Processo nº 67/2021 Data: 23.07.2021
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”.
Vícios da matéria de facto.
Reenvio.
SUMÁRIO
1. Sem uma boa “decisão sobre a matéria de facto” – relativamente ao que “provado” ou “não provado” está – (totalmente) inviável é uma justa “decisão de direito”.
Com efeito, dúvidas não existem que toda a decisão tem de ter (necessária e imprescindivelmente) como “fundamento” uma clara, precisa e completa (decisão da) “matéria de facto”.
2. Tal como a “acusação” tem uma estrutura e conteúdo próprios e que não se podem omitir, (cfr., art. 265° do C.P.P.M.), também as “decisões judiciais”, especialmente, as sentenças e acórdãos, devem obedecer a determinados “princípios” na sua elaboração, (cfr., art. 355° a 358° do dito C.P.P.M.), havendo de se ter em conta que as “considerações” pelo Tribunal tecidas em sede de justificação (e fundamentação) da decisão da matéria de facto não se identifica com a (própria) “decisão da matéria de facto” nem tão pouco constitui fundamento (jurídico) do seu (posterior) “enquadramento penal” e subsequente “decisão de direito”, (seja ela condenatória ou absolutória).
3. Aquelas (considerações), tem como razão de ser o (cabal) cumprimento do dever que ao Tribunal cabe de explicitar – exteriorizar, fundamentar – os motivos da sua “convicção” quanto à sua decisão sobre a “matéria de facto” (que do julgamento resultou “provada” ou “não provada”).
4. Porém, adequado não é expor-se em sede de “fundamentação” determinadas “razões da convicção” a que se chegou, e, sem que estas estejam (devidamente) reflectidas (ou inseridas) na “decisão da matéria de facto”, avançar-se para a prolação de uma “decisão de direito” (apenas com base nas referidas “razões”), ficando, assim, o decidido, sem qualquer “apoio” no decidido e constante na (respectiva) decisão da matéria de facto.
5. Constatando-se “contradição insanável da fundamentação” quanto ao que se “diz estar ou ter-se provado”, e ao que, como tal, “consta da decisão da matéria de facto”, o que, por sua vez, acaba por acarretar também o vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão de direito”, imperativo é o “reenvio do processo para novo julgamento” na parte em questão nos termos do art. 418° do C.P.P.M..
O relator,
José Maria Dias Azedo
Processo nº 67/2021
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. Sob acusação do Ministério Público e em audiência colectiva responderam, no Tribunal Judicial de Base, A (甲) e B (乙), respectivamente, (2°) e (5°) arguidos com os restantes sinais dos autos.
Realizada a audiência de julgamento, (e na parcial procedência da acusação deduzida), proferiu-se Acórdão (datado de 09.10.2020, Proc. n.° CR3-20-0023-PCC), onde, em sede do “dispositivo” se decidiu:
- condenar o (2°) arguido A como co-autor da prática de 1 crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009, (na redacção introduzida pela Lei n.° 10/2016), na pena de 7 anos e 6 meses de prisão; e,
- condenar o (5°) arguido B como co-autor da prática de 1 crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 e 14°, n.° 2 da mesma Lei n.° 17/2009, (na redacção introduzida pela Lei n.° 10/2016), na pena de 5 anos e 6 meses de prisão; (cfr., fls. 2056 a 2099 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
*
Em sede dos recursos que do assim decidido interpuseram os ditos (2° e 5°) arguidos, proferiu o Tribunal de Segunda Instância Acórdão de 25.02.2021, (Proc. n.° 8/2021), negando provimento aos recursos; (cfr., fls. 2410 a 2448).
*
Ainda inconformados, trazem os mesmos (2° e 5°) arguidos os presentes recursos; (cfr., fls. 2472 a 2516 e 2517 a 2571).
*
Após resposta do Exmo. Magistrado do Ministério Público pugnando pela sua improcedência, (cfr., fls. 2578 a 2585), e remetidos os autos a esta Instância, foram os mesmos objecto de adequada tramitação processual, com douto Parecer do Ministério Público opinando também no sentido da confirmação do decidido; (cfr., fls. 2602 a 2610).
*
Nada obstando, cumpre apreciar e decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. O Tribunal Judicial de Base deu como “provada” e “não provada” a matéria de facto constante de fls. 2065 a 2075-v que foi pelo Tribunal de Segunda Instância integralmente confirmada e que, oportunamente, se fará adequada referência.
Do direito
3. Dois são os recursos trazidos a este Tribunal no âmbito dos presentes autos.
O primeiro, (de acordo com a data da sua apresentação), do (5°) arguido B, pedindo, a final, a sua absolvição pela prática do crime previsto e punido pelo art. 14°, n.° 2, e art. 8°, n.° 1, da Lei n.° 17/2009, pelo qual foi condenado, “passando a ser punido exclusivamente ao abrigo do art. 14°, n° 1 ou, subsidiariamente, por um crime de tráfico de menor gravidade nos termos do previsto no art. 11°, n° 1, alínea 1) da mesma Lei, reduzindo-se a pena de 5 anos e 6 meses de prisão para uma pena nunca superior a 15 meses de prisão, suspensa na sua execução”, “ou, reenviados os autos para novo julgamento, destinado ao apuramento da quantidade da droga apreendida ao aqui Recorrente que se destinava para consumo pessoal, e a quantidade da mesma que se destinava a ser cedida a terceiros, com as subsequentes consequências em matéria de qualificação jurídica dos factos e determinação da ilicitude, culpa e pena(s) em concreto a aplicar (…)”; (cfr., fls. 2515 a 2516).
O segundo, do (2°) arguido A, que termina a sua motivação de recurso pedindo que “se absolva o arguido da prática do crime consumado p. e p. pelo art.° 8.° da Lei n.° 17/2009, passando a ser condenado pelo crime previsto no art.° 11.° dessa Lei, ou, subsidiariamente, pela forma tentada do crime do art.° 8.°. Também subsidiariamente, devem ser julgados procedentes os vícios apontados ao Acórdão recorrido, ordenando-se a sua sanação através do reenvio da causa para novo julgamento”; (cfr., fls. 2571).
Analisados os autos, ponderada a decisão recorrida, e em face do peticionado, mostra-se-nos desde já de consignar o que segue.
3.1 Como resulta do que até aqui se deixou relatado, por ambos os recorrentes vêm colocadas “questões” relacionadas com o “enquadramento jurídico-penal” efectuado à factualidade apurada, e, subsidiariamente, relativamente à própria “decisão da matéria de facto”.
Porém, não obstante (apenas) pedirem o “reenvio do processo para novo julgamento” – em consequência dos vícios que imputam à decisão da matéria de facto – a título “subsidiário”, evidente se nos apresenta que há que se começar por apreciar da adequação e acerto da dita “decisão da matéria de facto”, pois que – como igualmente óbvio e lógico se nos mostra – sem uma “boa decisão” relativamente ao que “provado” – ou “não provado” – está, (ou devia estar), totalmente inviável é uma justa “decisão de direito”.
Nesta conformidade, (e não estando esta Instância vinculada a conhecer das questões pelos recorrentes suscitadas na mesma ordem em que estes as colocam), vejamos.
Nos termos do art. 400° do C.P.P.M.:
“1. O recurso pode ter como fundamento quaisquer questões de direito de que pudesse conhecer a decisão recorrida.
2. O recurso pode ter também como fundamentos, desde que o vício resulte dos elementos constantes dos autos, por si só ou conjugados com as regras da experiência comum:
a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) A contradição insanável da fundamentação;
c) Erro notório na apreciação da prova.
3. O recurso pode ainda ter como fundamento a inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada”.
Por sua vez, preceitua o art. 415° do mesmo código que:
“1. Quando tenha havido documentação das declarações prestadas oralmente perante o tribunal singular ou o tribunal colectivo, o Tribunal de Segunda Instância admite a renovação da prova se se verificarem os vícios referidos nas alíneas do n.º 2 do artigo 400.º e houver razões para crer que aquela permitirá evitar o reenvio do processo.
2. A decisão que admitir ou recusar a renovação da prova é definitiva e fixa os termos e a extensão com que a prova produzida em primeira instância pode ser renovada.
3. Se for determinada a renovação da prova, o arguido é convocado para a audiência.
4. Salvo decisão do tribunal em contrário, a falta de arguido regularmente convocado não dá lugar ao adiamento da audiência”.
E, sobre a questão agora em apreciação, vale também a pena atentar no estatuído no art. 418° do dito código, onde se dispõe que:
“1. Sempre que, por existirem os vícios referidos nas alíneas do n.º 2 do artigo 400.º, não for possível decidir da causa, o tribunal a que o recurso se dirige determina o reenvio do processo para novo julgamento relativamente à totalidade do objecto do processo ou a questões concretamente identificadas na decisão de reenvio.
2. Se o reenvio for de processo do tribunal singular, o novo julgamento compete ao tribunal colectivo.
3. Se o reenvio for de processo do tribunal colectivo, o novo julgamento compete a tribunal colectivo formado por juízes que não tenham intervindo na decisão recorrida”.
Em síntese que se tem como adequada (e atenta a questão a tratar), resulta dos transcritos preceitos legais que a impugnação da “decisão da matéria de facto” pode ter como fundamento qualquer dos “vícios” que se encontram enunciados nas “alíneas a), b) e c)” do n.° 2 do transcrito art. 400° do C.P.P.M. que, se existentes na decisão recorrida, dão lugar ao “reenvio do processo para novo julgamento” no Tribunal Judicial de Base nos termos do art. 418°, no caso de possível não ser a sua sanação com recurso à “renovação da prova” no Tribunal de recurso; (cfr., art. 415°).
Notando-se desde já que – não obstante serem os aludidos “vícios” de conhecimento oficioso; cfr., v.g., os Acs. deste T.U.I. de 30.07.2001, Proc. n.° 11/2001, de 30.05.2002, Proc. n.° 7/2002, de 01.11.2017, Proc. n.° 47/2017, de 31.07.2020, Proc. n.° 51/2020 e de 27.11.2020, Proc. n.° 193/2020 – não está esta Instância vocacionada para a dita “renovação da prova”, (cfr., o dito art. 415° que apenas se refere ao “T.S.I.”, podendo-se também, v.g., ver o Ac. deste T.U.I. de 10.10.2017, Proc. n.° 35/2007, onde se considerou que “O Tribunal de Última Instância, em recurso jurisdicional, em 3.º grau de jurisdição, não procede a renovação de prova, nos termos do artigo 415.º do Código de Processo Penal”), continuemos, mostrando-se, agora, também oportuna, uma outra “nota”.
É, a seguinte:
Com base na acusação pelo Ministério Público deduzida em sede do Inquérito que deu origem aos presentes autos, (cfr., fls. 1629 a 1638), foram levados a julgamento no Tribunal Judicial de Base 12 arguidos, (todos identificados nos autos).
Após audiência de julgamento, proferiu o dito Tribunal o Acórdão de 09.10.2020 a que atrás já se fez referência, julgando “parcialmente procedente” a dita acusação, e condenando – na parte que agora interessa – os (2° e 5°) arguidos, ora recorrentes, nos termos a que igualmente já se fez referência; (cfr., fls. 2056 a 2099 e pág. 2 deste aresto, e que, mais adiante, se irá decidir do seu acerto).
Ora, atento o número de arguidos, a extensão da acusação, (com 59 artigos), e a decisão da sua parcial procedência, inevitável, (normal), é que a matéria constante da acusação não seja (total e absolutamente) idêntica à que surge como “provada” no Acórdão a final da audiência de julgamento prolatado, sendo, assim, também obviamente possível que artigos da acusação, (ou parte deles), sejam objecto de uma outra, (ou nova) “redacção”, (em conformidade com o que da audiência de julgamento resultou provado ou não provado).
Por sua vez, cabe igualmente referir que, se ao que se deixou notado se aliar uma, (infelizmente, muitas vezes) não muito objectiva, precisa e (tanto quanto possível) completa descrição (factual) da conduta de cada um dos (vários) intervenientes, expectável (e compreensível) se mostra o seu inconformismo em relação ao que se vier a decidir, (dando-se lugar a recursos como os que, no caso, pelos 1°, 2°, 4°, 5° e 6° arguidos foram interpostos para o Tribunal de Segunda Instância, e, agora, pelos 2° e 5° arguidos trazidos a este Tribunal de Última Instância).
Todavia, importa deixar também claro que tal, (ainda que possa, eventualmente, parecer), não implica que se considere, necessariamente, que toda e qualquer “alteração da matéria de facto” constante da acusação em resultado do que do julgamento resultou provado ou não provado tenha sido efectuada de forma “ilegal” (e em “prejuízo” dos arguidos), ou que se tenha incorrido em qualquer dos “vícios” a que já nos referimos…
Útil se nos apresentando ter em conta o que se deixou consignado, cremos ser sabido que vasta e abundante é a doutrina e jurisprudência sobre o sentido e alcance dos ditos “vícios da decisão da matéria de facto”; (cfr., v.g., entre muitos, Manuel Leal-Henriques in, “Anotação e Comentário ao C.P.P.M.”, Vol. III, pág. 217 a 276, onde são citados diversos outros autores que tratam do tema, com referências a um grande número de decisões judiciais sobre o mesmo, abundantes sendo também os arestos em sede dos quais tem esta Instância, repetidamente, tratado e emitido pronúncia sobre os aludidos “vícios da decisão da matéria de facto” e para onde se remete, podendo-se, v.g., cfr., para se citar os mais recentes, os Acs. de 22.01.2020, Proc. n.° 126/2019; de 01.07.2020, Proc. n.° 9/2020; de 31.07.2020, Proc. n.° 51/2020; de 21.10.2020, Proc. n.° 148/2020; de 27.11.2020, Proc. n.° 193/2020 e de 05.05.2021, Proc. n.° 40/2021).
3.2 Isto dito, passa-se a conhecer do recurso do (2°) arguido A.
Atento o teor da decisão proferida pelo (Tribunal Judicial de Base e pelo) Tribunal de Segunda Instância, e ponderando (em tudo) no que pelo recorrente vem alegado – notando-se que na sua motivação de recurso vem produzidas “90 conclusões” – temos para nós que, as questões suscitadas, (e agora, focando-nos nas que coloca) em relação à “decisão da matéria de facto”, constituem, apenas, (com todo o respeito o dizemos), “falsas questões”, e que, se bem ajuizamos, vem apresentadas por deficiente compreensão do seu (verdadeiro) sentido, à qual se alia um menos adequado entendimento quanto ao seu (correcto) “enquadramento jurídico-penal” atento os elementos típicos – objectivos e subjectivos – do crime pelo qual foi condenado.
Aliás, compreende-se, (perfeitamente), o ponto de vista do ora recorrente, que, (como é natural), bate-se, a todo o custo, por uma decisão que lhe seja mais favorável, (com uma condenação por crime menos grave, e em pena mais leve), o que, por sua vez, o leva a dar (indevida) relevância a (pequenos) pormenores que, em face da “globalidade da factualidade apurada (e não controvertida)” – mas que, sem dúvida, se nos mostra de reconhecer que podia ser mais explícita e precisa – não tem, como é bom de ver, a (necessária) consistência para (produzir) os “efeitos” que pretende alcançar, (afigurando-se de aqui realçar também que, a título “principal”, pretende o recorrente uma condenação que lhe seja mais “favorável”, e, tão só, subsidiariamente, não sendo aquela atendida, o reenvio do processo para novo julgamento com base nos vícios da matéria de facto, o que, em nossa opinião, não deixa de reflectir o que se deixou consignado).
Dest’arte, e apresentando-se-nos igualmente de notar que o que em relação aos ditos “vícios” alega o recorrente constitui apenas uma “repetição” do antes (já) alegado perante o Tribunal de Segunda Instância, que, com adequada fundamentação, (que se mostra de acolher), os deu como inexistentes, mostra-se de se consignar, (abreviadamente), que na parte em questão, (e relativamente ao ora recorrente), não se verificam nenhum dos já referidos “vícios da matéria de facto”, pois que investigada, (e objecto de, na medida do possível, expressa pronúncia), foi toda a “matéria objecto do processo”, não se vislumbrando, igualmente, qualquer “contradição insanável da fundamentação” ou “erro notório na apreciação da prova”, pois que a convicção sobre aquela foi correctamente formada com base na livre apreciação de todos os elementos probatórios existentes e produzidos em julgamento, (em especial, nas declarações dos próprios arguidos assim como nos depoimentos das testemunhas, no caso, nomeadamente, de agentes da Polícia Judiciária), em integral respeito do princípio consagrado no art. 114° do C.P.P.M. e das regras sobre o valor das provas, (legais ou tarifadas), regras de experiência ou legis artis, apresentando-se, também, a decisão inteligível e isenta de quaisquer incongruências.
–– Nesta conformidade, passemos, assim, e sem mais demoras, para a – verdadeira razão do inconformismo do ora recorrente e que tem a ver com a – “qualificação jurídico-penal” da sua conduta evidenciada na matéria de facto dada como provada.
Pois bem, como se viu – enquanto “2° arguido” – foi o ora recorrente condenado pela prática de 1 crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009; (na redacção introduzida pela Lei n.° 10/2016).
E, (independentemente do demais), em nossa opinião, em face do que “provado” está (e que, como já se viu, não merece censura), correcta se apresenta a referida decisão.
Com efeito, está, nomeadamente, provado que:
- “A PJ constatou, nas suas investigações contra grupos criminosos ou actividades de tráfico de drogas, que o 1° arguido de Hong Kong ia frequentemente a Macau para dedicar-se às actividades de tráfico de droga. Após a investigação, apurou-se que o 1° arguido tinha relação próxima com os 2° e 7° arguidos que viviam em Macau”, (cfr., facto 2°);
- “De acordo com as necessidades de atendimento aos clientes de Macau para compra de drogas, o 2° arguido contactou com os membros do grupo criminoso de tráfico de drogas em Hong Kong C (丙) e o 1° arguido, e pediu ao 1° arguido que levasse as drogas (de D (丁) quem era responsável por fornecimento de drogas em Hong Kong) de forma não periódica para Macau.
Os 3ª e 4º arguidos trouxeram as drogas necessárias do Interior da China para Macau, pessoalmente ou através de terceiros, e distribuíram as drogas para vender.
Em seguida, o 2° arguido, como “intermediário de drogas”, providenciou a distribuição das drogas obtidas das duas fontes supracitadas e deixou uma pequena parte para consumo pessoal.
(…)”, (cfr., facto 3°);
- “Nos dias 2, 8 e 18 de Abril de 2019, o 1º arguido veio a Macau por várias vezes através do Terminal Marítimo para contactar com o 2º arguido e fez negócios de drogas. Em seguida, o 1º arguido apanhou navio e voltou para Hong Kong”, (cfr., facto 5°);
Por sua vez, está também, (e em síntese), provado, que:
- no dia 19.04.2019, os mesmos (1° e 2°) arguidos pretenderam fazer outra transacção de estupefaciente, pelo que, em conformidade com o previamente combinado, o 1° arguido veio de Hong Kong a Macau, trazendo consigo 23,8g de “Ketamina” e 0,292g de “Cocaína”, mas em resultado da actuação da Polícia Judiciária, acabaram ambos detidos antes de concretizar a transacção, (cfr., factos 6° a 10°); e que,
- “Os agentes da PJ encontraram na posse do 2º arguido um telemóvel de cor prateado (marca: IPHONE, modelo: A1524, com um cartão SIM “CTM 4G+”, n.º 8985301917101576456), e um telemóvel de cor preta (marca: IPHONE, modelo: A1661, com um cartão SIM “cartão pré-pago da China Telecom UM128K Greater Bay Area”, n.º 8985307188853289184E) e o dinheiro em numerário no valor de HKD$4.700,00, estes dois telemóveis e o dinheiro eram instrumentos de contacto e produtos do crime do 2º arguido nas actividades tráfico de drogas”; (cfr., facto 13°);
Para além disto, provou-se, também, que:
- “E (戊) (9ª arguida), amiga do 2° arguido, tendo tomado conhecimento de que este vendia droga, contactou o mesmo, na madrugada do dia 26 de Março de 2019, para comprar droga (cocaína) para o seu consumo pessoal, pagando por isso certa quantia”, (cfr., facto 48°); e que,
- “Em finais de Março de 2019, F (己) (10° arguido) contactou telefonicamente o 2° arguido para comprar droga – ketamina – para o seu consumo pessoal”; (cfr., facto 49°).
Ora, perante esta “factualidade” – que diga-se, melhor seria que fosse mais “precisa”, mas que, ainda assim, se apresenta suficientemente clara e sólida para efeitos de com ela se decidir de direito – cabe consignar que não se pode acolher a pretensão do recorrente que pugna por uma “alteração da qualificação jurídico-penal” da sua conduta, pedindo que “se absolva o arguido da prática do crime consumado p. e p. pelo art.° 8.° da Lei n.° 17/2009, passando a ser condenado pelo crime previsto no art.° 11.° dessa Lei, ou, subsidiariamente, pela forma tentada do crime do art.° 8.°”; (cfr., fls. 2571).
Então – e como se pode verificar da referida matéria de facto dada como provada e atrás retratada – não praticou, o ora recorrente, (de forma repetida), actos típicos que – para o que agora interessa – integram todos os elementos objectivos e subjectivos do crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”, tendo adquirido, por diversas vezes, quantidades de substâncias proibidas cuja maior parte destinava à “venda a terceiros”, (como efectivamente sucedeu com as aquisições efectuadas junto do 1° arguido em 2, 8 e 18 de Abril, e vendas em finais de Março ao 9° e 10° arguidos), vindo a ser surpreendido no dia 19 de Abril quando se preparava para fazer uma outra “transacção”, (de 23,8g de Ketamina e 0,292g de Cocaína com o 1° arguido), estando na posse de HKD$4.700,00 que era “produto do crime”?
Ora, sem prejuízo do muito respeito devido a outro entendimento, não se nos parece que possa haver qualquer dúvida – minimamente séria e razoável – sobre tal “realidade”…
Na verdade, não se pode também olvidar que o crime de “tráfico ilícito de estupefacientes” é um crime apelidado de “trato sucessivo”, (podendo por isso ser considerado um crime “naturalmente continuado”), onde se pondera, não só as porções de droga que em dado momento se apuram, sendo de se ter (antes) em conta (toda) a quantidade traficada durante determinado período de tempo; (cfr., v.g., Helena Moniz in, “Crime de Trato Sucessivo”, Revista Julgar, 2018, podendo-se, também, no mesmo sentido, cfr., os Acs. do T.S.I. de 08.06.2000, Proc. n.° 93/2000, de 15.03.2001, Proc. n.° 200/2000, de 06.03.2003, Proc. n.° 27/2003 e de 12.06.2003, Proc. n.° 107/2003).
Questiona, ainda, o recorrente, a sua “co-autoria com o 1° arguido”.
Porém, provados estando os factos a que se fez referência, e que “Os 1° e 2° arguidos, agindo em comunhão de intentos e com distribuição de tarefas com outrem, praticaram dolosamente em Macau actos de tráfico de estupefacientes, com o propósito de obterem, para si ou para outrem, vantagens pecuniários. (…)”, (cfr., facto 56°), e que “Os 1º e 2º arguidos, bem sabendo a natureza estupefaciente de ketamina e cocaína, procederam dolosamente à venda das referidas substâncias em Macau, ou participaram nos planos destinados ao tráfico dos mesmos produtos. (…)”, (cfr., facto 57°), mais também não se mostra de dizer sobre este ponto.
Por fim, atenta a moldura penal em questão – 5 a 15 anos de prisão – e tendo presente o que “provado” está – que demonstra um “dolo directo e intenso”, aliada a uma forte necessidade de “prevenção criminal” – excessiva ou inflacionada também não se mostra a pena de 7 anos e 6 meses de prisão aplicada, (a 2 anos e 6 meses do seu “mínimo legal”, a 2 anos e 6 meses do “meio da pena”, e a 7 anos e 6 meses do seu limite máximo).
Isto dito, e constatada a improcedência do recurso do (2°) arguido A, continuemos.
3.3 Passemos, sem mais demoras, para o recurso do (5°) arguido B.
Pois bem, antes de mais, e dando-se aqui como reproduzido tudo o que se consignou em relação ao sentido e alcance dos “vícios da matéria de facto”, vejamos.
Em relação ao ora recorrente, (e com relevo para a decisão a proferir), eis o que consta da matéria de facto dada como provada:
- “(…) G (ora 3ª arguida) e H (ora 4º arguido) praticaram as actividades de tráfico de drogas (transfronteiriças) em Macau (…)”, (cfr., facto 1°);
- “(…) Os 3ª e 4º arguidos trouxeram as drogas necessárias do Interior da China para Macau, pessoalmente ou através de terceiros, e distribuíram as drogas para vender (…)”, (cfr., facto 3°);
- “Os 3ª, 4º e 5º arguidos procederam a entrega de drogas de acordo com as exigências de clientes.
Além disso, os 3ª e 5º arguidos exigiram aos clientes que encomendaram drogas que depositassem o dinheiro associado a drogas na conta bancária aberta pelo 6º arguido em seu nome pessoal (titular: I, n.º XXXXXXXXXXXXXXXXX) por meio de transferência bancária on-line ou depositassem o dinheiro através das ATMs, em seguida, a 3ª arguida auxiliou o levantamento de uma parte de dinheiro associado a drogas e entregou-o à 3ª arguida”, (cfr., facto 4°);
- “Em 8 de Maio de 2019, os 3ª e 4º arguidos alojavam no quarto n.º XXXX do [Hotel]”, (cfr., facto 16°);
- “Em 9 de Maio de 2019, por volta das 06h30 da tarde, os 3ª e 4º arguidos dirigiram-se ao [Centro de Máquinas de Diversão] perto da Rua da Alegria para reunir-se com o 6º arguido”, (cfr., facto 17°);
- “No mesmo dia, por volta das 09h00 da noite, os três arguidos foram à [Loja] sita na [Edifício], Istmo de Ferreira do Amaral para conversar”, (cfr., facto 18°);
- “No mesmo dia, por volta das 09h20 da noite, a 3ª arguida saiu sozinho e caminhou até ao passeio para peões na Estrada do Cavaleiros, perto do [Edifício], encontrou o 5º arguido que acabou de conduzir até lá. Na altura, os 3ª e 5º arguidos procederam imediatamente à entrega de drogas, e depois, a 3ª arguida foi embora imediatamente, enquanto o 5º arguido também saiu de veículo. Os agentes da PJ interceptaram o 5º arguido”, (cfr., facto 19°);
- “Os agentes da PJ encontraram na mala do 5º arguido um saco plástico transparente de tamanho médio, que continha 4 pacotes plásticos transparentes com cristais brancos, com peso de cerca de 1,19g, 1,2g, 1,23g e 1,27g respectivamente (incluindo os sacos plásticos), no total de cerca de 4,89g”, (cfr., facto 20°);
- “Submetidos a exame laboratorial (fls. 723 dos autos), revelou-se que os cristais brancos num saco plástico transparente encontrado na mala do 5º arguido, com o peso líquido de 3,631g, continham “Ketamina”, substância abrangida na Tabela II-C da Lei n.º 17/2009, a análise quantitativa revelou que a percentagem de “Ketamina” era de 84,3%, com peso de 3,06g”, (cfr., facto 21°);
- “Os agentes da PJ encontraram na posse do 5º arguido um telemóvel de cor roxa (marca: HUAWEI, modelo: EML-ALOO, com dois cartões SIM n.ºs 8985301917101687809 e 8986011707620001535E) e o dinheiro em numerário no valor de HKD$ 2.000,00, esses dois telemóveis eram instrumentos de contacto do 5º arguido nas actividades de tráfico de drogas”, (cfr., facto 22°);
- “Em seguida, os agentes da PJ levaram os 3ª, 4º, 5º e 6º arguidos ao Centro Hospitalar Conde S. Januário para se submeterem ao teste de drogas, os resultados mostraram que apenas 5º arguido tinha reacção positiva”, (cfr., facto 35°);
- “Em Março de 2019, o 12º arguido tomou conhecimento de que J vendia droga (ketamina)”, (cfr., facto 53°);
- “No dias 24, 27 e 29 de Abril e 4, 7 e 9 de Maio, de 2019, o 12º arguido adquiriu várias vezes a J ketamina para consumo pessoal. As transacções sempre se realizaram por transferências bancárias electrónicas – o 12° arguido usou a sua conta bancária pessoal (n.º XXXXXXXXXXXXXXXXX) para transferir o dinheiro destinado à aquisição de droga para a conta (n.º XXXXXXXXXXXXXXXXX) indicada por J. J pediu ao 5º arguido para entregar droga ao 12º arguido”, (cfr., facto 54°);
- “(…) Os 3ª a 5º arguidos, agindo em comunhão de vontades e com distribuição de tarefas com outrem, praticaram dolosamente em Macau actos de tráfico de estupefacientes, com o propósito de obterem, para si ou para outrem, vantagens pecuniários (…)”, (cfr., facto 56°); e,
- “(…) Os 3ª a 5º arguidos, bem sabendo a natureza estupefaciente de ketamina, procederam dolosamente à venda da referida substância em Macau, ou participaram nos planos destinados ao tráfico do mesmo produto (…)”, (cfr., facto 57°).
Aqui chegados, (e tendo resultado não provado que “o montante de HKD$2.000,00 encontrado na posse do 5° arguido era produto do crime de tráfico”), «quid iuris»?
Diz o recorrente que da factualidade dada como provada no “ponto 19°”, apurado não está em que termos ocorreu a dita “entrega de drogas”, (ou seja, “quem entregou a quem”), assim como qual o “destino” da “Ketamina” encontrada na sua posse, em quantidade de 3,06g, e, assim, excedendo apenas em 0,06g a correspondente à quantidade de referência para uso diário por 5 dias, considerando, também, que as considerações tecidas em sede de fundamentação da decisão da matéria de facto se apresentam “infundadas e contraditórias”.
Ora, cremos que, (pelo menos, em parte), tem o recorrente razão.
Pois bem, dúvidas não parece que possam existir – e atrás já o referimos – que uma “decisão”, (e seja ela qual for), tem de ter necessária e imprescindivelmente como “fundamento”, uma clara, precisa e completa (decisão da) “matéria de facto”.
E como também já se reconheceu, os presentes autos, infelizmente, não constituem um (bom) exemplo da referida “clareza” e “precisão”, (especialmente, e como cremos se irá ver, no que diz respeito à “conduta do ora recorrente”).
Por outro lado, cabe também consignar, (e salientar), que tal como a “acusação” tem uma estrutura e conteúdo próprios e que não se podem omitir, (cfr., art. 265° do C.P.P.M.), também as “decisões judiciais”, especialmente, as sentenças e acórdãos, devem obedecer determinados “princípios” na sua elaboração, (cfr., art. 355° a 358° do dito C.P.P.M.), havendo de se ter em conta que as “considerações” pelo Tribunal tecidas em sede de justificação (e fundamentação) da decisão da matéria de facto não se identifica com a (própria) “decisão da matéria de facto”, nem tão pouco constituem fundamentos (jurídicos) do seu (posterior) “enquadramento (penal)” e (subsequente) “decisão de direito”, (seja ela condenatória ou absolutória).
Aquelas (considerações), tem como razão de ser o (cabal) cumprimento do dever que ao Tribunal cabe de explicitar – exteriorizar, fundamentar – os motivos da sua “convicção” quanto à sua decisão sobre a “matéria de facto” (que do julgamento resultou “provada” ou “não provada”).
Porém, adequado não é expor-se em sede de “fundamentação” determinadas “razões da convicção” a que se chegou, (referindo-se, v.g., a “factos” referidos por co-arguidos ou testemunhas), e, sem que estes estejam (devidamente) reflectidos (ou inseridos) na “decisão da matéria de facto”, avançar-se para a prolação de uma “decisão de direito” (apenas com base nas referidas “razões”), ficando, assim, o decidido, sem qualquer “apoio” (e correspondência com o decidido e constante) na (respectiva decisão da) matéria de facto.
No caso, e estando o ora recorrente inicialmente acusado da prática de um crime de “tráfico ilícito de estupefacientes” do art. 8°, n.° 1, e um outro de “consumo ilícito de estupefacientes”, do art. 14°, n.° 1, ambos da Lei n.° 17/2009, acabou condenado como co-autor da prática de 1 crime (a que se apelidou) de “tráfico ilícito de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 e 14°, n.° 2 da mesma Lei n.° 17/2009, (na redacção introduzida pela Lei n.° 10/2016), na pena de 5 anos e 6 meses de prisão.
Porém, (e independentemente do demais), importa atentar que, em sede de “decisão da matéria de facto”, (cfr., facto 19°), apurado não está como ocorreu a “entrega ou transacção de droga entre a 3ª e o 5° arguido”, ora recorrente, o mesmo sucedendo com o seu (projectado) “destino”, (sendo de notar, também, que o “facto 54°”, apenas refere que ao arguido “foi pedido para entregar droga”, não explicitando, concretamente, se o pedido foi aceite e se a entrega ocorreu), correcta não se apresentando, assim, a dita “decisão condenatória” proferida.
Ora, é verdade – não se nega – que na dita “decisão” são feitas “referências” (embora “vagas” e “genéricas”), sobre a conduta do recorrente, e que, em sede de “fundamentação”, se tecem “considerações” – igualmente vagas – quanto a tais “aspectos”…
Contudo, como se disse, toda a “decisão de direito”, (e, no caso, uma “decisão condenatória” como a que vem impugnada), não pode prescindir de uma directa, segura, e consistente correspondência e sustentação na “factualidade” dada como provada (ou não provada), de nada valendo para a mesma (meras) referências abstractas e “conclusivas”, assim como “considerações” (tecidas em sede de “fundamentação da convicção” sobre a matéria de facto) que não estejam (claramente) aí incluídas como “matéria de facto” (provada).
In casu, (em nossa opinião), foi o que sucedeu.
A “decisão condenatória” do ora recorrente proferida pelo Tribunal Judicial de Base, e, posteriormente, confirmada pelo Tribunal de Segunda Instância, assenta – essencialmente – em “considerações” expendidas em sede de “fundamentação da convicção” da decisão da matéria de facto, mas nesta não incluídas e elencadas.
Demonstrativo do que se deixou consignado é, (v.g.), o seguinte excerto do Acórdão do Tribunal de Segunda Instância que de seguida se passa a transcrever:
“(…) dos factos dados como provados e da convicção fáctica do Tribunal a quo (fls. 2084 e v) resulta demonstrado lapidarmente que o 5º arguido B fez parte da actividade de tráfico de estupefacientes dos 3ª e 4º arguidos – ele obteve drogas, em nome dos seus clientes, a estes últimos, e depois as vendeu a terceiros. Tendo analisado o teor das conversações de Wechat, o Tribunal a quo deu como provado que os estupefacientes entregues ao 5º arguido pela 3ª arguida no dia dos factos destinavam-se à venda a terceiros, e não ao seu consumo pessoal (como declarou o 5º arguido), ainda que ele tivesse consumido droga antes de ser interceptado e testado positivo no exame de urina. Obviamente, o Tribunal a quo não acreditou nas declarações do 5º arguido, tendo considerado, antes, que todas as drogas que lhe foram apreendidas destinavam-se à venda. Além disso, é de realçar que o 5º arguido exerceu a actividade de tráfico de estupefacientes há muito tempo, pelo que o crime que lhe foi imputado justificou-se não só pelo facto de no dia dos factos ter-se encontrado na sua posse ketamina com quantidade superior à de referência de 5 dias de uso (ou seja, 5,1 vezes a quantidade de referência de uso diário). Foi também por esta razão que o Tribunal a quo não aceitou a sua declaração relativa ao consumo pessoal e condenou-o, separadamente, num crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias previsto e punido pelo artigo 14.º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009 (alterada pela Lei n.º 10/2016).
De resto, tal como refere o Exmo. Magistrado do MP na sua resposta ao recurso do 5º arguido, da análise das provas documentais e das declarações prestadas por outros arguidos e pelas testemunhas resulta que o 5º arguido desempenhou desde há muito o papel de intermediário dos 3ª e 4º arguidos: obteve drogas aos dois arguidos e depois as vendeu a terceiros, incluindo ao 12º arguido; também foi encarregado de depositar o dinheiro recebido da venda de drogas na conta bancária dos 3ª e 6º arguidos. Ele participou activamente na actividade de tráfico de estupefacientes, fazendo assim uma parte imprescindível da mesma.
(…)”; (cfr., fls. 2430 a 2430-v e 140 a 142 do Apenso).
Por sua vez, e quiçá, atribuindo-se indevida relevância às referidas “considerações”, entendeu-se que a “matéria de facto dada como provada” (que como se referiu, não tem correspondência com as aludidas “considerações”), era “suficiente” (e bastante) para se proferir uma (boa) decisão de direito, (com a condenação do arguido nos termos já referidos), sem se esclarecer e consignar, (cabalmente) – em sede da “decisão da matéria de facto” – qual a “origem” do estupefaciente encontrado na posse do recorrente, e qual o seu “destino”, (inegável se nos apresentando a relevância de tais “realidades”, até mesmo para efeitos da “medida concreta da pena” a fixar).
Como (igualmente) já se consignou, compreende-se que o julgamento de processos com vários (ou um grande número de) arguidos e com uma extensa acusação apresente complexidades (várias).
Porém, tal não pode significar (ou implicar) uma dispensa do Tribunal em averiguar e investigar – até ao limite das suas possibilidades – se a “acusação” (ou pronúncia) que impende sobre o(s) arguido(s) é justa e fundada, esclarecendo, o que efectivamente sucedeu, e vertendo, em sede de decisão da matéria de facto, o que resultou apurado e, indicando, assim, de forma objectiva, exacta, e precisa, o que se provou ou não provou.
Ora, em nossa opinião, não foi o que nos presentes autos sucedeu, incorrendo-se, assim, em “contradição insanável da fundamentação” quanto ao que se “diz estar ou ter-se provado”, e ao que, como tal, “consta da decisão da matéria de facto”, o que, por sua vez, acaba por acarretar também o vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão de direito” que, por não serem susceptíveis de sanação em sede do presente recurso, implica o “reenvio do processo para novo julgamento” na parte em questão nos termos do art. 418° do C.P.P.M., (prejudicadas ficando as restantes questões pelo recorrente colocadas).
Decisão
4. Nos termos e fundamentos que se deixam expostos, em conferência, acordam:
- negar provimento ao recurso do (2°) arguido A; e,
- conceder provimento ao recurso do (5°) arguido B, ordenando-se o reenvio do processo para novo julgamento nos exactos termos consignados.
Pelo decaimento pagará o (2°) arguido A a taxa de justiça de 10 UCs.
Registe e notifique.
Macau, aos 23 de Julho de 2021
Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei
Proc. 67/2021 Pág. 20
Proc. 67/2021 Pág. 21