro dos seguintes factos:
a) decurso do prazo de 10 dias úteis (cfr. Artigo 63.º, n.º 4 do CPA) sem que o órgão administrativo tenha dado satisfação ao pedido;
b) recusa expressa de satisfação do pedido; ou
c) satisfação parcial do pedido.
Decorrido o prazo de 10 dias úteis previsto no n.º 4 do artigo 63º do CPA sem que a Administração tenha satisfeito o pedido da recorrente, e não logrando oportunamente lançado mão da acção para prestação de informação ou passagem de certidão prevista nos termos do artigo 108.º e seguintes do CPAC, cessa a suspensão do prazo concedida pelo n.º 1 do artigo 110.º do CPAC” – vd., o sumário do referido veredicto, que também foi citado pela entidade administrativa em expediente que veio juntar aos autos, a fls. 557 a 560 após, em obediência ao contraditório, lhe ter sido dado conhecimento do referido Parecer do Ministério Público, sendo, também este o sentido das considerações que sobre a questão são tecidas por J. Cândido Pinho in, “Notas e Comentários ao C.P.A.C.”, Vol. II, pág. 68 e segs., e V. Lima e A. Dantas in, “Código de Processo Administrativo Contencioso Anotado”, pág. 96, também citados no referido Parecer).
Porém, e atento o sucedido nos presentes autos, importa ter presente que a solução agora apresentada pelo Ministério Público tem um “campo de aplicação” (extremamente) limitado, dizendo tão só respeito a uma (única) “situação”, perfeitamente recortada e identificada, isto é, apenas para o caso de o particular, ao abrigo do art. 63° do C.P.A., requerer à Administração que lhe sejam facultados documentos ou elementos informativos do processo no qual é interessado directo e em sede do qual foi proferida uma decisão administrativa que lhe é “prejudicial”, (ou que o afecte na sua esfera jurídica, em relação à qual, lhe cabe o “direito fundamental – diríamos, “natural” – de reagir pelos meios que a Lei lhe coloca ao dispor, no caso, para recorrer contenciosamente), e em que em violação do “dever” (de decisão) que a Administração se impôs a si própria de apreciar e de se pronunciar sobre as pretensões que lhe são dirigidas, (pura e simplesmente), “nada diz”.
Com efeito, é apenas, e tão só, para esta “situação” – do “silêncio” – da Administração, que se opina no sentido de se entender que “prejudicado” não deve ficar o particular, cabendo-lhe, (sob pena da contagem e decurso do prazo para recorrer), o dever de ter que “insistir”, novamente, (agora, servindo-se da “acção de intimação” prevista no art. 108° e segs. do C.P.A.C.), intimando a Administração para efeitos de, beneficiando da suspensão do prazo para reagir, poder vir a obter o que antes já tinha solicitado e não lhe foi facultado, por (absoluta) inércia da entidade a que cabia o dever de o fazer, tornando, desta forma, as “regras do jogo” (claramente) “desiguais”, e até mesmo em – pelo menos, aparente – colisão aos “Princípios gerais” que regulam a matéria; (enunciados no Capítulo II do C.P.A., onde, entre outros, figuram, o “princípio de legalidade”, [cfr., art. 3°]; o da “prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos residentes”, [cfr., art. 4°]; o da “igualdade e da proporcionalidade”, [cfr., art. 5°]; o da “justiça e da imparcialidade”, [cfr., art. 7°]; o da “boa fé”, [cfr., art. 8°]; o da “colaboração entre a Administração e os particulares” , [cfr., art. 9°]; o da “decisão”, [cfr., art. 11°]; e o da “desburocratização e da eficiência”, [cfr., art. 12°], cabendo ainda aqui destacar, porque especialmente relevantes para o caso, o preceituado nos art°s 63° e 67°, respeitante ao “direito dos interessados à informação” e o “princípio da administração aberta”).
Na verdade, cremos mesmo que até por uma questão de “equilíbrio” (muito) razoável não se mostra impor-se ao particular o dever de ter de agir, desejável sendo que não tivesse que “insistir” no pedido já feito, submetendo-se às “formalidades” (e “burocracias”) legalmente impostas para a propositura de uma “acção de intimação”, (onde, de entre outras, tivesse, nomeadamente, de constituir mandatário para o representar, com os encargos que a tal são inerentes…).
Contudo, se bem ajuizamos, (e sem prejuízo do muito respeito por entendimento em sentido diverso), apresenta-se-nos que a “solução em questão” – não obstante (extremamente) “tentadora” – colide com o que (expressamente) consta do regime legal que, (“de iure constituto”), a regula.
Com efeito, nos termos do art. 63° do C.P.A.:
“1. Os particulares têm o direito de ser informados pela Administração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos procedimentos em que sejam directamente interessados, bem como o direito de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas.
2. As informações a prestar abrangem a indicação do serviço onde o processo se encontra, os actos e diligências praticados, as deficiências a suprir pelos interessados, as decisões adoptadas e quaisquer outros elementos solicitados.
3. Não podem ser prestadas informações sobre peças ou elementos:
a) Que, nos termos legais, estejam classificados como secretos ou confidenciais, enquanto essa classificação não for retirada pela entidade competente;
b) Cujo conhecimento pelos interessados possa comprometer o fim principal do procedimento ou direitos fundamentais de outras pessoas.
4. As informações solicitadas ao abrigo deste artigo devem ser fornecidas no prazo máximo de dez dias úteis.
5. A recusa da prestação de informações é sempre fundamentada e, se o interessado o solicitar, formulada por escrito”.
Por sua vez, (relativamente ao transcrito art. 63° e já em sede da “Acção para prestação de informação, consulta de processo ou passagem de certidão”), preceitua o art. 108° do C.P.A.C. que:
“1. Quando não seja dada satisfação às pretensões formuladas ao abrigo dos artigos 63.º a 67.º do Código do Procedimento Administrativo ou de lei especial sobre direito dos particulares à informação, consulta de processo ou passagem de certidão, o interessado ou o Ministério Público podem pedir a intimação do órgão administrativo competente nos termos e com os efeitos previstos na presente secção.
2. O pedido de intimação é igualmente aplicável na hipótese prevista no n.º 2 do artigo 27.º
3. À legitimidade na acção para prestação de informação, consulta de processo ou passagem de certidão é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto na alínea f) do n.º 2 do artigo 46.º e no artigo 47.º”.
No que toca ao “prazo” desta “intimação” estatui o também art. 109° do mesmo C.P.A.C. que:
“A intimação deve ser pedida no prazo de 20 dias contado da ocorrência do primeiro dos seguintes factos:
a) Decurso do prazo, contado da data de apresentação da pretensão, sem que o órgão administrativo a satisfaça;
b) Recusa expressa de satisfação da pretensão;
c) Satisfação parcial da pretensão”.
E, quanto à “suspensão da contagem do prazo” preceitua o seguinte art. 110° que:
“1. O pedido de prestação de informação, consulta de processo ou passagem de certidão dirigido a órgão administrativo, quando se destine a permitir ao interessado o uso de meios procedimentais administrativos ou processuais contenciosos, determina, a partir da data da sua apresentação, a suspensão da contagem dos respectivos prazos.
2. O efeito suspensivo, incluindo o previsto na parte final do n.º 2 do artigo 27.º, mantém-se quando o interessado peça a subsequente intimação e cessa:
a) Com o cumprimento da decisão que defira o pedido de intimação ou com o trânsito em julgado da que o indefira;
b) Com o trânsito em julgado da decisão que extinga a instância por satisfação da pretensão na pendência do pedido de intimação.
3. Não se verifica o efeito suspensivo quando o tribunal competente para o conhecimento do meio processual contencioso que venha a ser usado pelo interessado julgue que o pedido constituiu expediente manifestamente dilatório”.
Atento o assim estatuído sobre a matéria, ponderando na “redacção” dos preceitos em causa e na sua “razão de ser”, não tendo o legislador feito (qualquer) distinção entre o “silêncio da Administração”, (ou seja, a “falta de resposta”), e a “recusa expressa” (ou da “satisfação parcial”) ao pedido de prestação de informação para efeitos da contagem do prazo de 20 dias a ter em conta para a “acção de intimação”, (cfr., o transcrito art. 109°), o mesmo sucedendo, igualmente, em relação à “suspensão da contagem do prazo com tal pedido de intimação”, (cfr., art. 110°), adequado não se mostra de considerar o pelo Exmo. Magistrado do Ministério Público sugerido para a questão, no sentido de, no caso, se dever atribuir um “especial efeito” ao “silêncio” da Administração, até mesmo porque necessário seria então alterar (e inverter) o que (vem sendo entendido e) está estatuído relativamente ao “valor do silêncio da Administração”, (cfr., art. 101° e 102° do C.P.A., sobre o “deferimento” e “indeferimento tácito”; podendo-se também ver, v.g., J. E. Figueiredo Dias in, “Manual de Formação de Direito Administrativo de Macau”, 2ª ed., C.F.J.J., 2020, pág. 327 e segs.), em manifesto desrespeito às normas sobre a “interpretação da Lei” previstas no art. 8° do C.C.M..
Na verdade, e como já dizia Jean Bodin – in “Les Six Livres de la République” – aos juízes não cabe julgar as leis, mas julgar segundo as leis…
E cabendo ao intérprete ter “sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico”, devendo presumir que “o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos mais adequados”, (cfr., art. 8°, n.° 1 e 3 do C.C.M.), evidente se nos apresenta também que ao Tribunal não cabe distinguir onde o legislador não distinguiu; (“ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemos”).
Não se olvida que esta “velha máxima” já mereceu o qualificativo de “obsoleta”; (cfr., v.g., A. Varela in “R.L.J.” n.° 123-30).
Porém, em face da redacção dos preceitos atrás transcritos, em especial, no art. 109°, al. a), (onde se prevê, expressamente, a situação do “silêncio da Administração”), e art. 110°, n.° 1 do C.P.A.C., e atento, igualmente, ao preceituado no n.° 2 do art. 8° do C.C.M. – onde se estatui que “Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” – cremos que, neste ponto, vale, de pleno, o dito brocardio clássico, razões válidas não se vislumbrando para, in casu, se fazer uma interpretação que se afaste do respeito que o mesmo nos merece.
Dest’arte, em face do que se deixou exposto, e perante a (atrás) referida “nulidade por omissão de pronúncia”, cabe pois decidir no sentido da devolução dos presentes autos ao Tribunal de Segunda Instância para, nada obstando, se proferir decisão sobre a questão a que a mesma diz respeito.
Decisão
3. Nos termos e fundamentos que se deixam expostos, em conferência, acordam conceder parcial provimento ao recurso, devendo os autos voltar ao Tribunal de Segunda Instância nos exactos termos consignados.
Custas pelo recorrente, em relação ao seu decaimento, com a taxa que se fixa em 5 UCs.
Registe e notifique.
Oportunamente, e nada vindo de novo, remetam-se os presentes autos ao Tribunal de Segunda Instância com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 26 de Maio de 2021
Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei
O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Álvaro António Mangas Abreu Dantas
Proc. 5/2021 Pág. 12
Proc. 5/2021 Pág. 13