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Processo nº 355/2021
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 17 de Junho de 2021
Recorrente: A, S.A. (1ª Ré)
Recorrido: B (Autor)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I - RELATÓRIO
  Por sentença de 02/03/2021, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a 1ª Ré A, S.A. a pagar ao Autor B a quantia de MOP$352,620.94, acrescida de juros moratórios à taxa legal.
Dessa decisão vem recorrer a 1ª Ré, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
1. Vem o presente recurso interposto da douta Sentença de fls. 291 a 310 dos autos, na parte em que julga improcedente a excepção peremptória de prescrição.
2. A 1ª Ré A, ora Recorrente, não se conforma com a aludida decisão, por entender que a mesmo incorre em erro na aplicação de Direito, pugnando pela revogação da mesma por banda desse Venerando Tribunal de Segunda Instância da RAEM.
3. Em 27/07/2020, o Autor, ora Recorrido, intentou a presente acção de processo comum do trabalho contra a A, aqui Recorrente e a D, peticionando a condenação da 1ª Ré A no pagamento de uma indemnização global de MOP$346,200.00 e da 2ª Ré D no valor global de MOP$651,571.00, a título de créditos laborais emergentes das relações laborais do Autor com as Rés, alegando para tanto, entre outros factos, que o Autor prestou serviço à 1ª Ré A, entre 1 de Agosto de 1998 a 20 de Julho de 2003 e prestou serviço à 2ª Ré D desde 21 de Julho de 2003 até ao presente.
4. Em sede de contestação, a 1.ª Ré aduziu uma defesa por excepção, arguindo a prescrição dos créditos laborais reclamados pelo Autor emergentes da relação laboral, nos termos do disposto nos artigos 311, n.º 1, alínea c) e 315.º, n.º 1, ambos do Código Civil (doravante "CC").
5. O Autor respondeu, alegando, em suma, que "por força do Despacho nº 01949/SEF/2003, nos termos do qual a 2.ª Ré (D) foi autorizada a explorar todos os casinos pertencentes à 1.ª Ré (A), razão pela qual todos os trabalhadores não residentes permaneceram nos seus postos de trabalho por força da transferência das autorizações concedidas para a contratação dos referidos 280 trabalhadores (...)", pelo que, em sua opinião, os créditos reclamados pelo Autor não se encontram prescritos.
6. O Meritíssimo Juiz, por douta Sentença de fls. 291 a 310 dos autos, a Sentença ora recorrida, concordou com o teor da resposta do Autor e decidiu julgar improcedente a excepção peremptória da prescrição.
7. Verificou-se uma efectiva cessação - termo - do contrato de trabalho, isto é, a relação laboral entre Autor e 1ª Ré iniciou-se a 1 de Agosto de 1998 e terminou a 20 de Julho de 2003, o que conduz à prescrição dos créditos laborais emergentes da relação laboral subjacente a esse contrato de trabalho, nos termos do disposto no artigo 27.º, n.º 3 do CPT, e artigos 302.º, 311.º, n.º 1, alínea c) e 315.º, n.º 1, todos do CC.
8. A A e a D, são pessoas jurídicas distintas, como são distintas as relações laborais estabelecidas entre aquelas e o Autor.
9. Resulta dos factos dados como provados: "2. Entre 01/08/1998 a 20/07/2003, o Autor esteve ao serviço da A prestando funções de "guarda de segurança", enquanto trabalhador não residente (B); 9. Por força do Despacho nº 01949/IMO/SEF/2003 do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da A para a Ré D, com efeitos a partir de 21/07/2003 (1.º); C. Desde 21/07/2003 até ao presente o Autor presta trabalho para a Ré (D).".
10. Estamos perante duas relações laborais distintas e é o próprio Autor, que faz essa distinção ao deixar claro que trabalhou para a ora Recorrente (A) até 20 de Julho de 2003 para, depois dessa data, iniciar uma nova relação jurídica com a Ré D.
11. O Autor formula pedidos distintos contra cada uma das Rés, exercendo direitos autónomos e independentes, tratando-se de entidades patronais diferentes, sendo que a D apenas surge em 2003, ocorrendo nesta data a transferência de trabalhadores da A para a D.
12. É certo que houve uma transferência das autorizações concedidas para a contratação de 280 trabalhadores não residentes, daí não decorre, porém, nem se pode concluir, salvo o devido respeito, que o Autor manteve com a 2ª Ré a relação de trabalho que tinha com a 1ª Ré, isto é, não se pode concluir que o Autor trabalhava sob a égide de uma só relação de trabalho.
13. A efectiva cessação de contrato de trabalho resulta, pois, do próprio Despacho do Gabinete do Secretário para a Economia e Finanças, parágrafos 5 e 6º, donde se pode ler o seguinte:
"Autorizo, após parecer favorável da Direcção dos Serviços de Trabalho e Emprego, a transferência das autorizações concedidas para a contratação de 280 (duzentos e oitenta) trabalhadores não residentes, afectos ao casino XXX - A para a D, S.A. segundo o regime do Despacho nº 12/GM/88, de 1 de Fevereiro, devendo esta apresentar contrato de prestação de serviços com a entidade habilitada como fornecedora de mão - de - obra não residente, nos termos da línea c) do despacho 12/GM/88 de 1 de Fevereiro. Cancelo, nos termos do nº 10 do mesmo Despacho, as autorizações anteriormente concedidas ao Casino XXX - A, para a contratação de 280 (duzentos e oitenta) trabalhadores não residentes, bem como os respectivos contratos de prestação de serviços."
14. Daí decorre que não só foi autorizada a transferência das autorizações anteriormente concedidas à Ré A para a contratação dos 280 trabalhadores não residentes, como efectivamente foram estas mesmas canceladas, impondo-se a celebração, por banda da nova entidade patronal, qual seja a 2ª Ré D, de novos contratos de prestação de serviços, ex novo.
15. Não resulta do aludido Despacho do Gabinete do Secretário para a Economia e Finanças, nem tampouco da douta Sentença, facto algum que permita concluir que os contratos de trabalho celebrados com as Rés A e D não sejam dois contratos de trabalhos distintos entre si.
16. No presente caso, verificou-se o efectivo termo da relação laboral entre Autor e 1ª Ré A.
17. Tanto assim é que o Autor formulou pedidos de indemnização diferentes contra cada uma das suas entidades patronais, 1ª e 2ª Rés, reclamando créditos laborais relativos e emergentes de relações laborais distintas, de contratos de trabalho distintos.
18. Entendeu o douto Despacho sufragar pelo entendimento seguido pelo Tribunal de Segunda Instância no âmbito do Acórdão n.º 1280/2019, de que: "(...) não obstante juridicamente distinta da D, a A é uma sociedade vulgarmente denominada sociedade-mãe da D por ser sócio dominante desta. (...) uma vez que, mesmo após a sucessão da D na posição contratual da A, esta não deixa de ser a entidade a quem o trabalhador se encontra "subordinado"."
19. Porém, salvo o devido respeito, tal questão não consta da matéria de facto considerada como provada, nem consta da base instrutória, pelo que a Recorrente está em crer que a douta Sentença não poderia ter chegado a tal conclusão.
20. Por todo o exposto, deverão V. Exas. revogar a decisão constante da douta Sentença de fls. 291 a 310 dos autos, isto é, a decisão de julgar improcedente a excepção peremptória da prescrição invocada pela Ré A, ora Recorrente, por violação do disposto nos artigos 311.º, n.º 1, alínea c) e 315.º, n.º 1, ambos do Código Civil, declarando-se em conformidade prescritos os créditos reclamados pelo Autor da relação laboral com a 1.ª Ré A de 1 de Agosto de 1998 até 20 de Julho de 2003, uma vez que, a data da notificação da 1ª Ré A para a tentativa de conciliação foi em 4 de Setembro de 2020, estando assim prescritos os créditos laborais relativamente à Recorrente A até 21/07/2003.
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O Autor respondeu à motivação do recurso da 1ª Ré, nos termos constantes a fls. 342 a 348, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
1). O Autor foi recrutado pela C, Lda. para exercer funções de “guarda de segurança” para a A, ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, aprovado pelo Despacho n.º 687/IMO/SAEF/96. (A)
2). Entre 01/08/1998 a 20/07/2003, o Autor esteve ao serviço da Ré (A), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (B)
3). Desde 21/07/2003 até ao presente o Autor presta trabalho para a Ré (D). (C)
4). Entre 01/08/1998 a 20/07/2003 a Ré (A) pagou ao Autor a quantia de HK$7.500,00, a título de salário de base mensal. (D)
5). Entre 21/07/2003 a 31/07/2010 a Ré (D) pagou ao Autor a quantia de HK$7.500,00, a título de salário de base mensal. (E)
6). Entre 01/08/2010 a 20/07/2015 a Ré (D) pagou ao Autor a quantia de MOP$7.500,00, a título de salário de base mensal. (F)
7). Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$7.785,00, a título de salário de base mensal. (G)
8). Entre 21/07/2018 a 31/12/2019, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$10.000,00, a título de salário de base mensal. (H)
9). Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da A para a Ré (D), com efeitos a partir de 22/07/2003. (1.º)
10). Desde 21/07/2003 até ao presente, o Autor presta trabalho para a Ré (D) nos mesmos casinos, com os mesmos colegas e respeitando as ordens dos mesmos superiores hierárquicos que prestavam trabalho com o Autor para a Ré (A). (2.º)
11). Entre 21/07/2003 e 31/07/2010 o Autor exerceu as suas funções para a Ré (D), do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96. (3.º)
12). Entre 01/08/2010 a 31/07/2011, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (D) ao abrigo do Despacho n.º 06279/IMO/GRH/2010. (4.º)
13). Entre 01/08/2011 a 31/07/2012, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (D) ao abrigo do Despacho n.º 06743/IMO/GRH/2011. (5.º)
14). Entre 01/08/2012 a 31/07/2013, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (D) ao abrigo do Despacho n.º 11206/IMO/GRH/2012. (6.º)
15). Entre 18/07/2013 a 20/07/2014, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (D) ao abrigo do Despacho n.º 14932/IMO/GRH/2013. (7.º)
16). Entre 21/07/2014 a 20/07/2015, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (D) ao abrigo do Despacho n.º 16331/IMO/GRH/2014. (8.º)
17). Entre 21/07/2015 a 20/07/2016, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (D) ao abrigo do Despacho n.º 21493/IMO/GRH/2015. (9.º)
18). Entre 21/07/2016 a 20/07/2017, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (D) ao abrigo do Despacho n.º 20355/IMO/GRH/2016. (10.º)
19). Entre 21/07/2017 a 20/07/2018, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (D) ao abrigo do Despacho n.º 15014/IMO/DSAL/2017. (11.º)
20). O Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pelas Rés. (12.º)
21). As Rés sempre fixaram o local e o horário de trabalho do Autor, de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades. (13.º)
22). O Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e instruções das Rés. (14.º)
23). Entre 01/08/1998 a 31/12/2019, o Autor gozou de dias de férias anuais e de dias de dispensa ao trabalho por cada ano civil, nomeadamente: (15.º)

Data de saída da RAEM
Data entrada na RAEM
Dias de férias e/ou de ausência
1999
1999
24
03-10-00
27-10-00
25
24-02-01
23-04-01
59
03-01-02
26-01-02
24
07-01-03
31-01-03
25
08-01-04
31-01-04
24
06-01-05
29-01-05
24
20-04-06
13-05-06
24
06-03-07
29-03-07
24
04-03-08
28-03-08
25
05-03-09
28-03-09
24
03-06-10
26-06-10
24
11-10-11
08-11-11
29
15-12-11
27-12-11
13
10-11-12
01-12-12
22
26-11-13
17-12-13
22
18-07-14
18-08-14
32
07-07-15
01-08-15
26
20-10-16
10-11-16
22
04-11-17
25-11-17
22
08-12-18
29-12-18
22
12-11-19
07-12-19
26

24). Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços 2/96 ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para a Ré, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $20.00 patacas diárias por pessoa a título de subsídio de alimentação”. (16.º)
25). Entre 01/08/1998 e 20/07/2003, a Ré (A) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (17.º)
26). Entre 21/07/2003 e 31/12/2006, a Ré (D) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (18.º)
27). Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96 ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para as Rés até 31/07/2010, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (19.º)
28). Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (20.º)
29). Entre 01/08/1998 a 20/07/2003, a Ré (A) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (21.º)
30). Entre 21/07/2003 a 31/07/2010, a Ré (D) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (22.º)
31). Entre 01/08/1998 a 31/12/2002, a 1.º Ré (A) nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (23.º)
32). Entre 01/08/1998 a 31/12/2002, a 1.ª Ré (A) nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório, em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (24.º)
33). Entre 01/08/1998 e 20/07/2003 - descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau - o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (A) durante 27 dias de feriado obrigatório, correspondente aos seguintes: (25.º)

FERIADOS
ANOS

1998
1999
2000
2001
2002
2003
1 DE JANEIRO
0
1
1
1
1
1
3 DIAS DE ANO
0
3
3
0
3
3
NOVO CHINÊS






1 DE MAIO

1
1
1
1
1
1 DE OUTUBRO
1
1
1
1
1
0

34). Entre 01/08/1998 e 20/07/2003, a Ré (A) nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado pelo Autor nos referidos dias de feriado obrigatórios. (26.º)
35). Entre 21/07/2003 e 31/12/2008 - descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau - o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (D) durante 27 dias de feriado obrigatório, correspondente aos seguintes: (27.º)

FERIADOS
ANOS

2003
2004
2005
2006
2007
2008
1 DE JANEIRO
0
1
1
1
1
1
3 DIAS DE ANO
0
0
3
3
3
3
NOVO CHINÊS






1 DE MAIO
0
1
1
0
1
1
1 DE OUTUBRO
1
1
1
1
1
1

36). Entre 21/07/2003 e 31/12/2008, a Ré (D) nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado pelo Autor nos referidos dias de feriado obrigatórios. (28.º)
37). Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (29.º)
38). Para os presentes efeitos entre 01/08/1998 a 31/07/2010, as Rés procederam a uma dedução no valor de HK$750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (30.º)
39). A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego. (31.º)
40). Desde o início da relação de trabalho, por ordem das Rés, o Autor está obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (32.º)
41). Durante o referido período de tempo, tem lugar um briefing (leia-se, uma reunião) entre o Team Leader (leia-se, Chefe de turno) e os “guardas de segurança”, na qual são inspeccionados os uniformes de cada um dos guardas e distribuído o trabalho para o referido turno, mediante a indicação do seu concreto posto dentro do Casino. (33.º)
42). As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno. (34.º)
43). A Ré (D) nunca conferiu ao Autor o gozo de um descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado. (35.º)
44). Desde 21/07/2003 ao presente, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (D) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (36.º)
45). A que se segue um período de vinte e quatro horas de não trabalho, em regra, no oitavo dia, que antecede a mudança de turno. (37.º)
46). Entre 21/07/2003 a 31/12/2008 – descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau – a Ré (D) não fixou ao Autor em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas. (38.º)
47). Entre 21/07/2003 e 31/12/2008 a Ré (D) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (39.º)
48). Entre 21/07/2003 e 31/12/2008 – descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau – a Ré (D) fixou ao Autor um dia de descanso compensatório, de 8 em 8 dias, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (40.º)
49). Entre 01/01/2009 a 31/12/2019 – descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau – a Ré (D) não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas em cada semana (leia-se, em cada período de sete dias). (41.º)
50). Entre 01/01/2009 a 31/12/2019 – descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau – a Ré (D) nunca solicitou ao Autor autorização para que o período de descanso não tivesse uma frequência semanal. (42.º)
51). Entre 01/01/2009 a 31/12/2019 a Ré (D) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia pelo trabalho prestado ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (43.º)
52). Entre 01/01/2009 a 31/12/2019 – descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau – a Ré (D) fixou ao Autor um dia de descanso compensatório, de 8 em 8 dias, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (44.º)
*
III – FUNDAMENTAÇÃO
Entende a 1ª Ré que a decisão recorrida incorre em erro na aplicação de Direito.
Sobre esta questão, este TSI já tem oportunidade de se pronunciar em vários processos congéneres da Recorrente.
A título exemplificativo, citamos o acórdão de 22/04/2021, proferido no Proc. nº 177/2021, no qual entendeu-se que:
  “…É do seguinte teor o despacho que constitui o objecto deste recurso, proferido pelo Tribunal de primeira instância:
“(…)
Excepção da prescrição
A 1.ª Ré arguiu a prescrição dos créditos laborais reclamados pelo Autor na medida em que a relação laboral em causa nos presentes autos se iniciou a 27/06/2001 e terminou a 21/07/2003, pelo que todos os créditos reclamados pelo Autor se encontram prescritos.
O Autor, em sede de resposta, vem, resumidamente, invocar que, não obstante a diferente personalidade jurídica das duas Rés, o Autor (e os demais 280 trabalhadores não residentes) mantém a mesma actividade profissional, no mesmo local, com a mesma natureza, na 2.ª Ré (D), tendo ocorrido apenas uma mera sucessão de entidades patronais, muito embora sob a égide de uma só relação de trabalho, alegando assim que a prescrição dos créditos laborais reclamados não se completa antes de corridos 2 anos sobre o termo da mesma relação laboral.
Cumpre decidir.
A questão que nos é colocada tem sido alvo de aturada discussão nos Tribunais da RAEM tendo a jurisprudência maioritária decidido que os créditos reclamados nesta acção estão sujeitos ao prazo geral consagrado no artigo 302.º do Código Civil por estarmos em face de prestações de cariz indemnizatório e não remuneratório (sendo certo que não existe uma norma específica a regular esta matéria como acontece, por exemplo, na legislação laboral substantiva vigente em Portugal, v.g. no artigo 381.º, n.º 1 do Código do Trabalho).
Os factos em causa nos presentes autos iniciaram-se a 27/06/2001 e terminaram a 21/07/2003; assim, o prazo ordinário aplicável ao caso é o do actual Código Civil de Macau, entrado em vigor em 01 de Novembro de 1999.
Assim sendo, de acordo com o artigo 302.º do actual Código Civil, o prazo de prescrição de 15 anos foi efectivamente interrompido com a notificação da 1.ª Ré para a tentativa de conciliação em 03/07/2020, pelo que os factos posteriores a 03/07/2005 poderiam ser conhecidos agora em juízo.
Contudo, o artigo 311.º, n.º 1, al. c) do Código Civil vigente dispõe na sua versão chinesa que “一、在下列期間,時效不完成:(…)c) 就擔任家務工作之人與其僱主間所存在之一切債權,在此種工作關係存續期間直至關係終止後兩年;對於其他工作關係之當事人之間就該工作關係而產生之債權,在工作關係存續期間直至關係終止後一年;(…)” (sublinhado nosso).
Sendo a relação de trabalho em causa não doméstico, a prescrição só não se completaria se o trabalhador exercesse o seu direito durante um ano a contar da data da cessação da mesma relação.
No caso em apreço, o Autor formulou pedidos distintos contra cada uma das Rés, exercendo direitos autónomos e independentes.
Na verdade, de acordo com o aludido Despacho do Gabinete do Secretário para a Economia e Finanças (fls. 42 a 44 dos autos) estabelece-se nos 5.º e 6.º parágrafos que:
“Autorizo, após parecer favorável da Direcção dos Serviços de Trabalho e Emprego, a transferência das autorizações concedidas para a contratação de 280 (duzentos e oitenta) trabalhadores não residentes, afectos ao casino XXX – A para a D, S.A. segundo o regime do Despacho nº 12/GM/88, de 1 de Fevereiro, devendo esta apresentar contrato de prestação de serviços com a entidade habilitada como fornecedora de mão / de – obra não residente, nos termos da línea c) do despacho 12/GM/88 de 1 de Fevereiro.
Cancelo, nos termos do nº 10 do mesmo Despacho, as autorizações anteriormente concedidas ao Casino XXX/A, para a contratação de 280 (duzentos e oitenta) trabalhadores não residentes, bem como os respectivos contratos de prestação de serviços.” (sublinhado nosso)
Para o efeito, após estar ao serviço da 1.ª Ré (A), o Autor passou a estar o serviço da 2.ª Ré (D). Tratando-se de entidades patronais diferentes, sendo que a 2.ª Ré (D) apenas surge em 2003, ocorrendo nesta data a transferência de trabalhadores da 1.ª Ré (A) para a 2.ª Ré (D), mesmo que os trabalhadores, incluindo o Autor, trabalhavam nas mesmas ou semelhantes condições.
Não alegando nem se provando que a 1.ª Ré (A) transferiu todos os seus elementos constitutivos para a 2.ª Ré (D) e que por força dessa transferência esta adquiriu todos os direitos e obrigações emergentes dos contratos de trabalho celebrados anteriormente, não se pode concluir que o Autor trabalhava sob a égide de uma só relação de trabalho.
Está configurada a acção, estamos em presença, no lado passivo da relação jurídica processual, de uma coligação, uma vez que o Autor demandou as Rés, com pedidos indemnizatórios diferentes cuja procedência dependa essencialmente da apreciação das mesmas regras de direito ou de cláusulas de contratos perfeitamente análogas (artigo 64.º, n.º 2 do CPC).
A coligação analisa-se numa cumulação, no mesmo processo, de pedidos que poderiam ser deduzidos em acções intentadas separadamente; logo, na coligação de Rés – como é o caso em apreço – há uma pluralidade de partes, do lado passivo, sendo autónomos os direitos invocados e os correspondentes pedidos formulados contra cada uma delas, uns e outros fundados nas mesmas regras de direito ou de cláusulas de contratos perfeitamente análogas; há, portanto, no mesmo processo, uma cumulação ou reunião de acções, em cada uma das quais são exercidos direitos autónomos e independentes entre si que poderiam ser dirimidos em processos diferenciados. Tudo se passa como se o Autor intentasse acções separadas que, depois, seriam apensadas, para efeitos de julgamento conjunto.
Pelo exposto, para o efeito do artigo 311.º, n.º 1, al. c) do Código Civil, a prescrição só não se completaria se o Autor exercesse o seu direito durante um ano a contar da data da cessação da relação de trabalho entre o Autor e a 1.ª Ré, ou seja, a contar do dia 21/07/2003.
Sem necessidade de outras considerações, julga-se totalmente procedente a alegada excepção peremptória declarando-se prescritos os créditos reclamados pelo Autor contra a 1.ª Ré e em consequência, absolvendo-se a 1.ª Ré do pedido, nos termos do artigo 412.º, n.º 3 do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPT.
Custas pelo Autor.
Notifique.
(…)”.
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Quid Juris?
Ora, em vários arestos este TSI já se pronunciou sobre esta questão da prescrição dos créditos laborais reclamados pelos ex-trabalhadores da A, apesar de ela não se figurar como questão principal do recurso, citando-se, aqui, como exemplo, as considerações por nós tecidas no acórdão do processo nº 330/2020, de 11/06/2020:
“A questão levantada nesta parte do recurso consiste em saber se o facto de transferência dos 280 trabalhadores (dos quais fazia parte o ora Autor) da A para a D, tem ou não efeito de cessação da relação laboral que o Autor tinha para com a A.
A Recorrente entende que sim, enquanto o Autor defende o contrário.
Diga-se desse já que não se verificou uma "efectiva cessação" do contrato de trabalho entre o Autor e a 1.ª Ré em 21 de Julho de 2003.
É que, não obstante a 1.ª e a 2.a Rés serem "pessoas jurídicas distintas" o Autor manteve de forma contínua e ininterrupta uma mesma relação laboral com as Rés entre 01/09/2002 a 20/07/2018 (Cfr. neste sentido e para data do início da relação de trabalho, a Declaração emitida pela 2.ª Ré (D) e junta sob o Doc. 2 da PI).
E tal foi assim - conforme as Recorrentes bem o referem - por força do Despacho n.º 01949/SEF/2003, do Exmo. Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 21 de Julho de 2003, nos termos do qual foi autorizada a "transferência das autorizações para a contratação" de 280 trabalhadores não residentes (onde se encontra incluído o Autor) da 1.ª Ré (A) para a 2.ª Ré (D), de forma a que os mesmos "pudessem passar a exercer funções na D", "permanecendo no seu posto de trabalho". (Cfr. Doc. 3 junto com a Petição Inicial).
Depois, sempre se recorda, que uma das "condições" para que tivesse sido adjudicada a concessão de exploração de jogos de fortuna ou azar à 2.ª Ré (D) residiu no facto de esta se ter comprometido em "manter ao seu serviço" todos os trabalhadores da 1.ª Ré (A), tal qual se verificou.
Realcem-se 2 aspectos relevantes neste ponto:
a) - A transferência dos trabalhadores foi valorada e autorizada na sequência do pedido formulado pelas 2 Rés, e tal autorização estava sujeita a determinadas condições, nunca tal transferência foi “forçada” pelo Governo;
b) – Às Rés compete invocar e provar que, a partir da data da transferência dos trabalhadores, houve cessão da relação laboral que o Autor mantinha com a A, mas nada isto foi feito.
Pelo exposto, como a relação de trabalho apenas terminou no passado dia 20/07/2018 e que as Rés foram notificadas para a tentativa de conciliação em 29/04/2019, em caso algum se verifica a alegada prescrição dos créditos laborais reclamados pelo Autor, sabido que a mesma (prescrição) se não completa antes de corridos 2 anos sobre o termo da mesma relação laboral, o que in casu ainda se não verificou.”
Mutatis mutandis, o raciocínio expendido vale igualmente para a situação destes autos em análise.
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Nas decisões mais recentes, relativamente à mesma questão (prescrição dos créditos laborais), ou seja, a eventual aplicação do artigo 311º do CCM aos créditos laborais reclamados pelos trabalhadores da A e D, este TSI tem sido também chamado a pronunciar-se, tendo consignado o seguinte entendimento dominante:
“(…)
Considerando a mens legislatoris da causa de suspensão da prescrição prevista no artº 311º/1-c) do CC que é prevenir o não exercício tempestivo do direito por parte de um trabalhador subordinado, por causa da chamada inibição psicológica do exercício do direito, decorrente da situação de subordinação jurídica em que se encontra e do receio de suscitar conflito com a entidade patronal que poderá colocar, inclusivamente, em risco o seu emprego.
E tendo em conta o facto notório, ou pelo menos o facto de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das funções, de que, não obstante juridicamente distinta da YYY, a XXXX é uma sociedade vulgarmente denominada sociedade-mãe da YYY por ser sócio dominante desta.
Se, em vez de cessação definitiva da relação de trabalho entre o trabalhador e a XXXX, o que aconteceu é no fundo apenas a modificação subjectiva, consistente na substituição da XXXX (antecessor) pela YYY (sucessor) numa mesma relação laboral com o trabalhador, este não deve ficar impedido de beneficiar da causa de suspensão por 2 anos, a que se alude o artº 311º/1-c) do CC, a contar apenas a partir da cessação da relação laboral com a YYY, para reclamar os créditos laborais devidos pela XXXX, uma vez que, mesmo após a sucessão da YYY na posição contratual da XXXX, esta não deixa de ser a entidade a quem o trabalhador se encontra “de facto subordinado”. (sumário do proce. nº 1280/2019, de 05/03/2020)
Estas considerações continuam a ser válidas para o caso em análise, não encontramos razões bastantes para alterar a posição, o que determina necessariamente procedente o recurso, revogando-se o despacho recorrido e mandando-se a baixa dos autos ao Tribunal recorrido para reformular o despacho saneador em conformidade e prosseguir a acção até final, se não existir outra causa que a tal obste.
* * *
Em síntese conclusiva:
I - No caso de transferência dos ex-trabalhadores não residentes da A para a D, autorizada pelo Governo da RAEM na sequência do pedido formulado conjuntamente por aquelas sociedades comerciais anónimas, não há cessão pelos trabalhadores de relações laboral definitiva com a anterior entidade patronal, visto que, para além da coexistência actual dos referidos dois entes comerciais, uma das "condições" para que tivesse sido adjudicada a concessão de exploração de jogos de fortuna ou azar à 2.ª Ré (D) residiu no facto de esta se ter comprometido em "manter ao seu serviço" todos os trabalhadores da 1.ª Ré (A), tal qual se verificou.
II - A transferência dos trabalhadores foi valorada e autorizada na sequência do pedido formulado pelas 2 Rés, e tal autorização estava sujeita a determinadas condições, pelo que, há que entender-se que não se verifica a suspensão do prazo de prescrição prescrita no artigo 311º/-c) do CCM aquando da transferência em causa.
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Tudo visto, resta decidir.
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V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em conceder provimento ao presente recurso e consequentemente:
a) – Julgar improcedente a excepção da prescrição de créditos contra a 1ª Ré/A, revogando-se o despacho recorrido;
b) – Mandar baixar os autos ao Tribunal a quo para reformular o despacho saneador, a fim de prosseguir a acção até final, se não existir outra causa que a tal obste…”.
  Por ora, não se vê qualquer razão plausível para alterar a posição já assumida.
Nesta conformidade, o recurso não deixará de se julgar improvido.
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IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso interposto pela 1ª Ré, mantendo a sentença recorrida.
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Custas do recurso pela 1ª Ré.
Notifique e D.N..
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RAEM, aos 17 de Junho de 2021.
Ho Wai Neng
Tong Hio Fong
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro





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355/2021