Reclamação nº 6/2021/R
A, Autor no autos do processo civil do trabalho nº LB1-20-0065-LAC, que correm os seus termos no Juízo Laboral do Tribunal Judicial de Base, notificado da sentença que lhe julgou parcialmente procedente a acção por ele instaurada e inconformado a parte da mesma relativa ao pedido do pagamento do acréscimo salarial pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal e em dias de descanso compensatório, veio interpor recurso jurisdicional para o Tribunal de Segunda Instância mediante o requerimento motivado datado de 11JAN2021, ora constante das fls. 197 dos autos principais.
No mesmo dia, o Autor formulou um requerimento, ora constante das fls. 197 dos autos principais, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, pedindo em síntese que fosse devolvido à Ré o cheque sacado a seu favor e enviado pela Ré ao seu Mandatário para o cumprimento do pagamento ordenado na sentença e que o pagamento fosse feito directamente ao Tribunal para que este posteriormente fosse entregar precatório cheque ao Mandatário, ou mediante a emissão de novo cheque sacado à ordem do mesmo Mandatário.
Dada a incompatibilidade das duas intenções manifestadas pelo Autor no requerimento motivado de recurso e nesse requerimento, o Exmº Juiz titular do processo mandou notificar o Autor para esclarecer o que realmente pretende.
Notificado o Autor, veio expor e pedir o seguinte:
A, Autor nos autos à margem identificado, notificado do douto Despacho de fls. 224, vem, respeitosamente, requerer a V. Exa. que se digne dar sem efeito o pedido formulado pelo Autor em 11/01/2021.
Sem prescindir, uma vez mais se requer que o cheque bancário, na quantia de Mop$29,736.00 - entregue pela Ré directamente ao mandatário do Autor – e que este, posteriormente, devolveu ao tribunal - seja devolvido à Ré.
Em qualquer caso, reitera-se, que, aquando da condenação a final da Ré que a mesma seja ordenada a proceder ao respectivo pagamento mediante a emissão de guias, por forma a que depois, o Autor possa receber a quantia por precatório cheque, o qual deverá ser entregue ao mandatário do Autor no âmbito dos poderes que lhe foram conferidos pelo Autor para o efeito e constantes da Procuração.
Pelo seguinte despacho do Exmº Juiz, o recurso não foi admitido com fundamento na irrecorribilidade da sentença recorrida:
Uma vez que da resposta do Autor resulta a aceitação implícita da condenação proferida na sentença das fls. 184 a 187, torna-se a mesma irrecorrível relativamente a ele nos termos do art. 586º,2º do CPC, ex vi do art. 1º do CPT.
Assim sendo, julga-se inadmitido o recurso interposto nas fls. 197 a 206.
Custas pelo Autor.
Notifique.
Notificado do despacho da não admissão do recurso, veio o Autor interpor recurso ordinário dele para este TSI, concluindo e pedindo que:
1. Versa o presente recurso sobre o Despacho de fls. 227, nos termos do qual foi julgado “não admitir” o recurso interposto pelo Autor, junto de fls. 197 a 206, por se entender que em face da resposta do Autor ao pedido de esclarecimento formulado pelo douto Tribunal Judicial de Base “(...) resulta a aceitação implícita da condenação proferida na sentença das fls. 184 a 187, torna-se a mesma irrecorrível relativamente a ele nos termos do art. 586.º, 2.º do CPC, ex vi do art. 1.º do CPT”;
2. Salvo o devido respeito, em caso algum pode o ora Recorrente conformar-se com tal “insólita” decisão, por acreditar que em caso algum poderia o Recurso apresentado ter sido rejeitado pelo Tribunal judicial de Base;
Mais detalhadamente,
3. Importa recordar que, em 14/12/2020, nos termos da douta Decisão proferida pelo Tribunal a quo, junto de fls. 184 a 187, a Ré foi condenada a pagar ao Autor a quantia de Mop$26,712.00 a título de descanso semanal não gozado, acrescida da quantia de Mop$3,024.00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, o que perfaz a quantia total de Mop$29,736.00;
4. Escassos dias depois de ter sido notificado da douta Sentença, em 08/01/2021, o Mandatário do Autor recebeu no seu escritório, por correio registado, uma carta dirigida ao mesmo pela Ré e no qual se encontrava, entre outros, um cheque bancário na quantia de Mop$29,736.00, sacado à ordem do Autor;
5. Em concreto, trata-se de um cheque pagável ao Autor contendo uma cláusula não à ordem (“endosso proibido”) e que no canto superior esquerdo contém uma indicação de «A/C PAYEE ONLY», de onde se conclui tratar-se de um cheque cruzado, que terá necessariamente de ser depositado em conta titulada pelo Autor junto do Banco sacado;
6. Conforme resulta da Procuração junta aos autos, o Autor encontra-se nas Filipinas e não se pode deslocar à RAEM nos próximos tempos, em virtude das restrições impostas no âmbito das medidas de saúde pública impostas pela prevenção à COVID 19;
7. Neste sentido, em 11/01/2021, o Autor requereu que a Ré fosse ordenada ao pagamento da quantia devida directamente ao Tribunal (que, posteriormente, entregaria o precatório cheque ao mandatário do Autor), ou mediante a emissão de um novo cheque sacado à ordem do Mandatário do Autor (B), no âmbito dos poderes que lhe foram atribuídos pelo Autor na Procuração;
8. Mais requereu que o referido cheque fosse devolvido aos autos, por forma a ser posteriormente “devolvido” à Ré, após prova de pagamento da quantia devida por uma das formas de pagamento supra requeridas;
9. No mesmo dia, em 11/01/2021, o Autor interpôs um Recurso ordinário, por não se conformar com a Decisão tomada pelo douto Tribunal Judicial de Base;
10. Em 28/01/2021, a Ré veio responder ao Requerimento junto pelo Autor em 11/01/2021, avançando, em síntese, que: o pedido formulado pelo Autor deve ser negado, visto o Autor poder proceder ao levantamento do referido cheque no Banco C, e que com a emissão do referido cheque a obrigação da Ré se mostrava cumprida e a extinta a dívida por pagamento, tendo ainda apresentou em juízo as suas Alegações de Resposta ao Recurso interposto pelo Autor;
11. Por Despacho de fls. 224, entendeu o Tribunal a quo que se verificava uma “incompatibilidade” nos pedidos requeridos pelo Autor - depósito da quantia à ordem do Tribunal e interposição de Recurso da Sentença - ordenando que o Autor viesse “esclarecer" a tal respeito;
12. Em conformidade, por Requerimento de 10/02/2021 o Autor, ora Recorrente, requereu que fosse dado sem efeito o pedido formulado em 11/01/2021; que o cheque bancário fosse devolvido à Ré e que aquando da condenação a final da Ré fosse a mesma ordenada a proceder ao respectivo pagamento mediante a emissão de guias, por forma a que depois, o Autor possa receber a quantia por precatório cheque, o qual deverá ser entregue ao mandatário do Autor no âmbito dos poderes que lhe foram conferidos pelo Autor para o efeito e constantes da Procuração;
13. Ora, conforme se deixa ver, resulta do referido Requerimento três pedidos distintos: 1.º - Que seja dado sem efeito o pedido formulado pelo Autor em 11/01/2021; 2.º - Que o cheque bancário enviado pela Ré directamente ao Mandatário do Autor - e que este, posteriormente, devolveu ao tribunal- seja devolvido à Ré; 3.° - Que, apenas aquando da condenação à final da Ré (isto é, após a decisão a proferir pelo TSI) a mesma seja ordenada a proceder ao respectivo pagamento (isto é, da quantia a que vier a ser condenada) mediante a emissão de guias, por forma a que depois o Autor possa receber a quantia por precatório cheque a ser entregue ao Mandatário do Autor;
14. Em face da referida “Resposta” (leia-se, esclarecimento) entendeu, todavia, o Tribunal a quo resultar “(…) a aceitação implícita da condenação proferida na sentença (…) julga(ndo)-se inadmitido o recurso interposto”;
15. Ora, em caso algum pode o ora Recorrente conformar-se com o teor do referido Despacho, por estar em crer que o mesmo se encontra viciado por um erro de decisão e por um erro de aplicação de Direito, desde logo porque o Autor, ora Recorrente, jamais se conformou ou aceitou de forma “implícita” a condenação da Ré proferida na Sentença;
16. Bem pelo contrário. Em primeiro lugar, é isento de dúvidas que ao apresentar em juízo o Requerimento de fls... , datado de 10/02/2021, o Autor requereu para os devidos e legais efeitos que fosse “dado sem efeito o pedido” que havia formulado em 11/01/2021;
17. Em segundo lugar, o Autor procedeu de imediato à devolução do cheque ao Tribunal, por forma a que o mesmo fosse posteriormente devolvido à Ré, conforme expressamente formulado;
18. Em terceiro lugar, o Autor apresentou junto do Tribunal Judicial de Base as suas Alegações de Recurso, por não se conformar com a Sentença;
19. Em quatro lugar, o Autor (e o seu Mandatário) acredita ter sido claro ao requerer ao Tribunal Judicial de Base que apenas aquando da condenação da Ré à final - isto é, tão-só depois de apreciado e julgado o Recurso por si intentado por parte do douto Tribunal de Segunda Instância - fosse a Ré ordenada a proceder ao pagamento da respectiva quantia (isto é, da quantia que venha a resultar da Decisão a proferir pelo Tribunal ad quem) mediante precatório cheque, a fim de evitar todo o constrangimento (leia-se, impossibilidade) de a mesma quantia poder vir a ser recebida pelo Autor directamente, antes devendo sê-la por intermédio do seu Mandatário;
20. Em face do exposto, salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que o Tribunal a quo apenas poderia ter concluído pela existência de uma “aceitação implícita da condenação proferida na Sentença” no caso de: i) o Autor ter aceite e procedido ao levantamento do cheque em causa; ii) o Autor não ter pedido expressamente ao Tribunal a devolução do cheque à Ré; iii) o Autor ter pedido o pagamento imediato da quantia em dívida, e não apenas o respectivo pagamento a final e apenas e tão só após Decisão que venha a ser proferida pelo Tribunal de Segunda Instância;
21. Ora, visto nenhuma das referidas condições ter sido preenchida, está o Recorrente em crer que Despacho de fls. 227 se encontra viciado por um erro de decisão (leia-se, por um erro de raciocínio) e, bem assim, por um erro na aplicação de Direito, porquanto em caso algum se mostram preenchidas quaisquer das condições constantes do n.º 2 do art. 586.º do CPC, razão pela qual deve o mesmo ser julgado nulo e substituído por outro que aceite e admita o Recurso “interposto” pelo Autor, ora Recorrente, junto de fls. 197 a 206, porque tempestivo e formulado por quem tem legitimidade e poderes para o efeito.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. encarregar-se-ão de suprir, deve o Despacho de fls. 227 ser julgado nulo e substituído por outro que aceite e admita o Recurso interposto pelo Autor, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
Pelo seguinte despacho do Exmº Juiz, o recurso não foi admitido com fundamento na irrecorribilidade da sentença recorrida:
根據《民事訴訟法典》第595條規定,「一、對不受理平常上訴或留置平常上訴之批示,上訴人得向具管轄權審理該上訴案件之法院之院長提出聲明異議。二、如原應提出聲明異議,而當事人透過上訴就上款所指之任何批示提出爭執,則命令遵循提出聲明異議之程序。」
在尊重不同見解下,本法庭認為,對於卷宗第227頁之不受理上訴批示,上述條文規定原告應透過向中級法院院長提出聲明異議,而非提出上指頁數之上訴。
換言之,上指頁數之上訴所針對之裁判具有不可上訴性。
因此,根據《民事訴訟法典》 594條第1款規定,不受理原告所提出的上述上訴。
訴訟費用由原告承擔。
作出通知。
Notificado desse despacho da não admissão do recurso, veio o Autor nos termos do disposto no artº 595º e s.s do CPC formular a presente reclamação com os seguinte fundamentos:
l. Versa a presente reclamação sobre o Despacho de fls. 260, nos termos do qual foi "indeferida" a interposição do recurso oportunamente formulado pelo Autor junto de fls. 197 a 206, por se entender tratar-se de uma Decisão irrecorrível;
2. Salvo o devido respeito, não pode o ora Reclamante conformar-se com tal indeferimento, por acreditar que existem motivos e razões válidas para que o Recurso formulado pelo Autor devesse ter sido aceite pelo Tribunal a quo.
Em concreto,
3. Em 14/12/2020, nos termos da douta Decisão proferida pelo Tribunal a quo, junto de fls. 184 a 187, a Ré foi condenada a pagar ao Autor a quantia de Mop$26,712.00, a título de descanso semanal não gozado, acrescida da quantia de Mop$3,024.00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, o que perfaz a quantia total de Mop$29,736.00;
4. No dia 08/01/2021, escassos dias depois de ter sido notificado da douta Sentença, o Mandatário do Autor recebeu no seu escritório, por correio registado, uma carta dirigida ao mesmo pela Ré, contendo, entre outros, um cheque bancário na quantia de Mop$29,736.00, pagável ao Autor contendo uma cláusula não à ordem ("endosso proibido") e no canto superior esquerdo a indicação de «A/C PAYEE ONLY», de onde se conclui tratar-se de um cheque cruzado, isto é, de um cheque que terá necessariamente de ser depositado em conta titulada pelo Autor junto do Banco sacado;
5. Conforme resulta da Procuração junta aos autos, o Autor reside nas Filipinas, não tem condições económicas, nem se pode deslocar a Macau fruto das restrições impostas no âmbito das medidas de saúde pública impostas pela prevenção à COVID 19;
6. Em sequência, apelando ao bom senso e ao dever de colaboração das partes, por Requerimento de 11/01/2021, o Autor requereu ao Tribunal a quo que a Ré fosse ordenada a pagar a quantia devida nos presentes autos directamente ao Tribunal, o qual, posteriormente, a entregaria ao mandatário do Autor mediante precatório cheque ou mediante a emissão de um novo cheque sacado à ordem do Mandatário do Autor (B), no âmbito dos poderes que lhe foram atribuídos para o efeito pelo Autor na Procuração;
7. Com o referido Requerimento, o Mandatário do Autor procedeu à "devolução" do cheque que havia recebido directamente pela Ré ao douto Tribunal a quo, por forma a que o mesmo fosse devolvido à Ré;
8. No mesmo dia, em 11/01/2021, o Autor interpôs um Recurso ordinário, dirigido ao Tribunal de Segunda Instância, por não se conformar com a Decisão tomada pelo Tribunal Judicial de Base;
9. Em 28/01/2021, a Ré veio responder ao Requerimento junto pelo Autor em 11/01/2021, avançando, em síntese, que: o pedido formulado pelo Autor deve ser negado, visto ser possível ao Autor poder proceder ao levantamento do referido cheque num Banco C. Mais sublinhou a Ré que, com a emissão do referido cheque, a sua obrigação (de pagamento da quantia a que havia sido condenada) se mostrava cumprida, e a extinta a dívida por pagamento;
10. No mesmo dia, em separado, a Ré apresentou em juízo as Alegações de Resposta ao Recurso interposto pelo Autor;
11. Por Despacho de fls. 224, o douto Tribunal a quo entendeu que se verificava uma "incompatibilidade" nos pedidos requeridos pelo Autor - depósito da quantia à ordem do Tribunal e interposição de Recurso da Sentença - ordenando que o Autor viesse "esclarecer" a tal respeito;
12. Em conformidade, por Requerimento datado de 10/02/2021 o Autor, ora Reclamante, veio expor e requerer junto do Tribunal ad quo o seguinte:
"(...) V. Exa. se digne dar sem efeito o pedido formulado pelo Autor em 11/01/2021.
Sem prescindir, uma vez mais se requer que o cheque bancário, na quantia de Mop$29,736.00 - entregue pela Ré directamente ao mandatário do Autor - e que este, posteriormente, devolveu ao tribunal - seja devolvido à Ré.
Em qualquer caso, reitera-se, que, aquando da condenação a final da Ré que a mesma seja ordenada a proceder ao respectivo pagamento mediante a emissão de guias, por forma a que depois, o Autor possa receber a quantia por precatório cheque, o qual deverá ser entregue ao mandatário do Autor no âmbito dos poderes que lhe foram conferidos pelo Autor para o efeito e constantes da Procuração" ;
13. Conforme se deixa ver, resulta do referido Requerimento três pedidos distintos, a saber:
i) Que seja dado sem efeito o pedido formulado pelo Autor em 11/01/2021;
ii) Que o cheque bancário enviado pela Ré directamente ao Mandatário do Autor - e que este, posteriormente, devolveu ao tribunal – seja devolvido à Ré;
iii) Que, aquando da condenação à final da Ré (isto é, após a decisão de Recurso a proferir pelo TSI) a mesma seja ordenada a proceder ao respectivo pagamento (isto é, da quantia a que vier a ser condenada) mediante a emissão de guias, por forma a que depois o Autor possa receber a quantia por precatório cheque a ser entregue ao Mandatário do Autor;
14. Entendeu, todavia, o douto Tribunal a quo que da referida "resposta" resulta "(…) a aceitação implícita da condenação proferida na sentença (…) julga(ndo)-se inadmitido o recurso interposto";
15. Não se conformando com o conteúdo de tal Despacho, por estar em crer que o mesmo se encontra viciado por um erro de decisão e por um erro de aplicação de Direito, o ora Reclamante interpôs Recurso ordinário dirigido ao Tribunal ad quem;
16. Ora, a interposição do referido Recurso foi indeferida pelo Tribunal Judicial de Base, nos termos que se deixou dito no início da presente Reclamação: isto é, por se entender tratar-se de uma Decisão irrecorrível;
17. É, pois, do referido Despacho de indeferimento da interposição do Recurso constante de fls. 260 de que ora se Reclama, por se acreditar não existirem motivos válidos para o seu "indeferimento" por parte do Tribunal a quo;
18. Com efeito, salvo o devido respeito, está o ora Reclamante em crer que em caso algum poderia o Tribunal a quo ter concluído que o Autor, ora Reclamante, se terá conformado ou terá aceite de forma "implícita" a condenação da Ré proferida na Sentença;
19. Bem pelo contrário;
20. Em primeiro lugar, é isento de dúvidas que ao apresentar em juízo o Requerimento de fls... , datado de 10/02/2021, o Autor requereu para os devidos e legais efeitos que fosse "dado sem efeito o pedido" que havia formulado em 11/01/2021;
21. Em segundo lugar, o Autor procedeu de imediato à devolução do cheque ao Tribunal, por forma a que o mesmo fosse posteriormente devolvido à Ré, conforme expressamente formulado;
22. Em terceiro lugar, o Autor apresentou junto do Tribunal Judicial de Base as suas Alegações de Recurso, justamente por não se conformar com a Sentença;
23. Em suma, o Autor não só não se conformou com a douta Decisão - tendo da mesma apresentado Recurso - como igualmente não se conformou com o pagamento "avançado" pela Ré directamente ao seu Mandatário judicial, razão pela qual procedeu à imediata devolução do mesmo junto do Tribunal Judicial de Base;
24. O Autor (e o seu Mandatário) acreditou ter sido claro ao requerer ao Tribunal Judicial de Base que apenas aquando da condenação da Ré à final - isto é, tão-só depois de apreciado e julgado o Recurso por si intentado por parte do douto Tribunal de Segunda Instância - a Ré fosse ordenada a proceder ao pagamento da respectiva quantia (isto é, da quantia que venha a resultar da Decisão a proferir pelo Tribunal ad quem) mediante precatório cheque, a fim de evitar todo o constrangimento (leia-se, uma qualquer "impossibilidade") de a mesma quantia poder vir a ser recebida pelo Autor directamente, antes devendo sê-la por intermédio do seu Mandatário judicial com poderes para o efeito;
25. De onde, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo apenas poderia ter concluído pela existência de uma "aceitação implícita da condenação proferida na Sentença" no caso de se terem verificado alguma das seguintes situações:
v) o Autor ter aceite e procedido ao levantamento do cheque em causa;
vi) o Autor não ter pedido expressamente ao Tribunal a devolução do cheque à Ré;
vii) o Autor não ter apresentado tempestivamente Recurso da Sentença;
viii) e, em qualquer dos casos, o Autor não ter pedido o respectivo pagamento apenas a final, isto é, tão-só e apenas após Decisão que venha a ser proferida pelo Tribunal de Segunda Instância;
26. Em concreto, acreditando-se que nenhuma das referidas condições terá sido preenchida, deve o douto Despacho de fls. 260 ser revogado e, em consequência, ser julgada a admissão do Recurso anteriormente formulado pelo ora Reclamante, porque legal, tempestivo e formulado por quem tinha legitimidade e poderes para o efeito.
À cautela,
27. Para a hipótese - remota, no entender do ora Reclamante - de o douto Tribunal ad quem (leia-se, o seu Presidente) entender que o Despacho que "indeferiu" a interposição do Recurso foi o constante de fls. 227, e que do mesmo o ora Reclamante deveria ter apresentado Reclamação, está o ora Reclamante em crer ser de aplicar o disposto no art. 145.° do CPC, nos termos do qual, tratando-se de um "erro na forma de processo importa unicamente a anulação dos actos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei", sem que tal possa resultar uma diminuição de garantias do ora Reclamante.
28. Dito por outras palavras, para o caso de se entender que, em lugar das Alegações de Recurso apresentadas anteriormente, deveria o ora Reclamante ter apresentado Reclamação para o Presidente do TSI, desde já se requer que as mesmas sejam convoladas, ex officio, por forma a corrigir tal erro de qualificação jurídica, por forma ao aqui Reclamante não poder ficar prejudicado na sua defesa, em nome dos Princípios da economia processual e do aproveitamento dos actos, visto a vontade expressa demostrada pelo Autor em impugnar a Decisão em crise.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exa. se encarregará de suprir, deve o Despacho de fls. 260 ser julgado nulo e substituído por outro que admita o Recurso interposto anteriormente, assim se fazendo a sempre costumada JUSTIÇA!
Devidamente autuada e tramitada, a presente reclamação foi feita subir a esta instância.
Passemos pois a apreciar a reclamação.
Simplesmente falando, as vicissitudes que precedem a presente reclamação podem ser sintetizadas no seguinte:
* O reclamante, autor da acção, reagiu, por via de recurso ordinário, contra o despacho que, com fundamento na aceitação tácita, lhe não admitiu o anterior recurso interposto da sentença de 1ª instância, pedindo que fosse revogado aquele despacho de não admissão e em substituição, fosse ordenada a admissão daquele anterior recurso;
* Pelo despacho a fls. 260, o recurso (da não admissão do recurso da sentença) não foi admitido por ter sido considerado meio não idóneo para reagir contra um despacho de não admissão de recurso;
* Inconformado com esse despacho a fls. 260, o Autor veio formular a presente reclamação, pedindo que fosse ordenada a admissão do recurso da sentença; e
* Ou subsidiariamente que fossem as alegações de recurso do despacho que lhe não admitiu o recurso interposto da sentença de 1ª instância sejam convoladas, ex officio, em reclamação, por forma ao aqui Reclamante não poder ficar prejudicado na sua defesa, em nome dos princípios da economia processual e do aproveitamento dos actos, e nesta última hipótese, fosse ordenada a admissão desse recurso.
Ora, como se sabe, o recurso ordinário, tal como sucede com os outros meios de impugnação, justifica-se pela falibilidade humana, realidade que não podemos negar.
Mais concretamente falando, é a possibilidade de ser errada ou injusta uma decisão judicial, por esta ser justamente produzida pela cabeça humana.
Face a esta realidade inegável há, em regra, que colocar à disposição dos interessados que se sintam prejudicados por uma decisão judicial instrumentos processuais tendo em vista a modificação ou até a eliminação da decisão errada ou injusta por forma a acautelar judicialmente os seus interesses, quer processuais quer substanciais.
Eis a razão de ser dos meios de impugnação consagrados na generalidade das leis processuais.
Estão previstos na nossa lei processual civil vários meios de impugnação, dentre os quais, uns dirigidos ao próprio autor da decisão, que são por exemplo a arguição de nulidade, oposição mediante embargos de terceiro e embargos de executado, outros dirigidos a uma instância hierarquicamente superior, ai temos inter alia a reclamação para o presidente do tribunal superior e o recurso ordinário.
In casu, notificado do despacho que lhe não admitiu o recurso da sentença de 1ª instância, o Autor reagiu por via de recurso ordinário.
Andou mal.
Andou mal porque o meio de reacção criado pela lei para o efeito é a reclamação a que se refere o artº 595º/1 do CPC, à luz do qual do despacho que não admita o recurso ordinário ou que o retenha, pode o recorrente reclamar para o presidente do tribunal que seria competente para conhecer do recurso.
Todavia, a lei não estatui como consequência jurídica da inidoneidade do meio de impugnação utilizado a perda do direito de impugnar.
Pois o nosso legislador já teve o cuidado para acautelar esta situação, ao dispor no nº 2 do citado artº 595º que se, em vez de reclamar, a parte impugnar por meio de recurso qualquer dos despachos a que se refere o número anterior, mandam-se seguir os termos próprios da reclamação.
Ora, em vez de ordenar converter o recurso em reclamação, o Exmº Juiz a quo decidiu simplesmente não admitir o recurso com fundamento na irrecorribilidade.
Decisão essa que obviamente inobserva o disposto no artº 595º/2 do CPC que confere um poder e impõe um dever ao juiz.
Não se podendo portanto manter essa decisão, há que revogá-la e em substituição, e determinar a conversão do recurso em reclamação.
Em rigor, deveremos ordenar a baixa dos autos da presente reclamação a fim de se operar a conversão do recurso em reclamação.
Todavia, por força do princípio da economia processual e dada a existência dos elementos suficientes nos presentes autos para a apreciação da bondade ou não do despacho que não admitiu o recurso interposto da sentença de 1ª instância, temos de converter em reclamação, a que se refere o artº 595º do CPC, o recurso interposto mediante o requerimento motivado constante das fls. 230 a 241, e passar a conhecê-la imediatamente.
Dando uma vista de olhos ao teor dos vários requerimentos formulados pelo Autor e do despacho que não admitiu o recurso interposto da sentença de 1ª instância, verificamos logo que esse despacho se alicerçou sobre um juízo fundado nos factos erradamente reputados como verdadeiros.
Na verdade, de acordo com o esclarecido e o pedido no seu requerimento a fls. 226, cujo teor se encontra integralmente reproduzido supra, inexiste qualquer expressão que se mostra incompatível com a vontade de recorrer a sentença de 1ª instância.
O que torna o juízo de aceitação tácita infundado de facto.
Assim sendo, é de revogar o despacho de não admissão de recurso e, em substituição, ordenar a admissão do recurso.
Tudo visto, resta decidir.
São bastantes as razões acima expostas, cremos nós, para que defiramos, como deferimos, a reclamação, ordenando que seja feito subir a este Tribunal de Segunda Instância o recurso interposto da sentença de 1ª instância.
Sem custas.
Cumpra o disposto no artº 597/4 do CPC.
RAEM, 02SET2021
O presidente do TSI
Lai Kin Hong
Recl. 6/2021-1