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Processo n.º 102/2021
Recurso jurisdicional em matéria cível
Recorrente: Associação dos Advogados de Macau
Recorrida: A
Entidade recorrida: Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico
Data da conferência: 15 de Setembro de 2021
Juízes: Song Man Lei (Relatora), José Maria Dias Azedo e Sam Hou Fai

Assuntos: - Interesse legítimo no registo da marca
    - Classe 45 da Classificação Internacional de Produtos e Serviços
    - Serviços jurídicos
    - Recusa parcial do registo

SUMÁRIO
1. Nos termos da art.º 201.º do RJPI, é reconhecido o interesse legítimo no registo da marca a quem que se encontre a exercer uma das actividades económicas aí elencadas, incluindo aqueles que “prestam serviços, para assinalar a respectiva actividade”.
2. Não se deve concluir pela falta de interesse da recorrida em ver concedido o registo das marcas em causa, já que todos os serviços indicados na classe 45, incluindo os jurídicos, não são de prestação exclusiva pelos advogados e advogados estagiários, com a única excepção dos “serviços de contencioso”.
3. Analisadas as marcas em questão, não resultam das suas letras ou palavras utilizadas nem dos sinais gráficos qualquer ligação com a advocacia ou com os serviços prestados por esta profissão, pelo que não estão em causa marcas susceptíveis de induzir o público em erro sobre a natureza, qualidades, utilidade ou proveniência geográfica do produto ou serviço a que a marca se destina – al. a) do n.º 2 do art.º 214.º do RJPI.
4. Notando na lista dos serviços indicados na classe 45 uma excepção referente aos “serviços de contencioso”, exclusivamente prestados pelos advogados ou advogados estagiários, não pode a recorrida exercer as respectivas actividades, pelo que lhe falta o interesse legítimo no registo das marcas para assinalar este tipo de serviço, o que impõe a recusa parcial do registo nos termos do art.º 216.º do RJPI.
A Relatora,
Song Man Lei
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

1. Relatório
Associação dos Advogados de Macau, melhor identificada nos autos, interpôs recurso judicial das decisões da então Direcção dos Serviços de Economia que concedeu o registo de marcas requerido pela A (甲) que tomaram os n.ºs N/XXXXXX a N/XXXXXX, todas para assinalar os serviços da classe 45.
O Tribunal Judicial de Base julgou improcedente o recurso.
Inconformada com a decisão, recorreu a Associação dos Advogados de Macau para o Tribunal de Segunda Instância, que negou provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.
Deste acórdão vem a Associação dos Advogados de Macau recorrer para o Tribunal de Última Instância, apresentando nas suas alegações as seguintes conclusões:
1. A Recorrente, veio apresentar o presente recurso por não se conformar com a decisão constante do douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Segunda Instância, que veio negar provimento ao recurso da sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância e confirmar o despacho proferido pela Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico, de 14.05.2019, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º XX/2019, Série II, de XX.XX.2019, mediante o qual foi concedido à A (甲), ora Recorrida, o registo das marcas N/XXXXXX, N/XXXXXX, N/XXXXXX, N/XXXXXX, todas na classe 45.
2. O douto Tribunal a quo assim decidiu por entender que, “não se alcança, como conclui a recorrente, que os registos em crise preencham a tipicidade da alínea a) do n.º 2 do artigo 214.º do RJPI que determina a proibição do registo de marcas quando as mesmas sejam susceptíveis de induzir em erro o público, nomeadamente quanto à natureza do serviço. Não preenche.”.
3. É com esta decisão que, muito respeitosamente, a ora Recorrente não concorda e que na sua modesta opinião padece do vício de erro na aplicação do direito.
Senão vejamos,
4. As marcas objecto do presente recurso foram solicitadas, no âmbito da classe 45ª, para os seguintes serviços:
- Serviços jurídicos,
em Chinês, 法律服務
- Serviços pessoais e sociais prestados por terceiros destinados a satisfazer as necessidades dos indivíduos,
em Chinês, 由他人提供的為滿足個人需要的私人和社會服務; e
- Serviços de segurança para a protecção dos bens e dos indivíduos
em Chinês, 為保護財產和人身安全的服務.
5. A Recorrida é uma associação estabelecida ao abrigo da Lei de Macau que, de acordo com os seus Estatutos, tem como missão principal “consolidar a força dos cidadãos de Macau, construir uma sociedade próspera, civilizada, justa e harmoniosa em Macau, e promover o espírito de ajuda mútua e cuidados mútuos, bem como atender eficazmente às necessidades dos cidadãos e grupos vulneráveis, aprofundar intercâmbios e interacções entre grupos étnicos e promover o desenvolvimento sustentável e saudável da economia social de Macau”. (tradução livre)
6. Ora, é manifesto que a prestação de “Serviços Jurídicos” extravasa em absoluto o fim da associação, bem como nunca poderá a Recorrida prestar tais serviços.
7. Nos termos do artigo 201.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial de Macau (“RJPI”), “o direito ao registo da marca cabe a quem nisso tenha legítimo interesse”, nomeadamente, diz-nos a alínea e) deste preceito “aos que prestam serviços, para assinalar a respectiva actividade”.
8. Segundo Luís Couto Gonçalves (Manual de Direito Industrial, 5.ª ed., 2014, páginas 222 e 224), pelo critério do artigo 225.º [do Código de Propriedade Industrial de Portugal, equivalente ao artigo 201.º do RJPI] é explícito que é necessário haver legítimo interesse para se registar uma marca “e que, pelo menos (…) os prestadores de serviços preencham esse requisito quando requeiram o registo em vista dos interesses das respectivas actividades económicas”, ou seja
9. “o requerente tem legitimidade quando, independentemente da sua natureza jurídica, exerça ou demonstre poder vir a exercer (…) qualquer das actividades citadas nas várias alíneas do art. 225.º, e destine a marca, imediata ou diferidamente, a produtos e serviços relacionados com essas actividades (…)”.
10. Nessa medida, poder-se-á, desde logo concluir pela falta de legitimidade e falta de interesse da Recorrida para ver marcados um ou mais serviços que estão fora do seu escopo de actividades e para os quais não dispõe, nem nunca virá a dispor, das necessárias autorizações para os prestar.
11. Mesmo que fosse arguido que os Serviços Jurídicos poderiam eventualmente integrar o escopo da Recorrida, porquanto teriam como finalidade “o espírito de ajuda mútua e cuidados mútuos, bem como atender eficazmente às necessidades dos cidadãos e grupos vulneráveis”, tal conclusão seria igualmente errada.
12. Na verdade, sendo o Direito de Acesso à Justiça e aos Tribunais um direito fundamental de todos os cidadãos da R.A.E.M., aos mais carenciados e vulneráveis é prestado todo o apoio jurídico necessário através dos vários mecanismos disponíveis, quer oficiosamente por iniciativa dos Tribunais, quer através de requerimento dos próprios para a Comissão do Apoio Judiciário, que fazem recurso ao Patrocínio Oficioso.
13. O procedimento do registo de marcas junto da DSEDT tem natureza constitutiva, relevando a legitimidade procedimental que será determinada no momento em que se inicia o processo.
14. Ora, dentro deste quadro, no momento em que se vai aferir do interesse para o pedido da marca registanda, o certo é que a Recorrida, não se pode dedicar à prestação de serviços jurídicos.
15. É, pois, inegável que a Recorrida carece de um interesse digno de protecção em sede de marcas para assinalar serviços relativos a uma actividade que, tanto neste momento, como no futuro, lhe está vedada.
16. As marcas sub judice são essencialmente constituídas pelas componentes nominativas “ALIANÇA DOS CIDADÃOS / ADC / MACAU / SI MAN LUN MANG (C.C.) / 市民聯盟” e “PODER DOS CIDADÃOS / PDC / MACAU / SI MAN LEK LEONG (C.C.) / 市民力量”.
17. É jurisprudência assente, nos Tribunais de Macau, que a marca exerce uma função de garantia de qualidade não enganosa, visando associar um produto ou serviço a determinado produtor, destingindo os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas, conforme aliás resulta desde logo do artigo 197.º do RJPI, de modo a evitar o erro e a confundibilidade do consumidor quanto à origem desse produto ou serviço.
18. Pelo que, a concessão das marcas sub judice dará azo a confusão junto do público e dos consumidores, o que é frontalmente contrário aos ditames legais e regulamentos que regem tanto a advocacia em Macau como a admissibilidade do registo de marcas instituído no RJPI.
19. O artigo 197.º do RJPI delimita positivamente os diversos sinais que podem ser objecto de protecção, nos seguintes termos: «Só podem ser objecto de protecção ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas (…), que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas» (negrito nosso).
20. A característica essencial de qualquer marca é, assim, a sua eficácia distintiva.
21. As marcas que são objecto do presente recurso não cumprem o referido requisito, pois são compostas por elementos que não são adequados a distinguir os serviços jurídicos que venham a ser prestados pela Recorrida.
22. Nos termos do disposto na alínea a), do n.º 1, do artigo 214.º do RJPI, o pedido de registo é recusado quando se verifique qualquer dos fundamentos gerais de recusa da concessão de direitos de propriedade industrial previstos no n.º 1 do artigo 9.º do RJPI.
23. Nos termos da alínea a), do n.º 1, do artigo 9.º do RJPI, constitui fundamento de recusa da concessão dos direitos de propriedade industrial o objecto não ser susceptível de protecção.
24. A concessão das marcas N/XXXXXX, N/XXXXXX, N/XXXXXX e N/XXXXXX implica a atribuição de um monopólio sobre expressões que poderão servir para a prestação de serviços jurídicos e que nunca um advogado ou escritório de advogados, em Macau, poderia usar para distinguir os seus serviços.
25. Nem se venha dizer que as marcas N/XXXXXX e N/XXXXXX são marcas mistas, facto pelo qual deverão ser apreciadas pelo conjunto dos seus elementos, e não, apenas, em relação a alguns deles, sendo a imagem do conjunto a que mais é retida na memória do consumidor médio.
Tal não é aplicável ao presente caso, porquanto,
26. “No caso das marcas mistas, isto é, compostas simultaneamente por elementos figurativos e nominativos, a experiência demonstra que o elemento nominativo é, em regra, o mais importante para a apreciação do risco de confusão.
De facto, como já se referiu, os elementos fonéticos são mais idóneos para perdurar na memória do público.
Acresce que na prática comercial os comerciantes acabam por ver os produtos do seu comércio, que têm marcas mistas, ser conhecidos somente pela respectiva designação de fantasia.” (Propriedade Industrial, Carlos Olavo, Volume I, 2.a ed., Almedina, 2005, p. 110).
27. Considerando que o consumidor médio é aquele que é atento, razoavelmente prudente e advertido, que apreende uma marca como um todo e não procede a uma análise analítica das suas diferentes particularidades, facilmente poderá aquele ser induzido em erro, pensando que está realmente a recorrer a serviços jurídicos prestados por um advogado ou escritório de advogados.
28. Como é sabido, «A apreciação do carácter distintivo da marca tem que ser feito sob a vista do público, os consumidores médios dos produtos ou serviços que se destinam, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido» - Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, Processo n.º 144/2014 (Recurso Cível), 11.09.2017.
29. Acresce que também nos termos da alínea b), do n.º 1, do artigo 9.º do RJPI, constitui fundamento de recusa da concessão dos direitos de propriedade industrial a violação de regras de ordem pública.
30. Neste sentido, as “Regras para o uso de nomes profissionais de advogados e de denominações para os escritórios de advogados”, aprovadas em assembleia geral extraordinária da AAM de 18 de Outubro de 2012, estabelecem o seguinte quanto à composição de denominações para os escritórios de advogados:
“1 – A denominação do escritório, em qualquer língua, deve ser constituída pelo nome profissional, completo ou abreviado, de todos, alguns ou algum dos advogados do escritório.
2 – Quando a denominação não individualize o nome de todos os advogados que trabalhem em conjunto, pode-lhe ser aditada a expressão “e (&) associado” ou “e (&) associados”.
3 – É admissível a denominação composta por siglas, desde que estas tenham uma correspondência plausível com os nomes dos advogados que trabalham em conjunto no escritório.
4 – São vedadas, em qualquer língua, as designações de fantasia e as que possam fazer incorrer o público em confusão, engano, ou representem formas de publicidade encapotada.
5 – As denominações dos escritórios de advogados não podem ser confundíveis com marcas ou nomes de empresas comerciais.”
31. Analisada a marca sub judice, verifica-se que a utilização das expressões que integram as marcas objecto do presente recurso não estão em conformidade com as referidas regras e, principalmente, os usos atinentes a nomes de advogados e denominações de escritórios de advogados, em Macau.
32. A este propósito, salienta-se que os advogados devem sempre pautar-se pela dignidade que lhes cabe pelo papel que desempenham na administração da Justiça, conforme expressamente previsto no n.º 1.º do artigo 1.º do Código Deontológico: “O advogado deve, no exercício da profissão e fora dela, considerar-se um servidor da justiça e do direito e, como tal, mostrar-se digno da honra e responsabilidades que lhe são inerentes.”.
33. Acrescenta o n.º 3, do artigo 1.º do mesmo Código Deontológico que: “O advogado cumprirá pontual e escrupulosamente os deveres consignados neste Código e todos aqueles que a lei, usos, costumes e tradições lhe impõem para com os magistrados, os outros advogados, os clientes e quaisquer entidades públicas e privadas”.
34. Salienta-se que, o Código Deontológico encontra-se publicado no Boletim Oficial 52/1992, de 13 de Dezembro, tendo sido homologado pelo Governo de Macau mediante Despacho n.º 121/GM/92, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 35.º do Estatuto do Advogado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 31/91/M, de 6 de Maio, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 26/92/M, de 4 de Maio.
35. Está assim em causa a violação de regras de ordem pública que, nos termos da alínea b), do n.º 1, do artigo 9.º do RJPI, constituem fundamento de recusa da concessão das marcas objecto do presente recurso.
36. Por tal motivo, não é consentâneo com a ordem pública e dignidade profissional ínsita aos profissionais que prestam de serviços jurídicos, que sejam concedidas marcas constituídas por expressões como “ALIANÇA DOS CIDADÃOS” ou “PODER DOS CIDADÃOS”, que não podem servir para identificar um advogado ou escritório de advogados, sendo, em suma, totalmente inadequadas para assinalar serviços jurídicos.
37. Acresce que, de acordo com o disposto na alínea e), do n.º 2 do artigo 214.º do RJPI, o pedido de registo deve ser recusado sempre que a marca ou algum dos seus elementos (neste caso, a componente nominativa das marcas sub judice) contenha “nome, ou apenas parte característica do mesmo, que o mesmo não esteja autorizado a utilizar, se for susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão”.
38. Ora, de acordo com as disposições regulamentares acima referidas, a Recorrida não está autorizada a usar um nome profissional, para prestação de serviços jurídicos, que seja constituído pela sua denominação social “ALIANÇA DOS CIDADÃOS” ou “PODER DOS CIDADÃOS”.
39. Sendo jurisprudência assente, nos Tribunais de Macau, que a marca exerce uma função de garantia de qualidade não enganosa, considera-se inadmissível que sejam concedidas marcas que podem levar a crer os consumidores que os seus titulares (neste caso uma associação de cidadãos) estejam habilitados a prestar serviços jurídicos, integrando advogados ou funcionando de modo semelhante a um escritório de advogados.
40. Assim sendo, a concessão das marcas sub judice, para serviços jurídicos, dará azo a uma situação de confusão junto do público em geral e dos consumidores de serviços jurídicos, o que é frontalmente contrário aos ditames legais e regulamentos que regem tanto a advocacia em Macau como a admissibilidade do registo de marcas instituído no RJPI.
41. Assim, salvo, melhor entendimento, verifica-se que é plenamente aplicável ao presente caso o disposto no artigo 197.º do RJPI, porquanto se visa precisamente evitar o erro e a confundibilidade quanto à origem de serviços jurídicos.
42. Conforme refere o douto Acórdão proferido pelo Tribunal a quo:
“Temos por certo e correcto o que alega a recorrente, concretamente:
- A prestação de Serviços Jurídicos é uma actividade que engloba o exercício da advocacia, onde estão incluídos o mandato judicial, a consultadoria jurídica e a representação voluntária; procuradoria, designadamente judicial, administrativa, fiscal e laboral; e a consulta jurídica a terceiros, tal como prescrito Estatuto dos Advogados (DL 31/91/M de 6 de Maio);
- Tais actividades, podem ser apenas exercidas por Advogados e Advogados Estagiários, inscritos na A.A.M., que têm necessariamente de ser pessoas singulares, na medida em que é vedado, em absoluto, o exercício da Advocacia por parte de pessoas colectivas (artº 11º n.º 1 do EA;
- O Estatuto dos Advogados contém uma norma de Direito Penal que visa sancionar a práctica da procuradoria ilícita;
Caso a Requerente, ou um seu agente, viesse a praticar tais actos, ficariam todos eles, quer os agentes, quer os dirigentes da Requerente, sujeitos a uma pena de prisão até 2 anos e multa até 200 dias (artº 25 do EA).”
43. Tendo acrescentado também que “Refere a recorrente, e muito bem, que o Aviso do Chefe do Executivo n.º 10/2009 contém, na verdade, uma listagem onde são autonomizadas as várias descrições dos serviços abarcados pela Classe 45 da Classificação Internacional de Produtos e Serviços, para efeitos de registo.”.
44. Ainda assim, o Tribunal a quo não retirou as necessárias conclusões relativas à (i) falta de legitimidade da Recorrida, (ii) impossibilidade da Recorrida prestar serviços jurídicos e (iii) insusceptibilidade de protecção do objecto das marcas solicitadas para assinalar serviços jurídicos, por considerar que tais argumentos apenas poderiam ter relevância se à Recorrida “estiver vedada a prática de serviços jurídicos tal como os mesmos são concebidos no quadro do direito de marcas”.
45. Salvo devido respeito, que é muito, não se entende como pode considerar-se que a prestação de determinados serviços expressamente incluídos e autonomizados no Aviso do Chefe do Executivo n.º 10/2009, no âmbito da classe 45, encontram-se vedados à Recorrida, mas ainda assim, em termos gerais se concede a esta uma marca para, em termos gerais, assinalar esses mesmos serviços, incluídos na “prestação de Serviços Jurídicos”.
46. Se a Recorrida pretende prosseguir actividades lícitas e, para tal, pretende assinalar tais serviços com uma marca, é evidente que terá que especificar tais actividades, caso contrário, ser-lhe-á concedida uma marca para serviços que, evidentemente, nunca poderá prosseguir, dado que a descrição “Serviços jurídicos” abrange todos os serviços autonomizadas no Aviso do Chefe do Executivo n.º 10/2009.
47. É certo que conforme se refere e sublinha no douto Acórdão proferido pelo Tribunal a quo “Todavia, no sentido amplo, que neste âmbito do direito das marcas se pretende utilizado, abarcará muitas outras realidades para além daquela exclusiva actividade que apenas por advogados pode ser desenvolvida.”.
48. Aqui chegados, entende a Recorrente que se devem retirar os corolários precisamente contrários aos que resultam das conclusões do douto Acórdão proferido pelo Tribunal a quo.
49. Pois de igual modo será certo afirmar que no mesmo sentido amplo, que neste âmbito do direito das marcas se pretende utilizado, (a marca assim concedida) abarcará também a exclusiva actividade que apenas por advogados pode ser desenvolvida.
Assim,
50. Se o Tribunal a quo, refere, claramente que:
a) é o papel da Recorrente garantir o cumprimento das normas que regem o exercício da profissão;
b) o Aviso do Chefe do Executivo n.º 10/2009 contém, entre outras, actividades que podem ser desenvolvidas exclusivamente por advogados (p. ex. 45 C 0119 Contencioso (Serviços de -) L 0030 450211);
c) a Recorrida não pode praticar actos próprios de advocacia;
d) nos termos do artigo 201.º, “o direito ao registo da marca cabe a quem nisso tenha legítimo interesse”.
51. Tendo tal sido suscitado pela Recorrente e tendo o Tribunal a quo reconhecido que a Recorrida não pode desenvolver determinadas actividades que se encontram abrangidas no conceito de “Serviços Jurídicos”, deveria ter sido outra a decisão constante do Acórdão recorrido.
52. Com todo devido respeito, não se concede quando refere o douto Tribunal no Acórdão ora recorrido que “Nas suas alegações de recurso a Recorrente refere apenas “serviços jurídicos” não identificando um único do elenco da Classe 45 que entenda que é exclusivo do exercício da actividade legalmente reservada a Advogados, sendo certo que “Serviços Jurídicos” nada mais é que uma das nomenclaturas usadas para esta classe nada concretizando.”.
53. Ora, por natureza, “Serviços Jurídicos” são todos aqueles que se referem aos serviços prestados por Advogados e, quando não sejam, devem ser especificados, como por exemplo Propriedade intelectual (serviços de vigilância em matéria de) ou Mediação (cfr. item 45 P 0100 e 45 M 0016 da lista anexa ao Aviso do Chefe do Executivo n.º 10/2009).
54. Especificados na lista anexa ao Aviso do Chefe do Executivo n.º 10/2009, na Classe 45, sob a epígrafe “Serviços Jurídicos; Serviços de segurança para a protecção de bens e de pessoas; Serviços pessoais e sociais prestados por terceiros, destinados a satisfazer as necessidades de pessoas”, incluem-se, entre outras, a descrição dos seguintes serviços:
- Computador (Licenciamento de software de -) [serviços jurídicos];
- Consultadoria na área de propriedade intelectual;
- Contencioso (Serviços de -);
- Licenciamento de software de computador [serviços jurídicos];
- Nomes de domínio (Registo de -) [serviços jurídicos];
- Propriedade intelectual (Consultadoria na área de -);
- Registo de nomes de domínio [serviços jurídicos].
55. Ora, não se podendo considerar que tais serviços estejam incluídos em “Serviços de segurança para a protecção de bens e de pessoas; Serviços pessoais e sociais prestados por terceiros, destinados a satisfazer as necessidades de pessoas” só podem estar incluídos em “Serviços Jurídicos”.
56. E se estão incluídos em “Serviços Jurídicos”, é forçoso concluir-se que quaisquer dos serviços jurídicos acima mencionados é passível de integrar actos próprios da advocacia.
57. Assim, salvo devido respeito por opinião contrária, deveria o Tribunal a quo, ao decidir sobre o mérito da causa, ter dado procedência à pretensão da Recorrente, rejeitando o registo das marcas em questão, parcialmente, quanto aos “Serviços Jurídicos” com fundamento na falta de legitimidade da Recorrida, por manifesta falta de interesse no seu registo.
58. A Recorrida tem de concretizar quais os serviços que utiliza ou pretende vir a prestar, com a marca, não lhe sendo possível apenas mencionar termos genéricos ou abstractos como por exemplo: “Classe 45” ou “’Para todos os serviços da Classe 45”.
59. A razão subjacente à necessidade de tal concretização deve-se ao ónus de utilização da marca registada a que fica sujeito o seu titular.
60. Isto é, se o titular da marca registada dela não fizer uso sério durante 3 anos consecutivos, qualquer interessado pode invocar a sua caducidade nos termos do disposto no artigo 231.º do RJPI.
61. Mas tal caducidade poderá ser parcial, não abrangendo a totalidade da marca registada, porquanto o titular da mesma pode, efectivamente, ter prestado algum ou alguns serviços que a marca visa proteger.
62. Nos termos do n.º 3 do artigo 9.º do RJPI, sob a epígrafe (Fundamentos gerais de recusa), “nos casos em que se verifique a existência de facto susceptível de vir a constituir causa de anulabilidade do título requerido, em vez da recusa pode ser decidida a concessão total ou parcial ao interessado que assim o requerer”.
63. Acresce que, conforme previsto no artigo 216.º do mesmo diploma, “quando existam fundamentos para recusa do registo de uma marca apenas no que respeita a alguns dos produtos ou serviços para que este foi pedido, a recusa do registo restringe-se apenas a esses produtos ou serviços”.
64. Assim, conforme já referido, a não utilização de forma séria da marca pelo período de 3 anos leva à caducidade da mesma e, in casu, é evidente que tal sucederá, ainda que parcialmente, pois a Recorrida não pode, nem nunca poderá prestar serviços jurídicos relacionados com a advocacia aos seus associados ou a terceiros.
65. Se por mera hipótese as marcas da Recorrida viessem a ser definitivamente concedidas, como poderá a ora Recorrente, transcorridos 3 anos, solicitar a caducidade da marca para serviços relacionados com a advocacia, se a marca foi concedida, na globalidade, para “Serviços Jurídicos” (?)
66. E se é certo que as marcas objecto do presente recurso caducarão (pelo menos parcialmente) pela falta de uso, que sentido fará conceder ab initio as mesmas (?)
67. Ora, supondo que, por mera hipótese académica, a Recorrida viesse a prestar serviços de serviços de licenciamento de software de serviços jurídicos, jamais poderia ser declarada a caducidade de outros serviços para os quais a marca nunca foi utilizada, como, por exemplo, serviços de gestão de direitos de autor ou serviços de arbitragem, na medida em que, tendo estas marcas sido concedidas para “Serviços Jurídicos”, não será possível distinguir quais os serviços que as marcas visam proteger.
68. Assim sendo, a marca registada para “Serviços Jurídicos”, que segundo o Tribunal a quo englobaria a mediação, a arbitragem, a consulta em propriedade intelectual, a gestão de direitos de autor, a autorização de propriedade intelectual, a supervisão de propriedade intelectual, a autorização de software de computação, o registo de domínio, etc., inviabilizaria qualquer interessado de vir a suscitar a caducidade parcial da mesma no que respeita a algum ou alguns daquele(s) serviço(s),
69. Mesmo que se concebesse, por mera hipótese e dever de patrocínio, que “Serviços Jurídicos” englobam outras actividades que extravasam o exercício da advocacia e actividades conexas ao exercício da mesma, certo é que apenas dizer-se “Serviços Jurídicos” não exclui o exercício da advocacia, pelo que se torna inadmissível um descritivo genérico dos serviços que a marca visa proteger, carecendo o mesmo de melhor concretização.
70. Em suma, salvo melhor opinião e devido respeito pelo douto acórdão proferido pelo Tribunal a quo, não se encontram reunidos os pressupostos para o a concessão das marcas sub judice, nos termos previstos nos artigos 9.º n.º 1 a) e b), 197.º, 201.º e), 214.º n.º 1 a) e n.º 2 e), todos do RJPI e demais normas legais aplicáveis acima referidas.

2. Os Factos
Dão-se como assentes os seguintes factos:
1º- Em 7 de Junho de 2017, a associação “甲”, com sede em [Endereço], requereu junto da Direcção dos Serviços de Economia da R.A.E.M. (D.S.E.), o registo das marcas “PODER DOS CIDADÃOS / PDC / MACAU / SI MAN LEK LEONG (C.C.) / 市民力量” e “ALIANÇA DOS CIDADÃOS / ADC / MACAU / SI MAN LUN MANG (C.C.) / 市民聯盟” que tomaram, respectivamente, os números N/XXXXXX e N/XXXXXX;
2º- bem como as marcas “ALIANÇA DOS CIDADÃOS / SI MAN LUN MANG (C.C.) / 市民聯盟” e “PODER DOS CIDADÃOS / SI MAN LEK LEONG (C.C.) / 市民力量” que tomaram, respectivamente, os números N/XXXXXX e N/XXXXXX.
3º- todas para a classe 45 de serviços, designadamente para “法律服務,由他⼈提供的為滿⾜個⼈需要的私⼈和社會服務,為保護財產和⼈⾝安全的服務。”, em português, “Serviços Jurídicos, Serviços Pessoais e Sociais Prestados por Terceiros Destinados a Satisfazer as Necessidades dos Indivíduos, Serviços de Segurança para a Protecção dos Bens e dos Indivíduos.”
4º- Os aludidos pedidos de registo de marca foram publicados no Boletim Oficial de X de X de 2017 (II série, n.º XX, suplemento).
5º- A D.S.E. concedeu os aludidos registos que foram publicados no Boletim Oficial de X de X de 2019 (II série, n.º XX, suplemento).

3. O Direito
Imputando o vício de erro na aplicação do direito, alega a recorrente que não se encontram reunidos os pressupostos para a concessão das marcas em causa, nos termos previstos nos art.ºs 9.º n.º 1, al.s a) e b), 197.º, 201.º, al. e), 214.º n.º 1, al. a) e n.º 2, al. e), todos do RJPI.
Desde logo, é de notar que, no seu recurso judicial interposto para o Tribunal Judicial de Base, pretende a recorrente a revogação da decisão da DSEDT e a sua substituição por outra que recuse o registo das marcas em causa “com fundamento na alínea a) do n.º 2 do art.º 214.º, por si, ou em conjugado com o art.º 216.º ou na alínea a) do n.º 1 do art.º 9.º, todos do RJPI.
E no recurso interposto para o Tribunal de Segunda Instância, as alegações apresentadas pela recorrente vão praticamente no mesmo sentido, tendo o acórdão recorrido apreciado as questões colocadas pela recorrente.
Daí que, para a pretensão da recorrente, são novos os fundamentos, por si invocados, respeitantes aos art.ºs 9.º n.º 1, al. b), e 214.º n.º 2, al. e) do RJPI.
Não se tratando de questões de conhecimento oficioso, não cabe a este Tribunal de Última Instância conhecê-las.

3.1. Do interesse legítimo no registo de marca
Na óptica da recorrente, falta à associação recorrida o interesse legítimo para requerer o registo das marcas em causa, pois “é manifesto que a prestação de ‘Serviços Jurídicos’ extravasa em absoluto o fim da associação, bem como nunca poderá a Recorrida prestar tais serviços”, que estão reservados para advogados e advogados estagiários.
Sobre o direito ao registo, dispõe o art.º 201.º do RJPI o seguinte:
“Artigo 201.º
(Direito ao registo)
O direito ao registo da marca cabe a quem nisso tiver legítimo interesse, designadamente:
a) Aos industriais, para assinalar os produtos do seu fabrico;
b) Aos comerciantes, para assinalar os produtos do seu comércio;
c) Aos agricultores e produtores, para assinalar os produtos da sua actividade;
d) Aos artífices, para assinalar os produtos da sua arte, ofício ou profissão;
e) Aos que prestam serviços, para assinalar a respectiva actividade.”
Daí resulta que é reconhecido, desde logo, o interesse legítimo no registo da marca a quem que se encontre a exercer uma das actividades económicas acima elencadas, incluindo aqueles que “prestam serviços, para assinalar a respectiva actividade”.
No caso sub judice, a recorrida pretendeu o registo das marcas para os serviços jurídicos, serviços pessoais e sociais prestados por terceiros destinados a satisfazer as necessidades de pessoas e serviços de segurança para a protecção de bens e de pessoas, no âmbito da classe 45.ª.
Pondo em causa a prestação por parte da recorrida dos serviços jurídicos, alega a recorrente que o registo das marcas em questão deve ser parcialmente rejeitado, quanto aos “Serviços Jurídicos” com fundamento na falta de legitimidade da recorrida, por manifesta falta de interesse no seu registo.
A questão está em saber se a recorrida pode prestar os serviços jurídicos, ou seja, se a prestação desses serviços estão exclusivamente reservada aos profissionais que exercem a advocacia.

Ora, tal como se prescreve no Estatuto dos Advogados (DL n.º 31/91/M, de 6 de Maio), “O exercício da advocacia inclui o mandato judicial, a consultadoria jurídica e a representação voluntária” (art.º 1.º).
E encontram-se ainda no diploma a seguintes normas:
Artigo 11.º
(Dos actos próprios da profissão e obrigatoriedade de inscrição)
1. Só os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor na Associação dos Advogados de Macau podem, em todo o Território e perante qualquer jurisdição, instância, autoridade ou entidade pública ou privada, praticar actos próprios da profissão e, designadamente, exercer o mandato judicial ou funções de consulta jurídica em regime de profissão liberal remunerada.
2. Os docentes universitários de Direito que se limitem a dar pareceres jurídicos escritos não se consideram em exercício da advocacia e não são, por isso, obrigados a inscrever-se na associação pública.
3. O exercício de consulta jurídica por licenciados em Direito que sejam funcionários públicos não impõe a obrigação de inscrição na associação pública.
Artigo 12.º
(Do mandato judicial e da representação por advogado)
1. O mandato judicial, a representação e a assistência por advogado são sempre admissíveis e não podem ser impedidos perante qualquer jurisdição, autoridade ou entidade pública ou privada, nomeadamente para a defesa de direitos, patrocínio de relações jurídicas controvertidas, composição de interesses ou em processos de mera averiguação, ainda que administrativa, oficiosa ou de qualquer outra natureza.
2. O mandato judicial não pode ser objecto, por qualquer forma, de medida ou de acordo que impeça ou limite a escolha directa e livre do mandatário pelo mandante.
Artigo 18.º
(Escritório de procuradoria ou de consulta jurídica)
1. O exercício da procuradoria, designadamente judicial, administrativa, fiscal e laboral, e de consulta jurídica a terceiros, só pode ser exercida por advogados inscritos na Associação dos Advogados de Macau.
2. Consideram-se abrangidos pela estatuição do número anterior os gabinetes formados exclusivamente por advogados e as sociedades de advogados.
3. Incorrem na pena de suspensão os advogados que, em violação do presente Estatuto e com prejuízo da sua independência técnica e plena isenção, exerçam a sua actividade sob a direcção efectiva de terceiro não inscrito na Associação dos Advogados de Macau, ou o façam em associação de qualquer espécie com quem não esteja inscrito na referida Associação.
4. Não ficam abrangidos pela proibição do n.º 1 os serviços de consulta jurídica mantidos pela Administração, no âmbito da sua política de acesso dos cidadãos ao Direito.

Daí decorre que nas actividades exercidas por advogados e advogados estagiários estão incluídos o mandato judicial, a consultadoria jurídica, a representação voluntária, a procuradoria, designadamente judicial, administrativa, fiscal e laboral e a consulta jurídica a terceiros.
E só os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor na Associação dos Advogados de Macau podem exercer tais actividades, exceptuando-se os docentes universitários de Direito que se limitem a dar pareceres jurídicos escritos, os funcionários públicos licenciados em Direito que exercem a consulta jurídica e os serviços de consulta jurídica mantidos pela Administração, no âmbito da sua política de acesso dos cidadãos ao Direito.
Por seu lado, o Aviso do Chefe do Executivo n.º 10/2009 contém uma lista dos serviços por ordem de classes da Classificação Internacional de Produtos e Serviços para Efeitos do Registo de Marcas, onde se encontram indicados os seguintes serviços respeitantes à classe 45:
LISTA DOS SERVIÇOS POR ORDEM DE CLASSES
Classe 45
Serviços jurídicos; serviços de segurança para a protecção de bens e de pessoas; serviços pessoais e sociais prestados por terceiros, destinados a satisfazer as necessidades de pessoas

CL
N.º de Ordem (P)
INDICAÇÃO DOS SERVIÇOS
N.º de Ordem (I)
N.º de Base
45
A 0002
Abertura de fechaduras de segurança
O 0010
450033
45
A 0011
Acompanhamento em sociedade [pessoas de companhia]
E 0027
450002
45
A 0019
Adopção (Serviços de agências de -)
A 0014
450193
45
A 0026
Agências de detectives
D 0028
450003
45
A 0032
Agências de vigilância nocturna
G 0027
450006
45
A 0034
Agências matrimoniais
M 0018
450112
45
A 0048
Aluguer de alarmes de incêndio
R 0051
450203
45
A 0083
Aluguer de extintores de incêndio
R 0052
450204
45
A 0114
Aluguer de vestidos de noite
E 0035
450046
45
A 0130
Animais de estimação (Guarda de – ) ao domicílio [pet sitting]
P 0025
450198
45
A 0134
Antecedentes pessoais (Investigações sobre os -)
P 0020
450199
45
A 0145
Arbitragem (Serviços de -)
A 0056
450205
45
B 0001
Bagagem (Inspecção de -) para efeitos de segurança
B 0003
450196
45
C 0025
Casas (Serviços de guarda de -) na ausência dos habitantes [house sitting]
H 0028
450197
45
C 0049
Clubes de encontros
D 0004
450005
45
C 0063
Companhia (Pessoas de -)
C 0023
450002
45
C 0079
Computador (Licenciamento de software de -) [serviços jurídicos]
C 0093
450212
45
C 0111
Consultadoria na área de propriedade intelectual
C 0112
450206
45
C 0112
Consultadoria na área de segurança
C 0114
450117
45
C 0119
Contencioso (Serviços de -)
L 0030
450211
45
C 0120
Controlo de alarmes anti-furto e de segurança
M 0045
450194
45
C 0144
Cremação (Serviços de -)
C 0129
450047
45
C 0146
Crianças (Guarda de – ) ao domicílio [baby sitting]
B 0001
450195
45
D 0029
Devolução de objectos perdidos
L 0035
450200
45
D 0035
Direitos de autor (Gestão de -)
C 0119
450207
45
E 0040
Enterros
U 0002
450057
45
F 0007
Fechaduras de segurança (Abertura de -)
L 0033
450033
45
F 0064
Funerais
F 0050
450056
45
G 0009
Gestão de direitos de autor
M 0011
450207
45
G 0020
Guarda-costas pessoais [protecção]
B 0025
450001
45
G 0021
Guardas [protecção civil]
G 0026
450099
45
H 0002
Horóscopos (Elaboração de -)
H 0019
450146
45
I 0015
Incêndio (Aluguer de alarmes de -)
F 0021
450203
45
I 0016
Incêndio (Aluguer de extintores de-)
F 0022
450204
45
I 0019
Incêndios (Combate a -)
F 0024
450179
45
I 0040
Inspecção de bagagem para efeitos de segurança
I 0021
450196
45
I 0041
Inspecção de fábricas para efeitos de segurança
I 0022
450202
45
I 0051
Investigações sobre os antecedentes pessoais
I 0039
450199
45
I 0052
Investigações sobre pessoas desaparecidas
I 0038
450053
45
L 0020
Licenciamento de propriedade intelectual
L 0022
450208
45
L 0021
Licenciamento de software de computador [serviços jurídicos]
L 0023
450212
45
M 0016
Mediação
M 0024
450201
45
N 0015
Nomes de domínio (Registo de -) [serviços jurídicos]
D 0042
450213
45
O 0018
Organização de encontros religiosos
O 0022
450184
45
P 0043
Pesquisas jurídicas
L 0017
450210
45
P 0046
Pessoais (Guarda-costas -) [protecção]
P 0021
450001
45
P 0048
Pessoas desaparecidas (Investigações sobre -)
M 0040
450053
45
P 0098
Propriedade intelectual (Consultadoria na área de -)
I 0032
450206
45
P 0099
Propriedade intelectual (Licenciamento de -)
I 0033
450208
45
P 0100
Propriedade intelectual (Serviços de vigilância em matéria de -)
I 0034
450209
45
R 0023
Registo de nomes de domínio [serviços jurídicos]
R 0027
450213
45
S 0013
Segurança (Consultadoria na área da -)
S 0028
450117
45
S 0014
Segurança (Inspecção de fábricas para efeitos de-)
S 0004
450202
45
V 0017
Vestuário (Aluguer de -)
C 0058
450081
45
V 0030
Vigilância nocturna (Agências de -)
N 0008
450006

Passamos a ver se os serviços elencados na classe 45 se encontram incluídos nos serviços jurídicos que só podem ser prestados pelos advogados e advogados estagiário, não podendo a recorrida exercer tais actividades e não tendo, consequentemente, legitimidade para requerer o registo das marcas.
Analisada a lista transcrita, o que se deve dizer é que a maior parte dos serviços descritos na classe 45 não tem, evidentemente, a natureza jurídica, sendo certo que essa classe abrange não só serviços jurídicos, mas também os serviços de segurança para a protecção de bens e de pessoas e os serviços pessoais e sociais prestados por terceiros destinados a satisfazer as necessidades de pessoas.
Mesmo naqueles serviços indicados como “serviços jurídicos”, tais como Licenciamento de software de computador e Registo de Nomes de domínio, não são serviços que só podem ser prestados pelos profissionais que exercem a advocacia.
É verdade que naquela listagem estão incluídos alguns serviços que podem ter a natureza jurídica, tais como os serviços de arbitragem, a consultadoria na área de propriedade intelectual, a gestão de direitos de autor, o licenciamento de propriedade intelectual, a mediação, as pesquisas jurídicas e os serviços de vigilância em matéria de propriedade intelectual.
No entanto, tal como sucede com os serviços de Licenciamento de software de computador e de Registo de Nomes de domínio, tais actividades nem ficam necessariamente dentro do âmbito de actos próprios de advogados.
Por um lado, e de acordo com as leis vigentes na RAEM, os árbitros e mediadores não têm de ser advogados ou advogados estagiários e as actividades de pesquisas jurídicas também podem ser feitas por pessoas que não detenham aquela qualidade.
Por outro, e em relação à área de propriedade intelectual e de direitos de autor, os respectivos serviços de consultadoria, licenciamento, vigilância e gestão podem ter natureza técnica que não jurídica, como é evidente.
O único serviço que merece a maior reflexão refere-se a “Contencioso (Serviços de -)”, pois implica normalmente a prática de actos num determinado processo pré-judicial ou judicial, pelo que envolve a prática de actos de advogados ou advogados estagiários, actos próprios da profissão.
Assim sendo, não se deve concluir pela falta de interesse da recorrida em ver concedido o registo das marcas em causa, já que todos os serviços indicados na classe 45, incluindo os jurídicos, não são de prestação exclusiva pelos advogados e advogados estagiários, com a única excepção dos “serviços de contencioso”.
Por outras palavras, as actividades descritas na classe 45, com a excepção em causa, podem ser exercidas não só pelos advogados e advogados estagiários, mas também por outras pessoas alheias dessa profissão.
Não se verifica a situação de insusceptibilidade de protecção do objecto do registo prevista na al. a) do n.º 1 do art.º 9.º do RJPI, não é de recusar o registo das marcas pretendido pela recorrida nos termos da al. a) do n.º 1 do art.º 214.º do RJPI.
Improcede o recurso, nesta parte.

3.2. Da al. a) do n.º 2 do art.º 214.º do RJPI
Imputa ainda o vício de erro na aplicação do direito, alega a recorrente que não se encontra reunido o pressuposto para a concessão das marcas em causa, nos termos previstos no art.º 214.º n.º 2, al. a), do RJPI.
No acórdão ora recorrido, entende o Tribunal de Segunda Instância que não se alcança que o registo em crise preencha a tipicidade da al. a) do n.º 2 do art.º 214.º do RJPI, subscrevendo a decisão do TJB que considera que “o registo não se destina apenas para serviços jurídicos, que, como sabemos, no âmbito do que está definido, em nada coincide com actos de advocacia”, pelo que nega provimento ao recurso.
Vejamos.

Como se sabe, a marca é um dos direitos de propriedade industrial, que confere ao respectivo titular a plena e exclusiva fruição, utilização e disposição das invenções, criações e sinais distintivos, dentro dos limites, condições e restrições fixados na lei – art.º 5.º do RJPI.
Nos termos do art.º 197.º do RJPI, que prevê o objecto da protecção da marca, “Só podem ser objecto de protecção ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas”.
Daí que a marca deve ser adequada a distinguir produtos ou serviços, sendo ela “um sinal distintivo de coisas, há-de ela ser dotada, para o bom desempenho da sua função, de eficácia ou capacidade distintiva, isto é, há-de ser apropriada para diferenciar o produto marcada de outros idênticos ou semelhantes”1.
No caso ora em apreciação, tanto a DSEDT como os arrestos judiciais anteriores consideram que não procede o argumento deduzido pela recorrente para recusar o registo das marcas, ou seja, que não preenche a previsão legal contida na al. a) do n.º 2 do art.º 214.º do RJPI, segundo a qual o pedido de registo de marca é recusado “sempre que a marca ou algum dos seus elementos contenha sinais que sejam susceptíveis de induzir em erro o público, nomeadamente sobre a natureza, qualidades, utilidade ou proveniência geográfica do produto ou serviço a que a marca se destina”.
As marcas discutidas nos presentes autos são as seguintes:
Marca n.º
Marca
N/XXXXXX

N/XXXXXX

N/XXXXXX

N/XXXXXX


Analisadas as marcas em causa, claro é que não resultam das suas letras ou palavras utilizadas nem dos sinais gráficos qualquer ligação com a advocacia ou com os serviços prestados por esta profissão, pelo que não se tratam das marcas susceptíveis de induzir o público em erro “sobre a natureza, qualidades, utilidade ou proveniência geográfica do produto ou serviço a que a marca se destina”.
Daí que, tal como afirma a DSEDT na sua informação elaborada, a composição literal das marcas em crise não implica a indução do consumidor em erro sobre a natureza, qualidade ou outros aspectos dos serviços que se destinam a assinalar e as mesmas marcas, mesmo se destinando a assinalar os serviços jurídicos, não fazem o consumidor acreditar, por engano, que esses serviços sejam serviços de advocacia nem que o seu prestador possua qualidade de advogado profissional.
Assim sendo, não estão em causa sinais susceptíveis de induzir em erro o público, previstos na al. a) do n.º 2 do art.º 214.º do RJPI.

3.3. Da recusa parcial
Pretende a recorrente a recursa parcial do registo das marcas, quanto aos “Serviços Jurídicos”.
Prevê o art.º 216.º do RJPI (Recusa parcial) que “Quando existam fundamentos para recusa do registo de uma marca apenas no que respeita a alguns dos produtos ou serviços para que este foi pedido, a recusa do registo restringe-se apenas a esses produtos ou serviços”.
Ora, estamos perante recurso da decisão administrativa com características de plena jurisdição (e não de mera legalidade, como é regra nos recursos contenciosos), não se limitando o tribunal a anular a decisão administrativa ou a mantê-la, podendo também “…alterar, total ou parcialmente, a decisão recorrida...” sendo que a sentença “…, substitui essa decisão nos precisos termos em que for proferida”, o que resulta do n.º 3 do art.º 279.º do RJPI.2
Ora, é de reafirmar que se nota na lista dos serviços acima transcrita uma excepção referente aos “serviços de contencioso”, exclusivamente prestados pelos advogados ou advogados estagiários, não podendo a recorrida exercer as respectivas actividades.
Daí que não tem a recorrida o interesse legítimo no registo das marcas para assinalar este tipo de serviço, o que impõe a recusa parcial do registo nos termos do art.º 216.º do RJPI.

4. Decisão
Face ao exposto, acordam em julgar parcialmente procedente o recurso, determinando a recursa parcial do registo das marcas em causa, no que respeita apenas aos “serviços de contencioso”.
Sem custas.

Macau, 15 de Setembro de 2021
                Juízes: Song Man Lei (Relatora)
José Maria Dias Azedo
Sam Hou Fai

1 FERRER CORREIA, Lições de Direito Comercial, Universidade de Coimbra, Volume I, 1973, p. 323.
2 Cfr. Ac. do Tribunal de Última Instância, de 23 de Outubro de 2015, Proc. n.º 64/2015.
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34
Processo n.º 102/2021