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Processo nº 380/2021


Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I
A, instaurou no Tribunal Judicial de Base acção de processo comum do trabalho, contra a Yyy Yyy Yyy, S. A. (doravante abreviadamente designada YYY), ambos devidamente identificados nos autos.

A acção veio a ser julgada parcialmente procedente pela seguinte sentença:
I. RELATÓRIO
  A, solteiro, de nacionalidade nepalesa, residente habitualmente em Macau, na Rua do ......, n.º ..., Edf. ......, ...º Bloco, ...º andar, titular do Passaporte do Nepal nº 11****** de 13 de Fevereiro de 2019, instaurou contra YYY YYY YYY, S.A. (adiante, YYY), identificada melhor nos autos, a presente acção declarativa sob a forma de processo comum, emergente de contrato de trabalho, pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia total de MOP$457,295.50 acrescida de juros legais até integral e efectivo pagamento, assim discriminadas:
- MOP$31,930.00 a título de subsídio de efectividade (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/07/2010);
- MOP$3,862.50 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/12/2008);
- MOP$23,947.50 a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/07/2010);
- MOP$4,594.00 pela prestação de, pelo menos, 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/12/2008);
- MOP$76,130.00 pela prestação de, pelo menos, 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo (relativo ao período de 01/01/2009 a 20/07/2019);
- MOP$50,753.00 a título de descanso compensatório não gozado (relativo ao período de 01/01/2009 a 20/07/2019);
- MOP$24,720.00 a título do trabalho prestado, após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/12/2008);
- MOP$1,545.00 a título de descanso compensatório não gozado (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/12/2008);
- MOP$132,673.50 a título do trabalho prestado, após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias (relativo ao período de 01/01/2009 a 20/07/2019);
- MOP$16,000.00 a título de descanso compensatório não gozado (relativo ao período de 01/01/2009 a 20/07/2019);
- MOP$91,140.00 a título de bonificações e/ou remunerações adicionais (gorjetas).
  Tudo com os fundamentos que decorrem da sua petição inicial, que aqui damos por integralmente reproduzidos.
  A Ré contestou, pondo em crise, no essencial, a pretensão do Autor.
  Foi elaborado despacho saneador em que se afirmou a validade e regularidade da instância, e seleccionou-se a matéria de facto relevante para a decisão da causa.
  A audiência de julgamento decorreu com observância do formalismo legal, tendo o Tribunal, a final, respondido à matéria controvertida por despacho, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
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  O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
  O processo é o próprio, não enferma de nulidades que o invalidem.
  As partes são dotadas de personalidade, de capacidade judiciária.
  Todas as partes são legítimas, têm interesse de agir e estão devidamente patrocinadas.
  Não existem outras excepções dilatórias, nulidades ou questões prévias que cumpra conhecer.
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Questões a decidir:
- Se o contrato de prestação de serviços ao abrigo do qual a Ré foi autorizada a contratar o Autor, define os requisitos/condições mínimas da relação laboral estabelecida entre as partes e se permite sustentar ter o Autor direito aos montantes peticionados.
- Se o Autor tem direito aos créditos laborais por si reclamados e, caso se entenda pela positiva, determinar se são correctos os montantes indemnizatórios por si peticionados.
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II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
1. Desde 01/01/2008 até 20/07/2019 o Autor esteve ao serviço da Ré (YYY), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
2. Desde o início da prestação de trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela Ré. (B)
3. Entre 01/01/2008 a 31/07/2010 a Ré (YYY) pagou ao Autor a quantia de HK$7,500.00, a título de salário de base mensal. (C)
4. Entre 01/08/2010 a 20/07/2015 a Ré (YYY) pagou ao Autor a quantia de MOP$7,500.00, a título de salário de base mensal. (D)
5. Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$7,785.00, a título de salário de base mensal. (D-1)
6. Entre 21/07/2018 a 20/07/2019, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$10,000.00, a título de salário de base mensal. (E)
7. Entre 01/01/2008 e 31/07/2010, o Autor exerceu funções para a Ré (YYY). – ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/2003. (1.º)
8. Entre 01/01/2008 a 20/07/2018, o Autor gozou de dias de férias anuais e de dias de dispensa ao trabalho por cada ano civil, nomeadamente durante o período entre 25/04/2008 a 27/04/2008, 05/09/2008 a 01/10/2008, 24 dias em 2009, 04/12/2010 a 25/12/2010, 08/10/2011 a 29/10/2011, 10/04/2012 a 28/04/2012, 24 dias em 2013, 11/03/2014 a 05/04/2014, 24 dias em 2015, 20/02/2016 a 22/03/2016, 20/09/2016 a 21/09/2016, 13/11/2016 a 14/11/2016, 12/02/2017 a 13/02/2017, 21/02/2017 a 16/03/2017, 13/02/2018 a 08/03/2018. (2.º)
9. Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/2003 ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para as Rés até 31/07/2010, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (3.º)
10. Entre 01/01/2008 a 31/07/2010, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré. (4.º)
11. Entre 01/01/2008 a 31/07/2010, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (5.º)
12. Entre 01/01/2008 a 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (YYY) durante 5 dias de feriado obrigatório, correspondente aos seguintes. (6.º)
FERIADOS
ANOS

2008
1 DE JANEIRO
1
3 DIAS DE ANO
3
NOVO CHINÊS

1 DE MAIO
1
1 DE OUTUBRO
0
13. Entre 01/01/2008 a 31/12/2008, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado pelo Autor nos referidos dias de feriado obrigatórios. (7.º)
14. Entre 01/01/2008 a 20/07/2018, por ordem da Ré (YYY), o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (10.º)
15. Durante o referido período de tempo, tinha lugar um briefing (leia-se, uma reunião) entre o Team Leader (leia-se, Chefe de turno) e os “guardas de segurança”, na qual eram inspecionados os uniformes de cada um dos guardas e distribuído o trabalho para o referido turno, mediante a indicação do seu concreto posto dentro do Casino. (11.º)
16. Entre 01/01/2008 a 31/12/2008, o Autor compareceu ao serviço da Ré (YYY) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início dos 294 dias/turnos de trabalho efectivo que prestou para a Ré, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. (12.º)
17. Entre 01/01/2009 a 31/07/2010, o Autor compareceu ao serviço da Ré (YYY) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início dos 484 dias/turnos de trabalho efectivo que prestou para a Ré, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos.
Entre 01/08/2010 a 20/07/2015, o Autor compareceu ao serviço da Ré (YYY) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início dos, pelo menos, 1461 dias/turnos de trabalho efectivo que prestou para a Ré, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. (13.º)
18. Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, o Autor compareceu ao serviço da Ré (YYY) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início dos 863 dias/turnos de trabalho efectivo que prestou para a Ré, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. (14.º)
19. A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno. (16.º)
20. A Ré (YYY) nunca conferiu ao Autor o gozo de um descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado. (17.º)
21. Entre 01/01/2008 a 20/07/2018, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (YYY) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos, a que se seguia um período de vinte e quatro horas de descanso, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (18.º)
22. Entre 01/01/2008 a 31/12/2008, o Autor prestou 42 dias de trabalho ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (19.º)
23. Entre 01/01/2008 a 31/12/2008, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (20.º)
24. Entre 01/01/2008 a 31/12/2008, a Ré (YYY) fixou ao Autor um total de 42 dias de descanso compensatório, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (21.º)
25. Entre 01/01/2009 a 20/07/2018, a Ré (YYY) não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas em cada semana (leia-se, em cada período de sete dias). (22.º)
26. Entre 01/01/2009 a 31/07/2010, o Autor prestou 69 dias de trabalho ao sétimo dia, para a Ré (YYY) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho.
Entre 01/08/2010 a 20/07/2015, o Autor prestou, pelo menos, 208 dias de trabalho ao sétimo dia, para a Ré (YYY) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (23.º)
27. Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, o Autor prestou 123 dias de trabalho ao sétimo dia, para a Ré (YYY) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (24.º)
28. Entre 01/01/2009 a 20/07/2018 a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (26.º)
29. Entre 01/01/2009 a 31/07/2010, a Ré (YYY) faltou fixar ao Autor 10 dias de descanso compensatório.
Entre 01/08/2010 a 20/07/2015, a Ré (YYY) faltou fixar ao Autor 30 dias de descanso compensatório.
Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, a Ré (YYY) faltou fixar ao Autor 17 dias de descanso compensatório. (27.º)
30. Resulta do Contratos de Prestação de Serviço n.º 2/2003 ao abrigo do qual o Autor prestou trabalho para a Ré que: “(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, a Ré) paga aos operários residentes no Território”. (28.º)
31. Desde 31/03/2002 a Ré paga de forma regular e periódica aos trabalhadores guardas de segurança residentes uma determinada quantia por mês, a título de gorjetas ou tips. (29.º)
32. A distribuição das referidas gorjetas ou tips pelos seus funcionários obedece a um esquema desde 31/03/2002, denominado por “Distribution policy”. (30.º)
33. Entre 01/01/2008 a 31/07/2010, a Ré nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações, remunerações adicionais, gorjetas ou tips. (32.º)
34. A Ré pagou sempre ao Autor o salário correspondente ao trabalho prestado nos dias de descanso semanal em singelo, caso este tenha trabalhado em tal dia. (33.º)
*
III. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
  Em face da matéria de facto que se mostra provada e do direito que lhe aplicável, cumpre dar resposta às questões a decidir que supra se deixaram enunciadas.
  A pretensão do Autor assenta no regime legal de contratação de trabalhadores não residentes regulado no Despacho n.º 12/GM/88 de 01 de Fevereiro, cujas condições mínimas de contratação estarão, segundo defende incorporadas no contrato de prestação de serviços que a Ré celebrou tal como exigido pela alínea c) do n.º 9 desse diploma legal e na qualificação jurídica deste contrato como sendo a favor de terceiro.
  Ficou provado que desde 01/01/2008 até 20/07/2019 o Autor esteve ao serviço da Ré (YYY), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. Entre 01/01/2008 e 31/07/2010, o Autor exerceu funções para a Ré (YYY). – ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/2003. O Autor sempre respeitou os períodos, os horários e os locais de trabalho fixados pela Ré. Por outro lado, a Ré (YYY) pagou ao Autor a determinada quantia a título de salário de base mensal. Pelo que nesta acção importa analisar o regime legal a que está sujeita a contratação de trabalhadores não residentes, dado que não restarão dúvidas quanto à natureza jus laboral desta relação jurídica.
  Relativamente à questão jurídica fundamental, ao enquadramento da relação estabelecida entre as partes outorgantes do mencionado contrato de prestação de serviços e à sua repercussão na esférica jurídica do Autor, o Tribunal de Segunda Instância já firmou jurisprudência unânime no sentido de que estamos na presença de um contrato a favor de terceiro que tem como beneficiário ora Autor, citando-se como exemplo, o Acórdão datado de 25.07.2013, sob o Processo n.º 322/2013, cujo sumário parcial aqui nos permitimos reproduzir:
3. É de aplicar a uma dada relação de trabalho, para além do regulado no contrato celebrado directamente entre o empregador e o trabalhador, o regime legal mais favorável ao trabalhador e que decorre de um contrato celebrado entre o empregador e uma Sociedade prestadora de serviços, ao abrigo do qual o trabalhador foi contratado e ao abrigo do qual, enquanto não residente, foi autorizado a trabalhar em Macau, regime esse devidamente enquadrado por uma previsão normativa constante do Despacho 12/GM/88, de 1 de Fevereiro.
4. A Lei de Bases da Política de Emprego e dos Direitos Laborais, Lei n.º 4/98/M, de 27 de Julho, publicada no BO de Macau n.º 30, I série, no artigo 9.° admite a contratação de trabalhadores não residentes quando se verifiquem determinados pressupostos, estatuindo que essa contratação fica dependente de uma autorização administrativa a conceder individualmente a cada unidade produtiva.
5. O Despacho 12/GM/88 cuida tão somente do procedimento administrativo conducente à obtenção de autorização para a contratação de trabalhadores não residentes e não do conteúdo concreto da relação laboral a estabelecer entre os trabalhadores não residentes e as respectivas entidades patronais.
6. O trabalhador só foi contratado porque a Administração autorizou a celebração daquele contrato, devidamente enquadrado por um outro contrato que devia ser celebrado com uma empresa fornecedora de mão-de-obra e onde seriam definidas as condições mínimas da contratação, como flui do artigo 9º, d), d.2) do aludido despacho 12/GM/88.
7. Estamos perante um contrato a favor de terceiro quando, por meio de um contrato, é atribuído um benefício a um terceiro, a ele estranho, que adquire um direito próprio a essa vantagem.
8. Esta noção está plasmada no artigo 437º do CC, aí se delimitando o objecto desse benefício que se pode traduzir numa prestação ou ainda numa remissão de dívidas, numa cedência de créditos ou na constituição, transmissão ou extinção de direitos reais.
9. Será o que acontece quando um dado empregador assume o compromisso perante outrem de celebrar um contrato com um trabalhador, terceiro em relação a esse primitivo contrato, vinculando-se a determinadas estipulações e condições laborais.
10. O facto de a empregadora ter assumido a obrigação de dar trabalho, tal não é incompatível com uma prestação de contratar, relevando aí a modalidade de uma prestação de facere.
  Assim sendo, sem necessidade de outras considerações, como parte beneficiária do contrato de prestação de serviços dado como assente o Autor tem direito a prevalecer-se do clausulado mínimo deles constantes para reclamar eventuais diferenças remuneratórias e complementos salariais a que tinha direito e que não lhe foram pagos.
  A previsão do artigo 23.º, nº7 da Lei 21/2009, de 27/10/2009, traduz uma clarificação a este respeito, tornando mais clara ainda a orientação legislativa, no sentido de, havendo divergência entre as condições de trabalho constantes do contrato e as apresentadas com o requerimento de autorização de contratação, prevalecer o regime mais favorável ao trabalhador.
  Debrucemo-nos, pois, sobre os pedidos do Autor.
*
  Subsídio de efectividade
  Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/2003 ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para as Rés até 31/07/2010, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”.
  Ficou provado que durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré. Contudo, Entre 01/01/2008 a 31/07/2010, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade.
  Em relação ao subsídio de efectividade, vista a sua natureza e fins - já não se manifestam as razoes que levam a considerar que a sua atribuição esteja excluída numa situação de não assiduidade justificada ao trabalho. Se o patrão autoriza uma falta seria forcado retirar ao trabalhador uma componente retributiva da sua prestação laboral, não devendo o trabalhador ser penalizado por uma falta em que obteve anuência para tal e pela qual o patrão também assumiu a sua responsabilidade.
  Nestes termos, o Autor tem direito a receber as quantias calculadas segundo a fórmula: número dos meses X o salário diário X 4 dias:
Período
Meses
Salário diário X 4
Quantia indemnizatória
01/01/2008 a 31/07/2010
31 meses
HKD$250.00 X 4
MOP$31,930.00
  Assim, deve a Ré pagar ao Autor a quantia de MOP$31,930.00 a título de subsídio de efectividade.
*
  Compensação pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado
O Autor pretende ser indemnizado pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado, no período decorrido desde o início da relação laboral até 31/12/2008.
  Ficou provado que entre 01/01/2008 a 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (YYY) durante 5 dias de feriado obrigatório. Contudo, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado pelo Autor nos referidos dias de feriado obrigatórios.
  Segundo o artigo 19.º, n.ºs 2 e 3, nos feriados obrigatórios os trabalhadores, que tenham completado o período experimental, devem ser dispensados da prestação de trabalho, e os trabalhadores esses têm direito à retribuição correspondente aos feriados de 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 1 de Maio e, 1 de Outubro.
  O artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M de 3 de Abril dispõe, no seu n.º1, que se o trabalhador prestar trabalho nos dias de feriados obrigatórios remunerados na situação prevista na al. c) do mesmo, o trabalhador terá direito a auferir, para além da remuneração normal do dia de trabalho prestado, a um acréscimo salarial não inferior ao dobro da retribuição normal.
Assim sendo, para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado pelo trabalhador em feriados obrigatórios remunerados, mas somente a partir de 3 de Abril de 1989, vista a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 24/89/M, a fórmula há-de corresponder ao “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal”, para além do próprio salário normal em singelo, caso tenha que trabalhar nesses feriados, a despeito da regra da dispensa obrigatória de prestação de trabalho. Somando o singelo, no fundo vai receber no total triplo da retribuição normal (salário singelo + acréscimo salarial ao dobro da retribuição normal).
  Há, todavia, que ponderar a circunstância de a Ré ter pago o valor em singelo, pelo que aos valores apurados se tem de deduzir o montante pago em singelo pela Ré, assim o Autor só terá direito a auferir mais o dobro da sua retribuição.1
Vejamos, então, quais os valores que deveriam ter sido pagos a este trabalhador e não foram, partindo dos valores de retribuição diários que lhe eram devidos, segundo a fórmula (Salário diário) x (n.º de dias de feriado obrigatório não gozados) x 2:

Período
Salário diário X 2
N.º de dias de trabalho prestado em feriados obrigatórios remunerados
Quantia indemnizatória
01/01/2008 a 31/12/2008
HKD$250.00X2
5
MOP$2,575.00
Assim, deve a Ré pagar ao Autor a quantia de MOP$2,575.00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado.
*
  Devolução da comparticipação no alojamento
  Não se provou toda a matéria de facto quanto a isso.
  Pelo que, é de indeferir o referido pedido do Autor.
*
  Compensação de trabalho extraordinário de, pelo menos, 30 minutos que antecederam o início de cada turno
Ficou provado que entre 01/01/2008 a 20/07/2018, por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, tendo aí permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. Mas a Ré nunca atribuiu ao Autor uma qualquer quantia salarial pelo período de 30 minutos que antecediam o início de cada turno.
Em concreto,
- Entre 01/01/2008 a 31/12/2008, o Autor prestou 294 dias de trabalho efectivo, tendo comparecido com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno.
- Entre 01/01/2009 a 31/07/2010, o Autor prestou 484 dias de trabalho efectivo, tendo comparecido com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno.
- Entre 01/08/2010 a 20/07/2015, o Autor prestou 1461 dias de trabalho efectivo, tendo comparecido com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno.
- Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, o Autor prestou 863 dias de trabalho efectivo, tendo comparecido com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno.
O artigo 10.º, n.º4 do Decreto-Lei 24/89/M dispõe que os períodos fixados no n.º 1 não incluem o tempo necessário à preparação para o início do trabalho e à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados, desde que no seu conjunto não ultrapassem a duração de trinta minutos diários.
No caso em apreço, o Autor não era livre de comparecer, ou não, durante esse período que antecedia o início de cada turno de trabalho. Estava obrigado a fazê-lo porque assim lho era imposto pela entidade patronal e com carácter de regularidade.
  Ora, tal não é o espírito da lei. O preceito citado apenas trata da possibilidade de o trabalhador poder ter que ultrapassar em 30 minutos (no conjunto) o tempo de trabalho fixado no n.º1, desde que esse período de 30 minutos seja “necessário à preparação para o início do trabalho” (o que pressupõe que seja prévio ao início de cada turno), ou se mostre “necessário…à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados” (o que significa que é um tempo posterior ao termo de cada turno).
  A intenção do legislador será não fazer recair sobre a entidade patronal o período de tempo que antecede o início de cada turno na preparação da jornada de trabalho (v.g., o tempo que dura a substituir a roupa da viagem pela que seja mais próxima ao exercício laboral), bem assim como o tempo que dura a concluir um serviço começado e não acabado (v.g., concluir as contas ou, como também se diz, “fechar a caixa”), assim se evitando abusos do trabalhador com artimanhas e estratégias de serviço vagaroso que visem prolongar o horário da prestação de trabalho.
  Só que estas são sempre situações que, por natureza não têm carácter regular. Cremos, antes, que sejam excepcionais, que se verificarão apenas quando necessárias, logo, esporádicas e ocasionais.
  Porém, o Autor estava obrigado a comparecer ao local de trabalho 30 minutos antes todos os dias. Portanto, aquilo que era uma situação excepcional foi convertida em situação de normalidade por iniciativa da Ré.
  Sendo assim, este período deve ser contado para o cômputo da compensação pela prestação de trabalho em horas extraordinárias, uma vez que o Autor devia apresentar-se nas instalações da empresa durante esse período devidamente uniformizado, estando por isso ao serviço desta.
Portanto, tem o Autor direito a receber um acréscimo de salário, nos termos do artigo 11.º, n.º2 do Decreto-Lei 24/89/M.
Tendo em conta os dias de trabalho efectivo pelo Autor prestado, segundo a fórmula (Salário horário) x (n.º de dias de trabalho efectivo) /2, tem o Autor direito a receber a tal título:

Período
N.º de dias de trabalho efectivo
Salário horário/2
Quantia indemnizatória
01/01/2008 a 31/12/2008
294
HKD$31.25/2
MOP$4,731.56
  Assim num total de MOP$4,731.56 (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/12/2008). Conforme o princípio dispositivo, deve a Ré pagar-lhe a quantia global no montante de MOP$4,594.00.
  Com entrada em vigor da Lei n.º 7/2008 desde 1 de Janeiro de 2009, o seu artigo 33.º, n.ºs 1 e 5 prevê que, o período normal de trabalho não pode exceder oito horas por dia e quarenta e oito horas por semana, e os períodos referidos não incluem o tempo necessário à preparação para o início do trabalho e à conclusão de transacções, actividades e serviços começados e não acabados, desde que no seu conjunto não ultrapassem a duração de trinta minutos por dia.
O artigo 36.º da Lei n.º 7/2008 dispõe no seu n.º 1, o trabalho extraordinário é prestado: 1) Por determinação prévia do empregador, independentemente do consentimento do trabalhador, nas situações e com os limites previstos no número seguinte; 2) Por solicitação prévia do empregador, obtido o consentimento do trabalhador; 3) Por iniciativa do trabalhador, obtido o consentimento prévio do empregador.
O n.º 4 do mesmo artigo prevê que nas situações previstas nas alíneas 2) e 3) do n.º 1, deve existir registo que comprove o consentimento.
No caso vertente, por não existir nenhum registo para comprovar o consentimento, só pode se considerar que o Autor prestou trabalho extraordinário nos termos do artigo 36.º, n.º 1, al. 1) da Lei nº 7/2008.
  De acordo com o artigo 37.º, nº1 da mesma Lei, a prestação de trabalho extraordinário nos termos da alínea 1) do n.º 1 do artigo anterior confere ao trabalhador o direito a auferir a remuneração normal do trabalho prestado com um acréscimo de 50%.
  Portanto, tendo em conta os dias de trabalho efectivo pelo Autor prestado, segundo a fórmula (Salário horário) x (n.º de dias de trabalho efectivo) /2, tem o Autor direito a receber a tal título:

Período
N.º de dias de trabalho efectivo
Salário horário/2
Quantia indemnizatória
01/01/2009 a 31/07/2010
484
HKD$46.875/2
MOP$11,684.06
01/08/2010 a 20/07/2015
1461
MOP$46.875/2
MOP$34,242.19
21/07/2015 a 20/07/2018
863
MOP$48.656/2
MOP$20,995.06
  Assim, deve a Ré pagar ao Autor a quantia de MOP$66,921.31 pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo (relativo ao período de 01/01/2009 a 20/07/2018).
  Por outro lado, ficou provado que a Ré nunca conferiu ao Autor o gozo de um descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado.
  De acordo com o artigo 38.º, n.ºs 1 a 3, da Lei n.º 7/2008, 1. Nas situações previstas nas alíneas 1) e 2) do n.º 2 do artigo 36.º, o trabalhador tem direito a gozar um descanso adicional, remunerado nos termos gerais, com uma duração: 1) Não inferior a vinte e quatro horas, se o período de trabalho atingir o respectivo limite diário máximo; 2) Proporcional ao período de trabalho prestado, se o período de trabalho não atingir o respectivo limite diário máximo. 2. O disposto no número anterior aplica-se à situação prevista na alínea 3) do n.º 2 do artigo 36.º se o trabalhador prestar trabalho extraordinário durante dois dias consecutivos. 3. O direito ao descanso compensatório é gozado nos quinze dias seguintes ao da prestação do trabalho extraordinário, em dia escolhido pelo trabalhador, com a concordância do empregador.
  O artigo 36.º, n.º2 da mesma Lei prevê que, o empregador pode determinar que o trabalhador preste trabalho extraordinário, independentemente do seu consentimento, quando: 1) Se verifiquem casos de força maior, caso em que o período de trabalho diário não pode exceder dezasseis horas; 2) O empregador esteja na iminência de prejuízos importantes, caso em que o período de trabalho diário não pode exceder dezasseis horas; 3) O empregador tenha de fazer face a acréscimo de trabalho não previsível, caso em que o período de trabalho diário não pode exceder doze horas.
  No caso em apreço, por não se verificarem casos de força maior nem casos em que o empregador esteja na iminência de prejuízos importantes, tendo em conta os interesses das partes e a protecção do direito do trabalhador, só pode se aplicar o artigo 36.º, n.º2, al. 3) da Lei nº 7/2008.
  Ficou provado que o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (YYY) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos, a que se seguia um período de vinte e quatro horas de descanso compensatório, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno.
  Assim, o Autor tem direito a gozar um descanso adicional, remunerado nos termos gerais, com uma duração proporcional ao período de trabalho prestado, por prestar trabalho extraordinário durante dois dias consecutivos.
  Contudo, só pode agora fixar uma compensação económica calculada segundo a fórmula (N.º de vezes de trabalho extraordinário prestado durante dois dias consecutivos) x (Salário horário) x 1 (isto porque, o Autor prestou, pelo menos, 30 minutos de trabalho extraordinário por dia, ou seja, 1 hora de trabalho extraordinário durante dois dias consecutivos):
Período
N.º de vezes de trabalho extraordinário prestado durante dois dias consecutivos2
Salário horário
Quantia indemnizatória
01/01/2009 a 31/07/2010
207 = 484/7x3
HKD$31.25
MOP$6,662.81
01/08/2010 a 20/07/2015
626 = 1461/7x3
MOP$31.25
MOP$19,562.50
21/07/2015 a 20/07/2018
369 = 863/7x3
MOP$32.438
MOP$11,969.62
  Assim perfaz de MOP$38,194.93.
*
  Compensação pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias (Compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal)
  O Autor ainda pretende ser indemnizado pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal no período decorrido entre 01/01/2008 a 20/07/2019.
Ficou provado que o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (YYY) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos, a que se seguia um período de vinte e quatro horas de descanso compensatório, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno.
  Em concreto, entre 01/01/2008 a 31/12/2008, o Autor prestou 42 dias de trabalho efectivo junto da Ré no sétimo dia em cada período de sete dias de trabalho consecutivo. Contudo, a Ré nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado no sétimo dia em cada período de sete dias de trabalho consecutivo.
  O artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M de 3 de Abril dispõe, no seu n.º1, que todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26.º.
  O artigo 18.º do mesmo Decreto-Lei prevê as excepções do referido artigo: sempre que, em função da natureza do sector de actividade, se revele inviável a observância do n.º 1 do artigo anterior, deverá ser concedido aos trabalhadores um descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, o qual não deverá ser inferior ao que resultaria de uma média semanal de 24 horas.
  No caso em apreço, mesmo que considerando a natureza do sector de actividade (guarda de segurança), a Ré concedeu ao Autor um descanso consecutivo de vinte e quatro horas, após cada sete dias de trabalho consecutivos, obviamente não se verificando o disposto no artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M. Assim, tem que se considerar que o Autor prestou trabalho junto da Ré em dia de descanso semanal nos termos do artigo 17.º, n.º1 do mesmo Decreto-Lei.
  O n.º6 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 32/90/M de 9 de Julho, dispõe, pois, que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago: a) aos trabalhadores que auferem salário mensal, pelo dobro da retribuição normal.
  Então, deve calcular os valores da indemnização a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, segundo a fórmula: (Salário diário) x (n.º de dias devidos e não gozados) x 2.
  Há, todavia, que ponderar a circunstância de a Ré ter pago o valor em singelo, pelo que aos valores apurados se tem de deduzir o montante pago em singelo pela Ré3, sob pena de estar o Autor a ser pago, não pelo dobro, mas pelo triplo do valor diário devido, o que a lei manifestamente não prevê4.
  Vejamos, então, quais os valores que deveriam ter sido pagos a este trabalhador e não foram, partindo dos valores de retribuição diários que lhe eram devidos, segundo a fórmula (Salário diário) x (n.º de dias devidos e não gozados):
Período
Salário diário
N.º de dias não gozados
Quantia indemnizatória
01/01/2008 a 31/12/2008
HKD$250.00
42
MOP$10,815.00
Assim num total de MOP$10,815.00.
  Ficou provado que entre 01/01/2008 a 31/12/2008, a Ré (YYY) já fixou ao Autor um total de 42 dias de descanso compensatório, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal.
  Pelo que é de indeferir o pedido da indemnização a título de descanso compensatório não gozado relativo ao período de 01/01/2008 a 31/12/2008.
  Por outro lado, com entrada em vigor da Lei n.º 7/2008 desde 1 de Janeiro de 2009, o seu artigo 42.º, n.º 1 também prevê que, o trabalhador tem direito a gozar um período de descanso remunerado de vinte e quatro horas consecutivas por semana.
Contudo, o n.º 2 do mesmo artigo dispõe que, o gozo do período de descanso pode não ter frequência semanal em caso de acordo entre as partes ou quando a natureza da actividade da empresa o torne inviável, casos em que o trabalhador tem direito a gozar um período de descanso remunerado de quatro dias por cada quatro semanas.
É verdade que ficou provado que entre 01/01/2009 a 20/07/2018 a Ré (YYY) não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas em cada semana (leia-se, em cada período de sete dias).
  Em concreto,
- Entre 01/01/2009 a 31/07/2010 o Autor prestou 69 dias de trabalho ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho em cada semana.
- Entre 01/08/2010 a 20/07/2015 o Autor prestou, pelo menos, 208 dias de trabalho ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho em cada semana.
- Entre 21/07/2015 a 20/07/2018 o Autor prestou 123 dias de trabalho ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho em cada semana.
  Os números de dias referidos são calculados com base do regime de trabalho do Autor e dos dias de férias aunais e/ou de dispensa ao trabalho gozados pelo Autor (Cfr. Fundamentação na resposta à matéria de facto).
  De acordo com o artigo 567.º do CPC, o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.
  Tendo em conta a natureza do sector de actividade (guarda de segurança no casino), o gozo do período de descanso pode não ter frequência semanal, mas o Autor ainda tem direito a gozar um período de descanso remunerado de quatro dias por cada quatro semanas, nos termos do artigo 42.º, n.º2 da Lei n.º 7/2008.
De acordo com o artigo 43.º, n.º2, al. 1) da Lei n.º 7/20085, a prestação de trabalho nos termos do número anterior confere ao trabalhador o direito a gozar um dia de descanso compensatório, fixado pelo empregador, dentro dos trinta dias seguintes ao da prestação de trabalho, e o direito a auferir um acréscimo de um dia de remuneração de base ou gozar, dentro de trinta dias, um dia de descanso compensatório para os trabalhadores que auferem uma remuneração mensal.
  Pelo que, segundo a fórmula (Salário diário) x (n.º de dias que o Autor tem direito a gozar – n.º de dias que o Autor já gozou), o Autor tem direito a receber:
Período
Salário diário
N.º de dias não gozados6
Quantia indemnizatória
01/01/2009 a 31/07/2010
HKD$250.00
10=(577-24)/7–69
MOP$2,575.00
01/08/2010 a 20/07/2015
MOP$250.00
30=(1815-146)/7–208
MOP$7,500.00
21/07/2015 a 20/07/2018
MOP$259.50
17=(1096-110)/7–123
MOP$4,411.50
Assim num total de MOP$14,486.50.
  Ainda ficou provado a matéria de facto a seguintes:
- Entre 01/01/2009 a 31/07/2010, a Ré (YYY) faltou fixar ao Autor 10 dias de descanso compensatório.
- Entre 01/08/2010 a 20/07/2015, a Ré (YYY) faltou fixar ao Autor 30 dias de descanso compensatório.
- Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, a Ré (YYY) faltou fixar ao Autor 17 dias de descanso compensatório.
  Contudo, só pode agora fixar uma compensação económica, pelo que, entende o Tribunal ser de atribuir de modo a ser-lhe concedido um montante equivalente a um dia de salário, o que dá o montante de MOP$14,486.50.
*
  Bonificações, remunerações adicionais e gorjetas
Na presente acção, apenas ficou provado que resulta do Contrato de Prestação de Serviço ao abrigo do qual o Autor prestou trabalho para a Ré que: “(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, a Ré) paga aos operários residentes no Território”.
  Ao abrigo da referida cláusula, o Autor tem direito a receber as bonificações ou remunerações adicionais, para além da remuneração normal, que a Ré pagou aos operários residentes, mas a Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de bonificações ou remunerações adicionais ou gorjetas.
  Ora, a questão será, se a Ré sempre pagou aos seus trabalhadores residentes, para além das respectivas remunerações normais, determinadas bonificações ou remunerações adicionais.
  Segundo a matéria de facto dada como provada, é verdade que existia um regime estabelecido pela Ré segundo o qual esta sempre pagou/distribuiu aos seus trabalhadores guardas de segurança residentes, para além das respectivas remunerações normais, determinadas quantias a título de gorjetas ou tips.
  No entanto, salvo melhor opinião, o Tribunal entende que as alegadas bonificações ou remunerações adicionais (em chinês 獎金或額外報酬) não são iguais às gorjetas (no caso vertente, em chinês 茶資) ou a tips (小費).
  As bonificações ou remunerações adicionais podem ser as prestações não periódicas pagas casuisticamente pelo empregador, nomeadamente subsídios, prémios e comissões que tenham natureza de gratificação, ainda podem ser as prestações periódicas em dinheiro fixadas por acordo entre o empregador e o trabalhador. Em qualquer dos casos, as bonificações ou remunerações adicionais são controláveis pelo empregador. Por outro lado, as gorjetas, no caso vertente, são dadas voluntariamente pelos clientes (terceiros) nos casinos, cuja cobrança é incontrolável pelo empregador.
  Portanto, o Autor não tem direito a auferir as gorjetas que a Ré pagou aos trabalhadores residentes.
  Todavia, sem dúvida que o Autor tem direito a receber as bonificações ou remunerações adicionais (mas não gorjetas), para além da remuneração normal, que a Ré pagou aos operários residentes, por não resultarem provadas as respectivas quantias, o que se liquidará em execução de sentença, nos termos do artigo 564.º, n.º2 do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPT.
*
  Juros moratórios
  Às quantias supra mencionadas acrescerão juros a contar da data da decisão judicial que fixa o respectivo montante7, atento o que dispõe o artigo 794.º, n.º4 do CC, dado que por estarmos na presença de um crédito ilíquido, os juros moratórios, só se vencem a contar da data em que seja proferida a decisão que procede à liquidação do quantum indemnizatório.
*
IV. DECISÃO
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, julga-se a acção parcialmente procedente e em consequência condena-se a Ré a pagar ao Autor, a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$184,003.24 sendo:
- MOP$31,930.00 a título de subsídio de efectividade (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/07/2010);
- MOP$2,575.00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/12/2008);
- MOP$4,594.00 pela prestação de, pelo menos, 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/12/2008);
- MOP$66,921.31 pela prestação de, pelo menos, 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo (relativo ao período de 01/01/2009 a 20/07/2018);
- MOP$38,194.93 a título de descanso compensatório não gozado pela prestação de trabalho extraordinário (relativo ao período de 01/01/2009 a 20/07/2018);
- MOP$10,815.00 pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal (relativo ao período de 01/01/2008 a 31/12/2008);
- MOP$14,486.50 pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal (relativo ao período de 01/01/2009 a 20/07/2018);
- MOP$14,486.50 a título de descanso compensatório não gozado pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal (relativo ao período de 01/01/2009 a 20/07/2018).
  Mais se condena a Ré a pagar ao Autor o montante correspondente às bonificações ou remunerações adicionais (mas não gorjetas) pagas aos operários residentes, a liquidar em execução de sentença.
  Às quantias supra mencionadas acrescerão juros moratórios à taxa legal a contar da data da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório até integral e efectivo pagamento.
  Absolve-se no mais a Ré do pedido.
  As custas serão a cargo da Ré e do Autor na proporção do respectivo decaimento.
  Registe e notifique.

Notificadas as partes da sentença, veio o Autor recorrer dela para esta segunda instância, concluindo e pedindo que:
1) Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação da Recorrente na atribuição de uma compensação devida ao Autor pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e, bem assim, pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado à luz do DL n.º 24/89/M, de 3 de Abril;
2) Impõe-se, ainda, apreciar a interpretação e aplicação que o Tribunal a quo levou a cabo a respeito do art. 42.º da Lei n.º 7/2008, e que conduziu à condenação da Recorrida numa quantia muito inferior à reclamada pelo Autor em sede de Petição Inicial;
3) Pelas razões que adiante melhor se expõem, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de direito quanto às concretas formas de cálculo devidas pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado e, deste modo, se mostra em violação ao disposto nos artigos 17.º, 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril e do art. 42.º da Lei n.º 7/2008, razão pela qual se impõe que a mesma seja julgada nula e substituída por outra que decida em conformidade com a melhor interpretação a conferir aos referidos preceitos;
Em concreto,
4) Entendeu o Tribunal a quo ser de sufragar o entendimento seguido pelo Tribunal de Última Instância e, em consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor apenas ao correspondente ao valor de um salário em singelo no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso semanal durante todo o período da relação laboral, a liquidar em execução de sentença;
5) Porém, salvo melhor opinião, ao proceder à condenação da Ré apenas em singelo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
6) Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, para além do valor relativo ao próprio dia de trabalho prestado;
7) Trata-se, de resto, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma uniforme pelo Tribunal de Segunda Instância, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: (salário diário X n.º de dias devidos e não gozados X 2);
8) De onde, in casu, resultando provado que entre 01/01/2008 a 31/12/2008 o Autor prestou 42 dias de trabalho efectivo junto da Ré no sétimo dia em cada período de sete dias de trabalho consecutivo - deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$21.630,00 a título do dobro do salário - e não só apenas de MOP$10.815,00 correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer;
Acresce que,
9) Contrariamente ao concluído pelo Tribunal a quo, não é correcto concluir que a Nova Lei das Relações de Trabalho admite a concessão do dia de descanso semanal ao 8.º dia após a prestação de sete dias de trabalho consecutivo em cada semana, nem o dia de descanso semanal pode ser confundido com o dia descanso compensatório;
10) Depois, contrariamente ao concluído pelo Tribunal a quo, não resulta da matéria de facto assente (nem foi sequer alegado pela Ré nos articulados) que a actividade desenvolvida pela Ré, por si só, "torne inviável" o gozo pelo Autor (e pelas demais centenas de guardas de segurança) de um dia de descanso semanal em cada período de sete dias;
11) Trata-se, de resto, de uma situação (leia-se, interpretação) que foi já anteriormente apreciada pelo douto Tribunal de Recurso, nos termos da qual se entendeu que: "(...) uma coisa é a continuidade das actividades de casino, outra coisa é a inviabilidade de assegurar aos seus guardas de segurança o gozo de um descanso de vinte e quatro horas consecutivas num período de sete dias. Não podemos aceitar que, dado o número gigantesco, que aliás é facto notório, dos elementos do pessoal de segurança da YYY, como é que não é viável mobilizá-los por forma a conciliar o normal funcionamento dos casinos com a não prestação de serviço por um número razoável dos guardas de segurança durante apenas vinte e quatro horas em cada período de sete dias! Aliás, se é viável, (...) o gozo pelo Autor de um dia de descanso ao oitavo dia, não se vê por quê motivo não é viável o gozo do tal dia ao sétimo dia! De qualquer maneira, o dito oitavo dia que o Autor gozou nunca é qualificável como descanso semanal a que se refere o art. 42.º da Lei n.o 7/2008(...)" (Cfr. o Ac. do TSI n.º 944/2020);
12) E a ser assim, salvo o devido respeito, em caso algum se justifica que aquando do apuramento dos dias de descanso semanal a que o Autor tem direito, pudesse o douto Tribunal a quo ter procedido ao "desconto" dos dias de descanso compensatório pelo mesmo gozados, porque em manifesta contradição com a letra e com o espírito do art. 42.º, n.º 2 da Lei n.º 7/2008;
13) De onde, resultando da matéria de facto provado que:
  "Desde 01/01/2009 até 20/07/2018, a Ré (YYY) não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas em cada semana (leia-se, em cada período de sete dias)" (ponto 25.º da Sentença);
  "Entre 01/01/2009 até 31/07/2010, o Autor prestou, pelo menos, 69 dias de trabalho ao sétimo dia, para a Ré (YYY) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho";
  "Entre 01/08/2010 até 20/07/2015, o Autor prestou, pelo menos, 208 dias de trabalho ao sétimo dia, para a Ré (YYY) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho" (ponto 26.º da Sentença);
  "Entre 21/07/2015 até 20/07/2018, o Autor prestou, pelo menos, 123 dias de trabalho ao sétimo dia, para a Ré (YYY) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho" (ponto 27.º da Sentença);
14) Impõe-se a condenação da Ré, Recorrida, a pagar ao Autor, Recorrente, a quantia de Mop$101.686,00 e não só de apenas Mop$14.486,50 conforme resulta da Decisão em crise, o que desde já se requer;
15) A não se entender assim, está o Recorrente em crer ter existido uma errada aplicação da norma em questão (leia-se, do n.º 2 do art. 42.º da Lei n.º 7/2008) pelo Tribunal de Primeira Instância, o que em caso algum poderá deixar de conduzir, nesta parte, à sua nulidade, devendo ser substituída por outra que decida em conformidade com o referido preceito legal, o que desde já e para os legais e devidos efeitos se invoca e requer.
Por último,
16) Entendeu o douto Tribunal a quo que na determinação da quantia devida pelas Rés ao Autor a título de trabalho prestado nos dias de feriados obrigatórios o Autor terá direito a receber das Rés as compensações compostas pela remuneração em singelo, acrescida do dobro dessa remuneração;
17) Ora, tendo o Tribunal a quo explicitado que pelo dobro da retribuição se deve entender o equivalente a mais um dia de salário em singelo (nos termos que têm vindo a ser seguidos pelo TUI nos Acs. 28/2007, 29/2007, 58/2007 e 40/2009) tal significa que, neste particular, a douta Sentença igualmente se afasta do entendimento que tem vindo a ser sufragado pelo Tribunal de Segunda Instância - nos termos do qual se entende que a fórmula mais correcta de interpretar o referido preceito será conceder ao Autor, ora Recorrente, um "acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito" - o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal - e não somente o dobro da retribuição normal como parece ter decidido o Tribunal Judicial de Base;
18) Em concreto, resultando provado que durante o período da relação laboral o Recorrente prestou trabalho para a Recorrida durante 5 dias de feriados obrigatórios, deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$3.862.50 a título do triplo do salário - e não só apenas de MOP$2.575,00, o que desde já e para os legais e devidos efeitos se requer.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. encarregar-se-ão de suprir, deve a douta Sentença ser julgada nula e substituída por outra que atenda às fórmulas de cálculo tal qual formuladas pelo Autor na sua Petição Inicial e relativas ao trabalho prestado em dia de descanso semanal e feriado obrigatório, assim se fazendo a já costumada JUSTIÇA!

Ao recurso respondeu a Ré pugnando pela improcedência.

Admitido no Tribunal a quo, o recurso foi feito subir a este Tribunal de recurso.

Liminarmente admitido o recurso e colhidos os vistos, cumpre conhecer.
II

Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).

Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.

Inexistindo questão de conhecimento oficioso e face às conclusões do recurso, as questões que constituem o objecto da nossa apreciação consiste em saber, no âmbito da vigência do Decreto-Lei nº24/89/M, quais são os multiplicadores para o cálculo do trabalho prestado nos dias de descanso semanal e de feriado obrigatório, e se, em face do disposto na Lei nº 7/2008, os descansos gozados pelo Autor em cada oitavo dia após a prestação contínua de 7 dias nova laboral são considerados com descanso semanal a que se refere o artº 42º do mesmo diploma.

O Autor pede na acção a condenação da Ré a pagar-lhe, inter alia, a compensação do trabalho prestado nos dias de descanso semanal, referentes aos períodos de tempos sucessivos da vigência das leis laborais velha e nova, assim como a compensação de feriados obrigatórios não gozadas na vigência da lei laboral nova.

O Tribunal a quo deu-lhe parcialmente razão e acabou por reconhecer ao Autor esses direitos.

Mas o Autor questiona o multiplicador (X 1) para o cálculo do trabalho prestado nos dias de descanso semanal e o multiplicador (X 2) para o cálculo do trabalho prestado nos dias de feriados obrigatórios, adoptados pelo Tribunal a quo, defendendo que deve ser adoptado o multiplicador (X 2) e (X3), respectivamente, assim como invocou o erro de direito em relação à compensação arbitrada pelo trabalho prestado nos dias de descanso semanal na vigência da Lei nº 7/2008.

Então vejamos estas questões:

1. Do multiplicador para o cálculo do trabalho prestado nos dias de descanso semanal e do multiplicador para o cálculo do trabalho prestado nos dias de feriados obrigatórios, na vigência do Decreto-Lei nº24/89/M

Para nós, tem razão o recorrente no que diz respeito a estas duas questões.

Pois no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, a lei regula as condições do trabalho prestado em dias de descanso semanal e as diferentes formas de compensações desse trabalho consoante as variadas circunstâncias que o justificam.

Diz o artº 17º deste diploma que:

1. Todos os trabalhadores têm direito a gozar, em cada período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26º.
2. O período de descanso semanal de cada trabalhador será fixado pelo empregador, com devida antecedência, de acordo com as exigências do funcionamento da empresa.
3. Os trabalhadores só poderão ser chamados a prestar trabalho nos respectivos períodos de descanso semanal:
a) Quando os empregadores estejam em eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
b) Quando os empregadores tenham de fazer face a acréscimos de trabalho não previsíveis ou não atendíveis pela admissão de outros trabalhadores;
c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável e insubstituível para garantir a continuidade do funcionamento da empresa.

4. Nos casos de prestação de trabalho em período de descanso semanal, o trabalhador tem direito a um outro dia de descanso compensatório a gozar dentro dos trinta dias seguintes ao da prestação de trabalho e que será imediatamente fixado.
5. A observância do direito consagrado no nº 1 não prejudica a faculdade de o trabalhador prestar serviço voluntário em dias de descanso semanal, não podendo, no entanto, a isso ser obrigado.
6. O trabalho prestado nos termos do número anterior dá ao trabalhador o direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Em face dos factos que ficaram provados nos presentes autos, não se mostrando que o trabalho em dias de descanso semanal foi prestado em qualquer das situações previstas no nº 3 e na falta de outros elementos fácticos, a compensação deve processar-se nos termos consagrados no nº 6, isto é, o trabalhador tem direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso semanal, a fórmula é:

2 X o salário diário médio X número de dias de prestação de trabalho em descanso semanal, fora das situações previstas no artº 17º/3, nem para tal constrangido pela entidade patronal.

E em relação ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatório, o trabalho em feriados obrigatórios e a forma das suas compensações encontram-se regulados no artº 20º do Decreto-Lei nº 24/89/M que prescreve:

1. O trabalho prestado pelos trabalhadores nos dias de feriado obrigatório, referidos no nº 3 do artigo anterior, dá direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal e só pode ser executado:
a) Quando os empregadores estejam na eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
b) Quando os empregadores tenham de fazer face a um acréscimo de trabalho não previsível;
c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável para garantia a continuidade do funcionamento da empresa, nos casos em que, de acordo com os usos e costumes, esse funcionamento deva ocorrer nos dias de feriados.
2. Nos casos de prestação de trabalho em dia feriado obrigatório não remunerado, ao abrigo da alínea b) do nº 1, o trabalhador que tenha concluído o período experimental tem direito a um acréscimo de salário nunca inferior a 50% do salário normal, a fixar por acordo entre as partes.

Nos termos do disposto no artº 19º/3, os trabalhadores têm direito à retribuição nos seis dias de feriado obrigatório (1 de Janeiro, os primeiros 3 dias do Ano Novo Chinês, 1 de Maio e 1 de Outubro).

Perante a materialidade fáctica assente, o trabalho prestado pelo trabalhador em dias de feriados obrigatório integra-se justamente na circunstância prevista no artº 20º/1-c), pois o trabalhador estava afectado aos casinos explorados pela entidade patronal, que como vimos supra, se obrigava legalmente a manter os seus casinos em funcionamento contínuo.

Assim, ao abrigo do disposto no artº20º/1, o trabalhador tem direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal.

A propósito da interpretação da expressão “acréscimo salarial”, ensina o Dr. Augusto Teixeira Garcia que “......A prestação de trabalho nestes dias dá o direito aos trabalhadores de receberem um acréscimo de retribuição nunca inferior ao dobro da retribuição normal (artº 20º, nº1). Assim, se um trabalhador aufere como remuneração diária a quantia de MOP$100, por trabalho prestado num dia feriado obrigatório e remunerado ele terá o direito de auferir MOP$300, ou seja, MOP$100 que corresponde ao dia de trabalho mais MOP$200, correspondente ao acréscimo salarial por trabalho prestado em dia feriado.” – vide, op. cit., Capítulo V, ponto 9.2.

Cremos que essa é única interpretação correcta da expressão “acréscimo salarial”.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo da quantia a pagar o trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado, a fórmula é:

3 X o salário diário médio X número de dias de prestação de trabalho em feriado obrigatório remunerado, nas situações previstas no artº 20º/1-c).

Procede o recurso quanto a estas duas questões.

Como, por um lado, a sentença recorrida adoptou o multiplicador X 1 para o cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso semana na vigência do Decreto Lei nº 24/89/M e o multiplicador X 2 para o cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatório na vigência do Decreto Lei nº 24/89/M, em vez de os multiplicadores X 2 e X 3, respectivamente, que defendemos, e por outro lado não foram impugnados pela Ré quer o número dos dias de descanso semanal e de feriado obrigatório, em que trabalhou e quer o quantitativo diário do salário, é de alterar a sentença recorrida e passar a aplicar os multiplicadores X 2 e X 3 para o cálculo dos quantitativos da compensação pelo trabalho prestado nos descansos semanais e de feriado obrigatório, respectivamente.

Assim sendo, na vigência do Decreto-Lei nº24/89/M, merece o Autor, a título da compensação pelo trabalho prestado nos dias de descanso semanal, o valor de MOP$21.630,00 (HKD$250 X 1.03 X 42dias X 2 = MOP$21.630,00), e a título da compensação pelo trabalho prestado nos dias de feriado obrigatório, o valor de MOP$3.862,50 (HKD$250 X 1.03 X 5dias X 3 = MOP$3.862,50).

2. Do erro de direito em relação à compensação pecuniária arbitrada pelo trabalho prestado nos dias de descanso semanal e ao dia compensatório na vigência da Lei nº 7/2008

Estão em causa factos ocorridos na vigência da Lei nº 7/2008.

Este diploma regula no seu artº 42º a matéria de descanso semanal nos termos seguintes:
1. O trabalhador tem direito a gozar um período de descanso remunerado de vinte e quatro horas consecutivas por semana.
2. O gozo do período de descanso pode não ter frequência semanal em caso de acordo entre as partes ou quando a natureza da actividade da empresa o torne inviável, casos em que o trabalhador tem direito a gozar um período de descanso remunerado de quatro dias por cada quatro semanas.
3. O período de descanso é fixado pelo empregador consoante as exigências do funcionamento da empresa, com uma antecedência mínima de três dias.
Na petição inicial, o Autor pediu a condenação da Ré a pagar-lhe um dia de remuneração de base, acrescido de um dia de descanso compensatório (substituído por um dia de remuneração de base), pelo trabalho prestado ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho em cada semana, quer na vigência do Decreto-Lei nº 24/89/M quer na da Lei nº 7/2008.

Em sede de contestação, a Ré veio a defender-se dizendo que o Autor gozou um período de descanso de quatro dias por cada quatro semanas de trabalho.

Ficou provado que:

Entre 01/01/2008 a 20/07/2018, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (YYY) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos, a que se seguia um período de vinte e quatro horas de descanso, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (18.º)
Entre 01/01/2008 a 31/12/2008, o Autor prestou 42 dias de trabalho ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (19.º)
Entre 01/01/2008 a 31/12/2008, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (20.º)
Entre 01/01/2008 a 31/12/2008, a Ré (YYY) fixou ao Autor um total de 42 dias de descanso compensatório, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (21.º)
Entre 01/01/2009 a 20/07/2018, a Ré (YYY) não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas em cada semana (leia-se, em cada período de sete dias). (22.º)
Entre 01/01/2009 a 31/07/2010, o Autor prestou 69 dias de trabalho ao sétimo dia, para a Ré (YYY) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho.
Entre 01/08/2010 a 20/07/2015, o Autor prestou, pelo menos, 208 dias de trabalho ao sétimo dia, para a Ré (YYY) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (23.º)
Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, o Autor prestou 123 dias de trabalho ao sétimo dia, para a Ré (YYY) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (24.º)
Entre 01/01/2009 a 20/07/2018 a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (26.º)
Entre 01/01/2009 a 31/07/2010, a Ré (YYY) faltou fixar ao Autor 10 dias de descanso compensatório.
Entre 01/08/2010 a 20/07/2015, a Ré (YYY) faltou fixar ao Autor 30 dias de descanso compensatório.
Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, a Ré (YYY) faltou fixar ao Autor 17 dias de descanso compensatório. (27.º)

Ora, quando globalmente interpretada a matéria tida por assente na 1ª Instância e ora transcrita supra, é de concluir que o Autor não gozou um período de 24 horas de descanso semanal num período de sete dias, nos termos impostos pelo artº 42º da Lei nº 7/2008 e prestou efectivamente trabalho naqueles períodos de 24 horas que deveriam ser de descanso.

É verdade que ficou provado que gozou “um dia de descanso no oitavo dia após cada sete dias de trabalho consecutivos durante ao serviço da Ré.”.

Todavia, não tendo sido demonstrado pela Ré, sobre a qual impende o ónus de prova, que se verificou qualquer das circunstâncias previstas no artº 42º/2 da Lei nº 7/2008, justificativas da derrogação da regra geral da frequência semanal exigida no nº 1 do mesmo artigo, é de entender aplicável in casu essa regra geral.

Assim, é de revogar a sentença ora recorrida e passar a arbitrar, em substituição, ao Autor a compensação de dia de remuneração de base, acrescido de um dia de descanso compensatório (substituído por um dia de remuneração de base), pelo trabalho prestado ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho em cada semana, conforme detalhadamente apurado na matéria assente de 1ª instância, no período entre 01JAN2009 e 20JUL2018, em que vigora a Lei nº 7/2008.

Em relação ao facto provado de que o Autor gozou um dia de descanso no oitavo dia após cada sete dias de trabalho consecutivos durante ao serviço da Ré, entendemos que, por razões de justiça, não nos repugna de aceitar que esse dia de descanso no oitavo dia que se seguia sempre e regularmente aos turnos rotativos de sete dias consecutivos seja considerado, habilmente, no plano de juízo de direito, como descanso compensatório a que se refere o artº 43º/2 da Lei nº 7/2008, ou seja para compensar o descanso semanal que ficou por gozar no período de sete dias imediatamente anterior.

Todavia, a questão da compensação pecuniária dos descansos compensatórios não se põe neste recurso, uma vez que a compensação a este título não foi arbitrada na sentença recorrida, nem o Autor reagiu contra a sentença na parte respeitante ao não arbitramento dessa compensação.

Portanto, só nos cabe apurar a compensação pelo trabalho prestado ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho em cada semana.

Assim, a título da compensação pelo trabalho prestado nos dias de descanso semanal, é de arbitrar a favor do Autor a quantia de MOP$116.172,50, correspondente à soma das quantias referentes a três períodos e calculadas pelas seguintes fórmulas:

No período compreendido entre 01JAN2009 e 31JUL2020:

MOP$20.342,50 (HKD$250X1.03 X 79dias = MOP$20.342,50)

No período compreendido entre 01AGO2010 e 20JUL2015:

MOP$59.500,00 (MOP$250 X 238dias = MOP$59.500,00)

No período compreendido entre 01AGO2010 e 20JUL2015:

MOP$36.330,00 (MOP$259,50X 140dias = MOP$36.330,00)

Todavia, por força do princípio do dispositivo, dominante dos recursos civis ordinários, não é de arbitrar, em sede do presente recurso, a favor do Autor o montante de MOP$116.172,50, por ter sido apenas peticionada a quantia de MOP$101.686,00.

Há que portanto reduzir para esse valor o montante a arbitrar a favor do Autora.


III

Pelo exposto, acordam em julgar procedente o recurso interposto pelo Autor e revogar a sentença recorrida na parte respeitante à condenação da Ré relativamente às compensações pelo trabalho prestado nos dias de descanso semanal e de feriado obrigatório, passando a atribuir ao Autor:

* A título da compensação pelo trabalho prestado nos dias de descanso semanal, na vigência do Decreto-Lei nº 24/89/M, o valor de MOP$21.630,00;

* A título da compensação pelo trabalho prestado nos dias de descanso semanal, na vigência da Lei nº 7/2008, o valor de MOP$101.686,00;

* A título da compensação pelo trabalho prestado nos dias de feriado obrigatório, na vigência do Decreto-Lei nº 24/89/M, o valor de MOP$3.862,50; e

* Manter a sentença recorrida na parte que não foi impugnada pelo recorrente e não modificada por este Acórdão.

Custas pela recorrida.

RAEM, 08JUL2021


(Relator)
Lai Kin Hong

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong

(Segundo Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng
1 Cf., neste preciso sentido, Acórdão do TUI de 21 de Setembro de 2008, onde, avaliando uma situação semelhante envolvendo a aqui Ré nos presentes autos, afirma: « ... Quer isto dizer que a lei atribui uma remuneração nunca inferior ao dobro da normal, que acresce a esta, pelo que bem decidiu o Acórdão recorrido ter o trabalhador direito ao triplo da retribuição diária, já que não se provou terem as partes acordado uma remuneração superior para tal trabalho. Mas, como o autor já foi pago em singelo, terá, agora, direito ao dobro da retribuição.»
2 Em cada período de sete dias de trabalho consecutivo, há três vezes de trabalho extraordinário prestado durante dois dias consecutivos.
3 Cf., neste preciso sentido, Acórdão do TUI de 27 de Fevereiro de 2008, onde, avaliando uma situação semelhante envolvendo a aqui Ré nos presentes autos, afirma: « ... tem razão a Ré ao dizer que o autor já recebeu o salário normal correspondente ao trabalho nesses dias de descanso, pelo que, agora, só tem direito a outro tanto, e não ao dobro, como se decidiu no Acórdão recorrido, que não explica, aliás, porque não levou em conta o salário já pago. E que está em causa o pagamento do trabalho em dia de descanso semanal, pelo dobro da retribuição normal, mas o autor foi pago já em singelo.» Temos conhecimento do sentido adoptado a este respeito pelo Tribunal de Segunda Instância, nomeadamente, no Acórdão tirado nos autos de Processo 138/2011, com o qual, no entanto, sempre salvaguardando o seu douto entendimento, não concordamos.
4 Cremos, sempre salvaguardando opinião contrária, que a previsão constante do art. 43.°, n.º 2, 1) da Lei n.º 7/2008, de 18/8/2008, traduz uma clarificação muito relevante a este respeito, tornando mais clara ainda a orientação legislativa, no sentido de compensar o trabalhador pela prestação do trabalho em dia que seria de descanso com um dia (e não dois) de remuneração de base; não seria muito compreensível, num território que se aproxima paulatinamente de novos padrões normativos, que, nesta matéria, sinalizasse um retrocesso tão drástico relativamente ao diploma anterior.
5 Não se aplica, no caso em apreço, a alteração pela Lei n.º 8/2020, nos termos do artigo 5.º, parte final, da mesma Lei.
6 Segundo a fórmula: (n.º de dias calendários – n.º de dias de férias anuais e de dispensa ao trabalho) /7 (por o trabalhador tem direito a gozar um dia de descanso semanal em cada semana) – n.º de dias que o Autor já gozou. (Cfr. Fundamentação na resposta à matéria de facto)
7 Com pertinência também para este caso, a jurisprudência do Acórdão do Tribunal de Última Instância no processo n.º 69/2010 de 02/03/2011.
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Ac.380/2021-40