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Processo n.º 961/2020 Data do acórdão: 2021-7-22
Assuntos:
– acidente de viação
– erro notório na apreciação da prova
– incapacidade permanente parcial
– esperança da vida
– reparação dos danos não patrimoniais
– crime de ofensa grave à integridade física por negligência
– crime praticado no exercício da condução
– bem jurídico de natureza pessoal
– medida da pena
– art.o 40.o, n.o 1, do Código Penal
S U M Á R I O
1. No caso, após examinados todos os elementos probatórios examinados pelo tribunal recorrido e referidos na fundamentação probatória da decisão recorrida, não se vislumbra que a livre convicção desse tribunal sobre os factos controvertidos relativos à ocorrência do acidente de viação dos autos com pertinência à aferição final da culpa pela produção do acidente tenha sido formada com violação de quaisquer normas jurídicas sobre o valor legal das provas, ou de quaisquer regras da experiência da vida humana quotidiana, ou de quaisquer leges artis vigentes no campo de julgamento de factos, pelo que improcede o vício de erro notório na apreciação da prova, esgrimido àquela decisão judicial pela condutora do veículo que deu causa ao acidente e pela seguradora desse veículo.
2. Embora as duas demandantes tenham percentagens da incapacidade permanente parcial (IPP) diferentes, os efeitos negativos – dos quais se salientando a rigidez na parte do pescoço da 1.a demandante e a anómala sensação dos seus membros, e a rigidez e a dificuldade de movimentação da parte do pescoço da 2.a demandante – que resultam das suas IPP para a vida quotidiana de ambas durante todo o restante longo período de tempo da esperança da vida delas continuarão a acarretar a ambas incómodos e desgostos permanentes e em grau semelhtante no quotidiano da vida, daí que pode ser fixado um montante pecuniário igual para cada demandante, para reparação dos danos não patrimoniais.
3. Estando em causa no crime de ofensa grave à integridade física por negligência no exercício da condução bem jurídico de natureza pessoal, a medida da pena de prisão deste tipo legal de crime deve ser feita em dose mais pesada, com vista à melhor protecção do bem jurídico (cfr. o critério do art.o 40.o, n.o 1, do Código Penal).
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 961/2020
(Autos de recurso penal)
Recorrentes:
  – arguida e 2.a demandada civil A
  – 1.a demandada civil X Insurance (Hong Kong) Limited
  Não recorrentes:
  – assistente e 1.a demandante civil B
– assistente e 2.a demandante civil C
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por acórdão proferido a fls. 649 a 659v do Processo Comum Colectivo n.o CR1-19-0293-PCC (com pedidos cíveis de indemnização por acidente de viação) do 1.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base:
– ficou condenada a arguida A, aí já melhor identificada, como autora material, na forma consumada, de dois crimes de ofensa grave à integridade física por negligência (no exercício da condução), p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.os 142.o, n.os 3 e 1, e 138.o, alínea c), do Código Penal (CP) e do art.o 93.o, n.o 1, da Lei do Trânsito Rodoviário (LTR), em dois anos de prisão por cada um deles, e, em cúmulo jurídico dessas duas penas, finalmente na pena única de três anos e três meses de prisão, com inibição de condução por um período total de três anos;
– ficou condenada a 1.a demandada civil X Insurance (Hong Kong) Limited, como seguradora do veículo automóvel então conduzido pela arguida, a pagar às duas demandantes civis (também assistentes) a quantia indemnizatória de MOP$1.500.000,00, com juros legais contados a partir da data do próprio acórdão até efectivo e integral pagamento;
– e ficou condenada a arguida como 2.a demandada civil a pagar às duas demandantes a quantia indemnizatória de MOP$217.665,30, com juros legais contados a partir da data do próprio acórdão até efectivo e integral pagamento, bem como a pagar todas as futuras despesas de tratamento médico de foro psiquiátrico das duas demandantes e todas as percas salariais delas por causa desse tipo de tratamento, tudo a ser liquidado em sede de execução do julgado.
Inconformadas, vieram recorrer a arguida e a demandada seguradora para este Tribunal de Segunda Instância (TSI).
Alegou a arguida (também na qualidade de 2.a demandada civil), na sua essência, na motivação apresentada a fls. 709 a 752 dos presentes autos correspondentes, o seguinte:
– ela não foi a única responsável pelo acidente de viação dos autos, tendo a 1.a ofendida, condutora do veículo MK-XX-XX, contribuído para que o acidente ocorresse, pelo que houve erro notório na apreciação da prova por parte do Tribunal recorrido ao julgar que a própria recorrente foi a única responsável na eclosão do acidente, devendo o Tribunal de recurso imputar à 1.a ofendida um certo grau de culpa na ocorrência do acidente;
– e mesmo que assim não se entendesse, deveria ser optada a pena de multa em detrimento da pena de prisão, à luz do art.o 64.o do CP;
– e ainda que se mantivesse a aplicação da pena de prisão, a medida concreta da pena feita no acórdão recorrido não deixaria de ser exagerada, com violação do disposto nos art.os 40.o, 64.o e 65.o e também 71.o do CP, devendo as duas penas de prisão parcelares e a pena única de prisão achadas no aresto recorrido ser reduzidas, com sempre almejada suspensão da execução da nova pena única de prisão em medida não inferior a três anos;
– quanto ao pedido cível, insurge-se apenas contra o elevado montante de MOP$750.000,00 desajustadamente atribuído no acórdão recorrido a cada uma das ofendidas para efeitos de reparação dos seus danos não patrimoniais, com errada interpretação e aplicação do disposto nos art.os 487.o e 489.o, n.o 3, do Código Civil (CC).
Por outro lado, alegou a 1.a demandada civil, na sua essência, na motivação apresentada a fls. 695 a 708 dos presentes autos, o seguinte:
– a visualização detalhada e crítica de imagens de vídeo demonstra claramente que o acidente em discussão nos presentes autos não ocorreu da forma como o Tribunal recorrido deu como provado, tendo por essa razão esse Tribunal cometido erro notório na apreciação da prova;
– com efeito, foi inequivocamente a conduta da 1.a demandante civil que violou culposamente o art.o 15.o, n.o 3, da LTR (que proíbe a prática de quaisquer actos susceptíveis de afectar o exercício de condução com segurança) e o art.o 21.o, n.os 1 e 3, da LTR (por não ter mantido entre o seu veículo e o da 2.a demandada civil a distância suficiente para evitar acidentes) e também o art.o 38.o da LTR (que proíbe a realização de manobra de ultrapassagem pela esquerda), tendo a mesma demandante dado causa exclusiva ao acidente, ou, pelo menos, concorrido em larga medida para a verificação do acidente;
– no concernente ao montante da indemnização por danos não patrimoniais fixado pelo Tribunal recorrido, verifica-se que não se encontra estabelecido nem factualmente comprovado qualquer nexo de causalidade;
– ademais, houve claramente erro de julgamento na fixação dos montantes indemnizatórios a título de danos não patrimoniais a favor das duas demandantes civis, visto que o Tribunal recorrido fixou um mesmo montante indemnizatório para ambas, bem sabendo que as circunstâncias pessoais e socioeconómicas delas são diferentes, tendo a 1.a demandante uma Incapacidade Permanente Parcial (IPP) de 20%, e a 2.a demandante uma IPP de 15%;
– e tal montante de MOP750.000,00 fixado a título de danos não patrimoniais afigura-se manifestamente excessivo e desproporcionado, face aos critérios legais existentes e aos montantes determinados pelos Tribunais de Macau em casos muito mais graves;
– em limite, no caso de se entender pelo arbitramento de uma compensação a título de danos não patrimoniais a favor das duas demandantes, a mesma não deverá ser de montante superior a MOP$150.000,00 para a 1.a demandante, e de MOP$100.000,00 para a 2.a demandante.
Ao recurso (na parte penal) da arguida, respondeu o Ministério Público a fls. 798 a 804v, entendendo que houve excesso na medida das penas parcelares e única da arguida, e opinando pela possível suspensão da execução da nova pena única de prisão.
Aos recursos da arguida e da demandada seguradora, responderam as duas assistentes e demandantes unamente a fls. 766 a 782, pugnando pela improcedência total dos mesmos.
Subidos os autos, a Digna Procuradora-Adjunta, em sede de vista, emitiu parecer a fls. 831 a 833v sobre a parte penal do recurso da arguida, no sentido da sua procedência parcial, com possível redução das penas parcelares e única da arguida, e com possível suspensão da execução da nova pena única de prisão.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se o seguinte, com pertinência à solução dos dois recursos sub judice:
1. O acórdão ora recorrido ficou proferido a fls. 649 a 659v dos autos, cujo teor se dá por aqui integralmente reproduzido.
2. Nesse acórdão, o Tribunal recorrido considerou que a arguida teve culpa exclusiva pela produção do acidente de viação dos autos.
3. No mesmo acórdão, o Tribunal recorrido atribuiu a cada uma das duas demandantes civis a quantia indemnizatória de MOP$750.000,00, destinada à reparação dos danos não patrimoniais sofridos por elas.
4. O acidente de viação dos autos ocorreu no dia 5 de Julho de 2018, data em que a 1.a demandante civil tinha 33 anos e um mês e tal de idade e a 2.a demandante civil tinha 32 anos e dez meses e tal de idade (quanto à data de nascimento das duas demandantes, cfr. os elementos documentais constantes dos autos).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas ao mesmo tempo nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
É de começar por abordar o vício de erro notório na apreciação da prova, imputado pela arguida e pela seguradora demandadas ao Tribunal recorrido, a respeito dos factos controvertidos relativos à ocorrência do acidente de viação, com pertinência à aferição final da culpa pela produção do acidente de viação.
Pois bem, sempre se diz que há erro notório na apreciação da prova, como vício referido na alínea c) do n.o 2 do art.o 400.o do Código de Processo Penal, quando for patente que a decisão probatória do tribunal violou inclusivamente as leges artis (neste sentido, e de entre muitos outros, cfr. o douto Acórdão do Venerando Tribunal de Última Instância, de 22 de Novembro de 2000, do Processo n.º 17/2000).
Na verdade, o princípio da livre apreciação da prova não significa que a entidade julgadora da prova possa fazer uma apreciação totalmente livre da prova. Pelo contrário, há que apreciar a prova sempre segundo as regras da experiência, e com observância das leges artis, ainda que (com incidência sobre o caso concreto em questão) não existam quaisquer normas legais a determinar previamente o valor das provas em consideração.
Ou seja, a livre apreciação da prova não equivale à apreciação arbitrária da prova, mas sim à apreciação prudente da prova (em todo o terreno não previamente ocupado por tais normas atinentes à prova legal) com respeito sempre das regras da experiência da vida humana e das leges artis vigentes neste campo de tarefas jurisdicionais.
E no concernente à temática da prova livre, é de relembrar os seguintes preciosos ensinamentos veiculados no MANUAL DE PROCESSO CIVIL (2.ª Edição, Revista e Actualizada, Coimbra Editora, 1985, páginas 470 a 472), de autoria de ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO E NORA:
– < […]
Há, todavia, algumas excepções ao princípio da livre apreciação da prova, que constituem como que justificados resíduos do sistema da prova legal.
[…]
Mas convém desde já conhecer os diferentes graus de convicção do julgador criados pelos meios de prova e precisar o seu alcance prático.
Quando qualquer meio de prova, não dotado de força probatória especial atribuída por lei, crie no espírito do julgador a convicção da existência de um facto, diz-se que foi feita prova bastante – ou que há prova suficiente – desse facto.
Se, porém, a esse meio de prova um outro sobrevier que crie no espírito do julgador a dúvida sobre a existência do facto, a prova deste facto desapareceu, como que se desfez. Nesse sentido se afirma que a prova bastante cede perante simples contraprova, ou seja, em face do elemento probatório que, sem convencer o julgador do facto oposto (da inexistência do facto), cria no seu espírito a dúvida séria sobre a existência do facto.
Assim, se a parte onerada com a prova de um facto conseguir, através de testemunhas, de peritos ou de qualquer outro meio de prova, persuadir o julgador da existência do facto, ela preencheu o ónus que sobre si recaía. Porém, se a parte contrária (ou o próprio tribunal) trouxer ao processo qualquer outro elemento probatório de sinal oposto, que deixe o juiz na dúvida sobre a existência do facto, dir-se-á que ele fez contraprova; e mais se não exigirá para destruir a prova bastante realizada pelo onerado, para neutralizá-la […]>>.
No caso dos autos, após examinados todos os elementos probatórios então examinados pelo Tribunal recorrido e referidos na fundamentação probatória da decisão recorrida, não se vislumbra que a livre convicção desse Tribunal sobre os factos controvertidos relativos à ocorrência do acidente de viação com pertinência à aferição final da culpa pela produção do acidente de viação tenha sido formada com violação de quaisquer normas jurídicas sobre o valor legal das provas, ou de quaisquer regras da experiência da vida humana quotidiana, ou de quaisquer leges artis vigentes no campo de julgamento de factos, pelo que improcede o vício de erro notório na apreciação da prova esgrimido pela arguida e pela seguradora demandadas.
Por isso, ante toda a matéria de facto descrita como provada no acórdão recorrido, é indubitável a culpa exclusiva da arguida pela ocorrência do acidente, e tem que decair, pois, a tese fáctica e jurídica defendida pela seguradora na motivação acerca da conduta de condução da 1.a demandante civil.
E em face da factualidade provada em primeira instância, é também indubitável, sob a égide do art.o 557.o do CC, a verificação do nexo de causalidade adequada entre a conduta de condução da arguida descrita como provada no acórdão recorrido (conduta essa causadora exclusiva do acidente de viação, e como tal lesadora, em grau grave, da integridade física das duas demandantes civis) e os danos não patrimoniais sofridos pelas duas demandantes como consequência dessa lesão grave.
A arguida e a seguradora demandada discordam do montante de MOP750.000,00 atribuído pelo Tribunal recorrido a cada uma das demandantes para reparação dos danos não patrimoniais destas.
Não assiste razão a estas duas demandadas, porquanto embora as duas demandantes tenham percentagens da IPP diferentes, os efeitos negativos (dos quais se salientando a rigidez na parte do pescoço da 1.a demandante e a anómala sensação dos seus membros, e a rigidez e a dificuldade de movimentação da parte do pescoço da 2.a demandante) que resultam das suas IPP para a vida quotidiana de ambas (com 33 anos e um mês e tal e 32 anos e dez meses e tal, de idade, respectivamente, à data do acidente) durante todo o restante longo período de tempo da esperança da vida delas (visto que, como facto notório, é já cada vez mais longa a esperança da vida das pessoas em Macau) continuarão, como se compreende naturalmente, a acarretar a ambas incómodos e desgostos permanentes e em grau semelhtante no quotidiano da vida delas, daí que não é de estranhar que o Tribunal sentenciador acabou por fixar um montante igual para cada demandante, para reparação dos danos não patrimoniais.
Quanto à justeza, ou não, desse montante de MOP750.000,00, atendendo a que em razão da esperança da vida das pessoas em Macau, os desgostos a sofrer pelas duas demandantes nos vindouros anos da vida delas por causa dos efeitos negativos decorrentes das suas IPP perdurarão ainda por dezenas de anos, e considerando também os outros factores da ponderação já mencionados no 3.o parágrafo da página 18 (em relação à 1.a demandante) e no 2.o parágrafo da página 19 (sobre a 2.a demandante), ambas do texto do aresto recorrido, a fls. 657v e 658, não se vislumbra que haja injustiça notória praticada pelo Tribunal recorrido aquando da fixação daquele montante indemnizatório para os danos não patrimoniais de cada uma das lesadas demandantes, pelo que é de respeitar o juízo equitativo desse Tribunal, formado à luz do disposto no art.o 489.o, n.os 1 e 3 (primeira parte), do CC, sendo de frisar que cada caso é um caso, cuja solução depende da ponderação dos ingredientes do próprio caso. Portanto, improcede o pedido de redução desse montante indemnizatório, formulado pela arguida e pela seguradora nas respectivas motivações de recurso.
E agora da questão da medida da pena, colocada no recurso da arguida:
O crime de ofensa grave à integridade física por negligência (no exercício da condução) é punível com pena de prisão de um ano e um mês a três anos (cfr. as disposições conjugadas dos art.os 142.o, n.os 3 e 1, 138.o, alínea c), e 41.o, n.o 1 (parte inicial), do CP e do art.o 93.o, n.o 1, da LTR).
Nota-se que este crime também é punível com pena de multa. No entanto, consideradas as prementes exigências da prevenção geral deste tipo de delito penal, não se pode optar pela pena de multa (cfr. o critério material vertido no art.o 64.o do CP em matéria da escolha da pena).
O Tribunal recorrido aplicou dois anos de prisão para cada um dos dois crimes deste tipo da arguida, sensivelmente um pouco aquém da metade da margem da respectiva moldura penal.
Estando em causa bem jurídico de natureza pessoal (i.e., integridade física), a medida concreta da pena de prisão dentro da moldura penal deve ser feita em dose mais pesada, com vista à melhor protecção do bem jurídico em causa (cfr. o critério do art.o 40.o, n.o 1, do CP).
Assim sendo, visto todo o circunstancialismo fáctico provado em primeira instância com pertinência à medida concreta da pena aos padrões dos art.os 40.o, n.os 1 e 2, e 65.o, n.os 1 e 2, do CP, tendo em conta também as elevadas exigências da prevenção geral do tipo legal de crime em questão, não se detecta que haja injustiça notória na imposição, pelo Tribunal recorrido, de dois anos de prisão para cada um dos dois crimes deste tipo da arguida.
E no tocante à pena única de três anos e três meses de prisão por que vinha condenada a arguida no acórdão recorrido: afigura-se mais equilibrado passar a condená-la em três anos de prisão única, nos termos do art.o 71.o, n.os 1 e 2, do CP, com suspensão da sua execução pelo período de quatro anos, sob condição de pagar, para já, no prazo de dois meses, MOP$217.665,30 (com juros legais desde a data do acórdão recorrido até efectivo e integral pagamento) a favor das duas ofendidas demandantes, por conta da obrigação da indemnização cível por que vinha ela já condenada nesse acórdão, bem como de prestar, no prazo de seis meses, MOP50.000,00 de contribuição a favor da Região Administrativa Especial de Macau, por ser de entender que atenta a idade avançada da arguida e a inexistência de antecedentes criminais no passado, a simples censura dos factos e a ameaça da execução da prisão, com subordinação àquelas duas condições, bastam para prosseguir as finalidades da punição (cfr. os art.os 48.o, n.os 1 e 5, e 49.o, n.o 1, alíneas a) e c), do CP).
Não sendo a inibição de condução imposta no acórdão recorrido objecto do recurso, essa inibição fica intacta.
Em suma, procede parcialmente a parte penal do recurso da arguida, e naufragam a parte civil do recurso da arguida e o recurso da seguradora, sem mais indagação por ociosa ou prejudicada (e por conseguinte, os juros legais do montante indemnizatório civil de MOP1.500.000,00 por que vinha condenada a seguradora no acórdão recorrido continuam a ter que ser contados, igualmente, desde a data desse acórdão em primeira instância até integral e efectivo pagamento, isto por força da posição jurídica uniformizada pelo Venerando Tribunal de Última Instância, no seu douto Acórdão de 2 de Março de 2011, do Processo n.o 69/2010).
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar não provido o recurso da seguradora demandada, e não provida a parte civil do recurso da arguida, e apenas parcialmente provida a parte penal do recurso desta, passando, por conseguinte, a alterar a pena única de prisão por que vinha condenada a arguida no acórdão recorrido, de três anos e três meses, para três anos apenas, e a decretar a suspensão, por quatro anos, da execução desta nova pena única de prisão, sob condição de pagar, no prazo de dois meses, MOP$217.665,30 (duzentas e dezassete mil, seiscentas e sessenta e cinco patacas e trinta avos) (com juros legais desde a data do acórdão recorrido até efectivo e integral pagamento) a favor das duas demandantes civis, por conta da obrigação da indemnização cível por que vinha a própria arguida já condenada nesse acórdão, bem como de prestar, no prazo de seis meses, MOP50.000,00 (cinquenta mil patacas) de contribuição a favor da Região Administrativa Especial de Macau.
Pagará a arguida metade das custas da parte penal do seu recurso, com duas UC de taxa de justiça. Pagarão as duas assistentes uma UC de taxa de justiça individual, por ter decaído parcialmente a oposição delas à parte penal do recurso da arguida.
Pagarão a arguida e a seguradora demandada as custas dos seus recursos relativos à causa civil.
Macau, 22 de Julho de 2021.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chao Im Peng
(Segunda Juíza-Adjunta)



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