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Processo nº 729/2020
(Autos de Recurso Cível e Laboral)

Data do Acórdão: 25 de Novembro de 2021

ASSUNTO:
- Restituição Provisória da Posse
- Esbulho
- Violência

SUMÁRIO:
- Para que seja ordenada a restituição provisória da posse é necessária a prova da posse, do esbulho e da violência;
- Para que se possa concluir que alguém tem a posse de determinada coisa é necessária a prova do “corpus” expressa nos actos matérias em que se traduz a apreensão material da coisa ou a possibilidade de a continuar a todo o tempo e do “animus” elementos subjectivo, ou intenção, com base na qual se possui por referência a um determinado direito real;
- A violência tanto pode ser exercida pelo uso da força sobre a coisa (v.g. arrombamento, escalamento, etc.) ou sobre a pessoa do possuidor esbulhado seja através da força física ou coacção moral.



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Rui Pereira Ribeiro





















Processo nº 729/2020
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 25 de Novembro de 2021
Recorrentes: A e outros (Recurso interlocutório)
   B (Recurso Final)
Recorridos: Os mesmos
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO
  
  A, C, D, F e G, todos com os demais sinais dos autos,
  vieram instaurar providência cautelar não especificada, contra,
  B, também, com os demais sinais dos autos,
  alegando que o marido e pai dos Requerentes desde 1969 está na posse do imóvel a que respeitam os autos, a qual após o óbito daquele passou a ser exercida pelos Requerentes, na convicção de serem os seus proprietários e que em Janeiro de 2019 tiveram conhecimento de que a fechadura do portão do prédio havia sido arrombada e substituída por um cadeado sem autorização dos mesmos, impedindo-os de exercer a posse sobre o mesmo, pedindo a restituição provisória da posse sobre o prédio, ou subsidiariamente, a restituição imediata pelo Requerido aos Requerentes do prédio, bem como das respectivas chaves e duplicados das mesmas.
*
Recurso interlocutório
  Foi proferido despacho inicial julgando-se improcedente o pedido de restituição provisória da posse nos termos do artº 388º do CPC, admitindo-se liminarmente o pedido subsidiário de restituição do prédio nos termos dos artº 340º e 326º do CPC, tendo sido ordenada a notificação da parte contrária para exercer o contraditório em 10 dias.
  Deste despacho vieram os Requerentes da providência interpor recurso apresentando as seguintes conclusões:
A. O despacho recorrido indefere o pedido de restituição provisória de posse formulado pelos Recorrentes, com o fundamento de que o esbulho não foi feito com violência, uma vez que os Recorrentes raramente se encontram no Prédio dos autos.
B. A violência do esbulho, prevista nos artigos 1185.º, n.º 1, e 1204.º do Código Civil e 338.º do Código de Processo Civil, não implica necessariamente que a ofensa da posse ocorra na presença do possuidor.
C. Basta que o possuidor dela seja privado contra a sua vontade em consequência de um comportamento que lhe é alheio e impede, contra a sua vontade, o exercício da sua posse como até então a exercia.
D. Decorre dos factos dos autos que o comportamento do Recorrido se pautou pela violência, na medida em que os Recorrentes ficaram privados da sua posse ao serem impedidos pelo Recorrido de aceder ao Prédio, pelo que o esbulho poderá ser qualificado como violento, para os efeitos do artigo 338.º do CPC.
  Contra alegando veio o Requerido e Recorrido neste recurso contra-alegar pugnando em síntese que:
1. Considerado que os Requerentes não têm interesse em recorrer, uma vez que, pese o facto de ter sido indeferida liminarmente a providência nominada “Restituição Provisória de Posse”, o Meritíssimo Juiz a quo mandou prosseguir os autos, dando oportunidade aos requerentes de defender a sua posse através do procedimento cautelar comum que, embora com pressupostos ligeiramente diferentes, acautela os mesmos interesses;
Se assim não for entendido por Vossas Excelências, Venerandos Juízes, requer-se que seja
2. Considerado improcedente o recurso interposto para essa Alta Instância e, em consequência, seja mantido o douto despacho de fls 123 dos autos, porque, efectivamente, dos autos constam provas de que o alegado esbulho ou turbação da posse não foi violento,
  Por este tribunal foi proferido Acórdão no qual se julgou extinta a instância de recurso nos termos da al. e) do artº 229º “ex vi” al. e) do nº 1 do artº 619º do CPC – cf. fls. 376 a 378 -.
  Interposto recurso desse Acórdão veio o mesmo a ser revogado por Acórdão do Venerando Tribunal de Última Instância.
  
  Cumpre apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO

É do seguinte teor a decisão recorrida:
  «Nos presentes autos os requerentes intentaram a providência cautelar de restituição provisória de posse sem audiência da parte contrária e subsidiariamente pede a restituição da posse nos termos gerais do procedimento cautelar comum.
  De antemão, há-de realçar que a restituição da posse, com características antecipatórias apreciada e decida à revelia do requerido, é reservada para situações em que a ilicitude da conduta é mais grave.
  Da diligência madada ex-officio consta-se que os requerentes raras vezes se permaneçam em Macau.
  Para a requerente A, apenas permaneceu em Macau 3 dias durante o ano 2014, 2 dias durante o ano 2015, 1 dia durante o ano 2016 e 2017, respectivamente (fls. 94).
  Para a requerente C, apenas permaneceu em Macau 16 dias durante o ano de 2014 (fls 98 e 103), 8 dias durante o ano de 2015 (fls. 98 e 104), 7 dia durante o ano de 2016 (fls 98 e 103 a 104), 7 dias durante o ano de 2017 (fls 98 e 104) e 6 dias no ano corrente (fls. 105).
  Para o requerente D, apenas permaneceu em Macau 6 dias durante o ano de 2014 (fls 108), 2 dias durante o ano de 2015 (fls. 108), 1 dia durante o ano de 2017 e 2018, respectivamente (fls 108 e 109) e 1 dia no ano corrente (fls. 109).
  Para a requerente F, apenas permaneceu em Macau 16 dias durante o ano de 2014 (fls 112), 8 dias durante o ano de 2015 (fls. 112), 3 dias durante o ano de 2016, O dia durante o ano de 2017 e 2 dias durante o ano de 2018 (fls 108).
  Para a requerente G, apenas permaneceu em Macau 12 dias durante o ano 2014 (fls 119 e 120), 6 dias durante o ano 2015 (fls. 112), 4 dias durante o ano 2016 (fls. 120 a 121), 3 dias durante o ano 2017 (fls. 121) e 5 dias durante o ano 2018 (fls 122) e 2 dias no ano corrente.
  Ora se os requerentes tão poucos dias passam por Macau afigura-se-nos que não estamos perante uma situação de iminência em que a gravidade da situação se justifica a restituição provisória de posse.
  É que, para o decretamento da restituição provisória de posse prevista no artigo 338.º do CPC, exige que a posse seja esbulhado e com violência.
  Quanto ao requisito da violência persistem fundamentalmente na doutrina e na jurisprudência duas posições.
  Uma diz-se que a violência relevante deve ser necessariamente exercida contra a pessoa do possuidor.1 Outra diz-se que basta a violência exerci da sobre a coisa, designadamente quando esteja ligada à pessoa do esbulhado ou quando dela resulte uma situação de constrangimento físico ou moral.
  Ora, dos dados carreados nos autos, tendo em atenção que os requerentes nos recentes anos poucos dias passam por Macau, se não vislumbram que a posse alegada pelos requerentes, a existir ou a esbulhar, seja feita com violência ou que resulte de uma situação de constrangimento físico ou moral.2
  Assim, nunca pode a restituição da posse seja procedida nos termos do artigo 338.º do CPC na revelia do requerido.
  Nestes termos, improcede-se quanto ao pedido da restituição provisória de posse nos termos do artigo 338.º do CPC. –
  Quanto ao pedido subsidiário da restituição do prédio aos requerentes nos termos do artigo 340.º e 326.º do CPC, admite-se liminarmente.
  Uma vez que a audiência do requerido não poria em risco sério o fim e a eficácia da providência requerida, visto que os requeridos não efectivamente vivem no prédio (pois, poucos dias passam aqui por Macau), notifique a parte contrária, para, querendo exercer o contraditório no prazo de 10 dias.»
  Em síntese entendeu o tribunal “a quo” em face do que se alegava no requerimento inicial, que a posse dos Requerentes a existir não pudesse ter sido esbulhada com violência ou alguma forma de constrangimento físico ou moral, pelo que se entendeu que nunca os Requerentes poderiam ser restituídos na posse na revelia do Requerido.
  O procedimento cautelar especificado de restituição provisória da posse vem regulado nos artºs 338º a 340º do CPC, os quais já foram sobejamente transcritos nas várias decisões proferidas nestes autos.
  A restituição provisória através do procedimento cautelar comum está regulada nos artº 326º e seguintes do CPC e resulta do nº 1 do artº 330º que o requerido é ouvido antes de ser decretada a providência se daí não resultar perigo para a utilidade da mesma.
  Para que a restituição provisória da posse seja ordenada é necessário que se demonstre que houve esbulho com violência.
  Para que seja ordenada a restituição provisória da posse é necessário que o Requerente demonstre:
  - A posse;
  - O esbulho;
  - A violência.
  Como ensina o Prof. Alberto dos Reis em Código de Processo Civil Anotado, em anotação ao artº 400º do CPC Português, 3ª Ed. Volume I, pág. 667, «o facto que dá causa à acção de restituição é o esbulho; mas este pode ser praticado com ou sem violência; a restituição provisória só tem cabimento quando o esbulho haja sido levado a cabo mediante violência. O benefício concedido, em tal caso, ao possuidor de ser restituído à posse imediatamente, isto é, antes de julgada procedente a acção, tem a sua justificação precisamente na violência cometida pelo esbulhador: é, por assim dizer, o castigo da violência.».
  Ou seja, a providência cautelar de restituição provisória da posse vem consagrar em termos de direito adjectivo o direito à restituição provisória na posse estatuído no artº 1204º do C.Civ., mas, não basta que se alegue e demonstre ter a posse e ter sido esbulhado é preciso que esse esbulho tenha ocorrido com violência.
  Quanto ao conceito de violência tem a jurisprudência vindo a entender que esta ocorre quando se usa da força, seja contra a pessoa do possuidor e aqui tanto pode ser pelo uso da força física como através de coacção moral, ou, pelo uso da força sobre a coisa (v.g. arrombamento, escalamento).
  Da decisão recorrida consta que através das diligências realizadas se concluiu que os Requerentes pouco tempo estiveram em Macau pelo que a situação não tem uma iminência de gravidade que justifique a providência. Prosseguindo, é manifesto que o tribunal “a quo” entende que só releva a violência sobre o possuidor quando conclui que não resulta uma situação de “constrangimento físico ou moral”.
  Ora, quando o legislador fala de violência não distingue, pelo que acompanhamos aqueles que entendem que a violência que se exige, tanto pode ter sido exercida sobre a pessoa do violador como sobre a coisa.
  O castigo da violência que segundo o Prof. Alberto dos Reis se pretende inflingir com esta providência tanto se justifica para aquelas situações em que a coisa é retirada da posse do esbulhado através da força física ou moral contra si usada, como naquelas outras em que, na ausência do esbulhado e através de um acto de agressão contra a coisa esta é retirada da posse daquele (possuidor esbulhado), seja através da destruição de portas, fechaduras, substituição destas, arrombamento, destruição ou construção de muros ou outras vedações, escalamento, colocação de obstáculos que impedem o acesso à coisa ou o uso da mesma, etc., até porque, em todas estas situações, através dessas acções realizadas sobre a coisa, de uma forma inopinada se impede o possuidor de continuar a usar a coisa com recurso a um impedimento físico.
  Tão violento é o acto em que através da força física se põe alguém fora da sua casa não o deixando regressar, como aquele em que com uma ferramenta se parte uma fechadura ou as dobradiças de uma porta, substituindo a fechadura por uma outra que fisicamente impede a pessoa de entrar na casa que possuía.
  Sobre esta matéria veja-se José Lebre de Freitas em Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, anotações ao artº 393º a pág. 70 e seguintes.
  Aqui chegados impõe-se apreciar o que consta do Requerimento inicial.
  Dos artºs 91º a 109º do requerimento inicial constam vários factos, tais como mudança de fechaduras e cadeados que a provarem-se podem integrar o conceito violência para efeitos do artº 1204º do C.Civ. e artºs 338º e 339º do CPC.
  Destarte, enferma de erro na aplicação do direito a decisão do tribunal a quo quando indefere liminarmente a restituição provisória da posse por entender que não havia sido invocada a violência.
  
  Aqui chegados, a solução aparentemente lógica seria revogar a decisão proferida e ordenar a remessa dos autos à 1ª instância para que se seguissem os ulteriores termos do processo e se decidisse em conformidade.
  Contudo, em termos processuais a diferença entre a restituição provisória da posse e o procedimento cautelar comum é que naquele nunca se ouve o Requerido e produzida a prova e verificados os requisitos a diligência é ordenada.
  Ora, no caso dos autos, o Requerido já foi ouvido e a prova já foi produzida e contra esta não foi apresentado recurso.
  Destarte, revogando-se o despacho de indeferimento liminar da restituição provisória da posse, já tendo sido a questão da restituição provisória da posse debatida pelas partes nestes autos, de acordo com o disposto no nº 2 do artº 630º do CPC impõe-se conhecer do pedido.
  
a) Factos
   
  Na decisão sob recurso foi dada por assente a seguinte factualidade, sem que haja sido interposto recurso algum quanto à mesma:
1) Na Rua de ......, n.º ..., em Macau, situa-se um prédio urbano composto por dois andares, o qual se encontra descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.º 1****, a fls. 99 do Livro B31.
2) O Prédio foi desanexado do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.º ****4, a fls. 153 vº do Livro B29.
3) Por sua vez, o prédio descrito sob o n.º ****4 foi desanexado do prédio descrito na mesma Conservatória sob o n.º ****9, a fls. 120 do Livro B29.
4) O domínio directo sobre o Prédio encontra-se inscrito na Conservatória do Registo Predial de Macau a favor do Território de Macau, conforme inscrição n.º 2***, a fls. 187 do Livro F3.
5) Tal inscrição foi requerida por H, que para o efeito apresentou um requerimento no dia 8 de Maio de 1928, no qual pode ler-se o seguinte:
“H, maior, casado, empreiteiro, residente em Macau, tendo aforado à Fazenda Nacional, conforme o alvará junto, um terreno com a área de 2.177 m2,86 situado na antiga Colina de S. Miguel, com as confrontações constantes do mesmo alvará, requer a V. Exa. se digne descrever primeiramente o referido terreno e inscrever a favor de Fazendo Nacional o domínio directo e em favor do Supte. o domínio útil.”
6) A inscrição n.º 2*** foi lavrada pelo Conservador do Registo Predial, que na mesma fez constar o seguinte:
“Inscrevo a favor de Fazenda Nacional o domínio directo do terreno descrito sob o n.º ****9 a fls. 120 do Livro B29, por a mesma Fazenda Nacional o haver sido concedido, em aforamento, a H, casado, empreiteiro, residente em Macau, mediante o foro anual de $43,56.”
7) O domínio útil sobre o Prédio encontrava-se inscrito a favor do Senhor H, conforme inscrição n.º ***6, a fls. 187 do Livro F3, onde se pode ler o seguinte:
“Inscrevo a favor de H, maior, casado, empreiteiro, residente em Macau, o domínio útil do terreno descrito sob o n.º ****9 a fls. 120 do Livro B29, por a Fazenda Nacional o haver sido concedido, em aforamento, mediante o foro anual de $43,56.”
8) Posteriormente, ocorreram diversas transmissões da titularidade do domínio útil do Prédio.
9) O titular inscrito do domínio útil do prédio dos autos é I, conforme inscrição n.º 2***3, a fls. 13 do Livro G20, e inscrição n.º 2***4, a fls. 76v do Livro G20.
10) O titular inscrito do domínio útil do Prédio, I, era empregado da sociedade X香煙公司, com sede em Guangzhou.
11) J, marido e pai dos Requerentes, era, nos anos 70, gerente da loja da Tabaqueria Filipina em Macau, sita na Avenida ......, n.º ...-....
12) Em virtude das funções que desempenhava na referida loja, em 1968 J começou a viver no Prédio com a sua família, os Requerentes.
13) Nos finais dos ano 60, J e os Requerentes se mudaram para o R/C do Prédio.
14) Desde 1970, J sempre dispôs do R/C do Prédio como melhor entendeu.
15) Ali preparando e tomando refeições.
16) Descansando e pernoitando.
17) Recebendo correspondência.
18) Procedendo ao pagamento das contribuições e impostos inerentes à sua propriedade.
19) Pagando todas as despesas relativas ao fornecimento de água e energia do R/C.
20) Nunca tendo pago rendas por tal utilização do Prédio, nem tais rendas lhes tendo sido solicitadas por quem quer que fosse.
21) B era parente de um membro da gerência da sociedade YY煙草公司, de Xangai, cidade em que a tal sociedade e a X香煙公司 mantinham uma relação de negócios.
22) Nos finais de 1980, B começou a trabalhar na loja da Tabaqueria Filipina em Macau, sob a supervisão de J.
23) A partir do final de 1980, B começou a viver no 1.º andar do Prédio.
24) Em 1981 vieram a esposa de B e o seu filho, passando a família ## a viver no 1.º andar do Prédio.
25) B permaneceu no 1.º andar do Prédio até 2002.
26) A partir de 2002, B continuou a usar o 1.º andar do Prédio como seu endereço de correspondência desde essa data.
27) Por razões de saúde, J e a Requerente A mudaram-se para Hong Kong em 2003.
28) Contudo, continuaram a manter o R/C do Prédio como a sua casa em Macau.
29) Ali ficando periodicamente com a sua família.
30) J faleceu em 2 de Dezembro de 2013, no estado de casado com a Requerente A.
31) Do casamento entre J e a Requerente A nasceram quatro filhos: os Requerentes C, D, F e G.
32) Em 19 de Dezembro de 2018, os Requerentes tomaram conhecimento de que o portão de entrada do Prédio, que se encontrava sempre fechado, tinha sido removido do respectivo local.
33) Tendo as dobradiças do referido portão sido destruídas.
34) Os Requerentes não deram qualquer tipo de autorização ou consentimento a qualquer pessoa ou entidade para remover o portão de entrada do Prédio.
35) As dobradiças do portão em causa tinham sido removidas por ordem do Sr. K Benjamin.
36) Em 12 de Dezembro de 2018, a empresa Ferragens WW removeu, a fechadura do Prédio.
37) Em 27 de Dezembro de 2018, os Requerentes solicitaram à empresa “ZZ工程” para instalar um novo portão no Prédio.
38) No mesmo dia, os Requerentes mandaram colocar no novo portão e na entrada do Prédio dois avisos com o teor que consta de fls. 38 do Doc. n.º 1 que ora se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
39) Quando foi instalado em 27 de Dezembro de 2018, por ordem dos Requerentes, o novo portão do Prédio tinha uma fechadura e um cadeado prateado.
40) Em 8 de Janeiro de 2019, os Requerentes tomaram conhecimento de que a fechadura do novo portão do Prédio tinha sido arrombada.
41) O cadeado que fechava no trinco do portão tinha sido removido e substituído por um cadeado dourado.
42) Os Requerentes não deram qualquer tipo de autorização ou consentimento a qualquer pessoa ou entidade para colocar tal novo cadeado no portão do Prédio.
43) Em virtude da colocação do novo cadeado, os Requerentes estão impossibilitados de aceder ao Prédio.
44) Existe um motociclo estacionado no interior do pátio do Prédio.
45) Foi instalada uma câmara de vigilância no primeiro piso do Prédio.

b) Do Direito

  Em sede de recurso da decisão proferida por este tribunal anteriormente, quanto ao mérito da providência cautelar já o Venerando Tribunal de Última Instância decidiu que está demonstrada a posse do Requerente, mandando baixar os autos para que se conhecesse da lesão grave e de difícil reparação do direito.
  Contudo, concluindo-se que não há fundamento para o indeferimento liminar da providência de restituição provisória da posse impõe-se antes de mais apreciar se os requisitos desta se verificam, até porque, sendo a diferença entre a restituição provisória da posse e o procedimento cautelar comum a exigência neste da verificação da lesão grave e de difícil reparação do direito enquanto naquele (na restituição provisória) este requisito não é exigido uma vez que em face da violência se entende estar justificada a providência independentemente de haver ou não a lesão grave e de difícil reparação do direito, cabe apreciar primeiro dos pressupostos do procedimento cautelar especifico requerido.
  
  Em face da factualidade apurada e na sequência do recurso interposto da decisão antes proferida por este tribunal, já o Venerando Tribunal de Última Instância concluiu estar provado nos autos que o Requerente é possuidor do prédio a que respeitam os autos.
  Dos factos que constam dos números 32 a 45 resulta demonstrado o esbulho, isto é, que os Requerentes foram privados da posse da coisa perdendo o domínio sobre a mesma, sendo que tal aconteceu porque foi arrombado e substituído o cadeado que fechava o portão de acesso ao pátio da propriedade o que, como já referimos supra, tendo sido feito sem autorização dos Requerentes, contra a vontade destes é um acto físico de arrombamento que impediu o acesso destes à coisa de forma inopinada e que é qualificada por Doutrina e Jurisprudência como violência para efeitos do artº 338º do CPC e do artº 1204º do C.Civ..
  
  Demonstrados os requisitos – posse, esbulho e violência - de que depende que seja decretada a restituição provisória da posse impõe-se que esta seja ordenada, ficando prejudicada a apreciação do pedido subsidiário e em consequência fica prejudicada a apreciação da questão de saber se está demonstrada a lesão grave e de difícil reparação do direito.
  
III. DECISÃO

  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, decide-se revogar o despacho de indeferimento liminar da restituição provisória da posse, bem como a decisão final de concessão parcial do procedimento cautelar comum e em consequência ordena-se que os Requerentes sejam restituídos provisoriamente da posse do prédio a que se reportam os autos, sito em Macau na Rua de ...... nº ..., e descrito na Conservatória do registo Predial sob o nº 1****, a fls. 99 do Livro B31.
  
  Custas a cargo do Requerido.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 25 de Novembro de 2021
  
  
(Relator)
Rui Carlos dos Santos Pereira Ribeiro

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Lai Kin Hong

(Segundo Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong
1 Vide jurisprudência citada por ABRANTES GERALDES, TEMAS DA REFORAM DO PROCESSO CIVIL, VOL IV, pago 44 e ss, e.g.: Ac. do STJ, de 15-3-83, BMJ 325.°/580; Ac. da Relação de Lisboa de 13-03-81, CJ, tomo II, pag. 172; Ac. da Relação do Porto, de 18-09-95, BMJ 449.°/445.
2 Para a posição dos diferentes autores, vide MANUEL RODRIGUES, A POSSE, pag. 364 e 365. ALBERTO DOS REIS, CPC ANOTADO, VOL 11, 3.ª ed. Pag. 178.
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729/2020 CÍVEL (R) 2