Processo n.º 223/2021
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais do TA)
Relator: Fong Man Chong
Data : 15 de Julho de 2021
Assuntos:
- Certificado de confirmação do direito de residência e erro nos pressupostos de facto
SUMÁRIO:
I - A emissão do certificado de confirmação do direito de residência (artigo 1.º/1 do Regulamento Administrativo n.º 7/1999, de 20 de Dezembro) é um acto estritamente vinculado. Na verdade, demonstrando-se que um cidadão chinês residiu habitualmente em Macau pelo menos sete anos consecutivos, antes ou depois do estabelecimento da RAEM, a Administração está obrigada a emitir o dito certificado, não dispondo de qualquer margem ou abertura discricionária para não o fazer.
II - O erro nos pressupostos de facto constitui uma das causas de invalidade do acto administrativo, consubstanciando um vício de violação de lei. Ocorre quando se verifica uma divergência entre os pressupostos de que o autor do acto partiu para proferir a decisão administrativa final e a sua efectiva verificação na situação em concreto, resultando do facto de se terem considerado na decisão administrativos factos não provados ou desconformes com a realidade.
III – Apesar de não haver prova de natureza documental da qual resulte que a Recorrida residiu em Macau durante o ano de 1961, a verdade é que a demais prova documental produzida permite concluir e considerar provado que a Recorrida, ainda menor, aqui frequentou estabelecimentos de ensino e que concluiu o curso da creche na Escola B de Macau em 15 de Julho de 1957, com a idade de 8 anos, que concluiu o curso primário em 7 de Julho de 1963 na mesma Escola com a idade de 14 anos e que foi aluna da Escola C entre 10 de Novembro de 1965 a 3 de Março de 1966. Além disso, a Recorrida foi titular da Cédula de Identificação Pessoal emitida pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública nos anos de 1963 a 1967. Desses factos que, com base nos referidos documentos, se encontram provados, é possível presumir, por apelo às mais elementares regras da experiência, que o facto que a Administração considerou não estar provado, qual seja, o de que, também no ano de 1961, a Recorrida não residiu em Macau, deve, afinal, considerar-se provado através de prova por presunção judicial que, nos termos do disposto no artigo 344.º do CCM, se mostra indiscutivelmente admissível, demonstra-se o facto que a Administração, erradamente, considerou que (o facto de residir em Macau em 1961) não estava provado.
O Relator,
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Fong Man Chong
Processo n.º 223/2021
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais do TA)
Data : 15 de Julho de 2021
Recorrente : Subdirectora dos Serviços de Identificação (身份證明局副局長)
Recorrida : A
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ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I - RELATÓRIO
Subdirectora dos Serviços de Identificação (身份證明局副局長), Recorrente, devidamente identificada nos autos, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, datada de 17/11/2020, que julgou procedente o recurso e anulou o acto recorrido, discordando dela, veio, em 21/01/2021, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 125 a 152, tendo formulado as seguintes conclusões :
1. 對於《居留權證明書》申請的審批,由於第8/1999號法律並沒有為“通常居住連續七年”的法律前提訂定具體的規則和內容,而是交由作出行為者依據公正和合理的基本原則,平衡各公共利益的基礎上,針對具體情形選擇適當的調查措施以作出行政決定。事實上,立法者預見到“通常居住連續七年”的證明將因應不同個案的具體情況有所不同,根本無法對相關證明訂定規則,故刻意預留空間讓行政機關對不同個案所需的證明進行自由考量及選擇,從而作出最適合的決定。因此,上訴人在相關事宜上其自由裁量權。
2. 上訴人或獲其授權者依法行使自由裁量權,根據《行政程序法典》第85條第1款及第86條第1款的規定,可自行決定符合“通常居住連續七年”法律前提的標準及採取適當的調查措施,以便在調查過程中判斷有利於對作出“公正及迅速的決定”屬重要的事實而應進行之調查及採用之證據方法。
3. 因此,在本案中,上訴人一直要求《居留權證明書》申請人提交在澳門居住的證明文件(如由澳門學校發出的證明書、工作證明、僱員登記表、納稅證明、醫療、旅遊證件中之出入境記錄等),以澄清有助於上訴人作出決定的事實—通常居住連續七年。
4. 對在審批《居留權證明書》申請時搜集到的證據,上訴人會按個案的具體情況及經驗法則作出自由評價,判斷是否可透過該等證據信納申請人“通常居住連續七年”的事實。
5. 正如檢察院在中級法院2014年5月8日第2/2013號案的意見:“對判斷‘通常居住’而言,第8/1999號法律第4條賦予身份證明局局長‘自由裁量權’”,該案法官於裁判中亦持相同觀點。
6. 可見,立法者賦予行政機關在審批《居留權證明書》申請的過程中行使自由裁量權,行政機關有權在行政程序中按證據法採信或不採信證據,以認定支持作出決定的事實。因此,在遵守法定證據證明力之前提下,上訴人審查證據時可按個案的具體情況及經驗法則對證據作自由評價。
7. 根據《行政訴訟法典》第21條第1款d)項的規定,行政機關只有在行使自由裁量權時出現明顯錯誤或絕對不合理時,才可被司法審查。換言之,除非上訴人在行使自由裁量權審批申請人《居留權證明書》的申請時出現明顯錯誤或絕對不合理的情況,否則法院不應介入。
8. 終審法院於2000年5月3日第9/2000號案的合議庭裁判和2012年5月9日第13/2012號案的合議庭裁判中引用DAVID DUARTE及MARIA DA GLÓRIA F.P. DIAS GARCIA的觀點指出:“在對事實作出適當決定的監查方面,作為對決定內容的監控,審查上的明顯錯誤是法官對行政自由裁量進行干預的最高形式。因此,只有在明顯不均衡情況下才進行干預......面對原則的多變性(適度原則、平等原則、公正原則),只有那些以不可容忍方式違反了上述這些原則的行政決定才可被司法審查。
9. 本案中,上訴人根據過去20年審查相關證據的經驗作出分析。雖然申請人提供了由同一所學校於1957年和1963年發出的幼稚園畢業和小學畢業證書,但只能證明其完成1956/1957年度和1962/1963年度的課程,並不能由此推斷申請人在同一所學校不間斷地完成了整個幼稚圍及小學的學習階段。
10. 正如上訴人在初審階段的答辯狀中所述,幼稚圍畢業和小學畢業證書不能作為整個學習階段就讀的證明文件,如需證明申請人於其餘年份在澳門就讀,必須提供各學年的學生證、成績表或學籍冊等文件予以證明。
11. 假如取得畢業證書就代表學生在同一所學校完成整個幼稚園或小學學習階段課程,那麼對於插班生而言,即使其完成畢業年度的課程,亦不能取得相關畢業證書,這顯然與實際情況相違悖。
12. 雖然申請人提供了自同一所學校發出的幼稚園畢業和小學畢業證書,但事實上,並未能夠完全排除申請人中途離開澳門到其他地方求學或生活,及後再回到澳門於同一所學校繼續就學的可能性。
13. 此外,對於原審法院法官提到申請人母親1961年的澳門警察廳身份證不載有申請人的姓名,是因為申請人剛滿14歲,毋需在有關證件上填報姓名,並不代表申請人此時已離開澳門方面,事實上,上訴人在審批申請時亦有留意到相關情節,需指出的是,根據當時生效的第6182號訓令規定,立法者將具資格領取澳門警察廳身份證的年齡設定為14歲,而對於未滿14歲人士,則會以將其資料載於父或法定代理人的澳門警察廳身份證上的方式處理。可見,在1961年申請人已具條件自行申請澳門警察廳身份證,但當時申請人未為之,而是直到1963年才申請有關證件。
14. 因此,上訴人不確認申請人1961年在澳居住是基於合理懷疑。在有疑點的情況下,上訴人不能夠,亦不應該採信申請人聲稱其1961年在澳居住,有關決定是合理及適當的,並沒有違反行使自由裁量權時所應遵從之限制,又或出現明顯錯誤或絕對不合理的情況,故有關決定不應受司法審查。
15. 可見,原審法院法官介入審查,違反《行政訴訟法典》第21條第1款d)項的規定,按照《行政訴訟法典》第1條所准許援引的《民事訴訟法典》第571條第1款d)項的規定,被上訴裁判構成裁判無效。
16. 除上述外,被上訴裁判還過度地對證據作出評價,在判決書中具體分析並指出現有證據足以得出申請人1961年在澳居住,即使此舉只是為了加強判決理據的說服力亦然。
17. 雖然被上訴裁判表面上僅作出撤銷上訴人的決定,上訴人仍可自由決定批准或不批准有關申請,但實際上裁判已對事實作出判斷,上訴人難以對證據作出自由評價,上訴人必須承認申請人1961年在澳門就讀,在滿足法例規定下,向當事人發出《居留權證明書》。
18. 由於被上訴裁判過當地對證據作出評價,違反《行政訴訟法典》第20條的規定,按照《行政訴訟法典》第1條所准許援引的《民事訴訟法典》第571條第1款d)項的規定,構成裁判無效。
19. 另外,關於原審法院法官指的上訴人太苛刻地要求申請人負擔極難之證據的舉證責任,透過已證事實可以推定申請人1961年在澳居住,上訴人應提出相反的證據推翻申請人1961年在澳的推定方面,根據《行政程序法典》第87條和第88條規定,申請人負有舉證責任,對於《居留權證明書》申請,由於需證明的事實年代久遠,申請人提供相關證明文件對本局作出決定有重要的幫助。
20. 而按照《行政程序法典》第85條和第86條規定,有權限作出決定的機關負責領導調查的進行,如知悉某些事實有助於對程序作出公正及迅速的決定,則有權限的機關應設法調查所有此等事實。為調查申請人的就讀年份,上訴人曾去函教育暨青年局了解申請人在B小學的就讀年份,惟由於該局沒有B小學的學生資料,故無法核實申請人於該校的就讀年份。
21. 關於透過分析證據而得出的已證事實,卷宗文件內沒有一份可以證明申請人1961年在澳居住的文件,上訴人不認同透過已證事實可以確定申請人1961年在澳居住。
22. 需指出的是,事實推定與法律推定的情況不同,本案顯然不是法律推定的情況。對於申請人提交的兩份由同一間學校發出的幼稚園和小學畢業證書,上訴人只能從證書反映的事實推定申請人於該年度在澳就讀,不能僅憑該兩份畢業證書推定申請人畢業年度以外的年度(即1961年)在澳就讀,如上所述,上訴人不能夠完全排除申請人曾中途離開澳門到其他地方求學或生活。
23. 須要強調的是,《居留權證明書》的審批有別於其他申請,確認申請人具有澳門永久性居民資格,其將享有澳門居留權及選舉權,故相關行政程序具嚴謹性,對於申請人是否具澳門永久性居民身份,行政當局必須嚴謹審批,並對申請的所有文件審慎核查,以確認申請人的居澳年期。
24. 從公共利益著眼,由於年代久遠,距今已相隔半個世紀,對於申請人的言詞,上訴人無法作出調查及確認其真確性,只能依據客觀資料所確切反映的年期確認申請人的居澳期間。
25. 由於申請人提供的兩份畢業證書未能令上訴人毫無疑問地確信其1961年在澳居住,故上訴人一再要求申請人提供1961年在澳居住的證明文件。可見,有關要求絕對合理及有客觀需要,並非苛刻地要求申請人負擔極難之證據的舉證責任。
26. 對於原審法院法官認為上訴人應提出相反證據推翻申請人1961年在澳的推定方面,根據《民法典》第339條的規定,進行反證的前提是負舉證責任之當事人提出的證據能夠證明到其主張的事實,在證據成立時,他方當事人才有需要就相關事實提出反證。
27. 然而,本案申請人並未能夠提出充分的證據支持其主張1961年在澳居住的事實,既然有關說法不成立,自然不存在上訴人需要提出反證進行推翻,亦未見申請人畢業時及現行的法律對幼稚園或小學畢業證書的證明力作出規範,尤其是畢業證書可證明當事人在該校就讀整個小學階段的規定,有關文件不屬《民法典》第340條所指的法定完全證據。
28. 因此,上訴人認為被上訴裁判中關於上訴人太苛刻地要求申請人負擔極難之證據的舉證責任,透過已證事實可以推定申請人1961年在澳居住,上訴人應提出相反的證據推翻申請人1961年在澳的推定之內容屬錯誤認定,構成審判錯誤。
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O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o douto parecer constante de fls. 225 a 228 dos autos, pugnando pelo improvimento do presente recurso jurisdicional.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – FACTOS
São os seguintes elementos considerados assentes pelo TA, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
- 根據身份證明局檔案資料,司法上訴人曾持有第2XXXX2號澳門警察廳身份證,原名為A,於1948年12月4日在中國內地出生(見行政卷宗三第2頁及背頁及行政卷宗四第2頁及背頁)。
- 2011年12月21日,司法上訴人向身份證明局提交編號2011-2107517《居留權證明書》申請表 (見行政卷宗四第1頁及背頁)。
- 附同上述申請表,司法上訴人還提交了多份文件,尤其包括:
․ B小學發出的幼稚園畢業和小學畢業證書;
․ C學校發出的學生證;
․ 其持有的第2XXXX2號澳門警察廳身份證 (見行政卷宗四第2頁至第6頁)。
- 2012年3月22日,被上訴實體透過編號03445/DIR/DR/2012公函以通知司法上訴人該局作出不向其發出《居留權證明書》之決定(見行政卷宗四第11頁,有關內容在此視為完全轉錄)。
- 2016年9月26日,司法上訴人向身份證明局提交編號2016-2102043《居留權證明書》申請表 (見行政卷宗四第16頁至第17頁)。
- 附同上述申請表,司法上訴人還提交了多份文件,尤其包括:
․ B小學於1957年7月15日發出的幼稚園畢業證書;
․ B小學於1963年7月7日發出的小學畢業證書;
․ 司法上訴人於1963年至1967年持有的第2XXXX2號澳門警察廳身份證;
․ 司法上訴人持有的1965年11月10日至1966年3月3日的C學校的學生證 (見行政卷宗四第21頁至第25頁、第52頁至第55頁及第60頁至第62頁)。
- 2016年12月2日,司法上訴人補充了多份文件,尤其包括:
․ D於1950年2月28日簽署的供電合同,司法上訴人指該合同是其父親於澳門居住期間使用別名簽署;
․ E持有的第4XXX4號澳門警察廳身份證,司法上訴人指該證件為其母親所持有(見行政卷宗四第29頁至第34頁)。
- 根據身份證明局檔案資料,司法上訴人之母親F於1957年至1960年持有的第6XXX0號澳門警察廳身份證內載有司法上訴人的資料(見行政卷宗二第1頁至第2頁及背頁)。
- 2019年10月28日,被上訴實體透過編號04042/DIR/DR/2019公函通知司法上訴人之訴訟代理人該局作出不向其發出《居留權證明書》之決定,公函內容如下:
“...事由: 不批准通知 (居留權證明書申請編號: 20162102043 )
敬啟者:
關於 台端向本局提出的《居留權證明書》申請,根據本人於2019年10月18日作出的批示,綜合 台端交來的證明文件,本局只能確認 台端於1956年至1960年、1962年至1967年在澳門居住(台端在澳門就讀、台端母親持有澳門警察廳身份證附有 台端資料及 台端持有澳門警察廳身份證的期間)。
由於未能證明 台端曾在澳門通常連續居住七年,不符合澳門特別行政區第8/1999號法律第一條第一款(二)項的規定,不具有澳門永久性居民的身份,故本局決定不向 台端發出《居留權證明書》。
如希望在澳門定居,可嘗試根據第3/2005號行政法規,透過貿易投資促進局(澳門友誼大馬路918號世貿中心二至四樓,電話:(853)28710300 網址:http://www.ipim.gov.mo/) 以投資者、管理或技術人員等方式申請居留許可。另,倘有親屬是澳門居民,亦可嘗試根據第4/2003號法律,以家庭團聚方式,透過治安警察局居留及逗留事務廳(澳門氹仔北安碼頭一巷出入境事務大樓,電話:(853)28725488 網址: http://www.fsm.gov.mo/psp/sm/) 申請居留許可。
根據第7/DSI/2015號批示第一款(二十五)項及第二款的規定,如對上述決定不服,可按照《行政程序法典》第一百四十五條第二款a)項及第一百四十九條的規定,於接收此公函翌日起計十五日內向本局提起聲明異議,或根據《行政訴訟法典》第二十五及二十六條之規定,於接收此公函翌日起計三十日內向行政法院提起司法上訴。
如有查詢,請致函本局(澳門郵箱1089號),來函請註明申請編號及申請人姓名。
專此。
身份證明局副局長
G
2019年10月22日…”
(見卷宗第51頁至第52頁,有關內容在此視為完全轉錄)。
- 2019年11月26日,司法上訴人之訴訟代理人透過圖文傳真方式針對上述決定向本院提起本司法上訴。
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IV - FUNDAMENTOS
Como o presente recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, importa ver o que este decidiu. Este proferiu a douta decisão com base nos seguintes argumentos:
I. Relatório
Recorrente A, melhor id. nos autos,
interpôs o presente recurso contencioso administrativo contra
Entidade recorrida Subdirectora dos Serviços de Identificação que pelo despacho exarado no ofício n.º 04042/DIR/DR/2019, decidiu indeferir o seu pedido de emissão de certificado de confirmação do direito de residência.
Alegou a Recorrente, com os fundamentos de fls. 40 a 50 dos autos, em síntese,
- o vício de forma por falta de fundamentação,
- o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto.
Concluiu, pedindo que seja anulado o acto recorrido.
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A Entidade recorrida apresentou a contestação com os fundamentos a fls. 79 a 102 dos autos, na qual pugnou pela inexistência do vício de ilegalidade alegado, concluindo no sentido de ser o presente recurso julgado improcedente.
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Nenhuma parte apresentou as alegações facultativas.
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A Digna Magistrada do M.º P.º emitiu douto parecer no sentido de ser julgado procedente o presente recurso com a anulação do acto recorrido, com base na verificação do erro no pressuposto de facto, com os fundamentos a fls. 109 a 111v dos autos.
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Este Tribunal é o competente em razão da matéria e da hierarquia.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária e de legitimidade “ad causam”.
O processo é o próprio.
Inexistem nulidades, ou questões prévias que obstem a apreciação “de meritis”.
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II. Fundamentação
1. De facto
Dos autos e dos P.A.s anexos resultam provada a seguinte factualidade pertinente:
(...)
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2. De direito
Começamos por apreciar o vício do erro no pressuposto de facto invocado pela Recorrente.
No seu entendimento, incorreu a Entidade recorrida nesse erro no cômputo do prazo de 7 anos consecutivos da residência habitual previsto no artigo 1.º, n.º 1, alínea 2) da Lei n.º 8/1999 (Lei sobre Residente Permanente e Direito de Residência na Região Administrativa Especial de Macau), designadamente, por ter contabilizado apenas um ano de residência – 1962/1963, em que a Recorrente concluiu o seu ensino primário, ignorando entretanto o período antecedente de 6 anos consecutivos.
A referida norma legal em causa, que servia como base da decisão de indeferimento recorrida dispõe o seguinte: “1. São residentes permanentes da Região Administrativa Especial de Macau, abreviadamente designada por RAEM:…2) Os cidadãos chineses que tenham residido habitualmente em Macau pelo menos sete anos consecutivos, antes ou depois do estabelecimento da RAEM;…”
Como se vê, do que se trata aqui é de um acto de conteúdo negativo, pelo qual a Entidade recorrida indeferiu uma pretensão da Recorrente particular no sentido de ser- lhe emitido o certificado de confirmação do direito de residência. Tem-se entendido doutrinalmente1 que, numa situação como essa, competirá ao particular interessado demonstrar perante a Entidade administrativa que preenche os requisitos legais constitutivos do seu direito – ou seja, tem o particular o ónus de prova que ela é cidadã chinesa, e se encontrava a residir habitualmente em Macau pelo menos sete anos consecutivos, seja antes ou depois do estabelecimento da RAEM.
O fundamento da ora decisão recorrida consiste na inexistência da prova do facto da sua residência habitual em Macau por sete anos consecutivos. A questão essencial é a de saber então se a Recorrente logrou demonstrar que este requisito esteja preenchido no caso concreto.
Na tentativa para o efeito, a Recorrente apresentou à Entidade recorrida, entre os outros, os seguintes elementos para a apreciação do seu pedido:
- o diploma da “Escola B de Macau” (B小學) que atesta a conclusão do curso de creche por parte da Recorrente em 15/7/1957, na idade de 8 anos (conforme doc. junto a fls. 25 e fls. 52 a 53 do P.A. Vol. 4).
- o diploma da mesma escola que atesta a conclusão do curso de ensino primário por parte da Recorrente em 7/7/1963, na idade de 14 anos (conforme doc. junto a fls. 24 e fls. 54 a 56 do P.A. Vol. 4).
À parte disso, consta do processo administrativo:
- a Recorrente foi titular de Cédula de Identificação Policial, emitida pelo CPSP nos anos 1963 a 1967 (conforme doc. junto a fls. 2 do P.A. Vol. 4).
- a Recorrente foi aluna da “Escola C”(C學校) entre 10/11/1965 e 3/3/1966 (conforme doc. junto a fls. 22 a 23 e 60 a 62 do P.A. Vol. 4).
- a mãe da Recorrente, F,foi titular de Cédula de Identificação Policial, emitida pelo CPSP n.º 6XXX0, nos anos de 1957 a 1960, com o averbamento do nome da filha Recorrente na cédula, e nos anos 1961 a 1964 sem o nome da Recorrente incluído na cédula (conforme doc. junto a fls. 2 e v e 4 e v do P.A. Vol. 2).
Não obstante disso, a conclusão que a Entidade recorrida extrai em face das provas produzidas, foi a de insuficiência probatória quanto à verificação do requisito da residência habitual durante 7 anos consecutivos, no sentido de ser apenas comprovada a residência da Recorrente em Macau, entre os anos 1956 a 1960 e 1962 a 1967, sem que esteja a mesma demonstrada relativamente ao ano 1961.
Nenhuma das provas documentais apresentadas pela Recorrente aponta, directamente, no sentido de que nesse ano de 1961 em particular esta se encontrava a residir em Macau. Isso é certo. Mas será que é totalmente vedada a possibilidade de inferir, a partir dos factos demonstrados com base nas provas produzidas, que a Recorrente se encontrava em Macau nesse período em causa?
Consta do diploma da “Escola B de Macau” (B小學) que aí a Recorrente concluiu o curso de ensino primário em 7/7/1963, na idade de 14 anos. Se conforme é sabido, partindo do pressuposto de que o curso de ensino primário tem uma duração de 6 anos, a Recorrente teria iniciado o seu curso em 1957, momento esse coincide com o do termo do anterior curso de creche, datado de 15/7/1957, atestado pelo diploma emitido pela mesma escola.
Todavia, não foi este entendimento acolhido pela ora Entidade recorrida que considerou ser apenas provada a frequência do curso pela Recorrente no preciso ano da conclusão dos cursos com os ditos diplomas, não sendo estes aptos para demonstrar que a Recorrente estudava nesta escola, de forma ininterrupta, durante o período inteiro de 6 anos.
Salvo melhor opinião, cremos que a razão não está ao lado da Entidade recorrida, por ser esta demasiadamente exigente no ónus da prova “diabólica” à Recorrente: uma vez que com base nos factos provados, é-nos suficiente presumir que a Recorrente se encontrava em Macau a frequentar o curso de ensino primário entre os anos 1957 e 1963, inclusivamente o ano 1961 em causa, utilizando Macau como o centro estável da sua vida pessoal e familiar, passará a ser a Entidade recorrida fazer contra prova para demonstrar o facto contrário – neste mesmo ano, a Recorrente se encontrava fora de Macau ou ausente da dita Escola.
Na ausência de nenhuma prova directa, deve valer a presunção judicial que se impõe neste caso, assim como foi sustentada pela digna Magistrada do M.º P.º no seu parecer final, presunção essa a ser ilidida pela Entidade recorrida.
Não foi, contudo, cumprida esta tarefa – inexiste nenhuma prova que a Recorrente, sendo ausente, deixou de residir habitualmente em Macau – nos termos do artigo 4.º, n.º 4 da Lei n.º 8/1999. O facto de que o nome da Recorrente deixou de constar do pedido de Cédula de Identificação Policial n.º 6XXX0 da sua mãe, datado de 4/8/1961 não significa que ela saiu de Macau nesta altura – mas porque ela chegou a ter, precisamente, 14 anos e o averbamento do seu nome na cédula da sua mãe tornou-se desnecessário.
Nesta conformidade, deve proceder o recurso quanto a este fundamento.
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No que toca ao vício de falta da fundamentação, alegou a Recorrente que o acto recorrido não esclareceu com base em que elementos ou prova chegou a tal conclusão fáctica, não explicou porque afastou a pertinência dos outros documentos submetidos pela Recorrente, e nem indicou a fundamentação jurídica do acto.
Ora bem, estando em causa um acto de indeferimento do pedido de emissão do certificado de confirmação do direito de residência, o inerente dever de fundamentação encontra-se estatuído na alínea c) do n.º 1 do art.º 114.º do CPA.
Em relação aos requisitos da fundamentação, impõe a norma do art.º 115.º, n.º s 1 e 2 do CPA, que a mesma deve ser clara, congruente e suficiente, com uma exposição sucinta das razões de facto e de direito que estão na base da decisão.
Neste sentido, como se refere no acórdão do TSI, proferido no processo n.º 375/2016, “o dever de fundamentação visa dar conhecimento ao administrado quais são as razões de facto e de direito que serviram de base de decisão administrativa, ou seja, permitir ao administrado conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pela entidade administrativa, para que possa optar em aceitar o acto ou impugná-lo através dos meios legais…”.
Pois, o essencial é saber se a fundamentação do acto permite ao administrado enquanto destinatário normal reconstituir o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão, de tal forma que este possa tomar a opção consciente entre conformar-se com tal decisão ou afrontá-la em juízo.
Acresce que a fundamentação formal da decisão não corresponde necessariamente à fundamentação material relativa à legitimidade da própria decisão, sendo portanto “reconhecida à obrigatoriedade da fundamentação uma dimensão formal autónoma que se apresenta como uma condição de validade dos actos administrativos, em termos de que a sua falta pode ter por consequência a anulação deles, mesmo que não contenham, ou independentemente de conterem ou não, vícios substanciais”, tal como considerado no Ac. do TUI, 6/12/2002, no Proc. n.º 14/2002.
Ora, no caso em apreço, afigura-se-nos que o acto está fundamentado pois que externou a razão pela qual foi indeferido o pedido da ora Recorrente com base na insuficiência da prova quanto à verificação do requisito de residência habitual durante 7 anos consecutivos, por consequência, na falta do preenchimento do requisito regulado no disposto do artigo 4.º, n.º 4 da Lei n.º 8/1999.
Tal fundamentação, atento a concreta situação em análise, é suficiente na medida em que possibilita a um destinatário médio apreender a motivação fáctica e jurídica da decisão. Como de resto, a mesma conclusão facilmente se extrai pela análise da pretensão deduzida pela Recorrente no âmbito da impugnação judicial do acto recorrido.
Nestes termos expostos, é evidente a satisfação do dever legal de fundamentação e o recurso deverá improceder, pela inexistência do invocado vício de ilegalidade.
***
III. Decisão
Assim, pelo exposto, decide-se:
Julgar procedente o presente recurso contencioso, com a consequente anulação do acto recorrido.
*
Sem custas pela Entidade recorrida, por ser subjectivamente isenta.
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Registe e notifique.
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Quid Juris?
Relativamente às questões suscitadas neste recurso, o Digno. Magistrado do MP junto deste TSI teceu as seguintes doutas considerações:
“A, melhor identificada nos autos, interpôs recurso contencioso do acto da Subdirectora dos Serviços de Identificação de indeferimento do seu pedido de emissão de certificado de confirmação do direito de residência.
Por douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo e que se encontra a fls. 112 a 117 dos presentes autos o recurso contencioso foi julgado procedente com fundamento na verificação do vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto com a consequente anulação do acto administrativo impugnado.
Inconformada, veio a Entidade Recorrida interpor o presente recurso jurisdicional perante o Tribunal de Segunda Instância.
Não foram produzidas contra-alegações.
2.
2.1.
A única questão que se coloca no presente recurso é a de saber se a douta decisão recorrida errou ao julgar procedente o vício que a Recorrente ao acto contenciosamente impugnado de erro nos pressupostos de facto.
Salvo o devido respeito, parece-nos que a Recorrente não tem razão. Procuraremos demonstrar, sucintamente, porquê.
(i)
Está aqui em causa o acto administrativo praticado pela Recorrente que indeferiu a emissão do chamado «Certificado de Confirmação do Direito de Residência» que foi requerida pela Recorrida com fundamento na falta de prova de esta residiu habitualmente em Macau durante 7 anos consecutivos, nomeadamente durante os anos de 1957 a 1963 (inclusive).
De acordo com a norma contida na alínea 2) do n.º 1 do artigo 8.º da Lei n.º 8/1999 resulta que são residentes permanentes da Região Administrativa Especial de Macau «os cidadãos chineses que tenham residido habitualmente em Macau pelo menos sete anos consecutivos, antes ou depois do estabelecimento da RAEM».
Por sua vez, resulta do n.º 1 do artigo 1.º do Regulamento Administrativo n.º 7/1999, que «os indivíduos que declarem ter o direito de residência na Região Administrativa Especial de Macau, doravante designada por RAEM, nos termos das alíneas 2), 3), 5) e 6) do n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 8/1999 da Região Administrativa Especial de Macau e não sendo titulares do Bilhete de Identidade de Residente de Macau válido ou do documento de identificação da RAEM válido, devem requerer o certificado de confirmação do direito de residência na Direcção dos Serviços de Identificação da RAEM, doravante designada por DSI, com excepção dos indivíduos referidos no n.º 2 do presente artigo».
Da conjugação destas normas decorre que a emissão do certificado de confirmação do direito de residência depende da verificação deste direito na esfera jurídica do requerente, o qual, por sua vez, na hipótese aqui em causa, depende da demonstração de que o mesmo residiu habitualmente na RAEM durante o período de sete anos consecutivos.
Importa notar que, ao contrário do que vem sustentado pela Recorrente, a Administração não dispõe de nenhuma margem de discricionariedade. A emissão do certificado de confirmação do direito de residência é, ao invés, um acto estritamente vinculado. Na verdade, demonstrando-se que um cidadão chinês residiu habitualmente em Macau pelo menos sete anos consecutivos, antes ou depois do estabelecimento da RAEM, a Administração está obrigada a emitir o dito certificado, não dispondo de qualquer margem ou abertura discricionária para não o fazer (como se sabe, a vinculação existe quando a norma de competência indica de forma fechada as circunstâncias que desencadeiam a intervenção administrativa; estabelece que a Administração tem de agir quando esses pressupostos se verifiquem e, por fim, define, de forma rigorosa e fechada em que consiste essa acção: nestes termos, por último, PEDRO COSTA GONÇALVES, Manual de Direito Administrativo, Coimbra, 2020, pp. 202-203).
A circunstância de o legislador utilizar um conceito aparentemente indeterminado, como seja o de «residência habitual» não mexe com a anterior conclusão. Isto porque se trata de um conceito que apenas na aparência é indeterminado, pois que o mesmo não concede qualquer margem de livre apreciação à Administração ou, se quisermos, que não lhe confere discricionariedade, sendo, por isso plenamente sindicável pelos tribunais (assim tem vindo a decidir o Tribunal de Última Instância: entre outros, acórdãos de 13.11.2019, processo n.º 106/2019; de 18.12.2020, processo n.º 190/2020; de 27.1.2021, processo n.º 182/2020. Sobre a questão da diferença entre indeterminação estrutural e mera dificuldade de interpretação e entre conceito jurídico indeterminado em sentido próprio e um mero conceito classificatório de imprecisão hermenêuticamente resolúvel, veja-se JOSÉ MANUEL SÉRVULO CORREIA, Conceitos jurídicos indeterminados e âmbito do controlo jurisdicional, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 70, pp. 38 a 57).
(ii)
O erro nos pressupostos de facto constitui uma das causas de invalidade do acto administrativo, consubstanciando um vício de violação de lei. Fala-se de erro nos pressupostos de factos quando ocorre uma «divergência entre os pressupostos de que o autor do acto partiu para prolatar a decisão administrativa final e a sua efectiva verificação na situação em concreto, resultando do facto de se terem considerado na decisão administrativos factos não provados ou desconformes com a realidade, isto é os fundamentos da motivação do acto em causa não existiam ou não tinham dimensão que foi por ele suposta» (assim, na jurisprudência comparada, entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12.03.2009, processo n.º 545/08, disponível em www.dgsi.pt).
No caso sujeito, tal como foi entendido pelo Tribunal recorrido, é de considerar que o acto administrativo em pleito padece do referido erro.
A questão é a de saber se, face aos elementos constantes dos autos, se encontra ou não provado que a Recorrida residiu habitualmente em Macau por um período de 7 anos consecutivos.
A Administração considerou faltar a prova de que a Recorrida residiu em Macau durante o ano de 1961, dado que, em seu entender, nenhum elemento documental foi junto aos autos que demonstrasse tal facto e partindo desse pressuposto indeferiu a pretensão da Recorrida.
Não nos parece que assim deva ser.
É certo que o ónus da prova de que residiu habitualmente em Macau durante 7 anos consecutivos recai sobre a Recorrida, uma vez que se trata de factos constitutivos do seu direito de residência na RAEM e da consequente emissão do certificado por si pretendida.
No entanto, o ónus da prova, como se sabe, é, sobretudo, um critério ou uma regra de decisão mobilizável para ultrapassar as situações de dúvida do julgador, transformando uma situação de non liquet numa situação de liquet contra a parte sobre quem recai o dito ónus (cfr. o artigo 8.º do Código Civil e o artigo 437.º do Código de Processo Civil).
Ora, no caso, como bem decidiu o Tribunal a quo, embora não haja prova de natureza documental da qual resulte que a Recorrida residiu em Macau durante o ano de 1961, a verdade é que a demais prova documental produzida permite concluir e considerar provado que a Recorrida, ainda menor, aqui frequentou estabelecimentos de ensino e que concluiu o curso da creche na Escola B de Macau em 15 de Julho de 1957, com a idade de 8 anos, que concluiu o curso primário em 7 de Julho de 1963 na mesma Escola com a idade de 14 anos e que foi aluna da Escola C entre 10 de Novembro de 1965 a 3 de Março de 1966. Além disso, a Recorrida foi titular da Cédula de Identificação Pessoal emitida pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública nos anos de 1963 a 1967.
Desses factos que, com base nos referidos documentos, se encontram provados, é possível presumir, por apelo às mais elementares regras da experiência, que o facto que a Administração considerou não estar provado, qual seja, o de que, também no ano de 1961, a Recorrida não residiu em Macau, deve, afinal, considerar-se provado, tal como muito bem decidiu o Meritíssimo Juiz a quo, acompanhando, aliás, o douto parecer no mesmo sentido da nossa ilustre Colega (como se sabe, na prova por presunção, parte-se de um determinado facto para se chegar por mera dedução à demonstração da realidade de outro facto ou, como se afirma na norma do artigo 342.º do Código Civil, parte-se de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido).
Portanto, através de prova por presunção judicial que, nos termos do disposto no artigo 344.º do Código Civil se mostra indiscutivelmente admissível, demonstra-se o facto que a Administração, erradamente, considerou que não estava provado. A situação não é, pois, de dúvida que cumpra resolver por apelo às regras de distribuição do ónus da prova. O que está em causa é, antes, a prova positiva do facto controvertido constitutivo do direito da Recorrida.
Por isso se impõe concluir, em nosso modesto entendimento, que, assentando o acto recorrido nesse pressuposto errado de que se não provou um facto que na verdade se mostra provado, ocorre o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto que justificou a respectiva anulação por parte da sentença recorrida pelo que esta não é merecedora de qualquer censura.
3.
Pelo exposto, é nosso parecer o de que, salvo melhor opinião, deverá ser negado provimento ao presente recurso.
Subscrevemos esta douta argumentação, que é reproduzida para a fundamentação deste aresto e como tal é de negar provimento ao presente recurso, confirmando-se a decisão do TA ora posta em crise.
*
Síntese conclusiva:
I - A emissão do certificado de confirmação do direito de residência (artigo 1.º/1 do Regulamento Administrativo n.º 7/1999, de 20 de Dezembro) é um acto estritamente vinculado. Na verdade, demonstrando-se que um cidadão chinês residiu habitualmente em Macau pelo menos sete anos consecutivos, antes ou depois do estabelecimento da RAEM, a Administração está obrigada a emitir o dito certificado, não dispondo de qualquer margem ou abertura discricionária para não o fazer.
II - O erro nos pressupostos de facto constitui uma das causas de invalidade do acto administrativo, consubstanciando um vício de violação de lei. Ocorre quando se verifica uma divergência entre os pressupostos de que o autor do acto partiu para proferir a decisão administrativa final e a sua efectiva verificação na situação em concreto, resultando do facto de se terem considerado na decisão administrativos factos não provados ou desconformes com a realidade.
III – Apesar de não haver prova de natureza documental da qual resulte que a Recorrida residiu em Macau durante o ano de 1961, a verdade é que a demais prova documental produzida permite concluir e considerar provado que a Recorrida, ainda menor, aqui frequentou estabelecimentos de ensino e que concluiu o curso da creche na Escola B de Macau em 15 de Julho de 1957, com a idade de 8 anos, que concluiu o curso primário em 7 de Julho de 1963 na mesma Escola com a idade de 14 anos e que foi aluna da Escola C entre 10 de Novembro de 1965 a 3 de Março de 1966. Além disso, a Recorrida foi titular da Cédula de Identificação Pessoal emitida pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública nos anos de 1963 a 1967. Desses factos que, com base nos referidos documentos, se encontram provados, é possível presumir, por apelo às mais elementares regras da experiência, que o facto que a Administração considerou não estar provado, qual seja, o de que, também no ano de 1961, a Recorrida não residiu em Macau, deve, afinal, considerar-se provado através de prova por presunção judicial que, nos termos do disposto no artigo 344.º do CCM, se mostra indiscutivelmente admissível, demonstra-se o facto que a Administração, erradamente, considerou que (o facto de residir em Macau em 1961) não estava provado.
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Tudo visto, resta decidir.
* * *
V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida do TA.
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Sem custa por isenção subjectiva.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 15 de Julho de 2021.
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Fong Man Chong Mai Man Ieng
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Ho Wai Neng
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Tong Hio Fong
1 Neste sentido, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Sobre as regras de distribuição do ónus material da prova no recurso contencioso de anulação de actos administrativos, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 20, pp. 45 a 50, em especial, p. 50
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2021-223-Estatuto-Residente-Permanente-7-anos 21