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Processo nº 520/2021
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 23 de Setembro de 2021
Recorrente: A
Recorrida: Yyy Yyy Yyy, S.A.
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO

  A, com os demais sinais dos autos,
  vem instaurar acção declarativa em processo comum do trabalho contra
  Yyy Yyy Yyy S.A., também com os demais sinais dos autos,
  Pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de MOP140.129,00 acrescida dos juros legais até integral e efectivo pagamento.
  Proferida sentença, foi a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia global de MOP61.795,94 sendo:
1. Subsídio de alimentação:
MOP$20 x 378 dias (após a dedução de 49 dias de férias anuais/ licença sem vencimento e 54 dias de descanso)
= MOP$7.560
2. Subsídio de efectividade:
HKD$7.500 / 30 dias x 1,03 x 4 dias / mês x 15 meses
= MOP$15.450
3. Trabalho prestado em dia de feriado obrigatório:
HKD$7.500 / 30 dias x 1,03 x 7 dias x 2
= MOP$3.605
4. Subsídio de alojamento:
HKD$750 x 1,03 x 15 meses
= MOP$11.587,50
5. Prestação de trabalho extraordinário:
HKD$7.500 / (30 dias x 8 horas) x 1,03 x 0,5 hora x 378 dias (após a dedução de 49 dias de férias anuais / licença sem vencimento e 54 dias de descanso)
= MOP$6.083,44
6. Trabalho prestado em dia de descanso semanal e de descanso compensatório:
HKD$7.500 / 30 dias x 1,03 x 432 dias (após a dedução de 49 dias de férias anuais / 7 dias (o número é arredondado) + [HKD$7.500 / 30 dias x 1,03 x (432 dias / 7 dias – 432 dias / 8 dias) (após a dedução de 49 dias de férias anuais, o número é arredondado).
= MOP$17.510
Perfazendo um total de MOP$61.795,94.
Nos termos do disposto no art.º 794.º, n.º 4 do Código Civil, em conjugação com a uniformização de jurisprudência fixada no Acórdão do TUI n.º 69/2010, os créditos acima referidos são acrescidos de juros legais desde a data da prolação da presente sentença até integral e efectivo pagamento.
  Não se conformando com a decisão proferida na parte relativa à condenação da Ré no pagamento da compensação devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, do trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, uma vez que a forma de cálculo usada se distancia da que tem vindo a ser usada por este Tribunal de Segunda Instância e das bonificações ou remunerações adicionais, vem o Autor interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:
1) Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação da Recorrente na atribuição de urna compensação devida ao Autor pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e, bem assim, pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado;
2) Pelas razões que adiante melhor se expõem, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de direito quanto à concreta forma de cálculo devido pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado e, deste modo, se mostra em violação ao disposto nos artigos 17.º, 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, razão pela qual se impõe que a mesma seja substituída por outra que decida em conformidade com a melhor interpretação a conferir aos referidos preceitos.
Em concreto,
3) Entendeu o Tribunal a quo ser de sufragar o entendimento seguido pelo Tribunal de Última Instância e, em consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor apenas ao correspondente ao valor de um salário em singelo no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso semanal durante todo o período da relação labor al, a liquidar em execução de sentença;
4) Porém, salvo melhor opinião, ao proceder à condenação da Ré apenas em singelo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
5) Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, para além do valor relativo ao próprio dia de trabalho prestado;
6) Trata-se, de resto, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma uniforme pelo Tribunal de Segunda Instância, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: (salário diário X n.º de dias devidos e não gozados X 2);
7) In casu, resultando provado que entre 15/07/2005 a 04/12/2006 (descontados os períodos de férias anuais e de dispensas ao trabalho em que o Autor se deslocou para o exterior da RAEM) a Ré não fixou ao Autor em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas - de onde se retira que o Autor prestou para a Ré um total de 61 dias de trabalho em dia de descanso semanal, correspondente à seguinte operação: (432 dias/7) - deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$31.415,00 a título do dobro do salário - e não só apenas de MOP$17.510,00 correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer;
Ao que acresce que,
8) Entendeu o douto Tribunal a quo que na determinação da quantia devida pelas Rés ao Autor a título de trabalho prestado nos dias de feriados obrigatórios o Autor terá direito a receber das Rés as compensações compostas pela remuneração em singelo, acrescida do dobro dessa remuneração;
9) Ora, tendo o Tribunal a quo explicitado que pelo dobro da retribuição se deve entender o equivalente a mais um dia de salário em singelo (nos termos que têm vindo a ser seguidos pelo TUI nos Acs. 28/2007, 29/2007, 58/2007 e 40/2009) tal significa que, neste particular, a douta Sentença igualmente se afasta do entendimento que tem vindo a ser sufragado pelo Tribunal de Segunda Instância - nos termos do qual se entende que a fórmula mais correcta de interpretar o referido preceito será conceder ao Autor, ora Recorrente, um “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito” - o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal - e não somente o dobro da retribuição normal como parece ter decidido o Tribunal Judicial de Base;
10) Em concreto, resultando provado que durante o período da relação laboral o Recorrente prestou trabalho para a Recorrida durante 7 dias de feriados obrigatórios, deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$5,407.50 a título do triplo do salário - e não só apenas de MOP$3.605,00 conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer;
Por último,
11) Salvo o devido respeito, está o ora Recorrente em crer que a conjugação do teor do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços ao abrigo do qual o Recorrente prestou trabalho para a Recorrida (Cfr. al. L) dos Factos Assentes) com o conteúdo do ponto 19.º da Sentença impunha-se ao Tribunal a quo ter condenado a Recorrida no pagamento ao ora Recorrente da quantia de Mop$49,980,00 ao mesmo devida a título de “bonificações ou remunerações adicionais”, conforme reclamada em sede de Petição Inicial;
12) Ao não entender assim, está o Recorrente em crer existir um erro de julgamento, por manifesta oposição entre a matéria de facto provada e a decisão proferida a final, razão pela qual deve a douta Sentença ser substituída por outra que condene a Recorrida a pagar ao Recorrente a referida quantia;
13) Caso assim se não entenda - por falta de elementos quantitativos para o efeito - desde já se requer que a Recorrida seja condenada no que se liquidar em execução de sentença, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 564.º, o que desde já e para os legais efeitos se invoca e requer.
  Contra-alegando veio a Recorrida pugnar para que fosse negado provimento ao recurso, apresentando as seguintes conclusões:
I. Veio o Autor, ora Recorrente, insurgir-se contra a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base no que respeita à fórmula de cálculo seguida pela douta decisão recorrida quanto à compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e em dia de feriado obrigatório remunerado, por entender que, nesse particular, a sobredita decisão enferma de erro de aplicação de Direito e, nessa medida, mostra-se em violação do preceituado nos artigos 17.º,19.º e 20.º do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril;
II. Alega ainda o Autor/Recorrente que está em crer existir um erro de julgamento quanto à decisão como improcedente do pedido formulado e título de pagamento de “bonificações ou remunerações adicionais (“tips”') devidas pela Recorrida nos termos do Contrato de Prestação de Serviços ao abrigo do qual o Recorrente foi recrutado e prestou trabalho.
III. Com o mui devido respeito, nada há nada a apontar à Decisão Recorrida, onde é feita uma correcta interpretação e aplicação do preceituado nos artigos 17.º, 19.º e 20.º do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril e onde é também feita uma correcta interpretação dos benefícios concedidos no Contrato de Prestação de Serviços ao abrigo do qual o Recorrente foi recrutado e prestou trabalho em conjugação com as respostas dadas aos quesitos 20º a 23º da Base Instrutória;
IV. Quanto à forma de cálculo adoptada pelo Tribunal a quo para apuramento da compensação pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriados obrigatórios remunerados nada há a apontar à Decisão Recorrida, que mais não é do que a fórmula que é sufragada pelo Tribunal de Última Instância;
V. Nos termos do preceituado no artigo 17.º, n.º 6, alínea a) do Decreto-lei nº 24/89/M, estando em causa o pagamento do trabalho em dias de descanso semanal, pelo dobro da retribuição normal, tendo o Recorrente sido pago já em singelo, importa ter em conta esse salário já pago e pagar apenas o que falta (e não o dobro);
VI. A tese defendida pelo Recorrente nas suas doutas alegações subverte por completo a letra da lei e, a seguir-se tal tese, onde se lê que o trabalhador que aufira um salário mensal tem o direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal quando presta trabalho nos dias de descanso semanal, ler-se-ia que o pagamento em apreço deveria corresponder ao triplo da retribuição normal;
VII. A Decisão em Recurso para além de encontrar total sustentação na letra da lei, encontra­a também na jurisprudência unânime do Tribunal de Última Instância de Macau, nos Acórdãos proferidos no âmbito dos processos n.º 40/2009, n.º 58/2007 e n.º 28/2007 e, bem assim, naquele que foi já entendimento unânime no Tribunal de Segunda Instância no Acórdão de 29.03.2001 no processo n.º 46/2001, para cuja fundamentação se remete;
VIII. Diga-se aliás, que, em face da redacção conferida pela Lei 7/2008 ao artigo 43º, nº 2, 1), tornou-se evidente a opção legislativa no sentido de compensar o trabalhador pela prestação do trabalho em dia que seria de descanso com um dia (e não dois) de remuneração de base;
IX. E, bem assim, naquele que foi já entendimento unânime no Tribunal de Segunda Instância no Acórdão de 29.03.2001 no processo n.º 46/2001, de cujo sumário se aprende que “Não obstante, o trabalhador obrigado a trabalhar no dia de descanso deve auferir, para além do seu salário normal outro tanto equivalente àquele dia.” (destacado nosso);
X. Diga-se aliás, que, em face da redacção conferida pela Lei 7/2008 ao artigo 43º, nº 2, 1), tornou-se evidente a opção legislativa no sentido de compensar o trabalhador pela prestação do trabalho em dia que seria de descanso com um dia (e não dois) de remuneração de base;
XI. Se o trabalhador já recebeu a remuneração só terá de receber o “equivalente a 100% dessa mesma remuneração a acrescer ao salário já pago” (neste sentido vide “Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau”, Miguel Pacheco Arruda Quental, págs. 283 e 284);
XII. Do mesmo modo, de acordo com o n.º 1 do artigo 20.º do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, se o trabalhador prestar trabalho no dia de feriado obrigatório, para além do salário que já recebeu em singelo, terá direito a uma compensação equivalente ao dobro desse salário e não ao triplo, como pretende o Recorrente;
XIII. Aliás, neste sentido vai o Venerando Tribunal de Última Instância nas decisões proferidas nos processos n.º 40/2009, n.º 58/2007 e n.º 28/2007, para cuja fundamentação se remete e de onde resulta claramente que tendo o trabalhador sido remunerado em singelo pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, o mesmo só terá direito a auferir o dobro da sua retribuição;
XIV. O Recorrente foi sempre remunerado pela sua prestação de trabalho em dias de feriados obrigatórios no valor de um dia de salário normal diário, pelo que o mesmo apenas teria direito a receber o dobro do salário normal diário por cada dia de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório;
XV. O Recorrente vem, ainda, colocar em crise a Sentença proferida pelo Tribunal a quo no que concerne às quantias reclamadas pelo mesmo a título de “bonificações ou remunerações adicionais”, defendendo que em face da matéria de facto provada, o Tribunal a quo deveria ter condenado a Recorrida a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$49,980.00 ou ser a Recorrida condenada a pagar ao Recorrente no que se liquidar em sede de execução de sentença.
XVI. O contrato de prestação de serviços n.º 2/2003 refere que «(...) (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª Outorgante (leia-se a Ré) paga aos operários residentes no Território.»
XVII. Porém, a distribuição das bonificações ou remunerações adicionais não tem carácter de obrigatoriedade e não é automática, sendo antes ocasional.
XVIII. A atribuição do bónus é uma gratificação paga pela entidade patronal e traduz-se numa recompensa, num incentivo que é atribuído pelo empregador ao trabalhador face ao seu bom desempenho no exercício da sua actividade profissional.
XIX. Pelo que, competirá a cada empresa, determinar as condições de atribuição do bónus ao trabalhador, tais como a assiduidade, a angariação de clientes, o resultado atingido na prestação do seu trabalho, etc.
XX. Se a Recorrida nunca pagou qualquer bonificação ao Recorrente, o que não se concede, foi porque o Autor não reuniu nessa altura as condições para a sua atribuição.
XXI. Sendo certo que o bónus corresponde a uma remuneração variável, casuisticamente paga pelo empregador, a título de gratificação, não decorrendo do contrato de trabalho a sua obrigatoriedade, nem correspondendo a uma obrigação do empregador.
XXII. Razão pela qual não se encontra incluída no conceito de salário, tal qual definido no art.º 25.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, sendo designada como remuneração variável, não controlada pelo empregador, nos termos do disposto do art.º 2.º, nº 5 da Lei 7/2008.
XXIII. E quanto às gorjetas, considerando que estas são gratificações dadas por um terceiro, ou seja, são entregues pelos clientes directamente ao trabalhador que lhes presta um determinado serviço, não tem a entidade patronal' qualquer controlo sobre essas mesmas quantias.
XXIV. Pelo que e, face a todo o exposto, não tem o Recorrente qualquer razão no recurso que apresenta, devendo o mesmo ser julgado totalmente improcedente.
  Foram colhidos os vistos.
  
  Cumpre, assim, apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO
  
  1. FACTOS
  
  A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
1. Entre 22/07/1999 a 04/12/2006, o Autor esteve ao serviço da Ré (YYY), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
2. O Autor foi recrutado pela Sociedade Z – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. – e, exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/99. (Cfr. fls. 18 a 24, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (B)
3. O referido Contrato de Prestação de Serviços foi sucessivamente objecto de apreciação, fiscalização e aprovação por parte da Entidade Pública competente. (C)
4. E entre 15/07/2005 a 04/12/2006 a Ré (YYY) pagou ao Autor a quantia de HK$7.500,00, a título de salário de base mensal. (D)
5. Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviço 2/99 ao obrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para a Ré, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (E)
6. Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para a Ré, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (F)
7. Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (G)
8. Entre 15/07/2005 a 04/12/2006, a Ré procedeu a uma dedução no valor de HK$750.00,00(sic.) sobre o salário mensal do Autor, a título de “compartição nos custos de alojamento”. (H)
9. A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ ou pela agência de emprego. (I)
10. Resulta do Contrato de Prestação de Serviço ao abrigo do qual o Autor prestou trabalho para a Ré que: “(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º(sic.) outorgante(leia-se, a Ré) paga aos operários residentes no Território”. (J)
11. Na cláusula I. da Declaração de Participação no Regime Distributivo de Gorjeta, onde se lê:
“As “gorjetas” são voluntariamente pagas pelos clientes do casino, não se tratando de uma receita fornecida pela sociedade aos trabalhadores. Relativamente ao pagamento dos clientes ou não, não é a responsabilidade da sociedade, e a sociedade não tem qualquer responsabilidade pelo pagamento.” (Cfr. fls. 28 a 29, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) (K)
12. Na cláusula VI. da Declaração de Participação no Regime Distributivo de Gorjeta, onde se lê:
“Uma vez que as “gorjetas” são voluntariamente pagas pelos clientes do casino, é determinado que o trabalho efectivamente prestado em dia de feriados estipulados por lei (por exemplo: feriados obrigatórios, dias de descanso semanal, outros feriados, etc.) tem direito a uma compensação adicional ao lado do salário base, mas, as “gorjetas” não têm direito a uma compensação adicional, ou seja, quanto ao trabalho prestado em dias acima referidos, o trabalhador só tem direito a receber as “gorjetas” como as recebidas em dia normal de trabalho.” (Cfr. fls. 28 a 29, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).(L)
13. Durante toda a prestação de trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela Ré. (1.º)
14. Mais, era a Ré que fixava o local e o horário de trabalho do Autor de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades. (2.º)
15. Durante todo o período de trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob ordem e instruções da Ré. (3.º)
16. Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré, sem prejuízo de 24 dias de férias anuais por cada ano civil e dispensas de trabalho não remuneradas, nomeadamente entre 22/07/2000 e 12/08/2000 (22 dias), entre 04/12/2001 e 27/12/2001 (24 dias), entre 03/10/2002 e 26/10/2002 (24 dias), entre 04/10/2003 e 02/11/2003 (30 dias), entre 02/12/2004 e 25/12/2004 (24 dias) e entre 03/12/2005 e 29/12/2005 (27 dias), bem como um dia de descanso no oitavo dia após cada sete dias de trabalho consecutivos durante ao serviço da Ré. (4.º, 5.º e 7.º)
17. Entre 15/07/2005 e 04/12/2006, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (6.º)
18. Entre 15/07/2005 e 04/12/2006, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (8.º)
19. Entre 15/07/2005 e 04/12/200(ic.), o Autor prestou a sua actividade de segurança durante em 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 1 de Maio e 1 de Outubro, sem prejuízo da resposta aos quesitos 4.º, 5.º e 7.º. (9.º)
20. Entre 15/07/2005 e 04/12/2006, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado pelo Autor nos referidos dias de feriado obrigatórios. (10.º)
21. Entre 15/07/2005 e 04/12/2006, por ordem da Ré, o Autor está obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos, sem prejuízo da resposta aos quesitos 4.º, 5.º e 7.º. (11.º)
22. Durante o referido período de tempo, tem lugar um briefing (leia-se, uma reunião) entre o Team Leader (leia-se, chefe de turno) e os “guardas de segurança”, na qual são inspeccionados os uniformes de cada um dos guardas e distribuído o trabalho para o referido turno, mediante a indicação do seu concreto posto dentro do Casino. (12.º)
23. A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno. (13.º)
24. Entre 15/07/2005 a 04/12/2006, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (YYY) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (14.º)
25. A que se seguia um período de vinte e quatro horas de descanso compensatório, em regra, no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (15.º e 18.º)
26. Entre 15/07/2005 a 04/12/2006, a Ré (YYY) não fixou ao Autor em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da resposta aos quesitos 4.º, 5.º e 7.º. (16.º)
27. Entre 15/07/2005 a 04/12/2006, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (17.º)
28. A Ré pagava de forma regular e periódica aos trabalhadores guardas de segurança residentes uma determinada quantia a título de gorjetas. (19.º)
29. A Ré pagou sempre ao Autor o salário correspondente aos dias de descanso semanal. (23.º)

  2. DO DIREITO
  
  São três os fundamentos do recurso:
  - Cálculo da remuneração devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal;
  - Cálculo da remuneração devida pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório;
  - Erro de julgamento no que concerne ao pedido de condenação da Ré a pagar ao Autor as quantias pedidas a título de gorjetas;
  
  Seguindo a ordem pelos quais os vícios são invocados nas conclusões de recurso, mostra-se oportuno reproduzir aqui o que na sentença recorrida se decidiu quanto ao trabalho prestado em dia de descanso semanal e de feriado obrigatório:
  «Quanto à compensação do trabalho prestado em dia de feriados obrigatórios reclamada pelo Autor, segundo o entendimento consolidado deste Juízo, o trabalhador que prestou trabalho em dia de feriados obrigatórios tem direito a receber o dobro do salário normal, para além do salário pelo próprio dia de trabalho prestado, nos termos do disposto nos art.º 19.º, n.º 3 e art.º 20.º, n.º 1 do D.L. n.º 24/89/M.
  No caso vertente, uma vez que foi dado como provado que, para além do salário normal pelo próprio dia de trabalho prestado, a Ré nunca pagou ao Autor qualquer compensação pelo trabalho prestado em dia de feriados obrigatórios, pelo que o Autor tem direito a receber o dobro do salário normal.
  (…)
  Relativamente à regra de um dia de descanso semanal em cada período de sete dias que não cumpriu a Ré, nos termos do disposto nos art.º 17.º, n.º 1 e art.º 18.º do D.L. n.º 24/89/M, relativamente ao gozo de descanso semanal, o legislador só permite as seguintes formas alternativas: o gozo do descanso semanal em 7.º dia de trabalho; ou, o gozo de um descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas.
  Quanto à compensação pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal e descanso compensatório, segundo o entendimento consolidado deste Juízo, o trabalhador, que prestou trabalho em dia de descanso semanal, tem direito a receber um acréscimo de um dia de remuneração de base e um dia de descanso compensatório que pode ser transferido para a remuneração, para além do salário base pelo próprio dia de trabalho prestado, nos termos do disposto no art.º 17.º, n.os 4 e 6 do D.L. n.º 24/89/M.
  No caso vertente, uma vez que foi dado como provado que, a Ré não cumpriu qualquer uma das formas alterativas relativas ao gozo de descanso semanal, bem como só pagou ao Autor a remuneração de base e não pagou qualquer compensação, pelo que um dia de descanso concedido ao Autor por cada período de 8 dias de trabalho deve ser considerado como o não gozo de descanso semanal e, só considerado como o gozo de descanso compensatório, e por isso, a pedido do Autor, a Ré tem de pagar ao Autor um acréscimo de um dia de remuneração de base e o salário de um dia de descanso compensatório relativamente ao número dos dias de descanso compensatório não gozados após a dedução do número dos dias de descanso compensatório já gozados.».
  Na parte sob recurso a sentença recorrida seguiu o entendimento de que o trabalho prestado em dia de descanso semanal era remunerado pelo dobro, considerando que a aplicação do factor de multiplicação 2 inclui a remuneração normal devida por esse dia, pelo que, tendo o Autor/Recorrente sido pago por esse dia e tendo trabalhado em dia de descanso semanal, havia apenas que receber mais o valor correspondente a um dia de trabalho, e quanto ao trabalho prestado em dia de feriado obrigatório entendeu que o acréscimo da remuneração é igual ao dobro para além do pagamento da retribuição normal, pelo que, tendo sido pago salário em singelo por esses dias, tem apenas a receber o dobro.
  Contudo, não tem sido esse o entendimento sufragado por este Tribunal de Segunda Instância.
  Consagra o artº 17º do Decreto-Lei nº 24/89/M, na redacção introduzida pelo nº 32/90/M o seguinte:
«Artigo 17º
(Descanso semanal)
  1. Todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26º
  2. O período de descanso semanal de cada trabalhador será fixado pelo empregador, com devida antecedência, de acordo com as exigências do funcionamento da empresa.
  3. Os trabalhadores só poderão ser chamados a prestar trabalho nos respectivos períodos de descanso semanal:
  a) Quando os empregadores estejam na eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
  b) Quando os empregadores tenham de fazer face a acréscimos de trabalho não previsíveis ou não atendíveis pela admissão de outros trabalhadores;
  c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável e insubstituível para garantir a continuidade do funcionamento da empresa.
  4. Nos casos de prestação de trabalho em período de descanso semanal, o trabalhador tem direito a um outro dia de descanso compensatório a gozar dentro dos trinta dias seguintes ao da prestação de trabalho e que será imediatamente fixado.
  5. A observância do direito consagrado no nº 1 não prejudica a faculdade de o trabalhador prestar serviço voluntário em dia de descanso semanal, não podendo, no entanto, a isso ser obrigado.
  6. O trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago:
  a) Aos trabalhadores que auferem salário mensal, pelo dobro da retribuição normal;
  b) Aos trabalhadores que auferem salário determinado em função do resultado efectivamente produzido ou do período de trabalho efectivamente prestado, pelo montante acordado com os empregadores, com observância dos limites estabelecidos nos usos e costumes.».
  A questão que se coloca consiste em saber se quando a lei fala em “dobro da retribuição normal” está a pensar apenas em o trabalho ser pago pela retribuição normal que seria devida pelo dia de descanso acrescida do equivalente à remuneração devida por mais um dia, ou se se pretende dizer que o “trabalho” prestado em dia de descanso semanal é pago com a retribuição equivalente ao dobro do que aquilo que seria devido por um dia de trabalho normal, sem prejuízo do trabalhador continuar a ter direito a receber o valor que já era devido por esse dia em que devia ter descansado.
  Tem vindo a ser entendimento deste tribunal que a remuneração devida é igual ao dobro da remuneração normal, sem descontar o valor que é pago ao trabalhador por esse dia ainda que não trabalhasse.
  A respeito de descanso semanal referem José Bento da Silva e Miguel Quental, em Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau, 2006, que: «As razões que justificam a existência de um dia de descanso prendem-se com motivos de ordem física e psíquica (recuperar do desgaste provocado por uma semana de trabalho), de ordem familiar (aproveitar esse dia para conviver com a própria família) e também por razões de ordem social e cultural (esse período permite o convívio com amigos, a participação em manifestações de carácter público, ou para que o trabalhador possa tratar de assuntos do seu próprio interesse junto, por ex. de repartições públicas, etc.).
  A fixação do período de descanso semanal, nos termos do nº 2 do art. 17º, cabe ao empregador, e deve ser realizado (fixado) “com devida antecedência de acordo com as exigências de funcionamento da empresa”. Assim, e embora seja a entidade patronal quem tem o poder para determinar o dia de descanso semanal dos seus trabalhadores, tal fixação está, no entanto, subordinada às exigências de funcionamento da empresa, O que se compreende, atendendo a que no Território o normal é as empresas funcionarem todos os dias, inexistindo um dia de paralisação da actividade, logo torna-se necessário escalonar os dias de descanso semanal dos trabalhadores por forma a que a empresa se possa manter em funcionamento todos os dias da semana.
  Como se referiu, a lei determina que o descanso semanal deve ser fixado com a “devida antecedência”: quer isto dizer que a entidade patronal deve avisar o trabalhador do seu dia de descanso com a antecedência suficiente, para que este possa organizar a sua vida de modo a poder usufruir efectivamente de todos os benefícios relacionados com o dia de descanso.».
  O trabalho prestado em dia de descanso semanal reveste carácter excepcional, ainda que seja voluntariamente prestado, sendo as normas respectivas de carácter imperativo.
  O trabalhador tem sempre o direito a receber a remuneração correspondente ao dia de descanso nos termos do artº 26º nº 1 do Decreto-Lei 24/89/M.
  Destarte, tem este tribunal vindo a entender que quando na al. a) do nº 6 do artº 17º do indicado diploma legal se diz que “o trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago (…) pelo dobro” se está a consagrar o valor remuneratório do trabalho efectivamente prestado e indisponibilidade de gozar o dia de descanso semanal, independentemente e para além da remuneração desse dia à qual o trabalhador, como já se referiu, sempre teria direito.
  Em igual sentido se disse no Acórdão deste tribunal de 27.02.2020 proferido no processo 1247/2019: «Não faria, aliás, sentido que fosse de outra maneira. Na verdade, se o trabalhador, mesmo sem prestar serviço nesse dia de descanso (v.g., domingo), sempre auferiria o correspondente valor (a entidade patronal não lho poderia descontar, visto que o salário é mensal), não faria sentido que, indo trabalhar nesse dia, apenas passasse a receber em singelo o trabalho efectivamente prestado. Seria injusto que apenas se pagasse ao trabalhador esse dia de serviço, que deveria ser de folga e descanso. Que vantagem teria então o trabalhador por prestar serviço a um domingo, se, além do que receberia mesmo sem trabalhar, apenas lhe fosse pago o valor do trabalho efectivamente prestado nesse dia de folga como se tratasse de um dia normal de trabalho?!
  Por isso é que o legislador previu que o trabalho efectivamente prestado nesses dias pelo trabalhador, além do valor que já lhes seria devido em qualquer caso, fosse compensado em dobro pelo valor da retribuição normal diária. Quando a lei fala em dobro refere-se, obviamente, à forma de remunerar esse serviço efectivamente prestado nesses dias de descanso, sem prejuízo, como é bom de ver, do valor da remuneração a que sempre teria direito correspondente a cada um desses dias de descanso e que já recebeu.
  Significa isto, assim, que a 1ª instância não poderia ter descontado o valor em singelo já recebido pelo Recorrente.
  Trata-se, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma quase uniforme por este TSI, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: salário diário X nº de dias devidos e não gozados X 2.».
  Assim sendo, sem necessidade de outras considerações e sendo esta a Jurisprudência consagrada de forma unânime nos Acórdãos proferidos por este tribunal, impõe-se decidir em conformidade, revogando a decisão recorrida nesta parte e substituindo-a por outra que respeite a indicada forma de cálculo da remuneração devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal.
  Logo, seguindo os parâmetros usados na sentença recorrida – HKD7.500/30 dias x 1,03 x 432 dias (descontados 49 dias de férias)/7 dias (arredondado) – obtemos o resultado de MOP15.707,50, o qual multiplicado pelo factor 2 (e não 1 como na sentença recorrida) nos conduz ao resultado de MOP31.415,00 o qual consiste no valor pelo qual a Ré haveria de ter sido condenada a título de indemnização pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal.
  
  Quanto ao trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, tem este tribunal entendido que:
  «2. Dos factores de multiplicação para efeitos de cálculos de indemnização pelo trabalho prestado nos feriados obrigatórios;
  No âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, o trabalho em feriados obrigatórios e a forma das suas compensações encontram-se regulados no artº 20º que prescreve:
  1. O trabalho prestado pelos trabalhadores nos dias de feriado obrigatório, referidos no nº 3 do artigo anterior, dá direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal e só pode ser executado:
  a) Quando os empregadores estejam na eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
  b) Quando os empregadores tenham de fazer face a um acréscimo de trabalho não previsível;
  c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável para garantia a continuidade do funcionamento da empresa, nos casos em que, de acordo com os usos e costumes, esse funcionamento deva ocorrer nos dias de feriados.
  2. Nos casos de prestação de trabalho em dia feriado obrigatório não remunerado, ao abrigo da alínea b) do nº 1, o trabalhador que tenha concluído o período experimental tem direito a um acréscimo de salário nunca inferior a 50% do salário normal, a fixar por acordo entre as partes.
  Nos termos do disposto no artº 19º/3, os trabalhadores têm direito à retribuição nos seis dias de feriado obrigatório (1 de Janeiro, os primeiros 3 dias do Ano Novo Chinês, 1 de Maio e 1 de Outubro).
  Perante a materialidade fáctica assente, o trabalho prestado pelo trabalhador em dias de feriados obrigatório integra-se justamente na circunstância prevista no artº 20º/1-c), pois o trabalhador estava afectado aos casinos explorados pela entidade patronal, que como vimos supra, se obrigava legalmente a manter os seus casinos em funcionamento contínuo.
  Assim, ao abrigo do disposto no artº20º/1, o trabalhador tem direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal.
  A propósito da interpretação da expressão “acréscimo salarial”, ensina o Dr. Augusto Teixeira Garcia que “......A prestação de trabalho nestes dias dá o direito aos trabalhadores de receberem um acréscimo de retribuição nunca inferior ao dobro da retribuição normal (artº 20º, nº1). Assim, se um trabalhador aufere como remuneração diária a quantia de MOP$100, por trabalho prestado num dia feriado obrigatório e remunerado ele terá o direito de auferirMOP$300, ou seja, MOP$100 que corresponde ao dia de trabalho mais MOP$200, correspondente ao acréscimo salarial por trabalho prestado em dia feriado.”–vide, op. cit., Capítulo V, ponto 9.2.
  Cremos que essa é única interpretação correcta da expressão “acréscimo salarial”.
  Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado, a fórmula é:
  3 X o salário diário médio X número de dias de prestação de trabalho em feriado obrigatório remunerado, nas situações previstas no artº 20º/1-c).» - Cit Acórdão do TSI proferido no Procº 681/2018 -.
  Pelo que, também no que concerne à indemnização pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório cabe aplicar a indicada fórmula.
  Logo, seguindo os parâmetros usados na sentença recorrida – HKD7.500/30 dias x 1,03 x 7 dias – obtemos o resultado de MOP1.802,50, o qual multiplicado pelo factor 3 (e não 2 como na sentença recorrida) nos conduz ao resultado de MOP5.407,50 o qual consiste no valor pelo qual a Ré haveria de ter sido condenada a título de indemnização pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório.
  
  Resta apreciar a questão do pagamento das bonificações ou remunerações adicionais.
  Sobre esta matéria o que se provou consta dos pontos 10 e 28 da factualidade apurada é:
«10. Resulta do Contrato de Prestação de Serviço ao abrigo do qual o Autor prestou trabalho para a Ré que: “(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º(sic.) outorgante(leia-se, a Ré) paga aos operários residentes no Território”. (J)
28. A Ré pagava de forma regular e periódica aos trabalhadores guardas de segurança residentes uma determinada quantia a título de gorjetas. (19.º)».
  Da fundamentação da resposta dada à matéria da Base instrutória consta que:
  «Relativamente às bonificações ou remunerações adicionais, a testemunha C afirmou que apenas os trabalhadores residentes recebem gorjetas e os trabalhadores não residentes não têm gorjetas. De acordo com os factos apurados oficiosamente pelos proc.os n.os LB1-20-0013-LAC, LB1-20-0015-LAC, LB1-20-0030-LAC, LB1-20-0045-LAC, LB1-20-0053-LAC, LB1-20-0055-LAC, LB1-20-0071-LAC, LB1-20-0073-LAC, LB1-20-0081-LAC, LB1-20-0083-LAC e LB1-20-00111-LAC do Tribunal, o regime distributivo de gorjeta é apenas aplicável a trabalhadores residentes e não a trabalhadores não residentes. Ao mesmo tempo, não há evidências que comprovem que os fornecimentos de gorjetas aos trabalhadores não residentes representam as bonificações ou remunerações adicionais indicadas pelo Autor, portanto, as respostas acima são feitas para os quesitos 19.º a 22.º.».
  Ou seja, o que se alega é que do contrato consta que o Autor tem direito a receber as bonificações ou remunerações adicionais que foram pagas aos residentes, mas não se densifica em que é que consistem estas remunerações e quais é que são pagas aos trabalhadores residentes que o Autor também tivesse direito por força do contrato.
  As gorjetas como resulta da factualidade apurada (pontos 11 e 12) não são pagas pela Ré mas pelos clientes desta, e como resulta da fundamentação da resposta à base instrutória, não são pagas aos não residentes.
  Destarte, de acordo com aquele que tem vindo a ser o entendimento deste tribunal quanto a esta matéria, bem se decidiu na decisão recorrida ao julgar improcedente por não provado este pedido.
  No mesmo sentido veja-se o Acórdão deste Tribunal de 29.06.2017 proferido no processo que correu termos sob o nº 326/2017, onde sobre esta matéria se diz:
  «8. Das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas
  Defende a recorrente que não tinha que pagar ao autor quaisquer bonificações ou gorjetas ao autor, primeiro por não ter ficado provado quais foram as bonificações ou remunerações adicionais que pagou aos trabalhadores residentes, segundo porque as gorjetas não são pagas por si, mas pelos seus clientes, que devem ser tidos por terceiros.
  A obrigação de pagamento desses suplementos prende-se com o estabelecido no ponto 3.3 do Contrato de Prestação de Serviços nº 2/99, segundo o qual o trabalhador, após 30 dias de prestação de serviço, teria direito, para além da remuneração normal, às bonificações adicionais, incluindo as gorjetas, que a 1ª ré paga aos operários residentes em Macau (facto 14).
  Da matéria provada não resulta quais sejam as bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª ré tenha pago aos seus trabalhadores residentes, embora se tenha provado que a ré vinha pagando bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas.
  Não só não resulta da matéria provada a sua definição material e quantificação, como nem sequer tal matéria vem alegada.
  Estamos em crer que mais do que uma dificuldade no cômputo daquilo que é devido, o que poderia passar por uma operação de liquidação em execução de sentença, como determinou o Mmo Juiz, na essência, estará mesmo em causa a especificação de um pedido que nem sequer está definido na sua génese.
  Será aceitável a parte pedir que o tribunal condene o patrão a pagar os suplementos que paga aos outros trabalhadores residentes, sem dizer em que é que esse pedido se traduz e se concretiza? Sem dizer a que suplementos se refere, qual a categoria dos beneficiados, a analogia de funções e qual o serviço dos beneficiários desses suplementos, partindo do facto comprovado de que a Ré pagou? Aceitar-se-ia que a parte trabalhadora pedisse ao tribunal que condenasse a pagar-lhe os salários em dívida pelo período por que perdurou a relação laboral sem os especificar?
  A factualidade em que vai radicar o pedido mostra-se crucial.
  Como salienta Alberto dos Reis, “… não pode ligar-se maior importância à formulação do pedido, do que à exposição dos fundamentos de facto. Que a menção das razões de direito ocupe lugar secundário, já o assinalámos; mas que a narração dos fundamentos de facto possa relegar-se para plano inferior ao da enunciação do pedido é proposição que temos por inexacta. O êxito da acção tanto depende da correcção do pedido, como da pertinência e suficiência dos fundamentos de facto; o advogado não tem que pôr maior cuidado na formulação do pedido, do que na apresentação do aspecto de facto da acção.”
  A insuficiência que se assinala, neste caso, perpassa até pelos dois vectores: narração e pedido. Não dizendo quais esses suplementos remuneratórios ou abonatórios, os termos e qualidade dos destinatários das bonificações ou remunerações adicionais que pagou a todos os trabalhadores residentes (art. 13 dos factos), está bem de ver que o pedido formulado fica necessariamente inquinado.
  A questão que se equaciona estará essencialmente dependente da admissibilidade da formulação de pedidos genéricos, enquadrada no art. 392º do CPC.
  Não se estando perante um caso de universalidade (al. a) do n.º1); não se estando perante um caso de impossibilidade de determinação, de modo definitivo, das consequências do facto ilícito, nem se configurando uma situação prevista no art. 563º do CC (al. b) do n.º1); nem estando a fixação do quantitativo dependente da prestação de contas ou de outro acto que deva ser praticado pelo réu – pelo menos nada se requer nesse sentido – (al. c) do n.º 1) parece não ser aceitável o pedido nos termos em que o foi na acção.
  Nesta conformidade, por falta de pedido certo e concreto, ao abrigo do disposto nos artigos 139º, n.º 1 e n.º 2, al. a) e 230º, n.º 1, al. b) do CPC, absolver-se-á a Ré da instância, por se tratar de um pressuposto processual inominado, o que impede a apreciação de mérito, não se sufragando aqui o entendimento que configura o caso como de improcedência do pedido.
  Esta insuficiência da petição mereceria, desde logo, um convite ao aperfeiçoamento, em tempo oportuno, a fim de evitar um desfecho do teor acima contemplado.».
  
III. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, decide-se em conceder provimento ao recurso interposto pelo Autor, revogando a sentença recorrida na parte respeitante à compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e em dia de feriado obrigatório, e improcedente quanto à quantia pedida a título de bonificação e/ou remuneração adicional, condenando-se a Ré a pagar ao Autor o seguinte:
  - A título de compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal MOP31.415,00;
  - A título de compensação pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório MOP5.407,50;
  Todas acrescidas dos juros legais como fixado na decisão recorrida, a qual em tudo o mais se mantém.
  
  Custas pelo Recorrente e Recorrida, na proporção do decaimento.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 23 de Setembro de 2021
  
  (Relator)
  Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
  
  (Primeiro Juiz-Adjunto)
  Lai Kin Hong
  
  (Segundo Juiz-Adjunto)
  Fong Man Chong

520/2021 CÍVEL 1