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Processo n.º 161/2020
(Autos de recurso em matéria penal)

Relator: Fong Man Chong
Data : 22 de Julho de 2021

Assuntos:

- Erro notório na apreciação das provas

SUMÁRIO:

I - Quando, na fundamentação quanto à matéria de facto dada como assente, o Tribunal a quo elencou as razões da valoração que efectuou, identificando a prova testemunhal que relevou na formação da sua convicção e indicando os aspectos de tal prova que conjugadamente o levaram a concluir no sentido de considerar demonstrada a factualidade impugnada, bem como assinalando de forma lógica e racional os fundamentos que, no seu entendimento, justificam a credibilidade reconhecida aos depoimentos das testemunhas e retiram relevância probatória aos depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência e aos documentos juntos, sendo estes prova essencial no caso dos autos, não há erro notório na apreciação das provas.
II – Perante a factualidade apurada, se podemos concluir que o Recorrente/arguido não tomou, em momentos distintos, a correspondente resolução diferente, tendo escolhido o método mais adequado para conseguir concretizar o seu objectivo, deve entender-se que existe apenas uma única resolução criminosa. Por outro lado, como estamos perante a realização plúrima do mesmo tipo de crime e verificam-se os aludidos pressupostos do crime continuado, desde logo, a existência de uma situação exterior que tenha facilitado a execução dos factos imputados, diminua, assim, consideravelmente a culpa do arguido, pois não foi o arguido que criou as condições necessárias à realização de cada um dos ilícitos, deve concluir-se que o arguido cometeu os ilícitos imputados sob forma continuada.


O Relator,

_______________
Fong Man Chong











合議庭裁判書


編 號:第161/2020號 (刑事上訴案)1
上 訴 人:A (A)
上訴標的:第一審有罪判決
日 期:2021年7月22日
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一、 案情敘述

   2019年11月27日嫌犯A (A)在初級法院刑事法庭(第CR2-19-0316-PCC號卷宗)被控以直接正犯和既遂行為觸犯《澳門刑法典》第244條第1款b項所規定及處罰之二十九項「偽造文件罪」,經庭審後判決結果如下:
‐ 嫌犯以直接正犯及既遂的方式觸犯《澳門刑法典》第244條第1款b項所規定及處罰之二十九項「偽造文件罪」罪名成立,每項各判處7個月的徒刑。
‐ 數罪並罰,合共判處嫌犯1年6個月徒刑的單一刑罰,准予暫緩2年執行。
‐ 判處嫌犯繳納500澳門元,用於保護暴力犯罪受害人(1998年8月17日頒佈的第6/98/M號法律第24條第2款規定)。
‐ 判處嫌犯負擔15個計算單位(15UC)的司法費(《法院訴訟費用制度》第71條第1款a項)負擔本案各項訴訟負擔。
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   嫌犯A (A)不服判決,向中級法院提起上訴,上訴理由為(結論部分):
I. O Tribunal a quo ao dar como provados os pontos 5.º, 11.º, 12.º, 13.º, 15.º e 16.º no título (二) da sentença recorrida incorreu em erro na apreciação da prova por os depoimentos das testemunhas B e C não o consentirem, nem se mostrarem infirmados por qualquer outro meio de prova que haja sido produzido na audiência de julgamento.
II. Em consequência, o Tribunal deu como provados os factos atinentes aos vinte e nove crimes de “falsificação de documento” p.p. pelo art.º 244.º n.º 1, al. b) do Código Penal por mera presunção, sem que tenha sido produzida qualquer meio de prova nesse sentido e apesar dos depoimentos supra-transcritos das testemunhas B e C e do Arguido A.
III. Sucede que o “non liquet” na questão da prova tem de ser sempre valorado a favor do arguido,2 pelo que o Tribunal a quo, ao assentar a sua convicção numa ilação (ou ilações) desconformes ao art.º 342.º do Código Civil, violou o princípio da presunção da inocência plasmado no artigo 29.º da Lei Básica.
IV. E não sendo possível a demonstração dos factos descritos na Acusação com a segurança necessária à prolação de uma decisão condenatória e, por conseguinte, vencer a dúvida daí resultante, devia ter absolvido o Arguido dos crimes que lhe foram imputados.
V. Isto por as presunções simples ou naturais serem meios de convicção e, nessa medida, cederem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto (MANUEL CAVALEIRO DE FERREIRA, Curso de Processo Penal, II, 1981, p.300).
VI. Por outro lado, caso se entenda que a decisão condenatória se baseou no documento de fls. 8, o desacerto da sentença recorrida é ainda mais evidente, conforme ensina o Venerando TUI no seu acórdão de 18 de Março de 2015, no Processo n.º 12/2015.
VII. Isto por se tratar de uma prova que não foi produzida ou examinadas em audiência, como impunha o disposto no artigo 336.º, n.os 1 e 2, do CPP Penal, nem que, por si só (ou conjugada com outras) consente a conclusão ou demonstra que o A actuou com dolo para diminuir os custos do condomínio à custa do Governo!
VIII. Trata-se de uma mera hipótese de raciocínio do tribunal a quo não substanciada nos factos resultantes da prova produzida na audiência de julgamento.
IX. O tribunal a quo retirou pois das declarações do Arguido, das testemunhas e do documento de fls. 8 uma conclusão inaceitável, tendo por isso incorrido no vício do erro notório na apreciação da prova, previsto na alínea c) do n.º 2 do artigo 400.º do Código de Processo Penal, tal como definido no Acórdão do Vdo T.U.I. - de 18.03.2015, Proc. n.º 12/2015.
X. Não obstante o Tribunal a quo ter dado como provado nos pontos 5.º, 11.º, 12.º, 13.º, 15.º e 16.º dados como provados no título (二) da sentença recorrida, o certo é também entendeu que: “…本院認為,嫌犯不應“集非成是”,且不能將過往的不當處理方式作為排除其罪過的理由,且填表說明(參見第8頁)當中已明確表明了需要申報的內容…” (sublinhado nosso).
XI. Tal como resulta das palavras “集非成是” empregues pelo Tribunal a quo os pedidos de complemento incorrectamente preenchidos pelos coordenadores e assinados pelo Recorrente, foram resultado de erro, por o B e C estarem convencidos que a sua maneira de preencher o pedido de complemento era conforme à lei.
XII. Mais, na fundamentação da sentença recorrida o tribunal a quo entendeu também que: “…從嫌犯的聲明及上述證人的證言,雖然未足以證實嫌犯刻意指示證人B及證人C故意向當局隱瞞員工的實際收入情況(經翻閱卷宗所扣押XX花園管理委員會主任溝通簿,也未有確切反映出嫌犯存在這種授意)…”
XIII. O que demonstra que a prova produzida tem juízo não consentia ao tribunal a quo ter dado como provado os pontos 5.º, 11.º, 12.º, 13.º, 15.º no título (二) da sentença recorrida, especialmente o ponto 16.º, nem consentia, por conseguinte, que o A tivesse actuado com dolo.
XIV. Mas, surpreendentemente, o tribunal a quo deu como provado no ponto 16.º que o Recorrente agiu livre, voluntária e conscientemente, e sabia perfeitamente que sua conduta era proibida e punida pela lei!
XV. Pelo que, a sentença recorrida incorreu no vício da contradição insanável da fundamentação previsto no artigo 400.º, n.º 2, al. b), do CPP.
XVI. Conforme resulta dos trechos da prova gravada supra transcrita, tanto o Recorrente e as testemunhas B e C afirmaram no decurso da audiência do julgamento que a tarefa do preenchimento dos pedidos de complemento cabia às duas referidas testemunhas e que tais pedidos foram preenchidos, não por instruções do A, mas de acordo com a prática habitual seguida pelo B e do C já antes do A assumir a função de presidente da administração do condomínio.
XVII. Afigura-se evidente que o Recorrente desconhecia que o B e o C não sabiam preencher correctamente os pedidos e que anos que o faziam mal por ignorância.
XVIII. Importa não perder de vista que as funções de presidente da administração do condomínio não são remuneradas, correspondendo o seu exercício a um dever cívico em benefício do colectivo dos condóminos.
XIX. O A nada ganha em servir os outros e a comunidade, fazendo-o por sentido de dever cívico, sendo impensável que ele tivesse representado sequer a possibilidade de realização de um facto que preenchesse um tipo de crime.
XX. Falta, pois, o “culpado”, dos vinte e nove crimes de crime “falsificação de documento” p.p. pelo art.º 244.º n.º 1, al. b) do Código Penal, do qual o Recorrente foi acusado.
XXI. Nada obsta assim a que o Recorrente seja absolvido dos 29 crimes de que vem acusado por a decisão recorrida ter violado o artigo 16.º do Código Penal.
XXII. Subsidiariamente, sempre o comportamento do Recorrente consubstanciaria um crime continuado, visto que cada um dos crimes que lhe foi imputado não correspondeu à renovação de um propósito criminoso, com diferentes circunstancialismos de modo, tempo e lugar, antes se inscrevendo na mesma “linha psicológica continuada” ou no quadro de uma solicitação de uma mesma situação exterior redutora da culpa, tal como a configura a mais qualificada doutrina que seguimos de perto.
XXIII. Mostra-se assim verificado o pressuposto enunciado no n.º 2 do art 29.º do CP, como seja o de ter beneficiado de circunstâncias exógenas determinantes da sua conduta, por o convocarem para a prática dos factos, de modo progressivamente menos resistível, e por isso mesmo geradoras de uma diminuição sensível da culpa.
XXIV. Afigurando-se, por isso, mais ajustado, a condenação do ora Recorrente pela prática de um só crime de “falsificação de documento”, na forma continuada, ao abrigo dos artigos 244.º, n.º 1, al. b) e artigo 29.º do Código Penal.
XXV. Acresce que o comportamento do Recorrente se inscreve na hipótese prevista no artigo 66.º, n.º 2, c) do CP - ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação dos danos causados.
XXVI. Devia, pois, salvo melhor opinião, terem sido aplicadas as regras do artigo 67.º do CP à determinação da medida concreta da pena.
XXVII. Por último, ao não optar pela pena alternativa de multa apesar de tal pena realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição no caso concreto, o tribunal recorrido violou o disposto nos artigos 40.º, n.º 1, 41.º, n.º 1, 45.º, n.º 1, 64.º e 67.º, n.º 1 e 2, todos do Código Penal, pelo que deve ser revogado, com as legais consequências.
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檢察院對上訴作出答覆,理據如下(結論部分):
1) 在本案,上訴人擔任大廈管理機關主席一職不取一分一毫酬勞,令人欽佩,但其不應為了員工增加收入、解決請人難的問題,而將開支成本轉移於澳門特區政府身上,即由其他無辜的澳門市民/納稅人承擔。
2) 據案卷第8頁的填表說明,已清楚表明“工作收入”是指受僱工作收益,即所有固定或偶然,定期或額外的報酬,不論屬日薪、薪酬、工資、酬勞費或服務費,抑或屬聘請金、出席費、酬勞、賞金、百分率、傭金、經紀傭、分享金、津貼、獎金、或其他報酬。上訴人作為管委會主席,在有關工作收入補貼申請表上簽名時,有責任看清楚申請表上的內容填表說明,否則需承擔有關責任,正如上述申請表左下方簽名處已列明:若提供假聲明或以任何不法手段獲發補貼,除被取消申請資格、返還補貼外,尚須負法律追究責任。
3) 但上訴人在庭審中,表示清楚知道B及C均僅以管理員的底薪向財政局申請收入補貼,但因前任負責人一直這樣做,故上訴人便沿襲這做法,並非存心欺騙政府。
4) 然而,我們認為,上訴人明知內容不實,仍簽署及向財政局遞交了上述載有不實資料的申請表,明顯為了隱瞞管理員每月的實際收入,並由此為管理員取得更多收入補貼,以解決請人難的問題,並轉嫁政府支付該成本,令本地區有所損失及令人他人獲得不正當利益。因此,上訴人的行為符合了《刑法典》第244條第1款b)項規定的偽造文件罪的罪狀。
5) 亦因此,原審法庭所審查的證據是正確的,沒有明顯的錯誤,即被上訴判決不沾有審查證據明顯錯誤的瑕疵(據《刑事訴訟法典》第400條第1款c)項),也不沾有在說明理由方面出現不可補救之矛盾的瑕疵(據《刑事訴訟法典》第400條第2款b)項)。亦沒有違反“疑罪從無” (in dubio pro reo)這一刑法根本性原則。
6) 關於連續犯方面:本案經過庭審,根據既證事實,上訴人在2012年1月1日至2015年11月30日期間,為29名管理員作出了合共113次的收入補貼申請,每次均未有如實反映管理員的每月總工作收入。
7) 在上述近3年期間,上訴人只有一個概括故意,就是不斷虛報,意圖令管理員獲不正當利益及造成本地區有損失,並每次均符合同一罪狀(偽造文件罪)、侵犯同一法益(文件的公信力)。
8) 此外,上訴人均是在他人填好的申請表上簽名,即實行的方式本質上相同,同時,上訴人是在可相當減輕行為人罪過的同一外在情況實行,即都是簽署後遞交申請表予財政局的情況下實行。因此,上訴人的行為符合《刑法典》第29條第2款關於連續犯的規定,可以一罪論處。
9) 關於是否符合《刑法典》第67條、64條等的規定:上訴人雖然在庭審前已以賠償名義向本案卷存放了全數賠償,然而,在庭審中,仍堅持因前任負責人一直祇向當局申報員工的基本薪金,沒有申報津貼、獎金等,故上訴人也依照這做法,並非存心欺騙政府。這表現出,上訴人並無顯示真誠悔悟的行為,故不符合《刑法典》第66條第2款c)項的刑罰特別減輕情節。
10) 在刑罰的選擇方面,據《刑法典》第64條規定,雖然上訴人屬初犯,但本案持續發生的年期長、涉及人數及金額不低,故我們認為,用罰金代替剝奪自由刑未足以達到刑罰的目的。因此,原審法庭對上訴人處以徒刑,並准以暫緩執行是合法、合理的,符合罪刑相稱原則。
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案件卷宗移送本院後,駐中級法院的檢察院司法官作出檢閱及提交法律意見,意見如下:
Ao abrigo do disposto no artigo 406.º do Código de Processo Penal (CPP) vem o Ministério Público junto do Tribunal de Segunda Instância pronunciar-se nos termos que seguem:
1.
Inconformado com o douto acórdão proferido nos presentes autos pelo Tribunal Colectivo do 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou pela prática de 29 crimes de falsificação de documento, previstos e punidos pelo artigo 244.º, n.º 1, alínea b) do Código Penal, na pena única de 1 ano e 2 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, veio o Arguido, A, melhor identificado nos autos, dela interpor recurso.
Da leitura das conclusões da douta motivação do recurso resulta que o Recorrente imputa à decisão recorrida, em síntese, os seguintes vícios:
• Erro notório na apreciação da prova, incluindo a violação do princípio in dubio pro reo;
• Contradição insanável na fundamentação;
• Violação do artigo 16.º do Código Penal, uma vez que o Recorrente não tinha consciência da ilicitude;
• Violação do disposto no n.º 2 do artigo 29.º do Código Penal, dado que estrão verificados os pressupostos do crime continuado;
• Violação do disposto nos artigos 40.º, n.º 1, 41.º, n.º 1, 45.º, n.º 1, 64.º e 67.º. n.ºs 1 e 2 do Código Penal, quanto à medida e à escolha da pena.
2
2.1.
A primeira questão que, como vimos, vem colocada pelo Recorrente é a de saber se o douto acórdão recorrido padece do vício do erro notório na apreciação da prova a que alude a alínea c) do n.º 2 do artigo 400.º do CPP.
No entender do Recorrente, o Tribunal a quo, ao dar como provados os factos que constam dos pontos 5, 11, 12, 13, 15 e 16 da parte do acórdão atinente à matéria de facto provada, incorreu em erro na apreciação da prova uma fez que a prova testemunhal produzida, não infirmada por qualquer outro meio de prova produzido a audiência, não consentiam tal decisão.
Além disso, alegou o Recorrente que, não sendo possível a demonstração dos factos descritos na acusação com a segurança necessária à prolação de uma decisão condenatória e, por conseguinte, vencer a dúvida daí resultante, deveria ter sido absolvido.
Salvo o devido respeito, parece-nos que o Recorrente labora em manifesto erro.
Na verdade, como esse Venerando TSI tem vindo a entender, «o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente» (nestes termos, Ac. do TSI de 18.10.2012, Processo nº 228/2012 e, no mesmo sentido, mais recentemente, Ac. do TSI de 31.10.2019, Processo n.º 987/2019; Ac. do TSI de 24.10.2019, Processo n.º 815/2019).
O referido erro, tal como está configurado na alínea c) do n.º 2 do artigo 400.º do CPP, único que, entre nós, constitui fundamento de recurso, não se confunde com o erro na apreciação da prova. O erro notório é aquele que ressalta evidente da mera leitura do texto da decisão, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum. E apenas esse. Não o que possa resultar da reapreciação pelo tribunal de recurso dos concretos meios de prova tidos em conta pelo tribunal recorrido.
Ao contrário do que o Recorrente parece entender, a apreciação do erro notório na apreciação da prova não implica qualquer reapreciação ou sequer controlo da prova produzida em 1.ª instância. É aferido no confronto com o próprio texto da decisão recorrida. Desse texto tem de emergir de forma ostensiva e evidente que, na parte atinente à matéria de facto, o tribunal recorrido operou de forma arbitrária, contrariando a lógica ou as regras da experiência comum ou, então, violou vinculação legal de direito probatório ou as chamadas legis artis.
Ora, o Recorrente limita-se a colocar em causa a apreciação da prova feita pelo tribunal recorrido, invocando, nomeadamente, o princípio in dubio pro reo para sustentar que não podiam ser dados como provados os factos integradores dos crimes por cuja prática foi condenado.
É certo que a violação do princípio in dubio pro reo, que o Recorrente invoca, pode enquadrar-se no vício do erro notório na apreciação da prova, justamente na medida em que desse princípio resulta uma vinculação para o tribunal de, na dúvida sobre a prova dos factos, decidir favoravelmente ao arguido.
Contudo, enquadrado o princípio no erro notório na apreciação da prova, a dúvida relevante é apenas a que o tribunal do julgamento tenha efectivamente sentido no momento da decisão e espelhada, de alguma forma, na respectiva fundamentação. Apenas quando da própria decisão resulte que o tribunal do julgamento esteve numa situação de dúvida ou de incerteza perante os factos e, ainda assim, decidiu contra o arguido é que se pode falar de erro notório na apreciação da prova por violação do dito princípio in dubio pro reo.
Tendo isto presente, parece-nos claro, face ao teor da decisão recorrida, que esta não enferma do erro na apreciação da prova que lhe é imputado, na medida em que, da sua análise não resulta que o tribunal tenha operado de modo ilógico, arbitrário ou absurdo nem que tenha infringido vinculações legais em matéria probatória, nem que tenha afrontada as regras da experiência comum.
Por outro lado, do acórdão recorrido também não emerge, de forma alguma, que o tribunal recorrido tenha se tenha debatido com qualquer dúvida ou incerteza relativamente à prova dos factos que estiveram na base da condenação da ora Recorrente. Pelo contrário. Com base nas provas produzidas e através de um processo lógico-dedutivo escorado nas regras da experiência comum, o tribunal a quo não teve dúvidas em dar como provados os referidos factos.
Por isso, parece-nos que deve improceder este fundamento do recurso.
2.2.
A segunda questão que vem colocada pelo Recorrente é a de saber se o acórdão recorrido enferma de contradição insanável na fundamentação, vício a que se refere a alínea b) do n.º 2 do artigo 400.º do CPP.
Também neste ponto nos parece que o Recorrente não tem razão.
 Como é sabido, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão consiste tanto na contradição entre a matéria de facto dada como provada ou como provada e não provada, como também entre a motivação da decisão sobre a matéria de facto, ou até mesmo entre a fundamentação e a decisão.
Do que se trata, portanto, é de uma situação em que, os factos julgados como provados ou como não provados colidem, de modo inconciliável, entre si ou uns com os outros ou, também, com a própria motivação da decisão.
Tal como sucede com o erro notório na apreciação da prova, a contradição insanável da fundamentação, para assumir o relevo que a lei lhe atribui, tem de resultar do texto da decisão.
Ora, do texto da decisão recorrida não resulta qualquer contradição. Na verdade, o facto de os funcionários que preencheram os formulários aqui em causa estarem convencidos que a forma como os preencheram era correcta, não entra em contradição com a prova do elemento subjectivo do tipo do ilícito, ou seja, o dolo, do crime de falsificação de documento.
Cremos que, também neste ponto, indevidamente, o Recorrente procura demonstrar a existência do vício da contradição insanável da fundamentação com o recurso à prova produzida, não se cingindo, como a lei impõe, ao que resulta da literalidade do acórdão recorrido.
Deve improceder, em nosso modesto entender, este fundamento do recurso.
2.3.
2.3.1.
No que concerne aos vícios de errada aplicação da lei que o Recorrente imputa à douta decisão recorrida, o primeiro deles é o da alegação violação do artigo 16.º do Código Penal, uma vez que, segundo alega, teria agido em erro sobre a ilicitude.
Vejamos.
Estabelece-se no referido artigo 16.º do Código Penal:
«1. Age sem culpa quem actuar sem consciência da ilicitude do facto, se o erro lhe não for censurável.
2. Se o erro lhe for censurável, o agente é punido com a pena aplicável ao crime doloso respectivo, a qual pode ser especialmente atenuada».
A resposta à questão colocada pelo Recorrente, que é a de saber se agiu em erro sobre a ilicitude, pressupõe logicamente a resposta a uma outra questão que é a de saber se o seu comportamento integra um ilícito criminal.
Ora, em nosso modesto entender, o comportamento do Recorrente, ao contrário daquilo que se decidiu no douto acórdão recorrido, não integra qualquer tipo legal de crime, nomeadamente o da falsificação de documentos previsto no artigo 244.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal.
Procuraremos, de forma breve, demonstrar porquê.
Na base da condenação do Recorrente pela prática de 29 crimes de falsificação de documento, está o facto de aquele, enquanto responsável pela administração do condomínio de um determinado edifício, ter assinado os impressos próprios para atribuição do subsídio complementar de rendimentos respeitantes a trabalhadores desse condomínio, sendo que, de tais impressos apenas constavam os salários base desses trabalhadores e não outros subsídios e prémios que os trabalhadores recebiam em complemento ao dito salário base.
Esta factualidade, no entanto, não é subsumível ao tipo legal do crime de falsificação de documentos previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 244.º do Código Penal, nos termos da qual
Na verdade, de acordo com o estabelecido na alínea a) do artigo 243.º do Código Penal, para efeitos do disposto nesse Código, nomeadamente do disposto no respectivo artigo 244.º, documento é:
«(1) A declaração corporizada em escrito, ou registada em disco, fita gravada ou qualquer outro meio técnico, inteligível para a generalidade das pessoas ou para um certo círculo de pessoas, que, permitindo reconhecer o emitente, é idónea para provar facto juridicamente relevante, quer tal destino lhe seja dado no momento da sua emissão, quer posteriormente; e
(2) O sinal materialmente feito, dado ou posto numa coisa para provar facto juridicamente relevante e que permite reconhecer à generalidade das pessoas ou a um certo círculo de pessoas o seu destino e a prova que dele resulta» (os destacados são nossos).
Face à noção de documento penalmente relevante, parece-nos claro e evidente que «não integra o tipo qualquer falsificação de uma declaração, mas apenas a falsificação de uma declaração idónea a provar um facto juridicamente relevante», isto é, de um facto que cria, modifica ou extingue uma relação jurídica (assim, HELENA MONIZ, in Comentário Conimbricense, Tomo II, Coimbra Editora, 1999, p. 666).
O que se compreende, já que bem jurídico protegido pelo crime de falsificação de documentos é, justamente, a segurança e credibilidade no tráfico jurídico probatório relacionada com meios de prova documentais (continuamos a seguir a lição de HELENA MONIZ, in Comentário…, p. 680).
Portanto, se o documento não tiver idoneidade para fazer a prova de um facto juridicamente relevante, não estaremos perante um documento cuja falsificação seja penalmente relevante.
No caso em apreço, parece-nos evidente que os impressos a que se refere o n.º 1 do artigo 5.º do Regulamento Administrativo n.º 6/2008, destinado a pedir a atribuição do subsídio complementar de rendimentos, constituindo um requerimento dirigido por um particular à Administração, não consubstancia um documento que tenha idoneidade, ele próprio, para provar qualquer facto. Nomeadamente, esse documento não prova nem tem idoneidade para provar, como é óbvio, que os rendimentos dos trabalhadores mencionados nos referidos impressos são aqueles que constam dos impressos.
Nada na lei geral, nem no Regulamento Administrativo n.º 6/2008 permite concluir que a mera declaração do requerente faz prova ou é idónea a fazer prova do facto declarado nos ditos impressos. Nem assim podia ser, como é facilmente alcançável.
A dita declaração que, repetimos, não prova nem se destina a provar o que quer que seja, não dispensa a Administração de exercer uma actividade instrutória tendente a confirmar tal declaração, nos termos gerais, como é próprio de qualquer procedimento administrativo (aliás, isto mesmo pode suceder, em geral, com quaisquer requerimentos dirigidos à Administração ou, até, com os articulados apresentados pelas partes em processos judiciais. Nunca se viu defendido, que seja do nosso conhecimento, que, por exemplo, a inclusão numa petição inicial de um facto que não seja verdadeiro faça incorrer o autor dessa petição no crime de falsificação de documentos. E no entanto, nessa situação, o autor da petição fez constar de um documento um facto falso. Porém, pela simples razão de que a petição, como qualquer outro articulado ou requerimento, não têm idoneidade probatória, aquele comportamento não pode ser penalmente punido como crime de falsificação de documentos. Neste mesmo sentido, vejam-se os exemplos fornecidos por PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, que considera não constituírem documentos, por não exercerem função probatória juridicamente relevante: a participação de um sinistro à seguradora; a participação de um acidente à polícia, um auto de notícia onde são vazadas declarações falsas do autuado, o pedido de uma segunda carta de condução com a falsa alegação de extravio - apud, MANUEL LEAL – HENRIQUES, Anotação e Comentário ao Código Penal de Macau, Volume V, CFJJ, 2017, p. 95).
Portanto, não sendo o requerimento para a obtenção do subsídio complementar de rendimentos um documento enquadrável no conceito constante do artigo 243.º do Código Penal, qualquer falsa declaração que do mesmo conste não poe ser criminalmente relevante.
Eis porque, em nosso entender, o Recorrente não praticou os crimes de falsificação de documentos que lhe são imputados.
Compreendemos bem que a prestação de declarações falsas para a obtenção de subsídio, ela própria, deva merecer censura e, até, censura penal, à semelhança do que sucede, por exemplo, nos ordenamentos jurídicos alemão (cfr. o crime de subventionsbetrug previsto parágrafo 264.º, (1), n.º 1, do Código Penal Alemão) e português (cfr. o crime de crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, p. e p. pelo artigo 36°, n°1, alíneas a) e c) do DL 28/84, de 20/01), onde tal comportamento se encontra criminalmente tipificado, como uma espécie, digamos assim, de crime de burla.
No entanto, por elementares razões decorrentes do princípio da legalidade penal consagrado no artigo 1.º do nosso Código Penal, enquanto aquele comportamento não for descrito e declarado passível de pena por lei prévia, escrita, estrita e certa (nullum crimen, nulla poena sine lege), não vemos como como pode o seu autor ser criminalmente punido.
É manifestamente insuficiente para justificar qualquer punição de natureza criminal, como julgamos evidente, a previsão, aliás inócua e redundante, que consta da norma do artigo 9.º do Regulamento Administrativo n.º 6/2008 (de acordo com essa norma, «a prestação de falsas declarações, informações inexactas ou inverídicas, ou o uso de qualquer meio ilícito para obtenção do subsídio, implicam, para além do cancelamento do subsídio e da restituição do valor atribuído, a assunção da eventual responsabilidade legal»).
De resto, neste caso concreto, uma outra razão acresce, para afastar o enquadramento do comportamento do Recorrente na norma incriminadora da alínea b) do n.º 1 do artigo 244.º do Código Penal. É que, o Recorrente não fez constar falsamente dos documentos em causa, qualquer facto juridicamente relevante, que é o comportamento ilícito-típico ali previsto.
Concluímos, pois, que o Recorrente não praticou os crimes de falsificação de documento por cuja prática foi condenado, tendo o acórdão recorrido, nesta parte e salvo o devido respeito, incorrido em erro na aplicação da lei, que deve justificar a respectiva revogação.
2.3.2.
Por dever de ofício, para o caso de assim não se entender, o que só por mera hipótese se admite, iremos referir-nos à questão, também colocada no recurso, de saber se os factos são susceptíveis de ser subsumidos ao conceito de crime continuado a que se refere o n.º 2 do artigo 29.º do Código Penal.
De acordo com o disposto na referida norma, «constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente».
No caso em apreço, os crimes praticados pelo Recorrente violaram o mesmo bem jurídico e foram executados de forma essencialmente homogénea.
Por outro lado, acompanhando o entendimento sustentado pela nossa Ilustre Colega na sua douta resposta ao recurso, e ao qual nos limitamos a aderir, parece-nos que também se verifica a solicitação de uma mesma situação exterior que diminui consideravelmente a culpa do agente.
Na verdade, o Recorrente, ao longo do tempo foi sendo colocado, sem que ele o tenha procurado ou provocado, perante uma situação que já se prolongava e se prolongou no tempo e em relação à qual nunca tinha havido qualquer reparo por parte da Administração, por isso se podendo dizer, que houve um enquadramento exterior favorável à repetição alegadamente criminosa (cfr. MANUEL LEAL–HENRIQUES, Anotação e Comentário ao Código Penal de Macau, Volume I, CFJJ, 2018, p. 383 e jurisprudência aí citada).
Por isso, sem necessidade de maiores considerações, a considerar-se que o Recorrente praticou qualquer crime, o que, como vimos, em nosso modesto entender não sucedeu, tal crime foi continuado, para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 29.º do Código Penal.
Colhe, parece-nos, este fundamento do recurso.
2.3.3.
Finalmente, ainda por dever de ofício, quanto à concreta medida e à escolha da pena, a entender-se que o Recorrente praticou um crime continuado de falsificação de documentos, o mesmo «é punível com a pena aplicável à conduta mais grave que integra a continuação», nos termos que resultam do disposto no artigo 73.º do Código Penal.
O crime é punido com prisão até três anos ou pena de multa.
Cremos que o Recorrente deveria beneficiar da atenuação especial da pena, uma vez que, olhados globalmente os factos, é patente que existem circunstâncias anteriores ou posteriores ao alegado crime, que diminuem de forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena, em especial aquela a que se refere a alínea c) do artigo 66.º do Código Penal, uma vez que o Arguido reparou voluntariamente, até onde lhe era possível, os danos causados.
Dessa atenuação especial resulta uma diminuição do limite máximo da pena de prisão aplicável em um terço, passando, portanto, para os dois anos de prisão, o mesmo sucedendo com a pena de multa que vê o seu limite máximo ser reduzido para os 240 dias.
Quanto à escolha da pena, tendo presente o critério definido no artigo 64.º do Código Penal, entendemos que, atentas as especificidades do caso em apreço, e salvo o devido respeito por opinião contrária, a pena de multa permite realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, devendo, por isso, optar-se pela sua aplicação, em medida que esse Venerando Tribunal considere acertada, dentro da moldura atenuada que referimos.
3.
Assim, face ao exposto, é nosso parecer, salvo melhor opinião:
Deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se, em consequência, o douto acórdão recorrido, o qual deve ser substituído por outro que absolva o Recorrente da prática dos crimes que lhe são imputados.
*
本院接受上訴人提起的上訴後,組成合議庭,對上訴進行審理,各助審法官依法定程序檢閱卷宗,並作出評議及表決。
* * *
   二、事實方面

經庭審後原審法庭確認下列事實為既證事實:
1) 財政局於2008年推出“工作收入補貼臨時措施”,以臨時方式向低收入的澳門居民發放工作收入補貼,以紓緩該等人士的經濟壓力,但申請者必須同時符合最低工作時數及工作收入不超過規定金額等條件方能獲得有關補貼款項。
2) 在上述“臨時措施”初推出時,規定申請者之季度總工作收入須少於12,000澳門元。但至2011年,有關金額已調升至13,200澳門元。至2013年,上述金額再次調升至14,100澳門元。其後在2014年,對申請者季度總工作收入之要求已調整為少於15,000澳門元。
3) “XX花園”之管理員直接受聘於“XX花園管理委員會”,而該 “管理委員會”亦自2008年開始為管理員申請上述“臨時措施”之收入補貼。
4) 在2008年至2012年間,“XX花園”管理員之薪金一直維持在每月3,350元。但至2012年,基於“XX花園管理委員會”在會議中討論到難以繼續用上述薪金招聘管理員,當時嫌犯A擔任該“管委會”的主席。會議上,大會上提出在底薪的基礎上,向每名管理員額外給予每月300元的表現獎金、每月200至500元的膳食津貼以及每月分別為600元及100元的正副組長津貼,藉此增加招聘的吸引力。嫌犯贊同上述建議。上述建議最終獲其他“管委會”成員同意及通過。
5) 嫌犯A清楚知道上述的薪金調整將導致“XX花園”管理員不再符合上述“臨時措施”的申請資格或雖符合申請資格但會導致管理員可收取之收入補貼減少。
6) 2012年1月1日至2015年11月30日期間,嫌犯A曾先後為下列29名“XX花園”之管理員申請收入補貼:D、E、F、G、H、I、J、K、L、M、N、O、P、Q、R、S、T、U、V、W、X、Y、Z、AA、AB、AC、AD、AE、AF。
7) 嫌犯A為上述29名管理員申請收入補貼時,該29人之薪金已根據“XX花園管理委員會”於2012年之決議而獲得調升。也就是說,除3,350澳門元之底薪外,上述29名管理員每月還可收取表現獎金、膳食津貼以及正副組長津貼等額外收入(參見偵查卷宗第534至537頁之表格,該等表格可反映出29名管理員之每月實際總收入,在此視為完全轉錄)。
8) 在通過上述決議後(已證事實第四點),嫌犯A隨即將增加獎金及津貼的決議內容告知當時正擔任“XX花園”管理處主任的B;為此,B按慣常的方式,為管理員填寫收入補貼申請表時僅向財政局申報管理員的每月底薪(3,350澳門元),而沒有將表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼等額外收入反映在管理員之工作總收入中。
9) 其後,B於2015年7月1日離職,並向接替其出任“XX花園”管理處主任的C轉達所一直沿用的申報方式,故C之後為管理員填寫收入補貼申請表時亦沒有向財政局申報該等管理員的每月額外收入。
10) 上述之收入補貼申請表均已在其開首部分列明“填表前請細閱表後的填表說明”,而該填表說明中亦明確指出“工作收入是指《職業稅章程》第三條第一款的受僱工作收益,即所有固定或偶然,定期或額外的報酬,不論屬日薪、薪俸、工資、酬勞費或服務費,抑或屬聘請金、出席費、酬勞、賞金、百分率、佣金、經紀佣、分享金、津貼、獎金或其他報酬,但屬第7/2008號法律第七十七條所指在勞動關係終止後由僱主實體支付予僱員的賠償除外”。
11) 為上述29名管理員申請收入補貼之申請表均經由嫌犯A簽署及蓋上“XX花園管理委員會”之印章,嫌犯清楚知道B及C均僅以管理員之底薪向財政局申請收入補貼,但其仍簽署及向財政局遞交了該等載有不實資料的申請表。嫌犯意圖隱瞞管理員每月之實際收入,並藉此為管理員取得更多的收入補貼。
12) 2012年1月1日至2015年11月30日期間,嫌犯A為上述29名管理員合共作出了113次之收入補貼申請,在該等申請表上嫌犯均僅申報了管理員之每月底薪,故意隱瞞管理員每月尚有表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼等額外收入,未有如實反映管理員的每月總工作收入(參見偵查卷宗第541至543頁之表格,該等表格可反映嫌犯填報之管理員每月收入,在此視為完全轉錄)。
13) 在嫌犯A的瞞騙下,財政局根據嫌犯提供的不實資料批准了當中的99次申請,並向該等管理員多發放了合共243,802澳門元之補貼(參見偵查卷宗第734至735頁之比較表,在此視為完全轉錄)。餘下的4次申請不獲批,10次則尚在審批階段,涉及金額分別為4,682澳門元及7,839澳門元(參見偵查卷宗第736至739頁之比較表,在此視為完全轉錄)。
14) 至2015年4月2日,廉政公署接獲匿名舉報,從而揭發事件。
15) 嫌犯A清楚知道表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼均屬工作總收入之範圍,但其為了讓二十九名管理員獲得不正當利益及造成澳門特別行政區政府的損失,多次向財政局虛報該等管理員之每月實際收入,使法律上重要的事實不實地登載於該等收入補貼的申請表上。
16) 嫌犯A是在自願、自由及有意識之情況下故意實施其上述行為,並清楚知道其行為違法,會受法律處罰。
此外,還查明:
庭審前,嫌犯已以賠償名義向卷宗存放了243,802澳門元。
嫌犯表示具有中學畢業的學歷,退休人士,與沒有工作的妻子育有三名成年子女,子女們均已成年。
根據嫌犯的最新刑事記錄顯示,嫌犯屬於初犯。
* * *
   三、法律理據
Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, importa ver o que o Tribunal a quo decidiu. Este fundamentou a sua decisão nos seguintes termos:

一、概述
1. 澳門檢察院以合議庭普通訴訟程序對下列嫌犯提起控訴:
嫌犯A(A),男性,已婚,大廈管理委員會主席,持有編號…之澳門居民身份證,19XX年X月X日於中國廣東省出生,父親AG,母親AH,居住於澳門…,電話:…,…。

2. 指控事實及罪名
檢察院指控稱:
一、
財政局於2008年推出“工作收入補貼臨時措施”,以臨時方式向低收入的澳門居民發放工作收入補貼,以紓緩該等人士的經濟壓力,但申請者必須同時符合最低工作時數及工作收入不超過規定金額等條件方能獲得有關補貼款項。
二、
在上述“臨時措施”初推出時,規定申請者之季度總工作收入須少於澳門幣12,000元。但至2011年,有關金額已調升至澳門幣13,200元。至2013年,上述金額再次調升至澳門幣14,100元。其後在2014年,對申請者季度總工作收入之要求已調整為少於澳門幣15,000元。
三、
“XX花園”之管理員直接受聘於“XX花園管理委員會”,而該“管理委員會”管理委員會”亦自2008年開始為管理員申請上述“臨時措施”之收入補貼。
四、
在2008年至2012年間,“XX花園”管理員之薪金一直維持在每月3,350元。但至2012年,基於“XX花園管理委員會”在會議中討論到難以繼續用上述薪金招聘管理員,故當時正擔任“管委會”主席的嫌犯A便提議在底薪的基礎上,向每名管理員額外給予每月300元的表現獎金、每月200至500元的膳食津貼以及每月分別為600元及100元的正副組長津貼,藉此增加招聘的吸引力。嫌犯之上述建議最終獲其他“管委會”成員同意及通過。
五、
嫌犯A清楚知道上述的薪金調整將導致“XX花園”管理員不再符合上述“臨時措施”的申請資格或雖符合申請資格但會導致管理員可收取之收入補貼減少,故其提出將管理員之底薪及其他獎金、津貼分開發放, 造成該等獎金及津貼非屬薪金之一部分的假象, 此舉獲管委員成員同意。
六、
2012年1月1日至2015年11月30日期間,嫌犯A曾先後為下列29名“XX花園”之管理員申請收入補貼:D、E、F、G、H、I、J、K、L、M、N、O、P、Q、R、S、T、U、V、W、X、Y、Z、AA、AB、AC、AD、AE、AF。
七、
嫌犯A為上述29名管理員申請收入補貼時,該29人之薪金已根據“XX花園管理委員會”於2012年之決議而獲得調升。也就是說,除澳門幣3,350元之底薪外,上述29名管理員每月還可收取表現獎金、膳食津貼以及正副組長津貼等額外收入(參見偵查卷宗第534至537頁之表格,該等表格可反映出29名管理員之每月實際總收入,在此視為完全轉錄)。
八、
然而,嫌犯A卻在2012年至2015年6月期間向當時正擔任“XX花園”管理處主任的B作出指示,要求其為管理員填寫收入補貼申請表時僅向財政局申報管理員的每月底薪(澳門幣3,350元),而無需將表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼等額外收入反映在管理員之工作總收入中,意圖隱瞞管理員每月之實際收入,並藉此為管理員取得更多的收入補貼。
九、
其後,B於2015年7月1日離職,並向接替其出任“XX花園”管理處主任的C轉達嫌犯之上述指示,故C之後為管理員填寫收入補貼申請表時亦沒有向財政局申報該等管理員的每月額外收入。
十、
上述之收入補貼申請表均已在其開首部分列明“填表前請細閱表後的填表說明”,而該填表說明中亦明確指出“工作收入是指《職業稅章程》第三條第一款的受僱工作收益,即所有固定或偶然,定期或額外的報酬,不論屬日薪、薪俸、工資、酬勞費或服務費,抑或屬聘請金、出席費、酬勞、賞金、百分率、佣金、經紀佣、分享金、津貼、獎金或其他報酬,但屬第7/2008號法律第七十七條所指在勞動關係終止後由僱主實體支付予僱員的賠償除外”。
十一、
為上述29名管理員申請收入補貼之申請表均經由嫌犯A簽署及蓋上“XX花園管理委員會”之印章,故嫌犯清楚知道B及C均有按其指示僅以管理員之底薪向財政局申請收入補貼,但其仍簽署及向財政局遞交了該等載有不實資料的申請表。
十二、
2012年1月1日至2015年11月30日期間,嫌犯A為上述29名管理員合共作出了113次之收入補貼申請,在該等申請表上嫌犯均僅申報了管理員之每月底薪,故意隱瞞管理員每月尚有表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼等額外收入,未有如實反映管理員的每月總工作收入(參見偵查卷宗第541至543頁之表格,該等表格可反映嫌犯填報之管理員每月收入,在此視為完全轉錄)。
十三、
在嫌犯A的瞞騙下,財政局根據嫌犯提供的不實資料批准了當中的99次申請,並向該等管理員多發放了合共澳門幣243,802元之補貼(參見偵查卷宗第734至735頁之比較表,在此視為完全轉錄)。餘下的4次申請不獲批,10次則尚在審批階段,涉及金額分別為澳門幣4,682元及澳門幣7,839元(參見偵查卷宗第736至739頁之比較表,在此視為完全轉錄)。
十四、
至2015年4月2日,廉政公署接獲匿名舉報,從而揭發事件。
十五、
嫌犯A清楚知道表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼均屬工作總收入之範圍,但其為了讓二十九名管理員獲得不正當利益及造成澳門特別行政區政府的損失,多次向財政局虛報該等管理員之每月實際收入,使法律上重要的事實不實地登載於該等收入補貼的申請表上。
十六、
嫌犯A是在自願、自由及有意識之情況下故意實施其上述行為,並清楚知道其行為違法,會受法律處罰。

綜上所述,嫌犯A作為直接正犯,其既遂行為觸犯了:
➢ 二十九項《澳門刑法典》第244條第1款b之所規定及處罰之偽造文件罪。

3. 辯護主張
嫌犯沒有提交書面的答辯狀。

4. 訴訟程序要件
審判聽證是在嫌犯在場的情況下進行。
已確定的訴訟要件無任何改變,並按法律程序對案件進行了公開開庭審理。

二、事實和證據
本法院經公開審理查明:
(......)

未能證明的事實:
嫌犯主動提出將管理員之底薪及其他獎金、津貼分開發放,造成該等獎金及津貼非屬薪金之一部分的假象,此舉獲管委員成員同意。
嫌犯向B作出指示,要求其為管理員填寫收入補貼申請表時僅向財政局申報管理員的每月底薪,而無需將表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼等額外收入反映在管理員之工作總收入中。
其後,B在離職時向C轉達了嫌犯的上述指示。
控訴書與上述已證事實不符的其他事實。

本法院依據卷宗所載的資料、書證、扣押物,嫌犯的聲明及證人的證言而形成心證。

三、判案理由
嫌犯A講述了案發的經過,確認案中所指的申報表由其所簽署,並表示其於2010年開始擔任業主會主席,雖然其知悉並確認案中員工收取控訴書所指的津貼及獎金,但由於其出任業主會主席之前,前任負責人一直只向當局申報員工的基本薪金,沒有申報津貼、獎金(嫌犯表示其上任後只是在原有的津貼及獎金基礎上作出了提升),且其認為申領工資補助只需申報基本薪金,其他獎金與津貼不包括在申報的範疇內(嫌犯表示其曾向勞工局查詢薪金的定義),嫌犯表示並非存心欺騙政府。
證人B3講述了(XX花園前管理處主任)表示當時因難以聘請員工,所以業主會決議增加員工的津貼及獎金,提升招聘的吸引力,證人表示其於2008年開始擔任有關職務,且當時所提交的工資補助申請,也只是申報員工的基本工資,當中沒有申報獎金及津貼,所以在嫌犯上任及增加了員工的福利後,仍沿用過往的申報方式(僅申報基本工資),過程中嫌犯並沒有刻意著證人不要申報員工的津貼及獎金,只是告知證人業主會決議增加員工的福利,證人C接任時,證人也沒有刻意對C作相關的指示。
證人C(XX花園管理處主任)表示在出任職務時,只是遵循上一手的處理方式(僅申報基本工資),填報申報表的內容後再交予嫌犯簽名及蓋章。
證人AI(XX花園管理委員會出納)表示有關申報方式是之前已一直所沿用的(僅申報基本工資),但證人知悉員工會獲發放其他津貼,發放工資與獎金的時間不同,且工資不等於獎金。
證人K(XX花園管理員)表示其有收取到政府所發放的津貼,也有收取公司所發放的獎金及薪金,有關工資補貼的申報表是由主任負責。
證人N(XX花園管理員)表示其有收取到政府所發放的津貼,也有收取公司所發放的獎金及薪金。
證人AJ(廉政公署調查一廳代廳長)講述了其所參與的調查工作,並對案件的調查結果作出了說明。
(辯方)證人AK講述了當時難以聘請管理人員的情況,業主會的會議上沒有提出過是否需要將員工的獎金與津貼向政府申報的問題。
(辯方)證人AL講述了當時難以聘請管理人員的情況,需要透過調升待遇吸引入行人士,業主會的會議上沒有提出過是否需要將員工的獎金與津貼向政府申報的問題。
(辯方)證人AM講述了當時難以聘請管理人員的情況,需要透過調升待遇吸引入行人士,業主會的會議上沒有提出過是否需要將員工的獎金與津貼向政府申報的問題。
《澳門刑法典》第244條第1款b項規定:
“一、意圖造成他人或本地區有所損失,又或意圖為自己或他人獲得不正當利益,而作出下列行為者,處最高三年徒刑或科罰金:
……
b) 使法律上之重要事實,不實登載於文件上;或"
根據卷宗調查所得的證據,經作出綜合的分析後,考慮到嫌犯的聲明,結合證人的證言及卷宗的資料,嫌犯在其聲明中承認知悉業主會透過決議增加了已證事實第四點所指的福利,承認案中的工資補貼申報表由其本人所簽署,也知悉當時只向當局申報了員工的每月底薪(3,350澳門元),而沒有將實際上向員工所發放的表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼等額外收入反映在管理員之工作總收入中。
嫌犯表示其出任業主會主席之前,一直以來也是僅向當局申報員工的底薪,並表示曾向勞工局了解該等獎金、津貼是否屬於薪金,據嫌犯了解,薪金與獎金、津貼的性質不同,所以僅申報了每月底薪;此外,嫌犯否認曾指示B作刻意的隱瞞。
證人B、證人C、證人AI、證人K、證人N均確認經業主會決議,通過已證事實第四點的獎金與津貼,證人K、證人N確認收取了有關的獎金與津貼,也收到政府所發放的補助。
證人B、證人C、證人AI均確認向當局所提交的工資補助申請表中,僅申報了員工的底薪,而沒有申報員工所收取的其他獎金與津貼,他們表示在嫌犯上任之前已採取這種申報方式。
證人B表示嫌犯並沒有刻意指示其隱瞞員工的收入,而只是將業主會的決議(已證事實第四點)通知證人,以便證人處理出納事宜,證人否認再刻意指示證人C虛報有關收入情況。
證人C表示其只是按慣常的處理方式作申報,證人B沒有刻意指示其向當局隱瞞員工的實際收入情況。
在對案中的證據作出綜合及邏輯的分析後,從嫌犯的聲明及上述證人的證言,雖然未足以證實嫌犯刻意指示證人B及證人C故意向當局隱瞞員工的實際收入情況(經翻閱卷宗所扣押的「XX花園管理委員會主任溝通簿」,也未有確切反映出嫌犯存在這種授意),但事實上,嫌犯清楚知悉案中員工除每月底薪外,還會獲得公司所發放的獎金及津貼,且向當局所提交的工資補貼申報表上,也只申報了員工的底薪,未有如實反映員工實際所收取的獎金及津貼,但嫌犯仍在有關的申報表上簽署確認,藉此讓員工不當地收取了政府所發放的工資補貼。
儘管嫌犯表示一直以來業主會也只向當局申報員工的底薪,證人B也確認嫌犯在出任主席之前,業主會也是採用這種申報方式(根據本案附件的資料,的確反映存在這種情況)。然而,本院認為,嫌犯不應“集非成是”,且不能將過往的不當處理方式作為排除其罪過的理由,且填表說明(參見第8頁)當中已明確表明了需要申報的內容,嫌犯所辯稱的“誤解”,並不構成可寬恕的合理理由,也不足以排除其罪過。
庭審期間,嫌犯及多名證人均表示當時物業管理行業請人困難,業主會只能增加員工的福利,以提升入行的吸引力。由此可見,嫌犯的這種做法,無非是為員工的增加收入,解決請人困難的問題,並將相關成本轉嫁予政府當局。
基於此,本院認為證充分且足夠,足以認定嫌犯實施了控訴書所指控的事實,但控訴書的一些事實細節將按上述的理由作出相應的調整。
綜上,控訴書的大部分的事實均足以獲得證實,根據有關的已證事實,嫌犯A在自由、自願及有意識的情況下,清楚知道表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼均屬工作總收入之範圍,但其為了讓二十九名管理員獲得不正當利益及造成澳門特別行政區政府的損失,多次向財政局虛報該等管理員之每月實際收入,使法律上重要的事實不實地登載於該等收入補貼的申請表上,嫌犯清楚知道其行爲是法律所不容,且會受法律制裁。
因此,嫌犯是直接正犯,其既遂及故意的行為,已觸犯了《澳門刑法典》第244條第1款b項所規定及處罰的二十九項偽造文件罪,均判處罪名成立。

在刑罰的選擇方面,《澳門刑法典》第64條規定:“如對犯罪可選科剝奪自由之刑罰或非剝奪自由之刑罰,則只要非剝奪自由之刑罰可適當及足以實現處罰之目的,法院須先選非剝奪自由之刑罰”。
根據嫌犯的犯罪記錄,雖然嫌犯屬於初犯,但考慮到案中所涉及的人數及金額,本院認為採用非剝奪自由的刑罰,即罰金,未足以達到處罰的目的,因此,會選科剝奪自由的刑罰,即徒刑。

在具體的量刑方面,根據《澳門刑法典》第40條及第65條規定,法院得考慮行為人的罪過和預防犯罪的要求,以及不屬罪狀的加重或減輕情況,尤其是:犯罪事實的不法程度、實施犯罪事實的方式、犯罪事實所造成的後果、犯罪的故意程度、犯罪時行為人的情緒狀態、犯罪的目的或動機、嫌犯的個人及經濟狀況和犯罪前後的表現等。
考慮到本案犯罪事實的不法程度屬中等、嫌犯犯罪的故意程度甚高,以及考慮了與本案有關的其他情節,尤其是嫌犯在庭審前已以賠償名義向卷宗存放了全數賠償。
綜上,本院針對嫌犯A所觸犯的:
- 二十九項偽造文件罪,每項判處7個月的徒刑。
根據《澳門刑法典》第71條的規定,針對嫌犯訂罪刑幅為7個月徒刑至16年11個月徒刑之間,考慮到嫌犯的人格及其所實施的事實,數罪並罰,合共判處1年6個月徒刑的單一刑罰。
考慮到嫌犯犯罪前後的表現、犯罪的情節,嫌犯屬於初犯,且願意作出全數賠償,積極彌補其行為所造成的損害,因此,本院認為僅對事實作譴責並以監禁作威嚇已可適當及足以實現處罰之目的,現決定暫緩2年執行對嫌犯所判處的刑罰(《澳門刑法典》第48條)。

四、判決
綜上所述,本院根據《澳門刑事訴訟法典》第353條、第355條(經第9/2013號法律所修改)及第356條的規定,作出如下判決:
1. 嫌犯A為直接正犯,其故意及既遂的行為,已觸犯了:
《澳門刑法典》第244條第1款b項所規定及處罰之二十九項「偽造文件罪」,每項判處7個月的徒刑。
2. 數罪並罰,合共判處嫌犯1年6個月徒刑的單一刑罰,准予暫緩2年執行。
3. 判處嫌犯繳納500澳門元,用於保護暴力犯罪受害人(1998年8月17日頒佈的第6/98/M號法律第24條第2款規定)。
4. 判處嫌犯負擔15個計算單位(15UC)的司法費(《法院訴訟費用制度》第71條第1款a項)負擔本案各項訴訟負擔。

根據法律規定作出通知。
通知有關人士,如不服本判決,可以在收到本判決通知之日起20日的法定期間內(經第9/2013號法律所修改),透過指派律師或自行委託律師,向澳門特別行政區中級法院提請上訴,申請書交到澳門特別行政區初級法院。

送交刑事紀錄登記表。
由於嫌犯自願向當局作出賠償,因此,判決確定後,通知財政局,以便提取嫌犯所存放的賠償。
判決確定後,將卷宗的扣押文件返還予相關單位(參見第749頁及第842頁)。
判決確定後,根據《澳門刑事訴訟法典》第198條第1款d)項的規定,宣告對嫌犯所實施的強制措施消滅。
Quid Juris?

São os seguintes vícios que o Recorrente/arguido imputou ao acórdão recorrido:
1) - Erro notório na apreciação da prova, incluindo a violação do princípio in dubio pro reo;
2) - Contradição insanável na fundamentação;
3) - Violação do artigo 16.º do Código Penal de Macau (CPM), uma vez que o Recorrente não tinha consciência da ilicitude da sua conduta;
4) - Violação do disposto no n.º 2 do artigo 29.º do CPM, dado que estão verificados os pressupostos do crime continuado;
5) - Violação do disposto nos artigos 40.º, n.º 1, 41.º, n.º 1, 45.º, n.º 1, 64.º e 67.º. n.ºs 1 e 2 do CPM, quanto à medida e à escolha da pena.
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Comecemos pela primeira questão:
1ª questão: Erro notório na apreciação da prova, incluindo a violação do princípio in dubio pro reo:
No entender do Recorrente, na sequência de erro notório de apreciação de provas, o Tribunal considerou provados os seguintes factos:
5 - 嫌犯A清楚知道上述的薪金調整將導致“XX花園”管理員不再符合上述“臨時措施”的申請資格或雖符合申請資格但會導致管理員可收取之收入補貼減少。
11 - 為上述29名管理員申請收入補貼之申請表均經由嫌犯A簽署及蓋上“XX花園管理委員會”之印章,嫌犯清楚知道B及C均僅以管理員之底薪向財政局申請收入補貼,但其仍簽署及向財政局遞交了該等載有不實資料的申請表。嫌犯意圖隱瞞管理員每月之實際收入,並藉此為管理員取得更多的收入補貼。
12 - 2012年1月1日至2015年11月30日期間,嫌犯A為上述29名管理員合共作出了113次之收入補貼申請,在該等申請表上嫌犯均僅申報了管理員之每月底薪,故意隱瞞管理員每月尚有表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼等額外收入,未有如實反映管理員的每月總工作收入(參見偵查卷宗第541至543頁之表格,該等表格可反映嫌犯填報之管理員每月收入,在此視為完全轉錄)。
13 - 在嫌犯A的瞞騙下,財政局根據嫌犯提供的不實資料批准了當中的99次申請,並向該等管理員多發放了合共243,802澳門元之補貼(參見偵查卷宗第734至735頁之比較表,在此視為完全轉錄)。餘下的4次申請不獲批,10次則尚在審批階段,涉及金額分別為4,682澳門元及7,839澳門元(參見偵查卷宗第736至739頁之比較表,在此視為完全轉錄)。
   (…)
    
15 - 嫌犯A清楚知道表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼均屬工作總收入之範圍,但其為了讓二十九名管理員獲得不正當利益及造成澳門特別行政區政府的損失,多次向財政局虛報該等管理員之每月實際收入,使法律上重要的事實不實地登載於該等收入補貼的申請表上。
16 - 嫌犯A是在自願、自由及有意識之情況下故意實施其上述行為,並清楚知道其行為違法,會受法律處罰。
O Tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de facto nos seguintes termos:
“(…)
在對案中的證據作出綜合及邏輯的分析後,從嫌犯的聲明及上述證人的證言,雖然未足以證實嫌犯刻意指示證人B及證人C故意向當局隱瞞員工的實際收入情況(經翻閱卷宗所扣押的「XX花園管理委員會主任溝通簿」,也未有確切反映出嫌犯存在這種授意),但事實上,嫌犯清楚知悉案中員工除每月底薪外,還會獲得公司所發放的獎金及津貼,且向當局所提交的工資補貼申報表上,也只申報了員工的底薪,未有如實反映員工實際所收取的獎金及津貼,但嫌犯仍在有關的申報表上簽署確認,藉此讓員工不當地收取了政府所發放的工資補貼。
儘管嫌犯表示一直以來業主會也只向當局申報員工的底薪,證人B也確認嫌犯在出任主席之前,業主會也是採用這種申報方式(根據本案附件的資料,的確反映存在這種情況)。然而,本院認為,嫌犯不應“集非成是”,且不能將過往的不當處理方式作為排除其罪過的理由,且填表說明(參見第8頁)當中已明確表明了需要申報的內容,嫌犯所辯稱的“誤解”,並不構成可寬恕的合理理由,也不足以排除其罪過。
庭審期間,嫌犯及多名證人均表示當時物業管理行業請人困難,業主會只能增加員工的福利,以提升入行的吸引力。由此可見,嫌犯的這種做法,無非是為員工的增加收入,解決請人困難的問題,並將相關成本轉嫁予政府當局。
基於此,本院認為證充分且足夠,足以認定嫌犯實施了控訴書所指控的事實,但控訴書的一些事實細節將按上述的理由作出相應的調整。
綜上,控訴書的大部分的事實均足以獲得證實,根據有關的已證事實,嫌犯A在自由、自願及有意識的情況下,清楚知道表現獎金、膳食津貼及正副組長津貼均屬工作總收入之範圍,但其為了讓二十九名管理員獲得不正當利益及造成澳門特別行政區政府的損失,多次向財政局虛報該等管理員之每月實際收入,使法律上重要的事實不實地登載於該等收入補貼的申請表上,嫌犯清楚知道其行爲是法律所不容,且會受法律制裁。
(…)”.
Como é sabido, a decisão sobre a matéria de facto é susceptível de ser sindicada nos termos do disposto no artigo 400.º, n.º 2, do CPPM.
No presente caso, o Recorrente faz assentar a sua posição no normativo citado, ao invocar que a decisão quanto à matéria de facto provada enferma do vício previsto no artigo 400.º/2-c) do CPPM e ao impugnar factualidade provada que no seu entendimento não é sustentada pela prova produzida nos autos e que indica na motivação do recurso que interpôs.
Tal como os restantes vícios elencados no citado normativo, o erro notório na apreciação da prova deve resultar do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum, não podendo, pois, estender-se a outros elementos, nomeadamente que resultem do processo, mas que não façam parte da decisão (Cf. Germano Marques da Silva, op. cit., pág.324, e Simas Santos e Leal-Henriques, op. cit., págs.84-85).
Neste contexto, conforme se assinala no Acórdão do STJ de 20-04-2006, citado aqui em nome do Direito Comparado, o erro notório na apreciação da prova previsto na alínea c) do referido normativo “consiste em o tribunal ter dado como provado ou não provado determinado facto, quando a conclusão deveria manifestamente ter sido a contrária, já por força de uma incongruência lógica, já por ofender princípios ou leis formulados cientificamente, nomeadamente das ciências da natureza e das ciências físicas, ou contrariar princípios gerais da experiência comum das pessoas, já por se ter violado ou postergado um princípio ou regra fundamental em matéria de prova”.4
No vício do erro notório está em causa, não o conteúdo da prova em si, nomeadamente o que foi dito no depoimento ou nas declarações prestadas, cujo teor se aceita, mas a utilização que foi dada à prova objecto de apreciação, no sentido de a mesma suportar a demonstração de um determinado facto.
In casu, o Recorrente/arguido sustenta que o Tribunal a quo incorreu no referido erro quando deu como provados os factos constantes dos artigos 5º, 11º a 13º e 15º e 16º dos Factos Assentes do acórdão recorrido, por ser notório que, face à prova testemunhal produzida e aos documentos constantes dos autos, existe uma claríssima dúvida razoável de que aquele praticou a conduta de que foi acusado pela qual foi condenado, consubstanciada na emissão de documentos em que omitiram parte do rendimento dos trabalhadores para requerer os respectivos subsídios, sendo que tal factualidade devia considerar-se como não provada, na óptica do Recorrente/arguido, ou pelo menos, justificada.
Para tanto transcreve os segmentos dos depoimentos produzidos em audiência de julgamento que, no seu entendimento, sustentam o desacerto da decisão tomada quanto à matéria de facto, sendo tal prova a base para a verificação do vício decisório que diz existir relativamente à factualidade dos dos artigos 5º, 11º a 13º e 15º e 16º dos Factos Assentes do acórdão recorrido.
Verifica-se, pois, que ao suscitar o apontado erro notório na apreciação da prova, o Recorrente se ancora, no essencial, em fundamentos que extravasam os limites da sindicância prevista no citado artigo 400.º do CPPM, remetendo para um juízo sobre a valoração da prova produzida em audiência feita pela 1.ª instância.
Ainda assim, sempre se dirá que da análise do texto da decisão recorrida, em conjugação com as regras da experiência comum, não se detecta qualquer erro ostensivo que evidencie o desacerto da opção tomada quanto à matéria que o Tribunal considerou provada.
Com efeito, na fundamentação quanto à matéria de facto dada como assente, acima transcrita, o Tribunal a quo elencou as razões da valoração que efectuou, identificando a prova testemunhal que relevou na formação da sua convicção e indicando os aspectos de tal prova que conjugadamente o levaram a concluir no sentido de considerar demonstrada a factualidade impugnada, bem como assinalando de forma lógica e racional os fundamentos que, no seu entendimento, justificam a credibilidade reconhecida aos depoimentos das testemunhas e retiram relevância probatória aos depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência e aos documentos juntos.
É de realçar que a prova essencial é a documental no caso dos autos.
Por isso, a credibilidade e o valor que a 1.ª instância atribuiu a certas declarações, depoimentos e provas documentais, na medida em que se inscrevem num resultado de imediação sujeito à livre apreciação, só deverão ser objecto de censura pelo Tribunal de recurso, quando ficar demonstrado que a opção tomada viola as regras da experiência comum (ou seja, que exprimem o que sucede na maior parte dos casos sendo, mais precisamente, regras extraída de casos semelhantes) consideradas válidas e legítimas dentro de um determinado contexto histórico e jurídico e, portanto, dotadas de razoabilidade.
Temos, assim, que, do quadro descrito na motivação quanto à matéria de facto provada e do teor global da decisão recorrida, não se verifica qualquer erro na valoração probatória resultante da violação das regras da experiência comum que seja patente aos olhos de qualquer observador que lê a decisão, pelo que forçoso se torna concluir que a sentença recorrida não padece do vício de erro notório na apreciação da prova invocado pelo Recorrente.

O que ressalta da motivação é que o Recorrente/arguido tem opinião diversa do Tribunal recorrido no que respeita à análise e valoração das provas.
O Recorrente/arguido não concorda com a valoração e a apreciação das provas feita pelo Tribunal, mas é a esta entidade que tem competência para o efeito.
Ora, a decisão, explícita claramente qual o processo seguido para formar a convicção do Tribunal recorrido.
O Recorrente com a impugnação da decisão sobre a matéria de facto visa o vencimento da sua versão dos factos, mormente daqueles que possam alterar a convicção do Tribunal no que se refere aos elementos do tipo legal do crime imputado, no sentido da impetrada condenação.
Ou seja, o que está em causa no presente recurso mais não é do que a discordância do Recorrente com a factualidade dada como provada e não provada na versão do Tribunal fundamentada na livre apreciação da prova produzida na oralidade e imediação da audiência, moldada nas regras da experiência comum de acordo com o disposto no art. 114º do CPP, assim determinando que o arguido fosse condenado na prática dos crimes imputados.
Sendo assim de concluir que, com o recurso nos moldes em que o fez tem em mira a reapreciação da prova produzida, qual novo julgamento pelo Tribunal ad quem, no intuito de lograr vencimento de decisão diversa da recorrida, mas não é seguramente esse o escopo final do recurso da decisão sobre a matéria de facto estruturado nos termos do disposto nos artigos 400º e 415º do CPPM.
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Uma nota final sobre a alegada violação do princípio in dúbio pro reo. Nesta matéria, tal como sustenta Germano Marques da Silva, a aplicação do princípio in dúbio pro reo não impõe ao Tribunal o dever de “desmontar uma por uma todas as circunstâncias ou que a mera alegação das mesmas pelo arguido implique a necessidade de provar a sua ausência” (…), “só se for introduzida no processo uma qualquer prova atinente a um facto excludente da responsabilidade é que o juiz tem o dever de se pronunciar sobre ela em conformidade com o princípio da presunção da inocência”5.
Não há elementos suficientes para aplicar tal princípio, logo improcede a argumentação do Recorrente neste ponto.

Pelo expendido, julga-se improcedente a impugnação da matéria em causa (inexistência de erro na apreciação de provas), mantendo-se a versão factual fixada pelo Tribunal recorrido.
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Passemos a ver a 2ª questão:
2ª questão: Contradição insanável na fundamentação:
   A segunda questão que vem colocada pelo Recorrente é a de saber se o acórdão recorrido enferma de contradição insanável na fundamentação, vício a que se refere a alínea b) do n.º 2 do artigo 400.º do CPP.
 Como é sabido, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão consiste tanto na contradição entre a matéria de facto dada como provada ou como provada e não provada, como também entre a motivação da decisão sobre a matéria de facto, ou até mesmo entre a fundamentação e a decisão.
Do que se trata, portanto, é de uma situação em que, os factos julgados como provados ou como não provados colidem, de modo inconciliável, entre si ou uns com os outros ou, também, com a própria motivação da decisão.
Tal como sucede com o erro notório na apreciação da prova, a contradição insanável da fundamentação, para assumir o relevo que a lei lhe atribui, tem de resultar do texto da decisão.
Ora, do texto da decisão recorrida não resulta qualquer contradição. Na verdade, o facto de os funcionários que preencheram os formulários aqui em causa estarem convencidos que a forma como os preencheram era correcta, não entra em contradição com a prova do elemento subjectivo do tipo do ilícito, ou seja, o dolo, do crime de falsificação de documento.
Cremos que, também neste ponto, indevidamente, o Recorrente procura demonstrar a existência do vício da contradição insanável da fundamentação com o recurso à prova produzida, não se cingindo, como a lei impõe, ao que resulta da literalidade do acórdão recorrido.
Pelo que, é de julgar improcedente esta parte do recurso.
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3ª questão: Violação do artigo 16.º do Código Penal de Macau, uma vez que o Recorrente não tinha consciência da ilicitude da sua conduta:

O artigo 16.º do Código Penal de Macau dispõe:
   1. Age sem culpa quem actuar sem consciência da ilicitude do facto, se o erro lhe não for censurável.
   2. Se o erro lhe for censurável, o agente é punido com a pena aplicável ao crime doloso respectivo, a qual pode ser especialmente atenuada.
   A resposta à questão colocada pelo Recorrente, que é a de saber se agiu em erro sobre a ilicitude, pressupõe logicamente a resposta a uma outra questão que é a de saber se o seu comportamento integra um ilícito criminal, ou seja, o da falsificação de documentos previsto no artigo 244.º, n.º 1, alínea b), do CPM.
   Está em causa o facto de o Recorrente/arguido, enquanto responsável pela administração do condomínio de um determinado edifício, ter assinado os impressos próprios para requerer a atribuição do subsídio complementar de rendimentos respeitantes a trabalhadores desse condomínio, sendo que, de tais impressos apenas constavam os salários base desses trabalhadores e não outros subsídios e prémios que os trabalhadores recebiam em complemento ao dito salário base.
   Se o Recorrente/arguido fosse acusado e condenado apenas com base nos referidos documentos particulares, admitimos que as provas seriam insuficientes, só que não foi isso que aconteceu. Pois o Recorrente chegou a assinar também os impressos próprios apresentados na DSF para obter os respectivos subsídios, impressos estes que tem apoio legal no n.º 1 do artigo 5.º do Regulamento Administrativo n.º 6/2008, destinado a pedir a atribuição do subsídio complementar de rendimentos. Ou seja, tal impresso constitui um requerimento dirigido por um particular à Administração, para provar uma realidade (que deve ser verdadeira) mediante declarações do respectivo requerente e da pessoa com legitimidade para este efeito, no caso, para certificar que os rendimentos dos trabalhadores mencionados nos referidos impressos são aqueles que constam dos impressos.
   Ou seja, o Recorrente/arguido fez constar falsamente de documento facto juridicamente relevante (rendimento parcial), tal como se prevê no artigo 244º/1-c) do CPM.

Em suma, cabe destacar o seguinte:
1) – Perante as provas juntas aos autos, nomeadamente os documentos de fls. 652 a 722 que, para certificar os salários de cada um dos trabalhadores, não correspondem aos valores globais dos rendimentos;
2) – Não só, o mais importante é que os documentos de fls. 723 a 729, são boletins destinados exclusivamente ao Pedido de Complemento do Rendimento de Trabalho em causa, e neles encontra-se consignada advertência expressa: as falsas declarações incorrem o autor de infracção na responsabilidade legal (contém-se a seguinte advertência: Declaro, sob compromisso de honra, que os presentes dados são exactos, estando ciente que a prestação de falsas declarações, de dados inexactos ou a obtenção do subsídio por qualquer meio ilícito determinam, para além do cancelamento do subsídio e da restituição dos valores recebidos, a assunção da respectiva responsabilidade legal)
3) – É difícil defender-se que, perante os documentos acima referidos, o arguido não sabia para que seviam tais documentos e mesmo assim punha a sua assinatura sem se curar de saber as consequências que daí pudessem decorrer.

Pelo que, improcede a argumentação do Recorrente nesta parte do recurso.
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4ª questão: Violação do disposto no n.º 2 do artigo 29.º do Código Penal, dado que estão verificados os pressupostos do crime continuado:

A questão fundamental que se discute nos presentes autos prende-se com a de saber se o arguido cometeu 27 crimes ou um crime sob forma continuada?
Estipula o artigo 29º do CPM, no seu nº 2, que “Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executado de forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”.
Visto o texto legal, impõe-se começar por anotar que existe total sintonia nos autos quanto à caracterização do crime continuado, sendo pacífico, ao que cremos, que o crime continuado consiste na aglutinação de uma pluralidade de infracções, que fundamentalmente protegem o mesmo bem jurídico e às quais presidiu uma pluralidade de resoluções, na medida em que, mercê da exógena predisposição das coisas para o facto, revelam uma considerável diminuição da culpa do arguido.
Cientes, pois, de que o fundamento desta diminuição da culpa emerge desse momento exterior da conduta, não deverá esquecer-se que “…pressuposto da continuação criminosa será, verdadeiramente, a existência de uma relação que, de fora, e de maneira considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente, isto é, de acordo com o direito”, sem esquecer ainda que “…deve existir uma conexão interior entre os diversos atos, derivada de a motivação de cada um estar ligada à dos outros”, pelo que “…a conexão de espaço e tempo só poderá ter relevância na medida em que afaste aquela conexão interior”6.
A jurisprudência dá-nos conta de que é esta teoria teleológica que Eduardo Correia transportou para o artigo 30º do CP de Portugal que corresponde ao artigo 25º do CPM, e que permite distinguir entre unidade e pluralidade de infracções, ao mesmo tempo que clarifica que “Existe unidade de resolução criminosa, quando, segundo o senso comum sobre a normalidade dos fenómenos psicológicos, se puder concluir que os vários actos são o resultado de um só processo de deliberação, sem serem determinados por nova motivação. Por outro lado, desde que haja uma única resolução a presidir a toda esta actuação, não existe crime continuado, mas um só crime”7.
Sempre nesta senda interpretativa, convirá anotar ainda que “A diminuição considerável da culpa do agente deve radicar em solicitações de uma mesma situação exterior que o arrastam para o crime, e não em razões de carácter endógeno”8. Ou, agora na versão de Paulo Pinto de Albuquerque, “A diminuição sensível da culpa só tem lugar quando a ocasião favorável à prática do crime se repete sem que o agente tenha contribuído para essa repetição. Isto é, quando a ocasião se proporciona ao agente e não quando ele activamente a provoca”9.
Clarificados que ficam os conceitos, e descendo à decisão recorrida, constata-se que, adentro de adequado enquadramento interpretativo, o tribunal esclareceu de modo muito geral por que razão é que se defende a ideia de vinte e sete crimes autónomos, sem atender aos factores exógenos inerentes à prática dos factos pelo Recorrente/arguido, tendo este sempre uma única resolução que abarcasse todas as acções ilícitas acima descritas, pois, quase em todos os meses o arguido repetia o mesmo comportamento, emitindo tais notas de salários.
De resto, considerando a factualidade apurada, pode-se concluir que o Recorrente/arguido não tomou, em momentos distintos, a correspondente resolução diferente, tendo escolhido o método mais adequado para o conseguir fazer, pelo que há única resolução criminosa.
Por outro lado, como estamos perante a realização plúrima do mesmo tipo de crime e verificam-se os aludidos pressupostos do crime continuado, desde logo, a existência de uma situação exterior que tenha facilitado a execução dos factos imputados, por isso, diminua consideravelmente a culpa do arguido, pois não foi o arguido que criou as condições necessárias à realização de cada um dos ilícitos.
Impõe-se, por isso, a condenação do arguido pela prática de um crime de falsificação sob forma continuada, procedendo, assim, o recurso nesta parte.
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   5ª questão: Violação do disposto nos artigos 40.º, n.º 1, 41.º, n.º 1, 45.º, n.º 1, 64.º e 67.º. n.ºs 1 e 2 do Código Penal de Macau (CPM), quanto à medida e à escolha da pena.

Chegada a esta fase, é momento oportuno de determinar a pena concreta que cabe no caso em análise.
Nesta matéria os artigos 64º e 65º do CPM mandam:
Artigo 64.º
(Critério de escolha da pena)
   Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Artigo 65.º
(Determinação da medida da pena)
   1. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal.
   2. Na determinação da medida da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente:
   a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
   b) A intensidade do dolo ou da negligência;
   c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
   d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
   e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
   f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
   3. Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da determinação da pena.

Posto isto, importa determinar a medida concreta da pena a aplicar ao arguido/Recorrente, pena essa que é limitada pela sua culpa revelada nos factos (cfr. artigo 39°, n° 2, do CPM), e terá de se mostrar adequada a assegurar exigências de prevenção geral e especial, nos termos do disposto nos artigos 39°, n° 1 e 40°, n° 1 do CPM.
Culpa e prevenção são, pois, os dois termos do binómio com auxílio do qual se há- de construir a medida da pena.
A culpa jurídico-penal vem traduzir-se num juízo de censura que funciona, ao mesmo tempo, como um fundamento e limite inultrapassável da medida da pena (cfr. Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português - Das Consequências Jurídicas do Crime, pág. 215), sendo tal princípio expressamente afirmado no n° 2 do artigo 40° do CPM.
Com recurso à prevenção geral procurou dar-se satisfação à necessidade comunitária da punição do caso concreto, tendo-se em consideração, de igual modo, a premência da tutela dos respectivos bens jurídicos (Ac. do STJ, de 04/07/1996, in CJ-STJ, Ano IV, t. 2, pág. 225).
Com o recurso à vertente da prevenção especial almeja-se responder às exigências de socialização do agente, com vista à sua integração na comunidade (cfr. Ac. do STJ supra citado).
Dando concretização aos mencionados vectores, o n° 2 do artigo 70° enumera, exemplificativamente, uma série de circunstâncias atendíveis para a graduação da pena, que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente.
Com vista à determinação da medida concreta da pena a aplicar ao arguido pelos crimes por ele cometido, importa, assim, valorar as seguintes circunstâncias:
O grau de ilicitude dos factos afigura-se-nos não muito elevado em relação ao crime perpetrado pelo arguido, tendo em conta, designadamente, os seguintes factores:
- Foram praticados os factos criminosos sem violência;
- Os factos cometidos reportam-se a 7 anos antes.

A forma singular da prática de factos atenua a ilicitude e diminui de forma acentuada a culpa.
As consequências das condutas do arguido não assumem igualmente especial e acentuada gravidade: documento contem um conteúdo inverídico.
O dolo directo do arguido, apresentando-se, em todas as circunstâncias, com pouca intensidade, sendo a sua actuação reveladora de uma atitude casuística, tendo o arguido actuado com uma causa “compreensível” que excluísse a culpa ou a diminuísse por qualquer forma.
As condições pessoais do arguido que resultaram provadas e que aqui se dão por reproduzidas.
Milita a favor do arguido a circunstância de não ter antecedentes criminais e de manter hábitos de trabalho e encontrar-se familiarmente inserido.
Relativamente à confissão, pode ter um valor atenuativo, por um lado, não foi uma confissão integral e, por outro lado, relevância assumiu na descoberta da verdade, tanta e tão inequívoca foi a prova produzida em julgamento, que nenhuma dúvida suscitou ao Tribunal quer na fixação dos factos objectivos dados como provados, quer nos factos subjectivos, nomeadamente quanto à personalidade e intenção munida.

O arguido admitiu parcialmente a prática dos factos, e apresentou um discurso desculpabilizante.
Há ainda que ponderar as exigências de prevenção, sendo as de prevenção especial elevadas porquanto, pese embora o arguido seja primário e as circunstâncias que rodearam a prática dos factos a que se reportam os autos encontrarem-se, à partida, ligeiramente atenuadas, por outro lado, apresentou um discurso desculpabilizante.
Quanto às exigências de prevenção geral, revelam-se prementes, atenta a objectiva gravidade jurídica do ilícito cometido pelo arguido e a necessidade de defesa da sociedade perante este tipo de criminalidade, que não é frequente, mas merece o alarme da sociedade.

Ponderando todas as referidas circunstâncias e as demais ocorrentes, com destaque para a primariedade do arguido, julgamos adequada aplicar ao arguido (tendo em conta ainda a pena concreta anteriormente aplicada):
- Uma pena de 1 ano e 3 meses de prisão.

Por outro lado, tendo em conta a personalidade do agente, as suas condições de vida, a conduta anterior e posterior aos factos puníveis e as circunstancias destes, e ainda que tudo permita chegar à conclusão de que a simples censura dos factos e a ameaça da pena bastam para afastar o delinquente da criminalidade e para satisfazer as necessidades de reprovação e prevenção dos crimes, decidiu-se suspender-se a execução da pena por um prazo de 18 meses, considerando todos os factores acima elencados.
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Síntese conclusiva:

I - Quando, na fundamentação quanto à matéria de facto dada como assente, o Tribunal a quo elencou as razões da valoração que efectuou, identificando a prova testemunhal que relevou na formação da sua convicção e indicando os aspectos de tal prova que conjugadamente o levaram a concluir no sentido de considerar demonstrada a factualidade impugnada, bem como assinalando de forma lógica e racional os fundamentos que, no seu entendimento, justificam a credibilidade reconhecida aos depoimentos das testemunhas e retiram relevância probatória aos depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência e aos documentos juntos, sendo estes prova essencial no caso dos autos, não há erro notório na apreciação das provas.
II – Perante a factualidade apurada, se podemos concluir que o Recorrente/arguido não tomou, em momentos distintos, a correspondente resolução diferente, tendo escolhido o método mais adequado para conseguir concretizar o seu objectivo, deve entender-se que existe apenas uma única resolução criminosa. Por outro lado, como estamos perante a realização plúrima do mesmo tipo de crime e verificam-se os aludidos pressupostos do crime continuado, desde logo, a existência de uma situação exterior que tenha facilitado a execução dos factos imputados, diminua, assim, consideravelmente a culpa do arguido, pois não foi o arguido que criou as condições necessárias à realização de cada um dos ilícitos, deve concluir-se que o arguido cometeu os ilícitos imputados sob forma continuada.
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Tudo visto e ponderado, resta decidir.
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   四、裁決

據上論結,中級法院合議庭法官裁決如下:

上訴人/嫌犯之部份上訴理由成立,改判如下:

1) – 判嫌犯以直接正犯、連續犯及既遂方式觸犯《刑法典》第244條第1款b項所定及處罰之一項「偽造文件罪」,罪名成立,判處一年三個月徒刑。
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2) – 上述刑期緩期18個月執行。
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3) – 判處嫌犯支付4個計算單位之司法費及有關訴訟費用。
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4) – 關於其他內容,維持第一審的裁定。
*
5) - 依法作出通知及登錄。
              
2021年7月22日
              
               ______________________________
               馮文莊 (裁判書製作人)
              
               ______________________________
               周艷平 (第一助審法官)
              
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               蔡武彬 (第二助審法官)
1 Por deliberação (nº 251) do Conselho dos Magistrados Judiciais de 14/05/2021, o signatário/relator foi designado para relatar, em acumulação de serviço, os processos-crime redistribuídos nos termos fixados pela referida deliberação.
2 F. Dias, Direito Processual Penal, 1974, pág. 213.
3 已根據《澳門刑事訴訟法典》第119條第2款的規定作出告誡。
4 Aresto proferido no processo n.º 06P363 e disponível na Internet em .
5 Nota de rodapé (3) do parecer, com o seguinte teor: SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal, II, Verbo, 2008, p. 126
6 Cfr. Eduardo, Direito Criminal I, pág. 280 e seguintes.
7 Idem, pág.290.
8 Vidé, idem.
9 Idem, pág. 300.
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