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Processo nº 561/2021
(Autos de recurso em matéria cível)

Data : 11 de Novembro de 2021

Recorrente : Sociedade de Investimento Predial e Imobiliário A (Macau), Limitada

Objecto do Recurso : Despacho que ordenou a suspensão da instância (命令中止訴訟程序之批示)

Ré : Companhia de Investimento Comercial e Fomento Predial B Limitada (B有限公司)

*
   Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

Nota preliminar:
Foi apresentado pelo Exmo. Juíz Relator o projecto do acórdão deste processo com o seguinte teor:

I

No âmbito dos autos de exame judicial à sociedade, requerido pela Sociedade de Investimento Predial e Imobiliário A (Macau) Limitada contra a Companhia de Investimento Comercial e Fomento Predial B Limitada, e que corre os seus termos no 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base sob o nº CV1-20-0025-CPE, foi pelo despacho seguinte determinada a suspensão da instância a requerimento da requerida B Limitada:
*
  - O pedido de suspensão
  Os Requeridos pedem a suspensão de instância até à decisão final do processo judicial n.º CV3-20-0070-CAO, invocando que o presente processo se encontrar dependente da decisão proferida no âmbito do referido processo e no processo de rectificação do registo entretanto instaurado por a decisão sobre a invalidade e ineficácia da cessão da quota detida na SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA e de nomeação de C como gerente desta sociedade poder originar a falta de legitimidade representativa da Requerente por C.
  A Requerente opôs o pedido de suspensão porque o processo n.º CV3-20-0070-CAO vai ser um processo longo e complexo e a Requerida instaurou a referida acção como manobra dilatória.
  Cumpre decidir.
  Os Requeridos defendem que a transmissão da quota da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA detida inicialmente pela A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED para C é inválida por não se encontrar demonstrado que o Senhor G tinha legitimidade de transmitir a referida quota, e a transmissão da quota em causa é ineficaz perante a SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA, ora Requerente, por não ter obtido o consentimento escrito desta sociedade. Por essa razão, C não tem qualidade de sócio da Requerente e as deliberações outorgadas por C são nulas, incluindo a designação de C como gerente da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA. Consequentemente, a procuração outorgada por C como gerente da Requerente cuja pública-forma se junto a fls. 239 a 242 é irregular.
  No fundo, o que os Requeridos estão a por em causa é a procuração outorgada por C em representação da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA, ora Requerente.
  De fls. 539 a 549 resulta que o 1.º Requerido pediu declaração de nulidade de cessão da quota com o valor nominal de MOP$80,000.00 realizada a favor de C, declaração de nulidade de todas as deliberações da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA tomadas na assembleia geral de 15 de Janeiro de 2019, cancelamento dos registos de tais deliberações junto da Conservatória do Registo Comercial de Macau sob AP.20/26112018, AP.27/22012019 e AP.28/22012019 e declaração de nulidade da procuração outorgada em 16 de Janeiro de 2019 por C, em representação da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA no processo n.º CV3-20-0070-CAO.
  Dispõe o artigo 223.º/1 do CPC que “O Tribunal poderá ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado.”.
  Como se refere o Prof. Alberto dos Reis (in Comentário ao Código do Processo Civil, vol. 3.º, Coimbra ed.1946, pág. 267 e ss), “Uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela pode prejudicar a decisão desta, isto é, quando a procedência da primeira tira a razão de ser à existência da segunda. Exemplos característicos: acção de anulação de casamento e acção de divórcio, acção de anulação de arrendamento e acção de despejo. O divórcio pressupõe um casamento válido; por isso, estando pendentes duas acções, uma destinada a anular determinado matrimónio, outra destinada a dissolvê-lo pelo divórcio, aquela é prejudicial em relação esta, porque, uma vez anulado o casamento, o pedido de divórcio já não tem razão de ser, já não tem suporte legal. Sucede o mesmo quando à anulação de arrendamento e ao despejo. O pedido de despejo pressupõe um arrendamento válido; portanto este pedido perde a sua razão de ser, desde que o arrendamento seja anulado.”.
  Já para RODRIGUES BASTOS, o conceito de prejudicialidade é mais amplo, “Quando deve entender-se que a decisão de uma causa depende do julgamento de outra? Quando na causa prejudicial esteja a apreciar-se uma questão cuja resolução possa modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para decisão de outro pleito”- in Notas ao Código de Processo Civil, Lisboa, 2000, vol. II, 3.ª ed., p. 43.
  A jurisprudência de Macau acolheram ambos conceitos, aceitando que é também causa prejudicial caso a resolução da questão na causa prejudicial modifica ou afecta de alguma maneira a causa dependente, mesmo que esta segunda causa não se extinga por via da decisão da primeira (TUI n.º 33/2015).
  Portanto, desde que a solução dada a uma causa possa ter reflexos ponderosos na decisão a proferir em outra acção, ou desde que a decisão da primeira possa destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda, sob o ponto de vista do efeito jurídico pretendido, ou possa modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a decisão de outro pleito, ou quando numa acção se ataca um acto ou um facto jurídico que é pressuposto necessário de outra acção, então o caso é de prejudicialidade (neste sentido, v.g., Ac. do TSI, Proc. n.º 610/2017, Ac. do TSI, de 12/07/2012, Proc. nº 326/2011; no direito comparado, Ac. do STJ, de 13/04/2010, Proc. nº 707/09).
  No caso em apreço, entendemos que a acção do processo n.º CV3-20-0070-CAO não é causa prejudicial na medida em que as questões que vão ser discutidas naquela acção não vão destruir a razão deste processo, que é averiguar se existem irregularidades na SOCIEDADE COMPANHIA DE INVESTIMENTO COMERCIAL E FOMENTO PREDIAL B LIMITADA. Ou seja, mesmo que a transmissão de quota detida inicialmente por A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED para C seja inválida ou ineficaz, o presente processo não deixa de ter razão de prosseguir, embora possa acontecer que a SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA não pode ser representada por C nesta acção.
A invalidade ou ineficácia de transmissão de quota detida inicialmente por A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED para C também não irá modificar a situação jurídica que tem que ser decidida neste processo (se existem irregularidades na SOCIEDADE COMPANHIA DE INVESTIMENTO COMERCIAL E FOMENTO PREDIAL B LIMITADA) porque tratam-se de duas questões independentes e autónomas.
Deste modo, não tem razões para ordenar a suspensão dos presentes autos por motivo de existência duma causa prejudicial.
Não obstante, entendemos que a decisão sobre o pedido de declaração de nulidade da procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019, em representação da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA, pode afectar a presente causa. Uma vez que o mandatário da Requerente foi constituído pela procuração outorgada em 16 de Janeiro de 2019 por C, em representação da Requerente, caso o pedido de declaração de nulidade de procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 proceder, o mandato conferido pela SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA passará a ser irregular e a SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA teria que regularizar o mandato sob pena de se verificar a excepção dilatória prevista na al. i) do artigo 413.º do CPC.
Assim sendo, caso prosseguir o presente processo sem aguardar pela decisão proferida no processo n.º CV3-20-0070-CAO sobre a validade da procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019, pode correr o risco de vir a ser praticado actos inúteis no presente processo se for judicialmente reconhecida a invalidade de procuração em causa. Deste modo, entendemos que existe motivo justificado para ordenar a suspensão dos presentes autos.
Por outro lado, apesar de a questão de regularidade do mandato da Requerente possa ser decidida incidentemente neste processo, entendemos que o processo n.º CV3-20-0070-CAO é a sede própria para a questão na medida em que A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED e C não são partes deste processo, mas partes de processo n.º CV3-20-0070-CAO. Ora, como a questão de validade de procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 em representação da Requerente encontra-se dependente da questão de validade e eficácia de transmissão de quota detida inicialmente por A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED para C e essa questão não deve ser decidida sem estarem presentes os intervenientes principais dos actos em causa, A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED e C, a questão de nulidade de procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 deve ser decidida numa causa em que A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED e C intervêm, que é o processo n.º CV3-20-0070-CAO.
Mais, caso prosseguir a presente acção e a decisão proferida nesta acção sobre a validade de procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 não for igual à decisão a proferir no processo n.º CV3-20-0070-CAO, as decisões sobre a mesma matéria serão contraditórias.
Pelas razões expostas, entendemos que há motivo justificado para ordenar a suspensão dos presentes autos para aguardar a decisão a proferir no processo n.º CV3-20-0070-CAO sobre a validade de procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 em representação da Requerente.
A Requerente defende que os prejuízos causados pela suspensão superam as vantagens pelo que não deve ordenar a suspensão dos presentes autos. Tendo em conta que a causa que esse Tribunal considera existe para ordenar a suspensão dos presentes autos não é a existência da causa prejudicial mas existência de motivo justificado, o motivo de não ordenar a suspensão prevista na 2.ª parte do n.º 2 do artigo 223.º do CPC não tem aplicação no presente caso. Assim sendo, a oposição deduzida pela Requerente sobre os prejuízos causados pela suspensão não pode proceder.
Também não entendemos que o 1.º Requerido, ao intentar a acção n.º CV3-20-0070-CAO, está a praticar uma manobra dilatória porque o que o 1.º Requerido fez não é mais de que tentar salvaguardar os seus interesses mediante a arguição de irregularidade do mandato conferido pela Requerente ao seu mandatário. Ou seja, não há indícios seguros de que tal acção foi intentada com intuitos meramente dilatórios por poder o 1.º Requerido entender que a questão em causa deve ser decidida a título principal numa acção própria.
Pelas razões expostas, ao abrigo do artigo 223.º/1, parte final, do CPC, ordeno a suspensão da instância por haver motivo justificado até que haja decisão transitada no processo n.º CV3-20-0070-CAO.
Notifique.

Notificada e não conformada com o decidido, veio a requerente A (Macau) recorrer para esta segunda instância, tendo para o efeito concluído e pedido:
1.ª Vem o presente recurso do douto despacho do Meritíssimo Juiz a quo, explicitado em 3 de Fevereiro de 2021, a fls 638 e seguintes dos autos, que, ao abrigo do artigo 223.º, n.º 1, parte final, do CPC, ordenou a suspensão da instância, por haver motivo justificado, até que haja decisão transitada no processo n.º CV3-20-0070-CAO, conforme solicitado pelos Requeridos/ Recorridos, no processo especial de Exame à Sociedade, “Companhia de Investimento Comercial e Fomento Predial B, Limitada” e D.
2.ª A Recorrente imputa ao douto despacho recorrido o vício de violação de lei, por incorrecta interpretação do art.º 223.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, o que diz com a ressalva do muito respeito que é devido.
3.ª No dia 20 de Julho de 2020, foi admitida a presente acção intentada pela Requerente/Recorrente, na qualidade de sócia, com o pedido de Exame Judicial à Sociedade Companhia de Investimento Comercial e Fomento Predial B, LIMITADA, 1.ª Requerida/Recorrida, tendo sido também citado para os termos do processo um dos seus Administradores, D, 2.° Requerido/Recorrido, para averiguar se existem quaisquer irregularidades na vida societária da 1.ª Requerida/Recorrida.
4.ª Em 7 de Setembro de 2020, os Requeridos/Recorridos apresentaram, em conjunto, a sua defesa, por excepção (ilegitimidade activa, ineptidão da petição inicial e abuso de direito) e por impugnação, tendo, ainda, requerido ao douto Tribunal que “suspenda a presente instância nos termos e ao abrigo do artigo 223.° do CPC, devendo a mesma ficar a aguardar decisão final do processo judicial n.º CV3-20-0070-CAO que corre termos no 3.° Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base”.
5.ª Com tal acção proposta já depois de terem sido os Requeridos/ Recorridos citados para a presente acção e a quatro dias do termo do prazo para apresentar a sua contestação, apresentada em 7 de Setembro de 2020, a l.ª RequeridalRecorrida, visa “obter a declaração judicial de invalidade e/ou ineficácia perante a 3.a Ré, aqui Requerente/Recorrente, da aquisição realizada, em 12 de Novembro de 2018, pelo 2.º Réu (C), representante da aqui Requerente/Recorrente, da quota com o valor nominal de MOP$80.000,00 (Oitenta mil Patacas) representativa de 80% do capital social da 3.a Ré, aqui Requerente/Recorrente, com o consequente reconhecimento judicial e declaração de nulidade de todas as deliberações sociais da 3.a Ré posteriores à data da referida aquisição, as quais foram exclusivamente aprovadas com os votos do 2.° Réu e, bem assim, de todos os actos e negócios jurídicos realizados pelo 2.° Réu “na putativa qualidade de sócio, administrador e representante da 3.ª Ré”.
6.ª A ora Recorrente opôs-se à suspensão da presente instância tendo em consideração o que sobre a questão dispõe o art.º 223.º do CPC, nomeadamente no que se refere não só ao facto de ter sido intentada tal acção para se obter a suspensão desta, mas, também, porque os prejuízos da suspensão superam as vantagens, porque as acções propostas em 2 de Setembro de 2020, têm como Réus, para além da Recorrente, e o seu gerente C, a empresa “A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED” (uma sociedade extinta), com sede em Singapura, o que pressupõe uma decisão em que se discutem normas de Direito Internacional Privado, e duas pessoas individuais (E e F) , cujo paradeiro em parte incerta é uma realidade do conhecimento da l.ª Requerida/Recorrida e que determinará que as respectivas citações devam ser feitas editalmente e com a demora que tal forma de citação provoca.
7.ª Os ora Recorridos tentaram usar vários argumentos para impedir que seja efectuado o Exame Judicial, não podendo colher o que é no sentido de que a Requerente/Recorrente devia ter sido dissolvida, pois, nos termos do art.º 316.° do Código Comercial, os efeitos da dissolução só produzem efeitos após o seu registo, ou seja, não existem efeitos retroactivos da dissolução de uma sociedade comercial e se ela existe e se ela é sócia da 1.ª Requerida/Recorrida, não existe razão para invocar tal argumento.
8.ª Os Recorridos não podem é insurgir-se com o facto de a Recorrente pretender conhecer com rigor a vida societária da 1.ª Requerida/Recorrida, desenvolvendo a sua actividade na área do imobiliário, quer arrendando espaços, quer vendendo imóveis do seu património e isto, após ter o 2.° Requerido/Recorrido, então sócio com uma quota nominal equivalente a 9% do capital social - através de uma deliberação social, cuja inexistência a ora Recorrente, requereu pela via judicial, estando a correr a Acção os seus termos sob o n.º CVl-20-0036-CAO -, logrado tornar-se sócio maioritário com uma quota de valor nominal de 90% do capital social, quota essa de que era titular a ora Recorrente.
9.ª Não só porque as circunstâncias muito específicas de três Rés nos referidos autos com o n.º CV3-20-0070-CAO - uma pessoa colectiva sediada fora da RAEM e duas pessoas individuais cujo paradeiro é desconhecido há muitos anos - determinarão um processo muito complexo e longo mas, também, porque a 1.ª Requerida/Recorrida, ao intentar tais acções, está a praticar uma manobra dilatória, pediu a Recorrente ao douto Tribunal a quo que não decretasse a suspensão da instância da presente lide, ainda que considerasse existir o nexo de prejudicialidade entre as acções em causa.
10.ª Decorre da fundamentação do douto despacho recorrido que a razão pela qual foi ordenada a suspensão da instância do presente processo não foi por “ocorrer outro motivo também justificado”, isto é, motivo diferente da pendência da causa prejudicial e que, no seu alto critério, justificasse a suspensão, sendo até suficiente que o prazo durante o qual estará suspensa a instância coincide com a decisão a ser explicitada no processo CV3-20-0070-CAO para se determinar que o Meritíssimo Juiz a quo ordenou a suspensão com fundamento na causa prejudicial.
11.ª O art.º 223.°, n.º 1, do CPC começa por indicar ao Tribunal um motivo justificado de suspensão - a pendência de causa prejudicial - e, depois, atribui o poder de suspender a instância quando entender que ocorra outro motivo também justificado que fundamente a suspensão da instância.
12.ª O douto Tribunal a quo apresentou como justificação para suspender a instância até que haja uma decisão definitiva na acção que corre termos pelo 3.° Juízo Cível do TJB, sob o n.º CV3-20-0070-CAO, 4 (quatro) razões, designadamente, (i) porque a decisão sobre o pedido de declaração de nulidade da procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019, em representação da Sociedade de Investimento Predial e Imobiliário A (MACAU), Limitada, pode afectar a presente causa; (ii) se esta acção prosseguir sem aguardar pela decisão proferida no processo n.º CV3-20-0070-CAO sobre a validade da procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019, pode correr-se o risco de virem a ser praticados actos inúteis no presente processo se for judicialmente reconhecida a invalidade da procuração em causa; (iii) o processo n.º CV3-20-0070-CAO é a sede própria para a questão da regularidade do mandato da Requerente (ora Recorrente), na medida em que A Investment (SINGAPORE) PTE Limited e C não são partes neste processo e (iv) o facto de poder haver decisões contraditórias, isto é, considerar-se válida a procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 no presente processo e vir a considerar-se inválida no processo n.º CV3-20-0070-CAO.
13.ª Não decorre da lei o que se deve entender por “outro motivo justificado”, permitindo concluir-se que se confere ao juiz uma margem lata de liberdade de acção, podendo ordenar a suspensão quando entenda que há utilidade ou conveniência processual em que a instância se suspenda, ou sej a, será perante cada caso concreto que se terá de indagar se ocorre ou não motivo que justifique a suspensão da instância, e com base em tal fundamento, sendo que, contudo, o mesmo fundamento não poderá ter nada a ver com a pendência de outra acção.
14.ª Das quatro (4) razões invocadas pelo douto Tribunal a quo, decorre que as mesmas têm todas a ver com a pendência da acção CV3-20-0070-CAO, certo sendo que parece ser unânime o entendimento de que existe verdadeira prejudicialidade e dependência quando na primeira causa se discute, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental.
15.ª O douto Tribunal a quo fez uma incorrecta ponderação e valoração dos motivos invocados pelas partes, designadamente, na oposição apresentada pela Requerente, ora Recorrente, e, consequentemente, mal decidiu ao determinar a suspensão da instância até que seja conhecida a decisão definitiva na acção n.º CV3-20-0070-CAO, com fundamento “num outro motivo justificado”, e não no facto de considerar que a decisão desta causa está dependente do julgamento da causa objecto do mencionado processo CV3-20-0070-CAO.
16.ª Tendo fundamentado a suspensão da instância no nexo de prejudicialidade entre as duas causas, o douto Tribunal a quo teria que entrar em linha de conta com a norma do n.º 2 do art.º 223.º do CPC, uma vez que não só a presente causa ( dependente e suspensa) não se compadece com a morosidade da causa do processo CV3-20-0070-CAO, mas, também, porque a 1.ª Recorrida intentou os dois processos unicamente para se obter a suspensão, pois ambos foram movidos, após terem os Recorridos sido citados para os termos da presente causa (Exame Judicial à Sociedade) e da Acção de Declaração de Inexistência de Deliberação Social, que corre termos pelo 1.º Juízo Cível sob o n.º CVl-20-0036-CAO.
17.ª Os Recorridos tinham conhecimento de que a Recorrente, enquanto sócia, tinha interesse em conhecer a vida societária da l.ª Recorrida e, através do seu representante C, a Recorrente teve acesso ao único livro de actas que lhe foi apresentado e de onde pôde intuir que havia irregularidades que pretende sejam conhecidas através da presente causa.
18.ª A Recorrente requerer ao Venerando Tribunal ad quem que considere que, efectivamente, face ao pedido de Exame Judicial, a suspensão da presente lide traz muitos prejuízos e poucas vantagens, sendo certo que, no âmbito deste processo não foi pedida a nulidade da transmissão da quota da empresa A (SINGAPORE) para C, pelo que não podia o douto Tribunal a quo indicar como um “motivo justificado” para ordenar a suspensão da instância, a possibilidade de haver decisões contraditórias, isto é, considerar-se válida a procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 no presente processo e vir a considerar-se inválida no processo n.º CV3-20-0070-CAO.
19.ª Nos termos da lei, “o registo definitivo constitui presunção de que existe a situação jurídica, nos precisos termos em que é definida”, e “os factos comprovados pelo registo não podem ser impugnados em tribunal sem que simultaneamente seja pedido o seu cancelamento”.
20.ª Nos termos dos estatutos da sociedade registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis, C tem poderes para representar a Requerente, ora Recorrente.
VIII - PEDIDO
  TERMOS EM QUE, e contando com o douto suprimento de Vossas Excelências, Venerando Juízes, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogado o douto despacho recorrido, porque enferma de um vício de violação de lei, por má interpretação, não estando reunidos os requisitos de “outro motivo justificado” para a suspensão da instância a que alude o art.º 223.º, n.º 1, in fine, do Código de Processo Civil.
Mais se requer, muito respeitosamente, que ainda que se considere existente o nexo de prejudicialidade entre a presente acção intentada pela Requerente/Recorrente, e a que corre termos, sob o n.º CV3-20-0070-CAO, pelo 3.° Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base, intentada pela 1.ª Requerida/Recorrida, em 2 de Setembro de 2020, não seja ordenada a suspensão da instância, uma vez que esta última só conhecerá uma decisão definitiva após um longo e complexo processo judicial, o que, por si só, acarreta graves prejuízos, porque está em causa nesta lide a verificação de irregularidades (confessadas pelos Requeridos) na vida societária da 1.ª Requerida/Recorrida, acrescendo que esta intentou a referida acção de invalidade, como manobra dilatória, pedido este tendo em consideração o que sobre esta matéria dispõe o art.º 223.° do Código de Processo Civil,
  Assim se procedendo, far-se-á, a costumada
Justiça!

Ao recurso respondeu a requerida B Limitada, pugnando pela improcedência do recurso.

Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.
II

Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).

Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.

Não há questões que nos cumpre apreciar ex oficio.

De acordo com o delimitado pelo teor das conclusões tecidas na petição do recurso, na presente lide recursória constitui o objecto da nossa apreciação a legalidade da suspensão da instância fundada na ocorrência de um outro motivo justificado, a que se alude o artº 223º/1 do CPC.

Para a apreciação da legalidade da suspensão ora determinada no Tribunal a quo, é preciso indagar se as razões expostas na decisão recorrida integram o conceito de “outro motivo justificado” para determinar a suspensão da instância.

E em caso negativo, se há uma verdadeira prejudicialidade da questão, a título principal discutida naqueloutra acção nº CV3-20-0070-CAO, em relação à questão de mérito na presente acção de exame judicial à sociedade, e em caso afirmativo, averiguar, tendo em conta todas as circunstâncias do caso, se há fundadas razões para crer que a acção instaurada pela requerida B Limitada foi instrumentalizada para servir de manobra dilatória com vista a impedir o exercício, por parte da requerente A (Macau) Limitada, do seu direito de exame judicial à sociedade.

Assim, vejamos as seguintes questões, elencadas na relação de subsidiariedade:

1. Do motivo justificado de suspensão da instância; e

2. Da prejudicialidade e da suspeita da manobra dilatória.

1. Do motivo Justificado de suspensão da instância

Então vamos analisar primeiro se estamos perante um motivo justificado a que se alude o artº 223º/1 do CPC, em que fundou a decisão recorrida.

Para fundamentar o juízo pela existência do motivo justificado, o Tribunal a quo teve o raciocínio que se pode sintetizar no seguinte:

* A decisão sobre o pedido de declaração da nulidade da procuração forense conferido por C, em representação da requerente A (Macau) Limitada, pode afectar a decisão a proferir nos presentes autos de exame judicial à sociedade;

* A eventual declaração da nulidade da procuração proferida no processo nº CV3-20-0070-CAO torna inúteis os actos praticados nos presentes autos de exame judicial à sociedade;

* O processo nº CV3-20-0070-CAO é a sede própria para decidir a questão sobre a invocada nulidade da procuração, na medida em que são chamados para a lide todos os sujeitos interessados, incluindo a A Investment (Singapore) PTE limited e o C, que não são partes nos presente autos de exame judicial à sociedade; e

* A suspensão da instância trará vantagens de evitar decisões contraditórias sobre a regularidade da procuração forense da requerente A (Macau) Limitada.

Ora, salvo o devido respeito, para nós, estas razões que se prendem com a economia processual e a coerência dos julgamentos não podem ser tidas como motivos justificados, para determinar a suspensão da instância.

Se é verdade que a nossa lei processual procura, na medida possível, evitar decisões contraditórias proferidas em acções diferentes no mesmo ou em diferentes Tribunais, temos de aceitar que, por razões variadíssima, nomeadamente em nome da harmonização das finalidades em conflito a que visam actos processuais diferentes e da salvaguarda de outros bens jurídicos de importância igual ou superiores, o ideal da coerência das decisões judiciais nem sempre é integralmente alcançado, antes pelo contrário, pode sujeitar-se a limitações nos termos prescritos na lei processual.

Basta pensar no simples desconhecimento da discussão da mesma questão em juízos ou Tribunais diferentes e nas situações em que a lei expressamente faz prevalecer os bens jurídicos de certeza e segurança jurídicas.

Para fazer face à eventualidade de aparecimento de decisões contraditórias, a lei processual prevê soluções no quadro do regime do caso julgado – cf. artºs 574º e s.s. do CPC.

In casu, as preocupações, por parte da Exmª Juiz a quo, fundadas na competência do Tribunal, na eventualidade de decisões contraditórias e na ilegitimidade (não intervenção da A (Singapore) Investment Limited e da C nos presentes autos de exame judicial), já foram contempladas pelo nosso legislador, ao estabelecer no artº 26º do CPC as limitações à extensão da competência reconhecida ao Tribunal de uma determinada causa para conhecer as questões que, podendo constituir objecto de uma acção autónoma, se levantem incidentalmente nessa mesma causa.

Reza o artº 26º do CPC que:
1. O tribunal competente para a acção é também competente para conhecer dos incidentes que nela se levantem e das questões que o réu suscite como meio de defesa.
2. A decisão das questões e incidentes suscitados não constitui, porém, caso julgado fora do processo respectivo, excepto se alguma das partes requerer o julgamento com essa amplitude e, para a sua apreciação, o tribunal a que a causa esteja afecta for competente.
Nos termos do nº 2 desse artigo, as eventuais contradições resolvem-se de acordo com o regime de casos julgados formais.

Cessam assim as preocupações da Exmª Juiz a quo fundadas na sua incompetência (ou na inconveniência de julgar), na eventualidade de decisões contraditórias e na não presença nos presentes autos da A (Singapore) Investment limited e de C.

Quanto à preocupação sobre a eventual inutilidade dos actos praticados nos presentes autos, é de relembrar que ao consagrar o princípio da proibição dos actos inúteis, o que a nossa lei processual pretende evitar é a prática dos actos processuais redundantes, dilatórios ou desadequados ao fim que o legislador tem em vista ao conferir a determinados sujeitos processuais o direito de os praticar.

E a utilidade deve ser aferida intraprocessualmente.

No caso em apreço, se não tivesse sido ordenada a suspensão da instância, e prosseguissem os autos de exame judicial à sociedade, os actos que viriam a ser neles praticados têm naturalmente em vista a averiguação da existência das alegadas irregularidades na gestão da sociedade B Limitada, ora requerida, e, se for caso disso, a realização do exame judicial às contas e aos documentos da sociedade requerida, ou seja, visam justamente aos fins para os quais a lei cria a acção de exame judicial à sociedade.

Portanto, estes actos naturalmente não são redundantes, dilatórios ou desadequados ao fim para que a lei processual confere o direito processual de o praticar.

Por outro lado, a inutilização dos actos processuais entretanto já praticados não é um tabus absoluto na nossa lei processual, pois esta admite a inutilização dos actos praticados desde que se verifiquem determinadas condições.

Citam-se como exemplos de fácil compreensão a anulação ou a revogação dos actos entretanto praticados na sequência do êxito da arguição de nulidade processual ou da impugnação por via de recurso ordinário, situações essas em que obviamente não está em causa o princípio da proibição da prática de actos inúteis.

Portanto, estas preocupações todas, fundadas na competência do Tribunal (ou na inconveniência de julgar), na eventualidade de decisões contraditórias, na eventual inutilidade de actos processuais e na ilegitimidade, cada uma de per si, ou conjuntamente, não devem constituir fundamento suficiente para decretar da suspensão da instância.

2. Da prejudicialidade e da suspeita da manobra dilatória

Passemos então a averiguar se existe a prejudicialidade, ora defendida pela recorrente.

O Tribunal a quo entende que a questão discutida naqueloutra acção nº CV3-20-0070-CAO não é prejudicial em relação à discutida nos presentes autos de exame judicial à sociedade.

O tal entendimento foi questionado pela recorrente.

Para a recorrente, existe efectivamente o nexo de prejudicialidade.

E na sua óptica, não obstante a existência do nexo de prejudicialidade, não é de determinar a suspensão da instância uma vez que, tendo em conta as circunstâncias do caso, a acção prejudicial (a acção nº CV3-20-0070-CAO) foi instaurada unicamente para obter a suspensão da instância por forma a impedi-la de exercer o direito de exame judicial à sociedade requerida.

Tem razão a recorrente em ambos os aspectos.

Senão vejamos.

Comecemos pelo primeiro aspecto.

Através da presente acção de exame judicial à sociedade, a requerente A (Macau) Limitada pretende ser informada sobre as contas da gerência no seio da sociedade requerida, com fundamento nas suspeitas de alegadas irregularidades na vida da sociedade B limitada, ora requerida.

À luz do artº 209º/1 do C. Comercial, todo o sócio tem direito à informação sobre a vida da sociedade, nomeadamente obter informações sobre a gestão da sociedade (alínea g)).

Como se sabe, em regra a qualquer direito corresponde uma obrigação.

O direito à informação conferido aos sócios não foge a essa regra.

Assim, se o sócio não puder exercer o direito à informação quanto à gestão da sociedade por incumprimento voluntário por parte dos órgãos da sociedade sobre os quais impende a obrigação de prestar informações, o sócio pode recorrer aos tribunais para efectivar coercivamente o exercício do seu direito.

A fim de obter a providência judicial, é preciso o requerente demonstrar aos Tribunais a sua qualidade de sócio e manifestar a vontade de pretender exercer o direito à informação.

No que diz respeito a este último aspecto, ou seja, a manifestação da vontade por parte de um sócio de pretender exercer o direito, a questão da regularidade da formação de tal vontade não se coloca, na maioria de casos, tratando-se de vontade manifestada por um sócio que é uma pessoa singular.

Todavia, já se podem colocar questões complexas e complicadas se o sócio é uma pessoa colectiva.

Pois existe sempre um procedimento de formação da vontade, mais ou menos complexo, consoante o prescrito na lei e o estipulado no acto constitutivo da própria pessoa colectiva.

E muitas vezes, a inobservância de determinados normativos legais ou estatutários reguladores da formação de vontade afecta fatalmente a validade do acto de manifestação de vontade de uma pessoa colectiva.

Voltemos ao caso em apreço.

Na acção nº CV3-20-0070-CAO instaurada pela aqui requerida B limitada, esta pretende a declaração de nulidade da aquisição por C da quota de 80% do capital social que a A (Singapore) Investment Limited detinha na A (Macau) Limitada, e por arrastamento a declaração de nulidade das deliberações tomadas, após essa aquisição, na assembleia da A (Macau) Limitada com o voto favorável de C, nomeadamente a nomeação de C como seu administrador.

Assim, se vier a ser declarada a nulidade da nomeação de C como administrador da A (Macau) Limitada, a procuração por ele outorgada em nome da A (Macau) Limitada terá de ser declarada nula.

Se isso vier a acontecer, a regularidade na formação e na manifestação da vontade, por parte da A (Macau) Limitada, de pretender exercer o direito de exame judicial à requerida B limitada será necessariamente posta em crise.

Portanto, torna-se necessário indagar previamente acerca da legalidade da deliberação versando sobre a nomeação de C como administrador da A (Macau) Limitada.

Como se sabe, questões prévias são todas as aquelas que devem ser resolvidas antes do julgamento final.

Sendo de indispensável resolução prévia, a questão acerca da regularidade da procuração forense, ora discutida a título principal naqueloutra acção pendente no 3º Juízo Cível, configura-se pelo menos uma verdadeira questão prévia na presente acção de exame judicial à sociedade.

Urge indagar se a questão prévia se configura também como efectiva questão prejudicial, e em caso afirmativo, se se justifica in casu a suspensão da instância.

É hoje aceite na generalidade de doutrinas a noção alargada da prejudicialidade, susceptível de fundar a suspensão da instância.

A propósito do que se deve entender por questão prejudicial, o Prof. Alberto dos Reis ensina que uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão da primeira pode destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda – in Comentário ao CPC, Vol. 3º, pág. 268.

A esta afirmação tradicional acrescenta o Mestre que:

……segundo o Prof. Andrade, verdadeira prejudicialidade e dependência só existirá quando na primeira causa se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental, como teria de o ser, desde que a segunda causa não é reprodução, pura e simples, da primeira. Mas nada impede que se alargue a noção de prejudicialidade, de maneira a abranger outros casos. Assim pode considerar-se como prejudicial, em relação a outro em que se discute a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal.

Estamos de acordo.

Há efectivamente casos em que a questão pendente na causa prejudicial não pode discutir-se na causa subordinada; há outros em que pode discutir-se nesta, mas somente a título incidental. Na primeira hipótese o nexo de prejudicialidade é mais forte, na segunda, mais frouxo; na primeira há uma dependência necessária, na segunda, uma dependência meramente facultativa ou de pura conveniência”. – ipidem pág. 269.

Cremos que o caso em apreço integra-se na noção alargada da prejudicialidade, ou seja na modalidade de um nexo de prejudicialidade frouxo que determina uma dependência meramente facultativa, nas palavras do Alberto dos Reis.

Pois entendemos que a regularidade/validade da procuração forense outorgada por C em representação da A (Macau) é um dos condicionantes da procedência da presente acção de exame judicial à sociedade, mas não tem de ser necessariamente resolvida naqueloutra acção a correr no 3º Juízo Cível e pode ser incidentalmente conhecida nos presentes autos, face ao disposto no artº 26º do CPC.

Concluindo pelo carácter prejudicial da questão da regularidade/validade da procuração forense, susceptível de justificar a suspensão da instância, resta saber se se verifica in casu a circunstância impeditiva da suspensão da instância, a que se refere o artº 223º/2 do CPC, à luz do qual não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as suas vantagens.

Ora, de acordo com os elementos existentes nos autos, a acção prejudicial (a acção nº CV3-20-0070-CAO) foi instaurada pela ora requerida B Limitada depois de ter sido citada para a presente acção de exame judicial à sociedade e apenas a 4 dias antes do termo do prazo para deduzir oposição.

Com a acção pretende-se a declaração de nulidade da aquisição por C da quota de 80% do capital social que a A (Singapore) Investment Limited detinha na A (Macau) Limitada, e por arrastamento a declaração de nulidade das deliberações tomadas na assembleia da A (Macau) Limitada, após essa aquisição, nomeadamente a nomeação de C como seu administrador.

A acção foi liminarmente indeferida por manifesta ilegitimidade substantiva pelo seguinte despacho liminar proferido nos autos de acção ordinária nº CV3-20-0070-CAO:
  Pretende-se com a presente acção a declaração de nulidade (subsidiariamente a ineficácia) da aquisição realizada no dia 12 de Novembro de 2018, pelo 2º R., da quota de 80% do capital social que a 1ª R. detinha na 3ª e, em decorrência, das deliberações que após essa aquisição surgiram na vida societária desta a 15.1.19, igualmente da procuração assinalada no petitório.
  Tal invalidade surge atacada por se entender que quem viabilizou a alienação da citada quota pela 1ª R. não tinha poderes para o efeito, outrossim invocando-se a falta de consentimento desta.
  Referir que a 3ª R. é também sócia da A., facto que, após a aquisição aludida, com o controlo que o 2º R. passou a ter naquela sociedade, tem «permitido» a demanda sistemática da peticionante, concretamente acções de invalidade de deliberações e de exame a sociedade – Cfr. artº26 da p.i
  Invoca-se esta circunstância, igualmente o imobilismo da 3ª R. durante muitos anos perante a vida societária da A, para garantir a legitimidade substantiva nesta acção.
  Mas será assim, visto que do CodCoM não resulta a atribuição de legitimidade substantiva a terceiro para reagir perante qualquer acto societário senão, e em relação as deliberações sociais, às pessoas e entidades referidas no artº230 do citado diploma?
  Mas vejamos, focando-nos aprioristicamente em relação à nulidade das deliberações, o que se tem entendido a propósito da legitimidade para contra elas se reagir, considerações que também para aqui relevam por se pretender igualmente a destruição das deliberações ocorridas na vida societária da 3ª R. em 15.1.19. e a supra citada procuração.
    
  Depois deste referido foco, faremos um paralelo com a impugnação do acto em causa (cessão de quota da 3ª R. e pela 1ª), daí se tirando as legais consequências.
  Quanto ao que se tem entendido a propósito da legitimidade para contra as deliberações nulas reagir, transcreve-se parte do Ac. da Rel. Do Porto de 24.1.2018, as paginas tantas sob a epigrafe: «Da (i)legitimidade substantiva do autor para requerer a declaração da invalidade das deliberações socias.»
  Refere este acórdão a propósito da referida legitimidade de terceiro para reagir contra deliberações nulas: «(…) Em consonância com a respetiva disciplina normativa (do CSC) terá legitimidade para arguir a nulidade de uma deliberação de sociedade comercial as entidades referidas no art. 57º, concretamente o sócio (nº 1), o órgão de fiscalização (nº 2) e, nas sociedades que não tenham órgão de fiscalização, “qualquer gerente”, como expressamente se dispõe no seu nº 4.
  É certo que para além dessas entidades não está proscrita a possibilidade de outras poderem arguir o vício que inquinará o ato deliberativo, já que, quanto a esta matéria, o citado art. 57º reporta-se unicamente ao âmbito social, limitando-se a acrescentar uma especialidade em relação ao regime geral previsto no Código Civil.
  Consequentemente, assumindo, como nos parece, as deliberações natureza de negócio jurídico (qualificação que, ainda assim, não se revela pacífica), ser-lhes-á, por isso, aplicável - quando enfermem de vício de nulidade - a regra de direito comum plasmada no art. 286º do Cód. Civil, nos termos do qual esse vício genético “é invocável por qualquer interessado”.
  Portanto, no caso vertente, não se integrando o autor em nenhuma das categorias de entidades previstas no art. 57º, tudo se resume em determinar se será interessado para arguição dos vícios que assaca às ajuizadas deliberações sociais»
  O regime de Macau é em tudo similar ao do CSC de Portugal, dele não se retirando expressamente qualquer legitimidade a terceiros para impugnar deliberações nulas – vide artº 230 .
  Assim sendo, não se integrando a A. em nenhuma das categorias de entidades previstas no art. referido, em processo especulativo, diremos que tudo se resume em determinar se seria ela interessada para efeitos de arguição dos vícios de uma eventual deliberação que autorizasse a referida e visada cedência de quota e se tal fosse estatutariamente exigido (já sabemos que não, apenas se exige autorização por escrito – vide artº47 da PI).
  Não o sendo, também, cremos, e por maioria de razão, carecerá de legitimidade (substantiva) para atacar o negócio em causa.
  
  Referimos supra que a 3ª R. é também sócia da A., facto que, após a aquisição da quota que a 1ª R. detinha naquela e pelo 2º R., com o consequente controlo que passou a ter nela, tem permitido a demanda sistemática da peticionante, concretamente através de acções de invalidade de deliberações e de exame a sociedade – Cfr. artº26 da p.i
  Isto posto, questiona-se se será isto motivo para ser elevado a um interesse que mereça tutela legal para garantir a legitimidade da A. numa ficcionada impugnação de deliberação nula que fosse fautor dos incidentes judiciais que a 3ª tem operado com si?
  Não cremos.
  O que a 3ª R. tem vindo a fazer contra a A. não mais é do que a procura da tutela de interesses por si perspectivados, por via do direito e no local próprio: os tribunais.
  A 3ª R. (agora controlada pelo 2º R. através da quota que tem e cedida pelo 1ª) mais não faz do que exercer um direito estatutário a todos os sócios consagrado: pedir ao tribunal que ajuíze algum pedaço da vida societária da A. que entenda ilegal.
  Se excede na actuação a lei tem «válvulas paralisantes» para o efeito, nomeadamente a invocação do abuso de direito pela A. perante cada caso concreto.
  Não vemos, pois, forma de contornar a falta de legitimidade substantiva da A. para propor uma qualquer impugnação de deliberação da 3ª R, concretamente uma que, ficcionada, permitisse a cessão de quota posta em crise.
  Mas se a A. não o pode fazer em relação à ficcionada deliberação, na nossa óptica também não o pode fazer em relação ao negócio id. na p.i..
  De facto não se logra atingir (o defeito é sempre nosso, não duvidamos: era mais fácil deixar seguir a acção) como pode a A. pretender que se lhe reconheça a qualidade de interessada para, ao abrigo do regime da venda de coisa alheia previsto nos artigos 882 e ss. do CC, na conjugação com o disposto no artº279 do mesmo diploma, invocar a nulidade da cessão da quota predita.
  O que está em rigor em causa (e que também poderá afectar a validade das deliberações que se lhe seguiram) é um negócio alheio à A. (res inter allios acta), um negócio que só a perturba porque a 3ª R., agora dominado pelo 2º R., tem reagido judicialmente contra actos da sua vida societária.
  Trata-se, pois, de negócio que per si não bule com nenhum interesse da A..
   Tal negócio apenas coloca o 2º R., agora como sócio da 3ª R., em posição de conformar a vontade desta e, destarte, «atacar» actos societários da A.
  Devemos notar que a lei não concede a faculdade de reacção perante um negócio ou acto nulo a qualquer pessoa ou entidade.
  De facto, da regra prevista no artº279 do CC, ao referir-se a «qualquer interessado», retira-se que se circunscreve subjectivamente a titularidade daquela faculdade apenas a alguns. Doutro modo não se referiria a interessados mas utilizaria outra expressão que, sem dúvidas, concedesse esse poder a todos.
  Deve entender-se como «qualquer interessado» aquela pessoa ou entidade «titular de qualquer relação cuja consistência, tanto jurídica, como prática, seja afectada pelo negócio» - Cfr. Antunes Varela e Pires de Lima, CC anotado, VI, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, p.263 / Mota Pinto, TGDC, 4ª edição, 2ª reimpressão, Coimbra Editora, p.620 -, ou seja, qualquer sujeito de qualquer relação jurídica que, de algum modo, possa ser afectado pelos efeitos que o negócio posto em causa tende a produzir.
  No caso vertente, em rigor, como já se tentou evidenciar, a A. não é afectada pelo negócio (cessão de quotas) posto em crise. Ocorresse o mesmo, mantivesse a 3ª R. a apontada atitude omissiva perante a vida societária da A., e nenhuma reacção surgiria por parte desta.
  O que verdadeiramente afecta e perturba a A., como já reiteradamente se frisou, não é esse negócio. O que perturba a A. é a 3ª R., como sua sócia, ter deixado aquela postura e, com ou sem razão, vindo agora a reagir perante actos societários ocorridos no seu seio.
  Conclui-se: a A. não tem legitimidade para deduzir esta acção porque não pode ser tida como sujeito de qualquer relação jurídica que, de algum modo, seja afectada pelos efeitos que o negócio posto em crise tende a produzir.
  Dir-se-á, mas o juiz pode conhecer oficiosamente a nulidade resultante da venda de coisa alheia e visto o disposto no artº279 do CC.
  Verdade.
  Todavia só o pode se a acção tiver sido regularmente proposta por quem tem legitimidade para o efeito e, por conseguinte, na sua pendência e ao conhecer o mérito.
  Não pode é utilizar-se a referida oficiosidade para garantir o «pontapé de saída» da causa: o juiz não propõe acções, o juiz conhece oficiosamente das nulidades que na pendência do processo surjam se não tiverem sido invocadas. Todavia quem trás o substrato factual que permite tal conhecimento é quem para o efeito tem legitimidade.
  Reafirmando e concluindo, não vemos, pois, forma de contornar a falta de legitimidade substantiva da A. para propor a presente acção.
  
  Quanto à processual concede-se a mesma vista a assunção da tese de Barbosa de Magalhães (artº58 do CPC).
  Por esta razão, o fundamento da rejeição da p.i. resulta do disposto da parte final da al.d) do artº394 nº1 do CPC.
  A presente rejeição da p.i. terá o mérito de se chamar o TSI a resolver de vez esta questão da legitimidade, desta sorte, a seguir a acção, excluir a invocação da inexistência deste pressuposto da defesa das RR.
  
  Por todo o exposto, rejeita-se a petição inicial, douta de resto nos seus argumentos – artº394 nº1 al.d) do CPC.
  Custas pela A.
  Notifique

Inconformada com o indeferimento liminar, a autora B Limitada, aqui requerida e recorrida interpôs dele o recurso ordinário.

Não obstante a ainda pendência do recurso que, segundo as informações oficiosamente obtidas junto do TJB, se encontra a aguardar a efectivação de todas as citações e notificações legalmente impostas antes da subida, é de antever que o recurso tem pouca probabilidade de vir a ser julgado procedente.

Pois para nós, conforme se vê no despacho de indeferimento liminar, foi demonstrada pelo Exmº Colega do 3º Juízo Cível, com raciocínio inteligível e razões sensatas e convincentes, a manifesta falta da legitimidade substantiva da autora B Limitada, para suscitar as alegadas invalidades imputadas à vida societária interna de um dos seus sócios.

Portanto, se tivéssemos sido chamados para se pronunciar, em sede de recurso, sobre a bondade desse despacho de indeferimento liminar, certamente iríamos louvá-lo nos termos autorizados pelo artº 631º/5 do CPC.

Por outro lado, não se vê o que pode habilitar a ali autora B Limitada, a intrometer-se na vida societária interna no seio de um dos seus sócios.

Assim, ponderando estas duas circunstâncias: a falta manifesta da legitimidade substantiva e a falta de interesse directo e pessoal de agir, somos levados a concluir pela existência das fundadas suspeitas de que a acção nº CV3-20-0070-CAO foi intencionalmente intentada pela aqui requerida B Limitada para impedir o exercício pela sócia A (Macau) Limitada do seu direito à informação sobre a gestão e as contas da requerida.

Verificando-se a circunstância impeditiva a que se refere o artº 223º/2 do CPC, não obstante a natureza prejudicial da questão da regularidade da procuração forense discutida a título principal naqueloutra acção que corre os seus termos no 3º Juízo Cível sob o nº CV3-20-0070-CAO, não deve ser decretada a suspensão da instância.

Concluindo e resumindo:

1. Numa acção de exame judicial a uma sociedade instaurada por um sócio seu que é uma pessoa colectiva, configura-se como efectiva questão prejudicial a questão acerca da regularidade/validade da procuração forense outorgada pelo administrador do sócio a favor do mandatário forense para a representação do sócio na mesma acção.

2. Não obstante a pendência de uma acção prejudicial, se o Tribunal da causa subordinada, depois de ponderadas as circunstâncias do caso concreto, nomeadamente a falta manifesta da legitimidade substantiva e a falta de interesse pessoal, directo e imediato de agir por parte do autor da acção prejudicial, concluir pela existência das fundadas suspeitas de que a acção prejudicial foi intencionalmente intentada para servir da manobra dilatória, não se deve determinar a suspensão da instância.


Resta decidir.
III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam julgar procedente o recurso, revogando o despacho recorrido e determinando a baixa dos autos à primeira instância para a prossecução dos ulteriores termos processuais.

Custas pela requerida.

Registe e notifique.

RAEM, 04NOV2021
* * *
Submetido à discussão e votação, tal projecto não obteve vencimento da maioria do Colectivo, passa o primeiro-adjunto a ser relator deste processo, ao abrigo do disposto no artigo 631º/3 do CPC.
* * *

I - RELATÓRIO
    Sociedade de Investimento Predial e Imobiliário A (Macau), Limitada, Recorrente, devidamente identificada nos autos, discordando do despacho proferido pelo Tribunal de primeira instância, datada de 03/02/2021 (fls. 638 a 641), dela veio, em 21/04/2021, interpor recurso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 763 a 794, tendo formulado as seguintes conclusões:
1.ª Vem o presente recurso do douto despacho do Meritíssimo Juiz a quo, explicitado em 3 de Fevereiro de 2021, a fls 638 e seguintes dos autos, que, ao abrigo do artigo 223.º, n.º 1, parte final, do CPC, ordenou a suspensão da instância, por haver motivo justificado, até que haja decisão transitada no processo n.º CV3-20-0070-CAO, conforme solicitado pelos Requeridos/ Recorridos, no processo especial de Exame à Sociedade, “Companhia de Investimento Comercial e Fomento Predial B, Limitada” e D.
2.ª A Recorrente imputa ao douto despacho recorrido o vício de violação de lei, por incorrecta interpretação do art.º 223.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, o que diz com a ressalva do muito respeito que é devido.
3.ª No dia 20 de Julho de 2020, foi admitida a presente acção intentada pela Requerente/Recorrente, na qualidade de sócia, com o pedido de Exame Judicial à Sociedade Companhia de Investimento Comercial e Fomento Predial B, LIMITADA, 1.ª Requerida/Recorrida, tendo sido também citado para os termos do processo um dos seus Administradores, D, 2.° Requerido/Recorrido, para averiguar se existem quaisquer irregularidades na vida societária da 1.ª Requerida/Recorrida.
4.ª Em 7 de Setembro de 2020, os Requeridos/Recorridos apresentaram, em conjunto, a sua defesa, por excepção (ilegitimidade activa, ineptidão da petição inicial e abuso de direito) e por impugnação, tendo, ainda, requerido ao douto Tribunal que “suspenda a presente instância nos termos e ao abrigo do artigo 223.° do CPC, devendo a mesma ficar a aguardar decisão final do processo judicial n.º CV3-20-0070-CAO que corre termos no 3.° Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base”.
5.ª Com tal acção proposta já depois de terem sido os Requeridos/ Recorridos citados para a presente acção e a quatro dias do termo do prazo para apresentar a sua contestação, apresentada em 7 de Setembro de 2020, a l.ª RequeridalRecorrida, visa “obter a declaração judicial de invalidade e/ou ineficácia perante a 3.a Ré, aqui Requerente/Recorrente, da aquisição realizada, em 12 de Novembro de 2018, pelo 2.º Réu (C), representante da aqui Requerente/Recorrente, da quota com o valor nominal de MOP$80.000,00 (Oitenta mil Patacas) representativa de 80% do capital social da 3.a Ré, aqui Requerente/Recorrente, com o consequente reconhecimento judicial e declaração de nulidade de todas as deliberações sociais da 3.a Ré posteriores à data da referida aquisição, as quais foram exclusivamente aprovadas com os votos do 2.° Réu e, bem assim, de todos os actos e negócios jurídicos realizados pelo 2.° Réu “na putativa qualidade de sócio, administrador e representante da 3.ª Ré”.
6.ª A ora Recorrente opôs-se à suspensão da presente instância tendo em consideração o que sobre a questão dispõe o art.º 223.º do CPC, nomeadamente no que se refere não só ao facto de ter sido intentada tal acção para se obter a suspensão desta, mas, também, porque os prejuízos da suspensão superam as vantagens, porque as acções propostas em 2 de Setembro de 2020, têm como Réus, para além da Recorrente, e o seu gerente C, a empresa “A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED” (uma sociedade extinta), com sede em Singapura, o que pressupõe uma decisão em que se discutem normas de Direito Internacional Privado, e duas pessoas individuais (E e F) , cujo paradeiro em parte incerta é uma realidade do conhecimento da l.ª Requerida/Recorrida e que determinará que as respectivas citações devam ser feitas editalmente e com a demora que tal forma de citação provoca.
7.ª Os ora Recorridos tentaram usar vários argumentos para impedir que seja efectuado o Exame Judicial, não podendo colher o que é no sentido de que a Requerente/Recorrente devia ter sido dissolvida, pois, nos termos do art.º 316.° do Código Comercial, os efeitos da dissolução só produzem efeitos após o seu registo, ou seja, não existem efeitos retroactivos da dissolução de uma sociedade comercial e se ela existe e se ela é sócia da 1.ª Requerida/Recorrida, não existe razão para invocar tal argumento.
8.ª Os Recorridos não podem é insurgir-se com o facto de a Recorrente pretender conhecer com rigor a vida societária da 1.ª Requerida/Recorrida, desenvolvendo a sua actividade na área do imobiliário, quer arrendando espaços, quer vendendo imóveis do seu património e isto, após ter o 2.° Requerido/Recorrido, então sócio com uma quota nominal equivalente a 9% do capital social - através de uma deliberação social, cuja inexistência a ora Recorrente, requereu pela via judicial, estando a correr a Acção os seus termos sob o n.º CVl-20-0036-CAO -, logrado tornar-se sócio maioritário com uma quota de valor nominal de 90% do capital social, quota essa de que era titular a ora Recorrente.
9.ª Não só porque as circunstâncias muito específicas de três Rés nos referidos autos com o n.º CV3-20-0070-CAO - uma pessoa colectiva sediada fora da RAEM e duas pessoas individuais cujo paradeiro é desconhecido há muitos anos - determinarão um processo muito complexo e longo mas, também, porque a 1.ª Requerida/Recorrida, ao intentar tais acções, está a praticar uma manobra dilatória, pediu a Recorrente ao douto Tribunal a quo que não decretasse a suspensão da instância da presente lide, ainda que considerasse existir o nexo de prejudicialidade entre as acções em causa.
10.ª Decorre da fundamentação do douto despacho recorrido que a razão pela qual foi ordenada a suspensão da instância do presente processo não foi por “ocorrer outro motivo também justificado”, isto é, motivo diferente da pendência da causa prejudicial e que, no seu alto critério, justificasse a suspensão, sendo até suficiente que o prazo durante o qual estará suspensa a instância coincide com a decisão a ser explicitada no processo CV3-20-0070-CAO para se determinar que o Meritíssimo Juiz a quo ordenou a suspensão com fundamento na causa prejudicial.
11.ª O art.º 223.°, n.º 1, do CPC começa por indicar ao Tribunal um motivo justificado de suspensão - a pendência de causa prejudicial - e, depois, atribui o poder de suspender a instância quando entender que ocorra outro motivo também justificado que fundamente a suspensão da instância.
12.ª O douto Tribunal a quo apresentou como justificação para suspender a instância até que haja uma decisão definitiva na acção que corre termos pelo 3.° Juízo Cível do TJB, sob o n.º CV3-20-0070-CAO, 4 (quatro) razões, designadamente, (i) porque a decisão sobre o pedido de declaração de nulidade da procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019, em representação da Sociedade de Investimento Predial e Imobiliário A (MACAU), Limitada, pode afectar a presente causa; (ii) se esta acção prosseguir sem aguardar pela decisão proferida no processo n.º CV3-20-0070-CAO sobre a validade da procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019, pode correr-se o risco de virem a ser praticados actos inúteis no presente processo se for judicialmente reconhecida a invalidade da procuração em causa; (iii) o processo n.º CV3-20-0070-CAO é a sede própria para a questão da regularidade do mandato da Requerente (ora Recorrente), na medida em que A Investment (SINGAPORE) PTE Limited e C não são partes neste processo e (iv) o facto de poder haver decisões contraditórias, isto é, considerar-se válida a procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 no presente processo e vir a considerar-se inválida no processo n.º CV3-20-0070-CAO.
13.ª Não decorre da lei o que se deve entender por “outro motivo justificado”, permitindo concluir-se que se confere ao juiz uma margem lata de liberdade de acção, podendo ordenar a suspensão quando entenda que há utilidade ou conveniência processual em que a instância se suspenda, ou sej a, será perante cada caso concreto que se terá de indagar se ocorre ou não motivo que justifique a suspensão da instância, e com base em tal fundamento, sendo que, contudo, o mesmo fundamento não poderá ter nada a ver com a pendência de outra acção.
14.ª Das quatro (4) razões invocadas pelo douto Tribunal a quo, decorre que as mesmas têm todas a ver com a pendência da acção CV3-20-0070-CAO, certo sendo que parece ser unânime o entendimento de que existe verdadeira prejudicialidade e dependência quando na primeira causa se discute, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental.
15.ª O douto Tribunal a quo fez uma incorrecta ponderação e valoração dos motivos invocados pelas partes, designadamente, na oposição apresentada pela Requerente, ora Recorrente, e, consequentemente, mal decidiu ao determinar a suspensão da instância até que seja conhecida a decisão definitiva na acção n.º CV3-20-0070-CAO, com fundamento “num outro motivo justificado”, e não no facto de considerar que a decisão desta causa está dependente do julgamento da causa objecto do mencionado processo CV3-20-0070-CAO.
16.ª Tendo fundamentado a suspensão da instância no nexo de prejudicialidade entre as duas causas, o douto Tribunal a quo teria que entrar em linha de conta com a norma do n.º 2 do art.º 223.º do CPC, uma vez que não só a presente causa ( dependente e suspensa) não se compadece com a morosidade da causa do processo CV3-20-0070-CAO, mas, também, porque a 1.ª Recorrida intentou os dois processos unicamente para se obter a suspensão, pois ambos foram movidos, após terem os Recorridos sido citados para os termos da presente causa (Exame Judicial à Sociedade) e da Acção de Declaração de Inexistência de Deliberação Social, que corre termos pelo 1.º Juízo Cível sob o n.º CVl-20-0036-CAO.
17.ª Os Recorridos tinham conhecimento de que a Recorrente, enquanto sócia, tinha interesse em conhecer a vida societária da l.ª Recorrida e, através do seu representante C, a Recorrente teve acesso ao único livro de actas que lhe foi apresentado e de onde pôde intuir que havia irregularidades que pretende sejam conhecidas através da presente causa.
18.ª A Recorrente requerer ao Venerando Tribunal ad quem que considere que, efectivamente, face ao pedido de Exame Judicial, a suspensão da presente lide traz muitos prejuízos e poucas vantagens, sendo certo que, no âmbito deste processo não foi pedida a nulidade da transmissão da quota da empresa A (SINGAPORE) para C, pelo que não podia o douto Tribunal a quo indicar como um “motivo justificado” para ordenar a suspensão da instância, a possibilidade de haver decisões contraditórias, isto é, considerar-se válida a procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 no presente processo e vir a considerar-se inválida no processo n.º CV3-20-0070-CAO.
19.ª Nos termos da lei, “o registo definitivo constitui presunção de que existe a situação jurídica, nos precisos termos em que é definida”, e “os factos comprovados pelo registo não podem ser impugnados em tribunal sem que simultaneamente seja pedido o seu cancelamento”.
20.ª Nos termos dos estatutos da sociedade registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis, C tem poderes para representar a Requerente, ora Recorrente.
VIII - PEDIDO
TERMOS EM QUE, e contando com o douto suprimento de Vossas Excelências, Venerando Juízes, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogado o douto despacho recorrido, porque enferma de um vício de violação de lei, por má interpretação, não estando reunidos os requisitos de “outro motivo justificado” para a suspensão da instância a que alude o art.º 223.º, n.º 1, in fine, do Código de Processo Civil.
Mais se requer, muito respeitosamente, que ainda que se considere existente o nexo de prejudicialidade entre a presente acção intentada pela Requerente/Recorrente, e a que corre termos, sob o n.º CV3-20-0070-CAO, pelo 3.° Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base, intentada pela 1.ª Requerida/Recorrida, em 2 de Setembro de 2020, não seja ordenada a suspensão da instância, uma vez que esta última só conhecerá uma decisão definitiva após um longo e complexo processo judicial, o que, por si só, acarreta graves prejuízos, porque está em causa nesta lide a verificação de irregularidades (confessadas pelos Requeridos) na vida societária da 1.ª Requerida/Recorrida, acrescendo que esta intentou a referida acção de invalidade, como manobra dilatória, pedido este tendo em consideração o que sobre esta matéria dispõe o art.º 223.° do Código de Processo Civil,
Assim se procedendo, far-se-á, a costumada
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    Ao recurso respondeu a requerida B Limitada, pugnando pela improcedência do recurso.
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II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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  III – FACTOS ASSENTES:
    A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
    São os já constantes do projecto do acórdão acima transcrito.

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     IV – FUNDAMENTAÇÃO

    O Tribunal recorrido fundamentou a sua posição nos seguintes termos:
    “(…)
  - O pedido de suspensão
  Os Requeridos pedem a suspensão de instância até à decisão final do processo judicial n.º CV3-20-0070-CAO, invocando que o presente processo se encontrar dependente da decisão proferida no âmbito do referido processo e no processo de rectificação do registo entretanto instaurado por a decisão sobre a invalidade e ineficácia da cessão da quota detida na SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA e de nomeação de C como gerente desta sociedade poder originar a falta de legitimidade representativa da Requerente por C.
  A Requerente opôs o pedido de suspensão porque o processo n.º CV3-20-0070-CAO vai ser um processo longo e complexo e a Requerida instaurou a referida acção como manobra dilatória.
  Cumpre decidir.
  Os Requeridos defendem que a transmissão da quota da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA detida inicialmente pela A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED para C é inválida por não se encontrar demonstrado que o Senhor G tinha legitimidade de transmitir a referida quota, e a transmissão da quota em causa é ineficaz perante a SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA, ora Requerente, por não ter obtido o consentimento escrito desta sociedade. Por essa razão, C não tem qualidade de sócio da Requerente e as deliberações outorgadas por C são nulas, incluindo a designação de C como gerente da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA. Consequentemente, a procuração outorgada por C como gerente da Requerente cuja pública-forma se junto a fls. 239 a 242 é irregular.
  No fundo, o que os Requeridos estão a por em causa é a procuração outorgada por C em representação da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA, ora Requerente.
  De fls. 539 a 549 resulta que o 1.º Requerido pediu declaração de nulidade de cessão da quota com o valor nominal de MOP$80,000.00 realizada a favor de C, declaração de nulidade de todas as deliberações da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA tomadas na assembleia geral de 15 de Janeiro de 2019, cancelamento dos registos de tais deliberações junto da Conservatória do Registo Comercial de Macau sob AP.20/26112018, AP.27/22012019 e AP.28/22012019 e declaração de nulidade da procuração outorgada em 16 de Janeiro de 2019 por C, em representação da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA no processo n.º CV3-20-0070-CAO.
  Dispõe o artigo 223.º/1 do CPC que “O Tribunal poderá ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado.”.
  Como se refere o Prof. Alberto dos Reis (in Comentário ao Código do Processo Civil, vol. 3.º, Coimbra ed.1946, pág. 267 e ss), “Uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela pode prejudicar a decisão desta, isto é, quando a procedência da primeira tira a razão de ser à existência da segunda. Exemplos característicos: acção de anulação de casamento e acção de divórcio, acção de anulação de arrendamento e acção de despejo. O divórcio pressupõe um casamento válido; por isso, estando pendentes duas acções, uma destinada a anular determinado matrimónio, outra destinada a dissolvê-lo pelo divórcio, aquela é prejudicial em relação esta, porque, uma vez anulado o casamento, o pedido de divórcio já não tem razão de ser, já não tem suporte legal. Sucede o mesmo quando à anulação de arrendamento e ao despejo. O pedido de despejo pressupõe um arrendamento válido; portanto este pedido perde a sua razão de ser, desde que o arrendamento seja anulado.”.
  Já para RODRIGUES BASTOS, o conceito de prejudicialidade é mais amplo, “Quando deve entender-se que a decisão de uma causa depende do julgamento de outra? Quando na causa prejudicial esteja a apreciar-se uma questão cuja resolução possa modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para decisão de outro pleito”- in Notas ao Código de Processo Civil, Lisboa, 2000, vol. II, 3.ª ed., p. 43.
  A jurisprudência de Macau acolheram ambos conceitos, aceitando que é também causa prejudicial caso a resolução da questão na causa prejudicial modifica ou afecta de alguma maneira a causa dependente, mesmo que esta segunda causa não se extinga por via da decisão da primeira (TUI n.º 33/2015).
  Portanto, desde que a solução dada a uma causa possa ter reflexos ponderosos na decisão a proferir em outra acção, ou desde que a decisão da primeira possa destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda, sob o ponto de vista do efeito jurídico pretendido, ou possa modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a decisão de outro pleito, ou quando numa acção se ataca um acto ou um facto jurídico que é pressuposto necessário de outra acção, então o caso é de prejudicialidade (neste sentido, v.g., Ac. do TSI, Proc. n.º 610/2017, Ac. do TSI, de 12/07/2012, Proc. nº 326/2011; no direito comparado, Ac. do STJ, de 13/04/2010, Proc. nº 707/09).
  No caso em apreço, entendemos que a acção do processo n.º CV3-20-0070-CAO não é causa prejudicial na medida em que as questões que vão ser discutidas naquela acção não vão destruir a razão deste processo, que é averiguar se existem irregularidades na SOCIEDADE COMPANHIA DE INVESTIMENTO COMERCIAL E FOMENTO PREDIAL B LIMITADA. Ou seja, mesmo que a transmissão de quota detida inicialmente por A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED para C seja inválida ou ineficaz, o presente processo não deixa de ter razão de prosseguir, embora possa acontecer que a SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA não pode ser representada por C nesta acção.
  A invalidade ou ineficácia de transmissão de quota detida inicialmente por A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED para C também não irá modificar a situação jurídica que tem que ser decidida neste processo (se existem irregularidades na SOCIEDADE COMPANHIA DE INVESTIMENTO COMERCIAL E FOMENTO PREDIAL B LIMITADA) porque tratam-se de duas questões independentes e autónomas.
  Deste modo, não tem razões para ordenar a suspensão dos presentes autos por motivo de existência duma causa prejudicial.
  Não obstante, entendemos que a decisão sobre o pedido de declaração de nulidade da procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019, em representação da SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA, pode afectar a presente causa. Uma vez que o mandatário da Requerente foi constituído pela procuração outorgada em 16 de Janeiro de 2019 por C, em representação da Requerente, caso o pedido de declaração de nulidade de procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 proceder, o mandato conferido pela SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA passará a ser irregular e a SOCIEDADE DE INVESTIMENTO PREDIAL E IMOBILIÁRIO A (MACAU) LIMITADA teria que regularizar o mandato sob pena de se verificar a excepção dilatória prevista na al. i) do artigo 413.º do CPC.
  Assim sendo, caso prosseguir o presente processo sem aguardar pela decisão proferida no processo n.º CV3-20-0070-CAO sobre a validade da procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019, pode correr o risco de vir a ser praticado actos inúteis no presente processo se for judicialmente reconhecida a invalidade de procuração em causa. Deste modo, entendemos que existe motivo justificado para ordenar a suspensão dos presentes autos.
  Por outro lado, apesar de a questão de regularidade do mandato da Requerente possa ser decidida incidentemente neste processo, entendemos que o processo n.º CV3-20-0070-CAO é a sede própria para a questão na medida em que A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED e C não são partes deste processo, mas partes de processo n.º CV3-20-0070-CAO. Ora, como a questão de validade de procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 em representação da Requerente encontra-se dependente da questão de validade e eficácia de transmissão de quota detida inicialmente por A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED para C e essa questão não deve ser decidida sem estarem presentes os intervenientes principais dos actos em causa, A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED e C, a questão de nulidade de procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 deve ser decidida numa causa em que A INVESTMENT (SINGAPORE) PTE LIMITED e C intervêm, que é o processo n.º CV3-20-0070-CAO.
  Mais, caso prosseguir a presente acção e a decisão proferida nesta acção sobre a validade de procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 não for igual à decisão a proferir no processo n.º CV3-20-0070-CAO, as decisões sobre a mesma matéria serão contraditórias.
  Pelas razões expostas, entendemos que há motivo justificado para ordenar a suspensão dos presentes autos para aguardar a decisão a proferir no processo n.º CV3-20-0070-CAO sobre a validade de procuração outorgada por C em 16 de Janeiro de 2019 em representação da Requerente.
  A Requerente defende que os prejuízos causados pela suspensão superam as vantagens pelo que não deve ordenar a suspensão dos presentes autos. Tendo em conta que a causa que esse Tribunal considera existe para ordenar a suspensão dos presentes autos não é a existência da causa prejudicial mas existência de motivo justificado, o motivo de não ordenar a suspensão prevista na 2.ª parte do n.º 2 do artigo 223.º do CPC não tem aplicação no presente caso. Assim sendo, a oposição deduzida pela Requerente sobre os prejuízos causados pela suspensão não pode proceder.
  Também não entendemos que o 1.º Requerido, ao intentar a acção n.º CV3-20-0070-CAO, está a praticar uma manobra dilatória porque o que o 1.º Requerido fez não é mais de que tentar salvaguardar os seus interesses mediante a arguição de irregularidade do mandato conferido pela Requerente ao seu mandatário. Ou seja, não há indícios seguros de que tal acção foi intentada com intuitos meramente dilatórios por poder o 1.º Requerido entender que a questão em causa deve ser decidida a título principal numa acção própria.
  Pelas razões expostas, ao abrigo do artigo 223.º/1, parte final, do CPC, ordeno a suspensão da instância por haver motivo justificado até que haja decisão transitada no processo n.º CV3-20-0070-CAO.
  Notifique.”

    Seguido o raciocínio do Tribunal a quo, com o qual concordamos, e acrescentamos ainda o seguinte:
    1) - No Processo nº 613/2021 do TSI, em que são as mesmas partes, não obstante as questões discutidas serem ligeiramente diferentes, acolhemos a posição da existência de motivos bastantes para suspender a instância para que certas “questões prévias” sejam resolvidas antes. Neste processo, não encontramos razões suficientemente fortes para não seguir o mesmo raciocínio.
    2) - Ora, todas as questões suscitadas nas alegações do recurso já foram objecto de análise por parte do Tribunal recorrido, e é de sublinhar que o artigo 223º do CPC confere ao julgador um poder discricionário de mandar suspender a instância até que certas questões pertinentes ou com repercussões ou reflexos importantes sejam resolvidas, que é o caso dos autos.
    3) - Dos elementos invocados pelo Tribunal recorrido não resulta que tal decisão violou algum preceito legal ou foi tomada com base nos elementos erroneamente apreciados, pelo que, é da nossa conclusão que o Tribunal a quo fez uma análise ponderada dos factos e uma aplicação correcta das normas jurídicas aplicáveis, proferido uma decisão conscienciosa e legalmente fundamentada, motivo pelo qual é de manter a decisão recorrida.
*
    Síntese conclusiva:
    Quando a decisão de uma causa depende de uma outra, ou seja, quando a situação jurídica deste processo pode ser modificada ou influenciada determinantemente por decisão de um outro processo pendente, é de entender que existe causa justificativa para suspender a instância deste processo ao abrigo do disposto no artigo 223º/1 do CPC, de modo a evitar proferir-se decisões contraditórias ou praticar actos processuais inúteis que possam pôr em causa a justiça material.
* * *
    Tudo visto e analisado, resta decidir.
* * *
V - DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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    Custas pela Recorrente.
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    Registe e Notifique.
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RAEM, 11 de Novembro de 2021.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
Lai Kin Hong
    Vencido nos termos do projecto do Acórdão por mim apresentado à conferência.

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2021-561-suspensão-instância