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Processo nº 239/2021
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data do Acórdão: 8 de Julho de 2021

ASSUNTO:
- Patentes

SUMÁRIO:
- Para que a patente seja registável é necessário que se preencham três requisitos cumulativos:
a) Sejam novas;
b) Impliquem actividade inventiva;
c) Sejam susceptíveis de aplicação industrial.
- Para que seja reconhecida actividade inventiva é necessário que as reivindicações não resultem evidentes para um profissional da área segundo os conhecimentos técnicos existentes, ou seja aquilo que se designa por estado da técnica.


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Rui Pereira Ribeiro

Processo nº 239/2021
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 8 de Julho de 2021
Recorrente: A Inc.
Recorrida: Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO

A Inc., com os demais sinais dos autos,
  veio interpor recurso judicial da decisão de 13.07.2020 do Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico que recusou o seu pedido de registo da patente da invenção I/**** pedindo que o mesmo seja revogado.
  Cumprido o disposto no artº 278º do RJPI veio a DSEDT responder ao recurso interposto e remeter ao tribunal o processo administrativo referente ao pedido de registo de patente a que se reportam os autos.
  Foi proferida sentença julgando-se improcedente o recurso e mantendo a decisão recorrida de indeferir o registo de patente da invenção I/****.
  Não se conformando com a sentença proferida veio o Recorrente interpor recurso daquela decisão apresentando as seguintes conclusões:
A. O Tribunal a quo entende erradamente que as reivindicações do pedido de registo de invenção não reúnem os requisitos de patenteabilidade previstos no artigo 61.º do RJPI por não estar preenchido o critério da actividade inventiva previsto no artigo 66.º do RJPI.
B. As especificações das reivindicações (mal) apreciadas pelo Tribunal, foram consideradas patenteáveis durante o exame dos pedidos estrangeiros correspondentes.
C. Do Relatório de Pesquisa Internacional (ISR) elaborado no contexto do pedido internacional submetido ao abrigo do Patent Convention Treaty de 1970 n.º PCT/CA2016/050442 o ISR considerou especificamente as reivindicações 9 e 10 e conclui que o objecto das referidas reivindicações envolvia uma etapa inventiva em relação ao estado da técnica presente em Knust.
D. A USPTO (United States Patent & Trademark Office - entidade congénere da DSE) também examinou as reivindicações (reivindicação independente 1) incluindo os alegados “valores de profundidade a seguir quando um ou mais valores de profundidade mudam abruptamente em resposta à obstrução” da reivindicação 9 nos autos pendente e concluiu que a matéria da presente reivindicação 9 não era óbvia, tendo em conta a patente Knust (cfr. pedido de patente norte-americano n.º 15/309,102, agora Patente n.º 10,096,206)
E. O Instituto Canadiano da Propriedade Intelectual determinou também que o objecto da reivindicação independente canadiana 1, que inclui os alegados “valores de profundidade a seguir quando um ou mais valores de profundidade mudam abruptamente em resposta à obstrução” da actual reivindicação 9 era elegível para patente quando confrontado com a patente Knust (cfr. cópia da patente canadiana nº 2,947,969).
F. A Recorrente não defende que “uma vez reconhecida a patente por uma entidade estrangeira, terá a mesma que ser reconhecida em Macau”, mas unicamente que a actividade inventiva tem que ser apreciada e decidida de forma objectiva, por referência a critérios objectivos e pré-existentes.
G. Actividade inventiva não é um critério subjectivo, pessoal e indefinido, que cada pessoa possa preencher e decidir a seu bel­prazer, tendo previsão legal no artigo 66.º do RJPI.
H. A actividade inventiva é determinada por alguém com conhecimentos técnicos que analisa o estado da técnica determinando o artigo 65.º n.º 2 do RJPI que o “estado da técnica é constituído por tudo o que, dentro ou fora do Território, foi tornado acessível ao público antes da data do pedido de patente, por descrição, utilização ou qualquer outro meio.”, incluindo “(...) o conteúdo dos pedidos de patentes requeridos, em data anterior à do pedido de patente, para produzir efeitos no Território e ainda não publicados.” (artigo 65.º n.º 3 do RJPI).
I. Os normativos legais em vigor em Macau determinam que a actividade inventiva se afere por comparação (e análise) do estado da técnica, incluindo patentes registadas ou publicadas, dentro ou fora de Macau, sendo a análise crítica efectuada pelas entidades estrangeiras supraditas de todos os elementos fornecidos relevante para aferir deste requisito pelas instituições de Macau.
J. Impõe-se que a actividade jurisdicional funcione como uma decisão crítica e imparcial da questão controvertida nos autos. O Tribunal a quo ao limitar-se a remeter na sua decisão para a fundamentação vertida no parecer da DNPI sem demais análise e ponderação, não executa o exercício pleno da função jurisdicional.
K. Os raciocínios e explicações formulados pela Recorrente não foram objecto de qualquer análise, consideração ou apreciação pelo Tribunal a quo, tendo sido manifestamente desconsiderados e descartados, remetendo a decisão recorrida, na sua alegada “fundamentação”, para a decisão da DSE e parecer da DNPI.
L. Tal omissão do dever de pronúncia determina a nulidade da sentença proferida, nos termos do artigo 571.º, n.º 1, al. d) do CPC.
M. O Tribunal a quo entende que as reivindicações da Recorrente “são óbvias”, porquanto, “os técnicos da área em causa podem facilmente pensar em como as imagens são processadas para destacar a mensagem”, “os profissionais da área podem facilmente colocar as imagens quase pareleles à área de trabalho”.
N. Ficamos sem saber quem são os “profissionais da área” a que se refere a decisão recorrida, não sendo identificados pelo parecer do DNPI ou sequer é feita qualquer citação ou referência nesse sentido.
O. O Tribunal a quo não indicou quais os profissionais da área ouvidos e sobre que matérias, que permitiram elaborar a decisão em apreço, limitando-se a invocar que tais considerações “são óbvias” sem enunciar argumentos para justificar tais conclusões, o que representa uma obliteração da função jurisdicional que se reporta essencial à boa decisão da causa.
P. As reivindicações (não) apreciadas pelo Tribunal a quo, foram consideradas relevantes para aferição da etapa inventiva durante o exame dos pedidos estrangeiros correspondentes, sendo a actividade inventiva definida por referência ao estado da técnica - que é global e extra-territorial.
Q. O sistema Knust é um sistema complexo que requer um grande número de câmaras e interconexões entre as câmaras, o que exige que estas estejam ligadas entre si utilizando um multiplexador.
R. O sistema Knust não considera questões como profundidade, determinação de obstrução, ou remoção de fundo, estando cada câmara colocada especificamente para cada área de apostas e o campo de visão para cada câmara em particular é centrado em torno da área de apostas específica.
S. As reivindicações no pedido em recurso resultam num sistema melhorado de monitorização das actividades do jogo, sistemas correspondentes e meios de leitura informática não transitórios.
T. A Recorrente requereu a audição de técnicos-peritos para apreciação dos factos de natureza técnica dos autos, para esclarecimento do Tribunal sobre o seu alcance e importância, nomeadamente, das reivindicações constantes do pedido de registo de patente I/**** por confronto com o elemento “actividade inventiva”, não tendo Tribunal a quo pronunciado sobre o requerimento formulado pela Recorrente.
U. O artigo 280.º do RJPI dispõe que “Quando o recurso suscitar um problema técnico que requeira melhor informação ou quando o tribunal o entender conveniente pode este “(...) requisitar a comparência (...) do técnico ou técnicos da DSE (...)”, estando na mesma linha o artigo 16.º do CPAC.
V. A Recorrente desconhece porque razão o Tribunal não se pronunciou sobre o pedido de audição de um técnico e porque razão o Tribunal não lançou mão a estes mecanismos legais que lhe permitem ter o apoio técnico necessário à prolação da decisão judicial.
W. Ao omitir estes passos, o Tribunal esteve desprovido de capacidade técnica para proferir a decisão de mérito (no fundo, para proferir qualquer decisão sobre a existência de actividade inventiva e o estado da técnica numa área técnica com alguma complexidade).
X. É necessário repetir o julgamento que nunca foi feito, por omissão dos critérios técnicos previstos nos artigos 65.º e 66.º do RJPI e por omissão do procedimento processual previsto no artigo 280.º do mesmo RJPI.
Y. O alegado exame realizado pela DNPI limita-se a um confronto básico e simplista da patente em exame com a patente D1/Knust, pecando a análise por ser sucinta e deficiente: o relatório afirma nove (9) vezes que as reivindicações em questão são óbvias mas apenas faz uma análise técnica da reivindicação 1 no parágrafo 2.1 do relatório de exame.
Z. O relatório de exame realizado pela DNPI é superficial e não elabora de forma concreta e compreensível porque razão as reivindicações da patente recusada não contêm actividade inventiva, estando crivado de um claro pré-julgamento.
AA. As decisões posteriores enfermam do mesmo vício, nunca se tendo verificado uma concreta apreciação crítica e razoável das reivindicações apresentadas a registo.
BB. A decisão ora em recurso padece da falta de fundamentação ou fundamentação insuficiente, vício que afecta todas as decisões anteriormente proferidas, exigindo-se que num recurso jurisdicional (apresentado em primeira instância) o grau de detalhe, explicação e fundamentação seja manifestamente superior.
CC. A apreciação jurídica da sentença recorrida limita-se a duas páginas e meia, de onde resulta a transcrição da decisão da DNPI, desligada de qualquer juízo crítico.
DD. Tendo o estado da técnica uma componente abrangente, extra-territorial e global, como é que a mesma patente contém actividade inventiva para as autoridades do Canadá, dos Estados Unidos da América e até para efeitos de registo de uma patente internacional, mas para a DSE já não?
EE. A jurisprudência dominante, defende que a actividade inventiva pretende dar uma resposta distinta - mais célere, eficaz, menos dispendiosa - a um problema recorrente no sector ou na acividade desempenhada, conforme resulta do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 02/10/2014 no âmbito do processo n.º 85/13.OYHLSB.L1-8 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 28/06/2018 no âmbito do processo n.º 108/16.0YHLSB.L1-2 e o qual dispõe.
FF. A aferição do requisito ou pressuposto de patenteabilidade de actividade inventiva não é concretizada ou efectuada pelas diferenças entre a invenção patenteanda e o “estado da técnica mais próximo”, mas antes pela adopção da doutrina da abordagem problema-solução.
GG. Verificado o preenchimento cumulativo de todos os requisitos subjectivos de patenteabilidade - novidade, actividade inventiva e aplicação industrial - impõese ao Tribunal a quo que proceda à alteração da decisão da DSE e conceda o registo da patente ora em apreço.

Notificada a DSEDT das alegações de recurso veio esta oferecer o merecimento dos autos.

Foram colhidos os vistos.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

a) Factos

Da decisão recorrida consta a seguinte matéria de facto:

A) Em 27/05/2016, a A INC. submeteu à DSE o pedido de registo de patente da invenção I/**** intitulado: sistema, maneira e dispositivo destinados à vigilâncias das apostas.
B) Passado o exame de forma, o pedido de registo em causa mostrava-se satisfazer às condições para ser aberto ao público. Nos termos do art.º 10.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, conjugado com o art.º 83.º, publicou-se o pedido de registo em 07/12/2016 na II Série do Boletim Oficial da RAEM, n.º 49.
C) Em 03/06/2019 a recorrente submeteu à DSE o pedido de exame substancial.
D) Por meio do ofício n.º 61397/DPI, a DSE encaminhou a documentação concernente ao pedido de registo em questão à Direcção Nacional da Propriedade Intelectual, para que passasse a servir de documentos de referência obrigatória para o efeito de elaborar o relatório de pesquisa internacional e a notificação do parecer de exame.
E) Em 18/10/2019, a DSE recebeu o relatório de pesquisa internacional e a notificação do parecer de exame relativos ao presente pedido de registo mandados de volta pela Direcção Nacional da Propriedade Intelectual. Conforme a notificação do parecer de exame, o presente pedido de registo não preenchia as condições de patenteabilidade.
F) Em 21/10/2019, por meio do ofício n.º 62539/DPI, a DSE encaminhou à recorrente o referenciado relatório de pesquisa internacional, a notificação do parecer de exame e os documentos de comparação, informando-a de apresentar à Direcção alegações de parecer ou modificações dentro de 3 meses desde o recebimento daquela.
G) Em 24/01/2020, a DSE recebeu as alegações de parecer em resposta à notificação do parecer de exame e as folhas de modificação das reivindicações submetidas pela recorrente. Em 17/02/2020, a DSE recebeu as folhas substitutivas das reivindicações entregues pela recorrente.
H) Por meio do ofício n.º 60433/DPI, a DSE encaminhou as alegações e as modificações supra mencionadas à Direcção Nacional da Propriedade Intelectual, para que passasse a servir de documentos de referência para o efeito de elaborar uma nova notificação do parecer de exame.
I) Em 10/07/2020 a DSE recebeu a notificação do parecer de reexame relativo ao presente pedido de registo mandada pela Direcção Nacional da Propriedade Intelectual.
J) Conforme a conclusão do parecer de exame pronunciada pela Direcção Nacional da Propriedade Intelectual, no tocante à reivindicação 1-96 do presente pedido de registo, embora demonstrando-se nova e susceptível de aplicação industrial, era privada de criatividade. Referindo-se correspondentemente ao disposto no Regime Jurídico da Propriedade Industrial, a dita reivindicação não implica a "actividade inventiva" prevista pelo art.º 66.º.
K) Com a sua reivindicação 1-96 de registo que não satisfaz o disposto no art.º 66.º sobre actividade inventiva, o presente pedido de registo não preenche o requisito substancial de patenteabilidade previsto pelo art.º 61.º, pelo que se lhe deve indeferir a concessão de propriedade industrial baseando-se nos motivos previstos pelo art.º 98.º e pelo art.º 9.º, n.º 1, alínea a).

b) Do Direito

Em síntese invoca o Recorrente
- Omissão de pronúncia pelo tribunal “a quo” quanto ao seu requerimento em que nos termos do artº 280º do RJPI e artº 16º do CPAC requeria que fosse ouvido técnico indicando a pessoa que entendia ter sido ouvida;
- Erro de julgamento da decisão recorrida.

Vejamos então.

- Da omissão de pronuncia do técnico indicado.

Invoca o Recorrente que requereu a audição do técnico que indica nos termos do artº 280º do RJPI e artº 16º do CPAC.
Salvo melhor opinião entendemos que o recurso a outro diploma legal que não o RJPI só se deverá fazer a título supletivo caso se mostre que no diploma em causa ocorre alguma lacuna.
O RJPI regula os termos do processo de recurso judicial das decisões referentes a patentes e marcas nos termos dos seus artº 275º e seguintes, atribuindo a competência ao tribunal de Competência Genérica e estabelecendo quanto ao recurso que os termos se processa nos termos do processo civil – cf. artº 282º do RJPI -.
Por sua vez o artº 280º do mesmo diploma legal estabelece os termos em que o tribunal pode ouvir os técnico da DSEDT quando necessitar de esclarecimentos.
Logo, não se vislumbra a razão do recurso ao artº 16º do CPAC quando não só o RJPI tem a situação regulada, como não há neste diploma (RJPI) qualquer remissão para aquele (CPAC) diploma.
Pese embora a actividade da DSEDT no que concerne à concessão de patentes e marcas seja por natureza administrativa, o certo é que está sujeita a uma disciplina e regime próprios arredados do CPA e do CPAC, pelo que, carece de qualquer fundamento o recurso àquela norma.

Mais adiante, também se invoca (conclusão X) que “é necessário repetir o julgamento que nunca foi feito”.
A este respeito recomendamos melhor leitura do diploma legal aplicável, a saber o RJPI artº 275º a 283º, uma vez que, não está prevista nesta forma processual a realização de qualquer fase de instrução ou julgamento nos termos em que é previsto no CPC.

Continuando,

É o seguinte o teor do artº 280º RJPI sendo o realce e sublinhado da nossa autoria:
Artigo 280.º
(Requisição de técnicos)
Quando o recurso suscitar um problema técnico que requeira melhor informação ou quando o tribunal o entender conveniente, pode este, em qualquer momento, requisitar a comparência, em dia e hora por ele designados, do técnico ou técnicos da DSE em cujo parecer se tenha fundado a decisão recorrida, a fim de que lhe prestem oralmente os esclarecimentos de que necessitar.
Ou seja, se em face das questões técnicas suscitadas no processo o tribunal tiver dúvidas ou necessitar de esclarecimentos relativamente ao parecer em que se tenha fundado a decisão recorrida, pode designar dia e hora para o técnico da DSEDT comparecer para o efeito.
Não se trata aqui de nenhuma peritagem em que assista à parte designar técnico para ser ouvido pelo tribunal.
A assistência de técnico a que alude o artº 280º do RJPI destina-se a auxiliar o tribunal se estiverem em causa conhecimentos técnicos especiais de que o tribunal necessite para proferir decisão à semelhança do que se prevê no artº 552º do CPC.
Destarte, carece de qualquer fundamento legal o requerimento do Recorrente para que se ouvissem técnicos indicando o seu, o qual do que resulta dos autos não será da DSEDT, nem o, ou um dos, autores do parecer em que se fundou a decisão recorrida.
No entanto, haveria o juiz “a quo” de ter proferido um despacho, ainda que simples e liminar de “indeferimento por falta de fundamento legal”, o que não sucedeu.
Porém, essa omissão em nada influenciou a decisão da causa, até porque, aquela (a decisão) acompanhou os pareceres da DSEDT e resulta da fundamentação da sentença recorrida, à qual o Mmº Juiz “a quo” aderiu e comentou, que não se lhe suscitaram dúvidas quanto ao conteúdo e conclusões do parecer que esteve subjacente à recusa de registo da patente.
Destarte, ainda que a omissão de indeferimento do requerido constitua uma preterição de formalidade essencial, não tendo influído na decisão da causa face ao disposto no artº 147º nenhum efeito se lhe pode assacar, menos ainda a realização de um julgamento que a lei nem prevê como pretende o Recorrente.
Por fim, “ex abundantia”, ainda que assim não fosse, reconhecendo-se que houve omissão de pronúncia por banda do tribunal “a quo”, cabendo a este tribunal conhecer desta questão nos termos do artº 630º do CPC “ex vi” artº 282º do RJPI, sempre seria agora de negar provimento ao recurso nesta parte uma vez que, como se explicou acima a audição de peritos requerida pelo Recorrente não cabe no âmbito do disposto no artº 280º do RJPI e em face dos elementos existentes nos autos o tribunal entende não haver esclarecimentos a pedir.
Pelo que, sempre será de negar provimento ao recurso com este fundamento.

- Do erro de julgamento da decisão recorrida.

Em suma e de essencial nas alegações deste recurso vem o Recorrente reiterar a posição que tem mantido desde o início.
É o seguinte o teor da decisão Recorrida:
«Na tentativa de contestar a decisão tomada pela DSE, o recorrente referiu que no estrangeiro se tinha confirmado a patenteabilidade ao seu pedido de registo por este satisfazer os requisitos para o efeito; de facto, a seu ver a DSE devia ter-lhe concedido à pedida patente de acordo com o resultado de exame proferido pelos organismos estrangeiros.
Segundo seja o art.º 2,§3 da Convenção de Paris, seja o princípio de âmbito territorial consagrado no art.º 4.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial de Macau, os exames realizados por organismos estrangeiros respeitantes à satisfação ou não dos requisitos de patenteabilidade não são vinculativos na RAEM. Portanto naufraga o argumento com que se tentava confutar o despacho recorrido sem acrescentar outros de que no estrangeiro se tinha confirmado a patenteabilidade das suas reivindicações por estas satisfazerem os requisitos para o efeito.
No aspecto do exame de patente, à luz do art.º 85.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial conjugado com o «Acordo de Cooperação entre a Direcção Nacional da Propriedade Intelectual e a Direcção dos Serviços de Economia da Região Administrativa Especial de Macau na Área dos Direitos de Propriedade Intelectual» publicado pelo Aviso do Chefe do Executivo n.º 7/2004, a Direcção Nacional da Propriedade Intelectual, enquanto uma das entidades designadas para o exame de patente no Regime Jurídico da Propriedade Industrial da RAEM, presta assistência técnica à DSE na aprovação dos pedidos de patente da invenção e da utilidade submetidos na RAEM para a elaboração do relatório de exame.
Portanto temos que passar em revista o relatório elaborado pela Direcção Nacional da Propriedade Intelectual. Conforme os factos provados, em observância aos procedimentos para o pedido de patente, a DSE encaminhou a documentação atinente ao presente pedido de registo à Direcção Nacional da Propriedade Intelectual, para que passasse a servir de documentos de referência obrigatória para o efeito de elaborar o relatório de pesquisa internacional e a notificação do parecer de exame.
Em 18/10/2019, a DSE recebeu o relatório de pesquisa internacional e a notificação do parecer de exame mandados de volta pela Direcção Nacional da Propriedade Intelectual, segundo a qual o presente pedido de registo não preenchia as condições de patenteabilidade.
Em seguida concedeu-se um prazo ao recorrente para apresentar à DSE alegações de parecer ou modificações.
Em 24/01/2020, a recorrente apresentou as alegações de parecer em resposta à notificação do parecer de exame e as folhas de modificação das reivindicações. A DSE, por sua vez, encaminhou as alegações e as modificações supra mencionadas à Direcção Nacional da Propriedade Intelectual.
Conforme a conclusão do parecer de exame pronunciada pela Direcção Nacional da Propriedade Intelectual, no tocante à reivindicação 1-96, embora demonstrando-se nova e susceptível de aplicação industrial, era privada de criatividade.
Por isso, a DSE indeferiu ao recorrente o pedido de patente.
Eis a opinião da Direcção Nacional da Propriedade Intelectual formada durante o exame:
“Citação e explicação:
O presente parecer escrito baseia-se nos seguintes documentos e no prognóstico razoável na colona VIII:
US 2005/0090310A1 (28.04.2005)
D1 publicou um sistema de monitorização automática de cada aposta lançada nos jogos de mesa de casino, nos quais as fichas do jogador ficam colocadas em certas zonas da mesa para ser utilizadas em certos jogos;
O sistema é composto de hardware do computador e sistema de software, capazes de capturar vídeos das filhas empilhadas colocadas nas zonas de aposta sobre a mesa; o processo realiza-se através das câmaras de vídeo a cores ou de outros vídeos ainda instaladas por cima da mesa de jogo em frente a cada zona de aposta; os sinais de vídeo são transmitidos à placa de captura de imagem localizada na unidade de computador central; a localização das câmaras é de importância fundamental para o programa de análise;
O sistema e a maneira permitem ainda a passagem rápida de uma aposta a outra dos jogadores em determinadas mesas para a obtenção veloz dos sinais de vídeo.
Através do dispositivo de accionamento, o sistema consegue ainda iniciar a leitura do vídeo e a captura pelas câmaras instaladas na mesa.
Munido de fonte de luz que ilumina uniformemente as fichas empilhadas. Com esta função evita-se a produção do efeito de sombra pelas fichas no fundo;
O sistema pode salvar as informações no programa de banco de dados dedicado à monitoração dos jogadores para consulta e análise (mais pormenorizadamente cf. a folha explicativa da D1, parágrafos [0007]-[0014] e a imagem 1).
1. D1 não publicou o sistema nas reivindicações 1 e 21, o dispositivo na reivindicação 41 e a maneira na reivindicação 62. Portanto, são todas novas as reivindicação bem como a sua reivindicação subordinada, ou seja a reivindicação 1-95, sendo novas, satisfazem o disposto no 33(2) do Tratado PCT.
2.1. A diferença entre a reivindicação 1 e D1 consiste: na diferença das funções realizadas pelas peças de formação de imagem. D1 já publicou as informações de fichas capturadas pelas câmaras de vídeo. Então é fácil para os técnicos do sector ter a ideia de processar as imagens para realçar as informações de fichas. Por isso mostra-se evidente a reivindicação 1.
Com as especificações técnicas suplementares na reivindicação 2-20, por terem sido publicadas por D1 ou ainda por serem de fácil concepção ou certas para os técnicos do sector, mostra-se evidente a reivindicação 2-20.
2.2. A diferença entre a reivindicação 21 e D1 consiste: na diferença da localização das peças de formação de imagem. Para obter sinais de imagem mais nítidos e mais precisos, é fácil para os técnicos do sector ter a ideia de colocar as peças de formação de imagem quase paralelas à superfície da mesa. Por isso mostra-se evidente a reivindicação 21.
Com as especificações técnicas suplementares na reivindicação 22-40, por terem sido publicadas por D1 ou ainda por serem de fácil concepção ou certas para os técnicos do sector, mostra-se evidente a reivindicação 22-40.
2.3. São evidentes para os técnicos do sector a reivindicação 41 e o dispositivo na sua reivindicação subordinada 42-61, cf. o comentário à reivindicação 1-40 para o parecer concreto.
2.4. A diferença entre a reivindicação 61 e D1 consiste: nas restrições sobre as formas e a disposição das fichas; nas restrições sobre o processamento das imagens capturadas. Para recolher informações correctas e precisas, pode-se usar fichas cujo valor se distingue através de cor e de tamanho, entre outros aspectos, e colocá-las empilhadas em zonas designadas, trata-se de uma ideia de fácil concepção para os técnicos do sector; trata-se igualmente de uma ideia evidente processar as imagens capturas originais para evitar erros, enquanto os procedimentos concretos de processamento podem ser facilmente determinados pelos técnicos do sector. Então mostra-se evidente a reivindicação 62.
Com as especificações técnicas suplementares na reivindicação 63-95, por terem sido publicadas por D1 ou ainda por serem de fácil concepção ou certas para os técnicos do sector, mostra-se evidente a reivindicação 22-40. (sic –n. da t.)
Por isso, privada de criatividade, a reivindicação 1-95 não satisfaz o disposto no 33(3) do Tratado PCT.
3. Susceptível de aplicação, a reivindicação 1-95 satisfaz o disposto no 33(4) do Tratado PCT.”
Assim pode-se ver que a Direcção Nacional da Propriedade Intelectual avaliou globalmente a reivindicação apresentada pela recorrente e considera que quanto à reivindicação de registo de patente, essa se mostrava nova e susceptível de aplicação industrial. Entre outros, apontava para os seus sistemas de hardware e de software: através das câmaras instaladas nas zonas de jogo, capturam-se sinais com vídeos a cores ou com outras imagens de vídeo; através do dispositivo de accionamento, lê-se o vídeo; a fonte de luz é projectada de forma uniforme sobre as fichas ou pilhas de ficha, para evitar a produção de efeito de sombra nas fichas no fundo. O sistema consegue ainda armazenar as informações no banco de dados para consulta e análise futuras. Processando as informações visivas capturadas e optimizando as informações previamente obtidas, podem-se reconhecer efectivamente os tipos de ficha e salvar as informações. Todas essas reivindicações são novas e susceptíveis de aplicação industrial, se bem não criativas.
A conclusão da Direcção Nacional da Propriedade Intelectual baseia-se sobretudo na comparação com US 2005/0090310A1 e aí pensa-se que a reivindicação 41 e a sua reivindicação subordinada, ou seja a reivindicação 1-95 são novas.
Apesar da diferença de funções realizadas pelas peças de formação de imagem, é fácil para os técnicos do sector ter a ideia de processar as imagens para realçar as informações de fichas. Por isso mostra-se evidente a reivindicação.
No que se refere à localização das peças de formação de imagem, apesar das localizações diferentes, procura-se sempre obter informações visivas mais nítidas e precisas, então é fácil para os técnicos do sector ter a ideia de colocar as peças de formação de imagem quase paralelas à superfície da mesa. Por isso mais uma vez mostra-se evidente a reivindicação.
A recorrente invocava ainda que no que toca à reivindicação, tinha optimizado a tecnologia KNUST. As numerosas câmaras instaladas na mesa de jogo, graças à configuração do ângulo de posicionamento, cada câmaras seguindo um único apostador, são capazes de vigiar e controlar as jogadas. Com a posição de instalação (horizontal) das câmaras, evita-se efectivamente a recepção de sinais estranhos pelas mesmas, de modo a garantir uma vigilância efectiva, pelo que se demonstra a criatividade e logo se vê preenchido o requisito de “actividade inventiva”. Só que ao apurar essas particularidades, a Direcção Nacional da Propriedade Intelectual confirmou somente que a reivindicação se caracterizava pela sua novidade e pela susceptibilidade de aplicação industrial, sem apresentar-se criativa, ou seja, que não implicava “actividade inventiva”.
Nos termos do art.º 33.º, n.º 3 do Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes, a invenção cuja protecção é solicitada é considerada com o implicando uma actividade inventiva, desde que ela não seja evidente para um profissional do ramo, na data pertinente estabelecida; enquanto analogamente prescreve o art.º 66.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial da RAEM o seguinte: considera-se que uma invenção implica actividade inventiva se, para um profissional do sector, não resultar de uma maneira evidente do estado da técnica.
As características mencionadas pela recorrente, a saber, a localização das câmaras e a configuração do ângulo, a maneira de armazenamento do sistema de vigilância, a captura de imagem, a filtração de informações inúteis, todas essas maneiras que se manifestam concretamente na reivindicação 1-96, foram julgadas evidentes para os profissionais do ramo.
Com efeito, na perspectiva da lei de experiência, no que diz respeito à videovigilância, principalmente à vigilância de jogo de azar sobre a mesa, dentro do ramo resultam muito evidentes as características como por exemplo a localização das câmaras e a configuração do ângulo, a maneira de armazenamento do sistema de vigilância, a captura de imagem, a filtração de informações inúteis, são, assim, de facílimo e claríssimo apercebimento. Então não podem ser consideradas criativas.
Com toda a segurança, tudo isso não altera o facto de que com uma localização melhor de câmara e um ângulo mais ideal, capturando imagens e filtrando as informações estranhas inúteis, diminuindo assim o volume das informações com vista a acelerar a transmissão, o que torna mais eficaz o funcionamento do sistema, isso é novo e susceptível de aplicação industrial, o que foi também reconhecido pela Direcção Nacional da Propriedade Intelectual e pela DSE. Todavia no aspecto de criatividade, partindo do ponto de vista dum profissional do sector, a reivindicação ora em discussão resulta deveras evidente e de conhecimento comum no próprio ramo, pelo que não se pode falar de forma alguma de criatividade.
Nos termos do art.º 61.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, são patenteáveis quaisquer invenções, em todos os domínios da tecnologia, quer se trate de produtos ou de processos de obtenção de produtos, substâncias ou composições, mesmo quando incidam sobre um produto composto de matéria biológica ou que contenha matéria biológica ou sobre um processo que permita produzir, tratar ou utilizar matéria biológica, desde que tais invenções:
a) Sejam novas;
b) Impliquem actividade inventiva; e
c) Sejam susceptíveis de aplicação industrial.
Daqui segue que para que seja patenteada, a reivindicação deve satisfazer simultaneamente os 3 requisitos substanciais acima citados.
No caso da reivindicação no pedido de patente em causa, embora demonstrando-se nova e susceptível de aplicação industrial, para que seja patenteada, teria que ser criativa ao mesmo tempo.
Privada de criatividade essencial às actividades inventivas, a reivindicação no pedido de patente em causa não reúne todos os requisitos de patenteabilidade previstos pelo art.º 61.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial. Logo, é improcedente o motivo avançado pelo recorrente.
É correcto o despacho recorrido, que lhe recusou o registo pois que a reivindicação no pedido de patente era privada de criatividade, pelo que deve ser sustentado.
Portanto, é de negar provimento ao recurso e sustentar a decisão de indeferimento de registo tomada pela DSE por a reivindicação 1-96 apresentada pelo recorrente no pedido de registo ser privada de criatividade.».
No caso, não está em causa o facto da patente ter de ser reconhecida em Macau como actividade inventiva por o ter sido noutros países, como o Recorrente expressamente reconhece.
O que o Recorrente entende é que a decisão de recurso haveria de ter decidido como se decidiu nas jurisdições estrangeiras em vez de acompanhar o parecer da Direcção Nacional da Propriedade Intelectual e reconhecido actividade inventiva às reivindicações que indica e aceite o registo da patente.
Contrariamente ao que se diz, a decisão recorrida para além da reprodução do parecer da DNPI faz uma análise crítica do mesmo, o que acontece é que não conclui da maneira que a Recorrente pretende que concluísse.
Aquilo que para o Recorrente – e nas jurisdições indicadas – foi reconhecido como actividade inventiva resulta do parecer da DNPI que apesar da novidade, não releva criatividade ou actividade inventiva porque em função do estado da técnica é fácil para os profissionais da área criarem as mesmas soluções.
O Estado da técnica corresponde aos conhecimentos existentes na área científica em questão, pelos profissionais da área.
Os profissionais da área – que o Recorrente na conclusão N) diz que não sabe quem são e que não se identificam na decisão recorrida -, não são ninguém em concreto, e lamentamos que o Recorrente não conheça o conceito, pese embora o mesmo conste do artº 66º do RJPI, mas que, significa uma referência generalizada às pessoas que estudam e trabalham na área em questão, ou seja, para que o Recorrente perceba “quem são esses técnicos”, corresponde àquilo que em direito civil se usa denominar de homem comum ou homem médio (que para que dúvidas não haja não é ninguém em particular), mas que significa a pessoa que em circunstâncias normais e com os conhecimentos generalizados de alguém que trabalha ou estuda a área/matéria em questão, poderia criar as mesmas soluções que a Recorrente indica e reivindica como invenção na sua patente.
Daí que se diga que é nova, porque não se tinham ainda associados os conhecimentos técnicos existentes para criar aquela solução,
mas,
não é inventiva porque não resulta de nenhum conhecimento novo, não resulta de algo que a técnica ainda não conhecesse, mas apenas de uma composição nova, inovadora, mas com base nos conhecimentos técnicos pré-existentes.
Por isso se diz que é nova mas não é inventiva.
Ora, de acordo com os artº 61º e 65º a 67º do RJPI, para que uma invenção seja patenteável têm de estar preenchidos os requisitos da novidade, actividade inventiva e aplicação industrial os quais são cumulativos, sendo certo que no caso em apreço, segundo se concluiu nas decisões recorridas, o segundo não se verifica.
Veja-se a propósito Luís M. Couto Gonçalves, Manual de Direito Industrial, pág. 69/70:
«3.1. Novidade
Uma invenção é considerada nova quando não está compreendida no estado da técnica (art. 55.º n.º 1).
O estado da técnica é constituído por tudo o que, dentro ou fora do País, foi tomado acessível ao público antes da data do pedido de patente, por descrição, utilização ou qualquer outro meio (art. 56.º n.º 1).
É igualmente considerado como compreendido no estado da técnica o conteúdo dos pedidos de patentes e de modelos de utilidade requeridos, em data anterior à do pedido de patente, para produzir efeitos em Portugal e ainda não publicados (art. 56.º n.º 2).
A novidade reveste, pois, carácter absoluto devendo ser apreciada de um modo objectivo à escala global. Isto significa que não é preenchido o requisito se o pedido couber no âmbito de conhecimentos actuais, mas, ainda, de acordo com o n.º 2 do art. 56.º, se fizer parte de conhecimentos incluídos em pedidos não publicados. Por último, a apreciação não deve ser condicionada por restrições temporais não podendo invocar-se, por exemplo, que a divulgação é distante no tempo.
A apreciação deste requisito exige por parte das autoridades uma complexa e vasta tarefa de consulta e busca de informação só possível com o recurso às novas e sofisticadas tecnologias de informação e à consulta de bases de dados digitalizados.
O estado da técnica compreende a descrição, utilização ou qualquer outro meio de divulgação, clara e inequívoca, de uma invenção idêntica, isto é, de uma invenção que represente, substancialmente, a mesma solução para o mesmo problema técnico.».
Como refere o Autor citado supra na obra indicada a pág. 72/74:
«3.2. Actividade Inventiva
Considera-se que uma invenção implica actividade inventiva se, para um perito da especialidade, não resultar de uma maneira evidente do estado da técnica (art. 55.º n.º 2).
  Não basta que a invenção seja nova: é necessário ainda que um perito da especialidade não seja capaz de chegar, de uma maneira evidente, a um mesmo resultado, no momento em que a protecção é solicitada. Neste contexto, evidente significa que a invenção não vai além do progresso normal da técnica e que mais não é que o resultado óbvio, manifesto e lógico do estado da técnica, ao tempo do pedido, sem que devam ser atendidos factos supervenientes eventual avanço tecnológico.
  O perito da especialidade pode ser um especialista ou, em certa tipologia de invenções mais complicadas, uma equipa de especialistas. O enorme desenvolvimento da investigação tecnológica e o alargamento da actividade inventiva a novos domínios como a biotecnologia tem contribuído para uma redefinição da figura do perito. Perito não significa um especialista acima da média, brilhante ou excepcionalmente talentoso, mas um técnico médio, normalmente informado, competente e experimentado. Esta evolução faz com que a apreciação do requisito da capacidade inventiva seja menos exigente tornando mais fácil a verificação do requisito da capacidade inventiva.
  Por outro lado, por confronto com a apreciação do requisito da novidade, no qual o perito deve efectuar uma comparação individualizada entre a invenção apresentada e a informação anterior, no caso do requisito da originalidade (ou actividade inventiva) a apreciação compreende a invenção e todos os elementos isolados ou combinados que formam o estado da técnica incluindo referências técnicas equivalentes.
  Na prática do IEP, relativamente consolidada, foi desenvolvida a doutrina problem-solution approach no exame do requisito da capacidade inventiva, segundo a qual devem ser tidas em consideração as anterioridades que resolvem o mesmo problema referido na descrição do pedido.
  O requerente deve apresentar com toda a clareza e objectividade o problema, o estado da técnica e a solução técnica proposta. A operação intelectiva mais importante dos examinadores substanciais do pedido será a de determinar até que ponto a solução proposta se distancia suficientemente do estado da técnica e não estaria ao alcance de um perito na especialidade. O campo técnico do perito também deve ser determinado, por regra, pelo critério do problema resolvido (problem solving approach). O que mais importa determinar é se o perito teria chegado (would), em condições normais, àquela solução e não se ele podia ter chegado a essa solução (could).».
  Suscitando a apreciação do carácter novo e criativo dificuldades técnicas, tem vindo a Doutrina e Jurisprudência a definir teorias, através das quais seja possível construir critérios de aferição que de modo objectivo possam facilitar o trabalho do julgador.
  A Doutrina dos equivalentes tem vindo assim, a tentar definir esses critérios.
  «A aplicação concreta da doutrina de equivalência, na ausência de uma definição (que, reconheça-se, teria sempre um valor relativo e seria insusceptível de eliminar, totalmente, a complexidade da tarefa), suscita sérias dificuldades. Há duas orientações principais: a alemã e a norte-americana.
  Na Alemanha, desde o “leading case” Formstein, parte-se do problema técnico objectivamente resolvido pela invenção e confronta-se a solução patenteada com o contributo dado pela invenção requerida. Se esta resolver o mesmo problema por meios diferentes mas acessíveis ao perito na especialidade haverá equivalência. O juízo de equivalência prende-se com a evidência dos meios modificados e a solução do mesmo problema técnico. O critério de apreciação privilegia a perspectiva sintética e qualitativa e visa qualificar o grau de evidência ou de originalidade da invenção. É o chamado critério da obviedade
  O Supremo Tribunal Alemão, em cinco acórdãos de 12/3/2002, propôs um conjunto de três questões para testar a verificação da doutrina dos equivalentes, designadas por Schneidmesser-Fragen.
  As três questões são as seguintes: (1.ª “a forma de execução em causa resolve o mesmo problema subjacente à invenção com meios modificados, mas com efeitos idênticos em termos objectivos?” 2.ª “Em caso afirmativo: com base nos conhecimentos especializados o perito na matéria está em condições de encontrar o mesmo efeito com os meios modificados?” 3.ª “Em caso afirmativo: as considerações que o perito faz dirigidas ao sentido da orientação técnica protegida pela patente são no sentido de considerar a execução modificada através dos meios alterados uma solução que é equivalente ao sentido literal dessa doutrina?”). As respostas afirmativas a estas questões implicam a equivalência das invenções.
  Em suma, há equivalência se houver identidade do problema técnico, evidência dos meios modificados e semelhança da solução técnica encontrada. No caso Schneidmesser I (que se reporta a um recurso proposto contra uma decisão da 1.ª instância que considerou procedente uma acção de contrafacção proposta pela titular de uma licença exclusiva de uma invenção que consiste numa lâmina para máquinas rotativas de corte de papel) o recurso foi julgado improcedente, porquanto a máquina da recorrente foi considerada equivalente à da recorrida.
  Nos EUA, a forma de determinar a equivalência assenta, essencialmente, mas não exclusivamente, no chamado critério function-way-result test (triplo teste), de acordo com a decisão do Supremo Tribunal no caso Graver Tank v. Linde Air (1950), que envolvia patentes de processo de soldadura eléctrica. O Supremo Tribunal (re)afirmou a validade da doutrina dos equivalentes e estabeleceu os dois momentos para avaliar a violação do direito de patente: o significado literal das reivindicações (peripheral claiming) e o teste de equivalências.
  Mais tarde, em 1987, O CAFC (en banc, isto é, reunido em pleno), no caso Penwalt v. Durand-Wayland confirmou a adopção da doutrina dos equivalentes defendendo, embora, uma apreciação analítica (element-by-element-rule) e não sintética das reivindicações (isto é, a doutrina deve ser aplicada elemento a elemento reivindicado) e adoptou uma interpretação mais restritiva das reivindicações.
  As decisões, não inteiramente coincidentes, do CAFC (1995) e do Supremo Tribunal (1997) no caso Warner Jenkinson v. Hilton Davis, em que se defrontavam patentes de procedimento para eliminar impurezas de corantes de produtos alimentícios, também adoptaram o triplo teste (um elemento reivindicado será equivalente se desempenhar substancialmente a mesma função, do mesmo modo substancial e com a obtenção substancial do mesmo resultado) e a apreciação “elemento a elemento”. Todavia, a apreciação element-by-element não vai ao ponto de afastar o elemento reivindicado da totalidade da invenção. Trata-se de uma técnica de delimitação da invenção, a partir da individualidade de cada reivindicação, e não de uma forma de abstracção da invenção no seu conjunto~
  Para a peripheral claiming theory as reivindicações definem os limites da invenção patenteada em oposição à central claiming theory, que foi dominante até 1990. Para esta última, a preocupação era a de proteger a ideia geral da invenção ainda que a mesma não resultasse única ou totalmente do conteúdo das reivindicações, mas pudesse constar também, por exemplo, do conteúdo das especificações (que correspondem às descrições europeias).
  A doutrina dos equivalentes pressupõe que as reivindicações delimitem, com clareza e rigor, o objecto de protecção, ou seja, só faz sentido se for adoptada a peripheral claiming theory.
  A aplicação da doutrina sofre limitações em algumas situações, no case law americano: o elemento atingido ser divulgado mas não reivindicado; o elemento equivalente não poder ser patenteado por fazer parte do estado da técnica; o conteúdo das reivindicações delimitar funcionalmente a invenção; a equivalência resultar da análise da reivindicação, uma a uma, mas não do conjunto reivindicado por ter ocorrido um avanço tecnológico superveniente imputável ao suposto infractor; no caso de ter lugar a chamada prosecution history estoppel (PHE), isto é, se tiver ocorrido um comportamento, expresso ou tácito, do titular da patente de limitação correctiva do âmbito do seu direito durante as diferentes fases do processo de registo.
  Por contraposição à posição alemã, de índole mais sintética e qualitativa, a orientação americana reveste uma natureza mais analítica e quantitativa, visando apurar semelhanças e diferenças entre os elementos reivindicados e realçando mais o comportamento anterior do titular da patente.
  Os tribunais ingleses adoptam o chamado Catnic test para saber se uma determinada característica ou variação cabe no âmbito de uma reivindicação e se, consequentemente, há ou não violação. O modelo britânico, por comparação com o alemão, privilegia uma interpretação mais estrita, literal e subjectivista das reivindicações o que reduz a possibilidade de aplicação dos equivalentes.
  O Catnic test apoia-se nas considerações suscitadas, ainda ao abrigo do anterior Patent Act de 1949, por Lord Diplock no caso Catnic V. Hill & Smith no qual o tribunal construiu a chamada purposive construction, por contraposição à purely literal construction, própria da doutrina pith and marrow ou da essência da invenção, que era dominante até então.
  Para a doutrina da essencialidade - pelo menos do modo restritivo como passou a ser aplicada pelos tribunais, a partir de meados do século XX (de que é exemplo paradigmático o caso Vander Lely V. Bamfords, nos anos sessenta) até ao caso Catnic – o âmbito de protecção da invenção era muito reduzido, porquanto, por um lado, todas as características reivindicadas eram essenciais e, consequentemente, não haveria infracção no caso de substituição da invenção patenteada por meios equivalentes.
  No caso Catnic, o tribunal considerou que, ao contrário da doutrina pith and marrow, nem todas as características constantes das reivindicações devem ser consideradas essenciais, sendo necessário determinar a essencialidade de cada uma delas através de uma interpretação finalística (purposive construction). Um elemento só será essencial se for necessário ao funcionamento da invenção através do teste function-on-way-result ou se, não o sendo, o respectivo titular lhe atribui essa importância.» - Obra e Autor citados supra a pág. 104/108 -.
  Salvo melhor opinião entendemos que a solução alemã será aquela que de modo mais objectivo nos permite apurar se há infracção do direito de patente e das delimitações positivas e negativas do respectivo direito.
  A ser assim há que adoptar o critério da obviedade, respondendo às três questões por este colocadas, a saber:
  - A forma de execução em causa resolve o mesmo problema subjacente à invenção com meios modificados, mas com efeitos idênticos em termos objectivos?
  - Em caso afirmativo, com base nos conhecimentos especializados o perito na matéria está em condições de encontrar o mesmo efeito com os meios modificados?
  - Em caso afirmativo, as considerações que o perito faz dirigidas ao sentido da orientação técnica protegida pela patente são no sentido de considerar a execução modificada através dos meios alterados uma solução que é equivalente ao sentido literal dessa doutrina?
  Usando a teoria das equivalências segundo o método alemão e tendo por referência as conclusões a que se chegou no relatório elaborado pelo DNPI, no caso em apreço impõe-se responder afirmativamente às três questões suscitadas, uma vez que o que resulta é que as reivindicações ou já constam de patente registada ou considerando o estado da técnica é acessível a um profissional da área através de modificações alcançar a solução que se pretende registar.
  Destarte, louvando-nos na decisão recorrida à qual reparo não há a fazer, mantendo-a nos seus precisos termos, deve ser negado provimento ao recurso, sem antes deixar de referir o nosso desagrado quanto à forma pela qual foram redigidas as conclusões de recurso BB) e CC), seja pelo que têm de inútil e gratuito, seja pelo que têm de juridicamente impróprio e irrelevante.
  Conforme se ensina no Acórdão deste Tribunal de 21.02.2013 proferido no processo 778/2011, cuja passagem se transcreve:
  «“Aquele que sabe não fala; aquele que fala não sabe” - Lao-Tsé.
Não é por escrever demais e martelar repetitivamente nas mesmas ideias que se ganha necessariamente razão. (…)
Uma peça jurídica não é um romance e a alegação de direito deve obedecer à regra da brevidade e da diafaneidade,1 (…)».

III. DECISÃO

Nestes termos e pelos fundamentos expostos, negando-se provimento ao recurso mantém-se a decisão recorrida.

Custas a cargo do Recorrente.

Registe e Notifique.

RAEM, 8 de Julho de 2021

(Relator)
Rui Carlos dos Santos Pereira Ribeiro

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Lai Kin Hong

(Segundo Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong
1 Alberto dos Reis, CPCA, vol. V, Reimp., 2005, 357
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239/2021 CÍVEL 1