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Processo nº 387/2021
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 24 de Junho de 2021
Recorrente: A (Autor)
Recorrida: B, S.A. (Ré)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I - RELATÓRIO
  Por sentença de 25/01/2021, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a Ré B, S.A. a pagar ao Autor A a quantia de MOP$206,507.26, acrescida de juros moratórios à taxa legal.
Dessa decisão vem recorrer o Autor, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
1) Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação da Recorrente na atribuição de uma compensação devida ao Autor pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e, bem assim, pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado, na medida em que as concretas fórmulas de cálculo utilizadas na Decisão Recorrida se mostram em oposição às que têm vindo a ser seguidas pelo Tribunal de Segunda Instância;
2) Impõe-se, ainda, apreciar a interpretação e aplicação que o Tribunal a quo levou a cabo a respeito do n.º 2 do art. 42.º da Lei n.º 7/2008, e que conduziu à condenação da Recorrida numa quantia muito inferior à reclamada pelo Autor em sede de Petição Inicial;
3) Pelas razões que adiante melhor se expõem, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de direito quanto à concreta forma de cálculo devido pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado e, deste modo, se mostra em violação ao disposto nos artigos 17.º, 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril e n.º 2 do art. 42.º da Lei n.º 7/2008, razão pela qual se impõe que a mesma seja substituída por outra que decida em conformidade com a melhor interpretação a conferir aos referidos preceitos.
  Em concreto,
4) Entendeu o Tribunal a quo ser de sufragar o entendimento seguido pelo Tribunal de Última Instância e, em consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor apenas ao correspondente ao valor de um salário em singelo no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso semanal durante todo o período da relação laboral, a liquidar em execução de sentença;
5) Porém, salvo melhor opinião, ao proceder à condenação da Ré apenas em singelo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
6) Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, para além do valor relativo ao próprio dia de trabalho prestado;
7) Trata-se, de resto, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma uniforme pelo Tribunal de Segunda Instância, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: (salário diário X n.º de dias devidos e não gozados X 2);
8) In casu, resultando provado que entre 30/06/2007 a 31/12/2008 (descontados os períodos de férias anuais e de dispensas ao trabalho em que o Autor se deslocou para o exterior da RAEM) o Autor prestou para a Ré um total de 74 dias de trabalho em dia de descanso semanal - deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$38.110,00 a título do dobro do salário - e não só apenas de MOP$19.055,00 correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer.
Ao que acresce que,
9) Resulta da matéria de facto assente que: Entre 30/06/2007 a 20/07/2019, o Autor prestou trabalho a cada um dos sétimos dias que seguiram a seis de trabalho consecutivo prestado, sem prejuízo da resposta aos quesitos 3.º, 4.º, 5.º (Cfr. quesitos 22, 26 e 29) e, bem assim, que Entre 01/01/2009 a 20/07/2019, a Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo pelo trabalho prestado ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (Cfr. quesito 25);
10) Não obstante a referida matéria de facto provada, com vista a apurar o valor que o Autor tinha a receber relativamente ao trabalho prestado em dia de descanso semanal entre o período de 01/01/2009 a 20/07/2019 o tribunal a quo seguiu o seguinte raciocínio: dividiu o número dos dias de trabalho prestados pelo Autor e descontou os dias em que o Autor havia descansado ao 8.º dia, após a prestação de sete dias de trabalho consecutivos, apurando que o Autor terá direito a auferir a diferença entre os dois;
11) Ora, salvo o devido respeito, está o ora Recorrente em crer existir um erro de julgamento traduzido, entre outro, no facto de se acreditar que a douta Decisão não ter factos para se poder chegar a tal resultado, nem os mesmos constavam da Base Instrutória;
12) Ou melhor, o que impunha apurar era os dias de trabalho em que o Autor prestou trabalho para a Ré em cada 7.º dia, após 6 dias consecutivos de trabalho e não apurar a diferença entre o trabalho prestado ao 7.º dia com os dias de não trabalho que o Autor gozou no 8.º dia após 7 dias de trabalho consecutivo, e consequentemente nada havia a descontar aquando do apuramento do montante indemnizatório, a tal respeito;
13) De onde, provado que entre 01/01/2009 (visto ser este o período aqui em consideração) a 20/07/2019, o Autor prestou trabalho a cada um dos sétimos dias que seguiram a seis de trabalho consecutivo prestado, descontados os períodos de ausência (Cfr. quesitos 22, 26 e 29) - tal significa que o Autor prestou 2202 dias entre 01/01/2009 a 21/07/2015, acrescido de 1019 dias entre a última data e 21/07/2018, acrescido de 341 dias entre a última data e 21/07/2019, o que perfaz um total de 3562 dias de trabalho prestado e, bem assim, de 509 dias de trabalho prestado em dia de descanso semanal - pelo que deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Autor a quantia de MOP$132.609,00 - correspondente a [(2202 dias /7 dias X Mop$7500/30 + 1019 dias /7 dias X Mop$7785/30 + 431 dias /7 dias X Mop$10,000/30] - e não só de apenas Mop$38.738,00 conforme parece resultar da Sentença, o que desde já e para os legais efeitos se requer.
Depois,
14) Entendeu o douto Tribunal a quo que na determinação da quantia devida pelas Rés ao Autor a título de trabalho prestado nos dias de feriados obrigatórios o Autor terá direito a receber das Rés as compensações compostas pela remuneração em singelo, acrescida do dobro dessa remuneração;
15) Ora, tendo o Tribunal a quo explicitado que pelo dobro da retribuição se deve entender o equivalente a mais um dia de salário em singelo (nos termos que têm vindo a ser seguidos pelo TUI nos Acs. 28/2007, 29/2007, 58/2007 e 40/2009) tal significa que, neste particular, a douta Sentença igualmente se afasta do entendimento que tem vindo a ser sufragado pelo Tribunal de Segunda Instância - nos termos do qual se entende que· a fórmula mais correcta de interpretar o referido preceito será conceder ao Autor, ora Recorrente, um "acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito" - o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal - e não somente o dobro da retribuição normal como parece ter decidido o Tribunal Judicial de Base;
16) Em concreto, resultando provado que durante o período da relação laboral o Recorrente prestou trabalho para a Recorrida durante 7 dias de feriados obrigatórios, deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$5,407.50 a título do triplo do salário - e não só apenas de MOP$3.605,00 conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer;
Por último,
17) Salvo o devido respeito, está o ora Recorrente em crer que a conjugação do teor do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços ao abrigo do qual o Recorrente prestou trabalho para a Recorrida (Cfr. al. B) dos Factos Assentes) com o conteúdo dos quesitos 32 e 35 da Matéria de Facto Provada impunha-se ao Tribunal a quo ter condenado a Recorrida no pagamento ao ora Recorrente das quantias ao mesmo devidas a titulo de "bonificações ou remunerações adicionais", conforme reclamadas em sede de Petição Inicial;
18) Ao não entender assim, está o Recorrente em crer existir um erro de julgamento, por manifesta oposição entre a matéria de facto provada e a decisão proferida a final, razão pela qual deve a douta Sentença ser substituída por outra que condene a Recorrida a pagar ao Recorrente a quantia de Mop$108.780,00, tal qual formulado pelo Autor no pedido;
19) Caso assim se não entenda - por falta de elementos quantitativos para o efeito - desde já se requer que a Recorrida seja condenada no que se liquidar em execução de sentença, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 564.º, o que desde já e para os legais efeitos se invoca e requer.
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A Ré respondeu à motivação do recurso do Autor, nos termos constantes a fls. 309 a 327, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
­ Desde 30/06/2007 até 20/07/2019 o Autor esteve ao serviço da Ré (B), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
­ Entre 30/06/2007 e 31/07/2010, o Autor exerceu funções para a Ré (B). – ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/2003 (Cfr. fls. 27 a 32, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (B)
­ Entre 01/08/2010 a 31/07/2011, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 06279/IMO/GRH/2010 (Cfr. fls. 34, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (C)
­ Entre 01/08/2011 a 31/07/2012, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 06743/IMO/GRH/2011 (Cfr. fls. 35, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (D)
­ Entre 01/08/2012 a 31/07/2013, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 11206/IMO/GRH/2012 (Cfr. fls. 36, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (E)
­ Entre 18/07/2013 a 20/07/2014, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 14932/IMO/GRH/2013 (Cfr. fls. 37, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (F)
­ Entre 21/07/2014 a 20/07/2015, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 16331/IMO/GRH/2014 (Cfr. fls. 38, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. (G)
­ Entre 21/07/2015 a 20/07/2016, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 21493/IMO/GRH/2015 (Cfr. fls. 39, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (H)
­ Entre 21/07/2018 a 20/07/2019, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 13336/IMO/DSAL/2018 (Cfr. fls. 40, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (I)
­ Desde o início da prestação de trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela Ré. (J)
­ Era a Ré quem fixava o local e o horário de trabalho do Autor, de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades. (K)
­ Durante todo o período de trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e instruções da Ré. (L)
­ E entre 30/06/2007 a 31/07/2010 a Ré (B) pagou ao Autor a quantia de HK$7.500,00, a título de salário de base mensal. (M)
­ E entre 01/08/2010 a 20/07/2015 a Ré (B) pagou ao Autor a quantia de MOP$7.500,00, a título de salário de base mensal. (N)
­ Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$7.785,00, a título de salário de base mensal. (O)
­ Entre 21/07/2018 a 20/07/2019, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$10.000,00, a título de salário de base mensal. (P)
­ Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/2003 ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para as Rés até 31/07/2010, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (Q)
­ Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (R)
­ Resulta do Contratos de Prestação de Serviço n.º 2/2003 ao abrigo do qual o Autor prestou trabalho para a Ré que: “(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, a Ré) paga aos operários residentes no Território”. (S)
­ Na cláusula I. da Declaração de Participação no Regime Distributivo de Gorjeta, onde se lê:
““茶錢”是由賭場顧客自願賞賜,並非公司向僱員提供之收入,顧客賞賜與否,並非公司之責任,而公司亦不存在任何繳付之責任。” (Cfr. fls. 46 a 47, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) (T)
- Na cláusula VI. da Declaração de Participação no Regime Distributivo de Gorjeta, onde se lê:
“由於“茶錢”為賭場顧客的自由賞賜,故明確接受在法例規定之假期(例如:強制性假期、週假、其他假期等)工作,可按法例獲得底薪之額外補償,但“茶錢”則不獲額外補償,即在上述日子工作,僱員只可以獲得像平常工作日“茶錢”。”(Cfr. fls. 46 a 47, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) (U)
­ Entre 21/07/2016 a 20/07/2017, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 20355/IMO/GRH/2016. (1º)
­ Entre 21/07/2017 a 20/07/2018, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 15014/IMO/DSAL/2017. (2º)
­ Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré, sem prejuízo de 24 dias de férias anuais por cada ano civil e dispensas de trabalho não remuneradas, nomeadamente entre 05/08/2008 e 28/08/2008 (24 dias), entre 05/09/2009 e 06/10/2009 (32 dias), entre 03/05/2011 e 21/05/2011 (19 dias), entre 04/12/2012 e 18/12/2012 (15 dias), entre 09/03/2013 e 03/04/2013 (26 dias), entre 10/03/2015 e 14/04/2015 (36 dias), entre 19/03/2016 e 16/04/2016 (29 dias), entre 21/03/2017 e 13/04/2017 (24 dias), entre 13/03/2018 e 05/04/2018 (24 dias) e entre 12/03/2019 e 04/04/2019 (24 dias), bem como um dia de descanso no oitavo dia após cada sete dias de trabalho consecutivos durante ao serviço da Ré. (3º, 4º及5º)
­ Entre 30/06/2007 a 31/07/2010, a Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (6º)
­ Entre 30/06/2007 e 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante em 01 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 01 de Maio e 01 de Outubro, sem prejuízo da resposta aos quesitos 3º, 4º e 5º. (7º)
­ Entre 30/06/2007 e 31/12/2008, a Ré (B) nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado pelo Autor nos referidos dias de feriado obrigatórios. (8º)
­ Entre 02/04/2007 a 30/04/2010, a Ré procedeu a uma dedução no valor de HK$750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (9º)
­ A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela Ré e/ou pela agência de emprego. (10º)
­ Desde o início da relação de trabalho até 31/12/2008, por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (11º)
­ Durante o referido período de tempo, tinha lugar um briefing (leia-se, uma reunião) entre o Team Leader (leia-se, Chefe de turno) e os “guardas de segurança”, na qual eram inspeccionados os uniformes de cada um dos guardas e distribuído o trabalho para o referido turno, mediante a indicação do seu concreto posto dentro do Casino. (12º)
­ Entre 30/06/2007 a 20/07/2019, o Autor compareceu ao serviço da Ré (B) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos, sem prejuízo da resposta aos quesitos 3º, 4º e 5º. (13º及15º)
­ A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno. (14º及16º)
­ A Ré (B) nunca conferiu ao Autor o gozo de um descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado. (17º)
­ Desde 30/06/2007 a 20/07/2019, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (18º)
­ A que se seguia um período de vinte e quatro horas de não trabalho, em regra, no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (19º, 23º, 30º及31º)
­ Entre 30/06/2007 a 31/12/2008 – descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau – a Ré (B) não fixou ao Autor em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas. (20º)
­ Entre 30/06/2007 e 31/12/2008 a Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (21º)
­ Entre 30/06/2007 e 20/07/2019, o Autor prestou trabalho a cada um dos sétimos dias que seguiram a seis dias de trabalho consecutivo prestado, sem prejuízo da resposta aos quesitos 3º, 4º e 5º. (22º, 26至29º)
­ Entre 01/01/2009 a 20/07/2019 – descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau – a Ré (B) não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas em cada semana (leia-se, em cada período de sete dias). (24º)
­ Entre 01/01/2009 a 20/07/2019 a Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo pelo trabalho prestado ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (25º)
­ Desde a data desconhecida, a Ré paga de forma regular e periódica aos trabalhadores guardas de segurança residentes uma determinada quantia 10 por 10 dias ou por mês a título de gorjetas. (32º)
­ Entre 30/06/2007 a 31/07/2010, a Ré nunca pagou ao Autor quaisquer gorjetas. (35º)
­ A Ré pagou sempre ao Autor o salário correspondente aos dias de descanso semanal. (36º)
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III – FUNDAMENTAÇÃO
1. Das bonificações ou remunerações adicionais:
Na óptica do Recorrente, a conjugação do teor do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços ao abrigo do qual o Recorrente prestou trabalho para a Recorrida (Cfr. al. B) dos Factos Assentes) com o conteúdo dos quesitos 32 e 35 da Matéria de Facto Provada impunha-se ao Tribunal a quo ter condenado a Recorrida no pagamento ao ora Recorrente das quantias ao mesmo devidas a título de "bonificações ou remunerações adicionais", conforme reclamadas em sede de Petição Inicial.
Ao não fazer assim, o Tribunal a quo cometeu um erro de julgamento, por manifesta oposição entre a matéria de facto provada e a decisão proferida a final, razão pela qual deve a douta Sentença ser substituída por outra que condene a Recorrida a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$108,780.00 tal qual formulado no seu pedido.
Adiantamos desde já que não lhe assiste razão, não obstante ficar provados que:
­ Desde a data desconhecida, a Ré paga de forma regular e periódica aos trabalhadores guardas de segurança residentes uma determinada quantia 10 por 10 dias ou por mês a título de gorjetas. (32º)
­ Entre 30/06/2007 a 31/07/2010, a Ré nunca pagou ao Autor quaisquer gorjetas. (35º)
Já no âmbito do processo congénere nº 326/2017, este TSI, por acórdão de 29/06/2017, decidiu nos seguintes termos:
  “…Da matéria provada não resulta quais sejam as bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª ré tenha pago aos seus trabalhadores residentes, embora se tenha provado que a ré vinha pagando bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas.
  Não só não resulta da matéria provada a sua definição material e quantificação, como nem sequer tal matéria vem alegada.
  Estamos em crer que mais do que uma dificuldade no cômputo daquilo que é devido, o que poderia passar por uma operação de liquidação em execução de sentença, como determinou o Mmo Juiz, na essência, estará mesmo em causa a especificação de um pedido que nem sequer está definido na sua génese.
  Será aceitável a parte pedir que o tribunal condene o patrão a pagar os suplementos que paga aos outros trabalhadores residentes, sem dizer em que é que esse pedido se traduz e se concretiza? Sem dizer a que suplementos se refere, qual a categoria dos beneficiados, a analogia de funções e qual o serviço dos beneficiários desses suplementos, partindo do facto comprovado de que a Ré pagou? Aceitar-se-ia que a parte trabalhadora pedisse ao tribunal que condenasse a pagar-lhe os salários em dívida pelo período por que perdurou a relação laboral sem os especificar?
  A factualidade em que vai radicar o pedido mostra-se crucial.
  Como salienta Alberto dos Reis, “… não pode ligar-se maior importância à formulação do pedido, do que à exposição dos fundamentos de facto. Que a menção das razões de direito ocupe lugar secundário, já o assinalámos; mas que a narração dos fundamentos de facto possa relegar-se para plano inferior ao da enunciação do pedido é proposição que temos por inexacta. O êxito da acção tanto depende da correcção do pedido, como da pertinência e suficiência dos fundamentos de facto; o advogado não tem que pôr maior cuidado na formulação do pedido, do que na apresentação do aspecto de facto da acção.”
  A insuficiência que se assinala, neste caso, perpassa até pelos dois vectores: narração e pedido. Não dizendo quais esses suplementos remuneratórios ou abonatórios, os termos e qualidade dos destinatários das bonificações ou remunerações adicionais que pagou a todos os trabalhadores residentes (art. 13 dos factos), está bem de ver que o pedido formulado fica necessariamente inquinado.
  A questão que se equaciona estará essencialmente dependente da admissibilidade da formulação de pedidos genéricos, enquadrada no art. 392º do CPC.
  Não se estando perante um caso de universalidade (al.a) do n.º1); não se estando perante um caso de impossibilidade de determinação, de modo definitivo, das consequências do facto ilícito, nem se configurando uma situação prevista no art. 563º do CC (al. b) do n.º1); nem estando a fixação do quantitativo dependente da prestação de contas ou de outro acto que deva ser praticado pelo réu – pelo menos nada se requer nesse sentido – (al. c) do n.º 1) parece não ser aceitável o pedido nos termos em que o foi na acção.
  Nesta conformidade, por falta de pedido certo e concreto, ao abrigo do disposto nos artigos 139º, n.º 1 e n.º 2, al. a) e 230º, n.º 1, al. b) do CPC, absolver-se-á a Ré da instância, por se tratar de um pressuposto processual inominado, o que impede a apreciação de mérito, não se sufragando aqui o entendimento que configura o caso como de improcedência do pedido.
Não se vê, por ora, qualquer razão plausível para alterar o entendimento supra transcrito.
Face ao expendido, é de negar provimento o recurso nesta parte.
2. Das compensações devidas pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal e de feriado obrigatório na vigência do DL nº 24/89/M:
O recurso do Autor nesta parte não deixará de se julgar provido face à jurisprudência unânime deste TSI nos processos congéneres em que a Ré também é parte, no sentido de que a fórmula para a compensação do descanso semanal é: dias não gozados X salário diário X 2, para além do salário-base já recebido e em relação aos feriados obrigatórios, a fórmula é: Nºs de dias não gozados X salário diário X 3, para além do salário-base já recebido.
A título exemplificativo, citamos os Acórdãos deste TSI, proferidos no âmbito dos Processos 778/2010, 376/2012 e 61/2014 e 582/2014.
Nesta conformidade, o Autor tem o direito a receber:
Descanso semanal: HKD$250*74*2=HKD$37,000.00 equivalentes a MOP$38,110.00 (à taxa cambial de 1.03).
Feriados obrigatórios: HKD$250*7*3=HKD$5,250.00, equivalentes a MOP$5,407.50.
3. Da compensação devida pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal e de feriado obrigatório na vigência da Lei nº 7/2008:
Ficou provado que:
- Desde 30/06/2007 a 20/07/2019, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (18º)
- A que se seguia um período de vinte e quatro horas de não trabalho, em regra, no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (19º, 23º, 30º及31º)
- Entre 30/06/2007 a 31/12/2008 – descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau – a Ré (B) não fixou ao Autor em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas. (20º)
- Entre 30/06/2007 e 31/12/2008 a Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (21º)
- Entre 30/06/2007 e 20/07/2019, o Autor prestou trabalho a cada um dos sétimos dias que seguiram a seis dias de trabalho consecutivo prestado, sem prejuízo da resposta aos quesitos 3º, 4º e 5º. (22º, 26至29º)
- Entre 01/01/2009 a 20/07/2019 – descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau – a Ré (B) não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas em cada semana (leia-se, em cada período de sete dias). (24º)
- Entre 01/01/2009 a 20/07/2019 a Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo pelo trabalho prestado ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (25º)
  Seguiu o seguinte raciocínio: dividiu o número dos dias de trabalho prestados pelo Autor e descontou os dias em que o Autor havia descansado ao 8.º dia, após a prestação de sete dias de trabalho consecutivos, apurando que o Autor terá direito a auferir a diferença entre os dois.
  Este TSI tem entendido, de forma unânime, que o trabalho prestado ao sétimo após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho em cada semana deve ser qualificado como trabalho prestado no dia do descanso semanal, não obstante o Autor ter gozado um dia de descanso ao oitavo dia.
A razão de ser consiste em “o trabalhador não pode prestar mais do que seis dias de trabalho consecutivos, devendo o dia de descanso ter lugar, no máximo, no sétimo dia, e não no oitavo, nono ou noutro dia do mês, salvo acordo das partes em sentido contrário, no que toca ao momento de descanso a título de “compensação”, mas o critério para este efeito é sempre o período de sete dias como uma unidade” (cfr. Ac. do TSI, Proc. nº 89/2020, de 16/04/2020).
Assim, o descanso remunerado do trabalhador no oitavo dia não pode ser qualificado como descanso semanal sem acordo das partes ou quando a natureza da actividade da empresa não torne inviável o gozo no sétimo dia, antes deve ser qualificado como dia de descanso compensatório pelo trabalho prestado no dia de descanso semanal a que se alude o nº 2 do artº 43º da Lei nº 7/2008.
Assim sendo, o Autor tem o direito de receber: MOP$7500/30*2202/7 (01/01/2009-20/07/2015)+MOP$7,785/30*1019/7(21/07/2015-20/07/2018) +MOP$10,000/30*341/7(21/07/2018-20/07/2019) = MOP$132,656.75, reduzidos a MOP$132,609.00 tendo em conta o próprio pedido do Autor no presente recurso jurisdicional.
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Tudo visto, resta decidir.
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IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo Autor, decidindo-se:
- julgar improcedente o recurso, mantendo o decidido quanto ao pedido relativo a bonificações adicionais, incluindo gorjetas;
- revogar a sentença na parte respectiva e condenar a Ré a pagar ao Autor, a título da compensação pelo não gozo dos dias de descanso semanal, no total de MOP$170,719.00 (MOP$38,110.00+MOP$132,609.00), e a título da compensação pelo não gozo dos dias de feriado obrigatório, a quantia de MOP$5,407.50, com juros de mora à taxa legal a partir da data do presente aresto (cfr. Ac. do TUI, de 02/03/2011, Proc. nº 69/2010).
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Custas pelas partes em ambas as instâncias em proporção de decaímento.
Notifique e D.N..
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RAEM, aos 24 de Junho de 2021.
Ho Wai Neng
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
Tong Hio Fong
Declaração de voto vencido
Para o trabalho prestado em dias de descanso semanal no âmbito do Decreto-Lei n.º 24/89/M, o trabalhador tem direito a receber o dobro da retribuição (“dobro” esse que consiste na soma do salário diário e um dia de acréscimo). Sendo assim, provado que entre 22/7/2003 e 31/12/2008 o autor já recebeu da ré B o salário diário em singelo, para efeitos de cálculo do valor da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal, terá direito a receber apenas mais um dia de acréscimo, sob pena de estar o autor a ser pago, não pelo dobro, mas pelo triplo do valor diário, ao que acresce ainda o dia de descanso compensatório previsto no n.º 4 do artigo 17.º, o autor estará a ser pago pelo quádruplo.
Por outro lado, conforme o previsto no n.º 1 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, para o trabalho prestado em dias de feriado obrigatório, o trabalhador tem direito a um acréscimo de dois dias de salário, para além do singelo. Tendo o autor recebido, durante a aquele período, o salário diário em singelo, terá agora apenas direito a receber mais 2 dias de salário.
Pelo que não merecem, a meu ver, reparo as fórmulas aplicadas pelo Tribunal recorrido para cálculo da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriado obrigatório, no âmbito no Decreto-Lei n.º 24/89/M.



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387/2021