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Processo nº 770/2021
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 02 de Dezembro de 2021

ASSUNTO:
- Impugnação da decisão da matéria de facto
- Responsabilidade solidária das concessionárias de jogo

SUMÁRIO :
- Segundo o princípio da livre apreciação das provas previsto nº 1 do artigo 558.º do CPC, “O tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”.
- Assim, a reapreciação da matéria de facto por parte deste TSI tem um campo muito restrito, limitado, tão só, aos casos em que ocorre flagrantemente uma desconformidade entre a prova produzida e a decisão tomada, nomeadamente quando não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação.
- Pois, não se trata de um segundo julgamento até porque as circunstâncias não são as mesmas nas respectivas instâncias, não bastando que não se concorde com a decisão dada, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de erro na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efectivamente, no caso, foram produzidos.
- A responsabilidade solidária da concessionária de jogo de fortuna e azar só existe quando o depósito em causa tem conexão com a promoção da actividade de jogo e azar.
- Não tendo elementos que permitem concluir o depósito tem conexão com a actividade da exploração de jogo, não podemos condenar a concessionária de jogo, a pagar solidariamente a quantia depositada ao abrigo do artº do artº 23º, nº 3 da Lei nº 16/2001, bem como dos artºs 29º e 30º do RA nº 6/2002.
O Relator,

Ho Wai Neng















Processo nº 770/2021
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 02 de Dezembro de 2021
Recorrentes: A (Autora)
XXX Entretenimento Sociedade Unipessoal Limitada (1ª Ré)
Recorridas: As Mesmas
YYY Resorts (Macau) S.A. (2ª Ré)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 05/02/2021, julgou-se parcialmente procedente a acção e, em consequência, absolve-se do pedido a 2ª Ré YYY Resorts (Macau) S.A. e condena-se a 1ª Ré XXX Entretenimento Sociedade Unipessoal Limitada a pagar à Autora A a quantia de HKD$10,000,000.00, acrescido dos juros de mora, a taxa legal, contados a partir do 06/07/2018 até integral pagamento.
Dessa decisão vêm recorreram a Autora e a 1ª Ré, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
Da 1ª Ré:
1. O presente recurso tem por objecto o acórdão proferido pelo Tribunal Colectivo sobre a matéria de facto, no que se refere às respostas dadas aos quesitos 15.º, 16.º, 17.º e 18.º da base instrutória e sobre a douta sentença que deu provimento ao pedido formulado pela Autora contra a ora Recorrente, ao pagamento do montante de HKD$10,000,000.00 (dez milhões de dólares de Hong Kong) acrescido de juros de mora a contar da da citação até integral pagamento.
2. A açcão que deu origem ao presente recurso, fundou-se num contrato de depósito alegadamente realizado junto da 1.ª Ré, ora Recorrente, no montante supra melhor mencionado.
3. De forma a provar que os quesitos 15.º, 16.º, 17.º e 18.º da base instrutória deveriam ter sido dados como não provados, a Recorrente lançou mão dos seguintes meios que, a seu ver, impunham um julgamento diferente daquele que foi proferido pelo Tribunal Colectivo, i.e., a prova testemunhal produzida pela testemunhas da Autora, B e C, e a prova documental, mormente, o talão de depósito apresentado pela Autora, junto a fls. 69 dos autos e ofício da DICJ a fls. 148 dos autos.
4. Os quesitos 15.º, 16.º, 17.º e 18.º da base instrutória foram quesitados da seguinte maneira: 15. "Após a/o funcionária/o da 1.ª Ré aceitar o pedido da Autora, esta entregou à/ao mesma/o dez milhões de dólares de Hong Kong (HKD10.000.000,00) em numerário que tinha na sua posse?"
3. "Depois da entrega da aludida importância, a/o supracitada/o funcionária/o emitiu à Autora um talão de depósito de fichas de jogo, com o nº ******79?"
4. "No referido talão de depósito consta o montante de dinheiro que a Autora entregou à 1.ª Ré para efeitos de depósito, sem qualquer menção concreta da data de restituição, sendo tal acto sido confirmado mediante as assinaturas do responsável da caixa e da testemunha presencial da sala VIP?"
7. "Por confiar no estatuto de funcionária/o da 1.ª Ré, a Autora fez a entrega de dez milhões de dólares de Hong Kong (HKD10.000.000,00) que tinha na sua posse a tal funcionária/o?"
5. Tendo sido todos os quesitos provados e o quesito 15.º recebeu a seguinte resposta: "3. "Provado que a Autora entregou à/ao mesma/o dez milhões de dólares de Hong Kong (HKD10.000.000.00) à 1.ª Ré.", o quesito 17.º "Provado que o que consta da resposta dada ao art.º 16.º" e o quesito 18.º "Provado que o que consta da resposta dada ao art.º 15.º"
6. A convicção do tribunal baseou-se depoimento das testemunhas ouvidas em audiência que depuseram sobre os quesitos da base instrutória, nomeadamente dois ex-funcionários da 1.ª Ré, ora Recorrente, e na prova documental, a fls. 69, cópia do talão de depósito de fichas emitido a favor da Autora, extraída do processo de inquérito n.º 10653/2015.
7. Como já referido, a açcão que deu origem ao presente recurso, fundou-se num contrato de depósito alegadamente realizado entre Autora e 1.ª Ré, no valor de HKD$10,000,000.00 (dez milhões de dólares de Hong Kong).
8. Sucede que, não só este contrato não foi celebrado, como esta quantia não foi entregue à 1.ª Ré. Muito menos, com a retribuição de juros à ordem mensal de 1,5%, como se irá demonstrar.
9. Salvo melhor entendimento, não basta a mera apresentação de um talão de depósito alegadamente emitido pela 1.ª Ré, para se concluir pelo depósito, muito menos quando a prova documental é claramente insuficiente, a par da prova testemunhal existente da banda da Autora, i.e., testemunhas que tivessem estado presentes aquando o depósito e que pudessem narrar os acontecimentos, o que não sucedeu.
10. Ao contrário, temos o depoimento de duas testemunhas, ex-funcionários que vêm suportar o já defendido pela Recorrente, e abalar fortemente qualquer convicção que ainda pudesse existir no sentido de depósito, como iremos demonstrar.
11. Mesmo que se aceitasse, o que por mera hipótese se aventa, o depósito nos moldes em que foi realizado, tal teria que ter sido feito junto das instalações onde a Recorrente exerce a sua actividade de promoção de jogos, o que não sucedeu, pois, inexistem registos nesse sentido.
12. Salientamos que do depoimento da testemunha B, resultou que, não tinha conhecimento sobre existência de juros Recorded 01Dec 2020, Translator 1, 10.59.06, aos 14minutos e 24segundos; quanto à função dos talões de depósito a testemunha refere que é preciso o talão de depósito para proceder/receber um depósito, Recorded 01Dec 2020, Translator 1, 10.59.06, aos 20minutos e 57segundos; a testemunha nega a existência de juros novamente Recorded 01Dec 2020, Translator 1, 10.59.06, aos 21minutos e 51segundos; e se tinha recebido ordens para emitir juros, a testemunha respondeu negativamente, Recorded 01Dec 2020, Translator 1, 10.59.06, aos 22minutos e 31segundos; quando exibido o talão de depósito, a testemunha não reconhece as assinaturas, Recorded 01Dec 2020, Translator 1, 10.59.06, aos 23minutos e 18segundos, respondendo novamente e de forma negativa quando questionada se reconhecia alguma das assinaturas dos colegas de trabalho, Recorded 01Dec 2020, Translator 1, 10.59.06, aos 23minutos e 25segundos.
13. Já a testemunha C, refere que um talão de depósito seria impresso para levantamento de quantias, Recorded 01Dec 2020, Translator 1, 11.29.50, aos 03minutos e 56segundos; relativamente à necessidade da assinatura dos funcionários, é confirmado, Recorded 01Dec 2020, Translator 1, 11.29.50, aos 04minutos e 20segundos, dizendo de seguida "E é preciso também a assinatura do titular da conta".
14. Ora, retiramos deste depoimentos vários elementos a reter, que era necessário: (i) emitir um talão de depósito pela ora Recorrente; (ii) do qual deveria constar a assinatura de dois funcionários e do cliente; e (iii) a 1.ª Ré, ora Recorrente não pagava qualquer retribuição em forma de juros.
15. Ficou por esclarecer que tipo de talão se tratava, se era original ou não, entrando nesta sede o conhecimento e diligência do homem médio pois, pelos vários processos que envolvem a ora Recorrente, é consabido que emite talões de depósitos originais e os duplicados ficam na posse da Recorrente para verificação aquando de um eventual levantamento.
16. Não houve uma única testemunha que tivesse estado presente aquando do depósito, que explicasse como 10milhões de dólares de Hong Kong em numerário foram entregues junto da tesouraria (se é que foram), como foi emitido o talão de depósito, quantas pessoas estavam presentes, e que tipo de documento foi entregue à Autora.
17. Face à clara e notória ausência de prova no sentido do depósito e, que competia à Autora, pois o ónus da prova impendia sobre esta, e face aos elementosaqui realçados do depoimento das testemunhas, outra solução não restaria que não dar os quesitos como não provados.
18. Passando à prova documental produzida nos presentes autos, verificamos que a fls. 69 consta um talão que se desconhece se é original ou não e que apresenta inúmeras deficiências, a saber, o documento não tem a indicação de qual o número da conta cliente, não se encontra assinado pela depositante e o montante está redigido à mão e, não, impresso.
19. Podíamos, caso aderíssemos à tese da Autora dizer que, tal depósito, para efeitos de investimento, não necessitaria de um número de conta cliente, mas tal não resultou provado e, mesmo que tivesse sido provado não se concedia.
20. Mais uma vez, de acordo com a diligência do homem médio e conhecimento, não é crível que se depositem 10 milhões de dólares de Hong Kong sem um número de cliente, sem nenhum elemento que pudesse identificar a Autora.
21. Como é consabido, para que se possa fazer um depósito junto duma instituição bancária, necessário é mais do que um elemento identificador, o primeiro é, necessariamente o nome da conta, e, posteriormente o nome do cliente.
22. Assim, o tribunal a quo nunca poderia ter dado por provado um depósito nestes termos.
23. A isto acresce que a fls. 148 dos autos, consta do ofício emitido pela DICJ, entidade competente pela supervisão das actividades de promoção de jogos de fortuna e azar, que não têm qualquer registo de uma operação de valor elevado, em nome da Autora. O que é coincidente com a realidade, pois, esta operação nunca existiu, sequer, a título de mútuo.
24. Entendemos, que face à prova documental existente nos autos, e face ao talão de depósito que não tem a informação necessária, que o tribunal ad quem está em condições de alterar a resposta aos quesitos, ressalvando sempre, que não compete à ora Recorrente, então Ré, pugnar pela prova daqueles factos, pois, o ónus recaía sobre a Autora.
25. Ainda que assista e impere o princípio de livre apreciação de prova ao tribunal a quo, a prova documental a que nos referimos foi oferecida aos autos pela Autora, e havendo dúvidas sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova, deverá recair sobre quem contra quem aproveita o facto, tudo nos termos do artigo 437.º do Código de Processo Civil.
26. Pelo que, ao dar como provados os quesitos 15.º, 16.º, 17.º e 18.º da base instrutória nos termos em que o fez, o acórdão de matéria de facto e sentença final, incorreram em erro de julgamento, por a decisão ter incorrido no vício de contradição, deficiência, falta de fundamentação tudo nos termos dos artigos 370.º e 386.º e ss do Código Civil e do n.º 5 do artigo 556.º do Código de Processo Civil.
27. Devendo assim, o acórdão proferido sobre a matéria de facto ser revogado por violação dos artigos 370.º e 386.º e ss do Código Civil e do n.º 5 do artigo 566.º do Código de Processo Civil e, consequentemente, com base nos meios de prova supra melhor mencionados, e os quesitos 15.º, 16.º, 17.º e 18.º base instrutória sejam dados como não provados, ou, subsidiariamente, caso não se entenda pela solução dada aos quesitos em questão, deverá ser anulada a sentença no que a estes quesitos concerne e ordenado um novo julgamento da matéria de facto.
28. Com o devido respeito, mal andou o tribunal a quo, ao condenar a ora Recorrente, pois, a relação de depósito pressupõe que haja uma obrigação de entrega e uma obrigação de restituição, tudo nos termos do artigo 1111.º do Código Civil.
29. A ora Recorrente, não pode devolver aquilo que nunca esteve consigo, sob pena de estarmos perante uma situação de enriquecimento sem causa.
30. Neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11 de Fevereiro de 2010, reza o seguinte: " " - O enriquecimento sem causa constitui, no nosso ordenamento jurídico, uma fonte autónoma de obrigações e assenta na ideia de que pessoa alguma deve locupletar-se à custa alheia.
II - A obrigação de restituir/indemnizar fundada no instituto do enriquecimento sem causa pressupõe a verificação cumulativa dos quatro seguintes requisitos: a) a existência de um enriquecimento; b) que ele careça de causa justificativa; c) que o mesmo tenha sido obtido à custa do empobrecimento daquele que pede a restituição; d) que a lei não faculte ao empobrecido outro meio de ser restituído/indemnizado."
31. A ora Recorrente não se encontra numa situação de enriquecimento sem causa, por não se encontrarem preenchidos cumulativamente os quatro requisitos, i.e., não há um enriquecimento, sem razão atendível, à custa do empobrecimento de outrém, e quanto à questão de outro mecanismo da lei, facto é que não se pode indemnizar/restituir algo que não está na sua esfera.
32. Mesmo que este depósito tivesse sido realizado junto da Recorrente, existem regras pelas quais a Recorrente norteia a sua actividade, sendo uma delas devolver depósitos contra a apresentação de título que foi emitido nas suas instalacões contra um depósito também ele realizado nas suas instalações onde exerce a sua actividade comercial.
33. Título esse que também respeita regras, como já referido, do talão tem que constar o número de conta do cliente, e também tem que constar a assinatura do depositante, assim como tem que estar impresso o montante depositado e não escrito à mão, como é o caso dos presentes autos.
34. Não nos podemos bastar com "a 1.ª Ré recebia ficha de jogo, ou, numerários, do cliente, para depósito emitiu a este um recibo de depósito chamado por "certificado de depósito ou talão de depósito", após a recepção efectiva dos mesmos".
35. Tratamos de uma operação de 10 milhões de dólares de Hong Kong e, salvo melhor entendimento, não nos podemos bastar com o "título" apresentado a juízo.
36. A isto acresce que, a ora Recorrente não está autorizada a receber do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis, tudo nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 16.º do Regime Jurídico do Sistema Financeiro aprovado pelo Decreto-Lei n.º 32/93 de 5 de Julho.
37. As promotoras de jogo exercem a sua actividade na Região Administrativa
Especial de Macau e, de acordo com o Regulamento Administrativo n.º 6/2002, artigo 23.º "Após a atribuição de uma licença de promotor de jogo, o promotor de jogo só pode exercer a sua actividade se estiver registado junto de uma concessionária.", autorização que decorre através de contrato celebrado com a concessionária, tudo nos termos do artigo seguinte do referido Regulamento Administrativo.
38. E, nos termos gerais da Lei 16/2001, artigo 5.º "A exploração de jogos de fortuna ou azar em casino é confinada aos locais e recintos autorizados pelo Governo".
39. Ora, a actividade da 1.ª Ré, ora Recorrente, cinge-se à actividade de promoção de jogos de fortuna e de azar, e não está autorizada nos termos do Regime Jurídico do Sistema Financeiro para recepcionar fundos do público.
40. Um alegado contrato de de depósito, a decorrer nas condições supra melhor referidas, sem qualquer outra sustentação factual, sem testemunhas que tivessem assistido ao depósito, e com um título insuficiente e desprovido de qualquer exequbilidade, não é de conceder.
41. Decaindo a obrigação de restituição, terá que decair a responsabilização da Recorrente, porque não estão reunidas as condições para que a ora Recorrente seja obrigada a restituir qualquer valor à Autora, ora Recorrida.
42. No que aos juros de mora concerne, semelhante raciocínio se impõe, i.e., por se entender que a obrigação de restituição não existe, não poderia a Recorrente ter sido condenada ao pagamento de juros a contar a partir de 6 de Julho de 2018.
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A Autora respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 332 a 334 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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Da Autora:
1. 原審法院於2021年02月05日作出被訴判決(載於卷宗第266-274頁,在此視為完全轉錄)
2. 在充份尊重原審法院有關裁決之前提下,上訴人對被訴判決駁回有關第二被告連帶責任之決定部分不能認同,並認為原審法院錯誤適用了第6/2002號行政法規第2條及第29條之相關規定。
3. 因此,現向尊敬的中級法院提起本上訴。
4. 根據已確定事實A)項、B)項及C)項,第二被告以承批人身份與澳門特區政府簽訂了一份關於澳門特別行政區娛樂場幸運博彩或其他方式的博彩經營批給合同,成為專營娛樂場幸運博彩的承批公司。
5. 根據已確定事實G)項、H)項、I)項及已獲證之事實(Quesito 1º),第一被告與第二被告建立合作關係,第一被告成為了第二被告旗下YYY澳門娛樂場中的娛樂場博彩中介人,並在上述娛樂場開設了一名為“XXX貴賓會”的貴賓廳,且設有獨立的賬房以免費供會員兌換、寄存及提取籌碼或現金款項,以及為會員提供各種便利。
6. 根據已獲證之事實(Quesito 7º),如越多客人到第一被告的貴賓會賭博,第二被告可從第一被告中獲得利潤分成。
7. 博彩中介人是指所有與承批公司有直接關係、為承批公司提供服務且從承批公司得到報酬的人士。
8. 在澳門,博彩中介人包括兩類,一是承包貴賓廳的賭廳承包人,二是不承包貴賓廳,但符合上述概念標準的一般博彩中介人。
9. 本案的第一被告是歸於賭廳承包人的一類,其擁有專屬的貴賓廳及獨立的賬房。
10. 賭廳承包人並不承包貴賓廳內具體的博彩活動。
11. 事實上,貴賓廳內的一切博彩活動仍由博彩經營公司主持,賭客賭博的對象是博彩經營公司,而不是賭廳承包人。
12. 賭廳承包人只不過是把盡量多的賭客介紹博彩經營公司,所以,賭廳承包人的業務本質上屬於博彩中介業務,因此可以被稱為博彩中介人。
13. 除了獲得佣金以外,貴賓廳也可以採用輸/贏錢比例分成方式。即如果貴賓廳輸錢,賭廳承包人按照一定比例與博彩經營公司共擔風險;反之,賭廳承包人按照一定比例與博彩經營公司分成。
14. 賭廳承包制的博彩中介人的經營特徵十分明顯,就是與博彩經營公司共用利潤、共擔風險。
15. 博彩中介人與承批公司在某程度上,雙方存在緊密合作及互相輔助的關係,並在利益的層面上是一個共同體,追求同一方向的目標。
16. 其次,根據第6/2002號行政法規第4條第1款之規定:如屬由公司從事博彩中介業務的情況,該公司的所營事業應僅為推介娛樂場幸運博彩或其他方式的博彩,且只有自然人方可成為其公司資本的擁有人。
17. 按照第一被告的商業登記及公司章程所記載的所營事業,第一被告的所營事業也是僅為推介娛樂場幸運博彩或其他方式的博彩。
18. 第一被告既然是一間公司,其業務活動僅應限於推介娛樂場幸運博彩或其他方式的博彩。
19. 第一被告是只可以出於從事博彩中介的業務活動之目的而成立或存續,並不可以包括從事其他業務之目的。
20. 第一被告之成立或存續僅是為了從事博彩中介的業務活動,而其從事博彩中介的業務活動所作出的行為,原則上是屬於商行為/商事活動,而非一般的民事行為。
21. 因此,第一被告接受客戶存放籌碼或現金款項的行為,也應該視之為其為了從事博彩中介的業務活動所作出的商事活動。
22. 本案中,沒有證明上訴人所交付的款項是用於投資第一被告的貴賓廳,也沒有證明第一被告不是將上訴人所交付的款項用於從事博彩中介的業務活動。
23. 由於立法者強行規定以公司模式從事博彩中介業務時,其所營事業只可以是推介娛樂場幸運博彩或其他方式的博彩,這意味著博彩中介人公司的成立其專門目的及其業務活動具有專職性。
24. 假如要否定博彩中介人公司所作出的行為不屬博彩中介業務活動範圍,此舉證責任應歸由被告方。
25. 這是出於立法者認為博彩中介人公司在娛樂場內進行的活動必然與推廣博彩活動有直接關聯,故無需權利人(上訴人)自行舉證,也只有負連帶責任之承批公司(第二被告)舉證才能推翻其連帶責任。
26. 據已確定事實及已證明事實,均沒有證明原告與第一被告之間的寄託合同不屬博彩中介業務活動。
27. 在本案中,上訴人將HKD1000萬現金交付給第一被告,第一被告的職員隨即向上訴人出具一張存碼單。
28. 第二被告作為承批公司,其允許第一被告的貴賓廳設置獨立的賬房提供存取籌碼或現金款項。
29. 第二被告一直從其娛樂場內的貴賓廳的籌碼和現金存款中受益。
30. 首先,存款人有存款時,須返回第二被告的娛樂場,或再次賭博,或將之提取,因此有可能與客戶保持聯繫。
31. 其次,第一被告的貴賓廳可利用本身運作的存款,因為存款增加了其現金或籌碼,也反映在承批公司經營的博彩業務中。
32. 本案的原告(上訴人)為內地人,眾所周知中國內地對資金入境流通的限制,如上訴人將寄存的資金帶回內地,是很難再將之帶入澳門,因此,上訴人寄存有關款項之目的旨在產生一種便利,以便日後可以在無須攜帶現金的情況下,直接從第一被告開設在第二被告娛樂場內的貴賓廳提取款項以使用於賭博或消費之目的。
33. 第6/2002號行政法規第29條規定:承批公司與博彩中介人就博彩中介人、其董事、合作人及在娛樂場任職的僱員在娛樂場進行的活動負連帶責任,並就彼等對適用的法律及法規的遵守情況負連帶責任。
34. 同一法規第30條第(五)項之規定:承批公司有義務監察博彩中介人的業務,尤其是博彩中介人履行法律、法規及合同所定義務的情況。
35. 結合以上兩條的規定,上訴人認為此規範精神是為了讓承批公司更負責任控制博彩中介人、其行政管理機關成員及合作者在其娛樂場所進行的活動,因此承批人是博彩中介人的受益人,承批人有義務監察該等活動,並與博彩中介人共同承擔該等活動所產生的責任,這是合理和合乎邏輯的。
36. 基此,即使博彩中介人合法/非法獲得維持貴賓廳運作所需的融資,該活動亦直接反映了承批公司經營博彩業務。
37. 如承批公司不履行其監察義務,容許或容忍博彩中介人在其娛樂場從事該活動,則根據上述行政法規第29條的規定,承批公司仍與對該活動所造成的損失負連帶責任。
38. 因此,正如尊敬的中級法院在第475/2018號合議庭裁判中所表達的觀點及立場,第一被告是在第二被告的同意及批准下,在第二被告的娛樂場開設貴賓廳及賬房並接受寄存籌碼或現金,而第二被告亦可從中獲益,因此第一被告有關寄存行為與博彩活動有直接關係,第二被告應對第一被告的民事責任負連帶責任。
39. 綜上所述,懇請上級法院裁定上訴人之上訴理由成立,裁定原審法庭作出的被訴判決沾有審判錯誤或法律適用錯誤,違反第6/2002號行政法規第29條之規定,廢止被訴判決中開釋第二被告民事責任的部分,繼而改判處第二被告與第一被告連帶向上訴人支付HKD$10,000,000元,附加自2018年07月06日起以法定利率計算的遲延利息,直至完全支付為止。
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A 2ª Ré respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 313 a 329 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
- 第二被告為一家於本地區主要從事經營娛樂場博彩或其他方式博彩業務的股份有限公司。(已確定事實A)項)
- 2002年06月24日,第二被告與澳門特別行政區政府簽訂了一份關於澳門特別行政區娛樂場幸運博彩或其他方式的博彩經營批給合同(下稱“博彩批給合同”,卷宗第43至66頁,為著有關效力在此視為完全轉錄)。(已確定事實B項)
- 透過博彩批給合同,第二被告取得了於澳門特別行政區經營娛樂場幸運博彩或其他方式的博彩的資格,成為了娛樂場幸運博彩的承批公司。(已確定事實C)項)
- 第二被告目前旗下至少擁有二間娛樂場,包括:YYY澳門娛樂場(位於澳門外港填海區......街)、YYYZZ娛樂場(位於澳門路氹......大馬路)。(已確定事實D)項)
- 第一被告為一家於本地區從事推介娛樂場幸運博彩或其他方式的博彩業務的一人有限公司,商業登記編號*****(SO)。(已確定事實E)項)
- 第一被告自2006年08月18日起至2016年08月31日止,其持有博彩中介人牌照,牌照編號:E***。(已確定事實F)項)
- 經第二被告許可及同意下,第一被告成為了第二被告旗下YYY澳門娛樂場(位於澳門外港填海區......街)中的娛樂場博彩中介人。(已確定事實G)項)
- 而第一被告為從事其博彩中介業務,經第二被告批准及同意下,於上述娛樂場開設了一名為“XXX貴賓會”的貴賓廳或賭廳。(已確定事實H)項)
- 經第二被告批准及同意下,第一被告在“XXX貴賓會”內設置了獨立的賬房以免費供會員兌換、寄存及提取籌碼或現金款項,以及為會員提供各種便利。(已確定事實I)項)
- 第二被告與第一被告建立合作關係,第一被告為第二被告推介娛樂場幸運博彩。(對調查基礎內容第1條的答覆)
- Quanto mais clientes fossem jogar na Sala VIP da 1ª Ré, tendo esta podido ainda obter lucros distribuídos pela 1ª Ré. (對調查基礎內容第7條的答覆)
- 每當第一被告接受客戶存放博彩籌碼或現金款項,且獲得客戶實際交付博彩籌碼或現金款項後,均會向客戶發出記寄存之收據,稱為“存款證”或“存碼單”。(對調查基礎內容第9條的答覆)
- 每張出具的“存款證”或“存碼單”,都會由第一被告之負責人處理接受客人存碼或存款之職員簽名確認。(對調查基礎內容第10條答覆)
- 第一被告出具上述的收據,目的是為了證明客戶已向其交放了相應的現金或籌碼。(對調查基礎內容第11條答覆)
- A Autora entregou à/ao mesma/o dez milhões de dólares de Hong Kong (HKD$10.000.000,00) à 1ª Ré. (對調查基礎內容第15條答覆)
- 原告交付上述款項後,有關職員便向原告出具一張存碼單,編號為******79。(對調查基礎內容第16條答覆)
- A Autora ainda não levantou os dez milhões de dólares de Hong Kong (HKD$10.000.000,00) ali depositados. (對調查基礎內容第20條、第25條及第26條答覆)
- 於2018年07月03日,原告委託律師透過書面信函要求第一被告在信件發出日起十日內向原告返還港幣壹仟萬元(HKD$10,000,000.00),但第一被告沒有領取受託律師寄出的書面信函。(對調查基礎內容第24條答覆)
*
III – Fundamentação
(I) Da 1ª Ré:
1. Da impugnação da decisão da matéria de facto:
Vem a 1ª Ré impugnar a decisão da matéria de facto respeitante aos quesitos 15.º, 16.º, 17.º e 18.º da base instrutória, a saber:
15.º
   第一被告的職員接受原告的要求後,原告將其擁有的港幣壹仟萬元(HKD10.000.000.00)的現金款項交付給該職員?
16.º
   原告交付上述款項後,有關職員便向原告出具一張存碼單,編號為******79?
17.º
   上述存碼單記載著原告交付給第一被告用作存款的金額,沒有具體的返還日期,有貴賓會之賬房經手人簽名及場面見證人簽名確認?
18.º
   原告信任第一被告的職員身份,才將其擁有的港幣壹仟萬元(HKD10,000,000.00)的現金款項交付給該職員?
As respostas dadas aos referidos quesitos foram as seguintes:
Quesitos 15º: PROVADO que a Autora entregou à/ao mesma/o dez milhões de dólares de Hong Kong (HKD10.000.000.00) à 1ª Ré.
Quesito 16º: PROVADO.
Quesito 17º: PROVADO que o que consta da resposta dada ao artº 16º.
Quesito 18º: PROVADO que o que consta da resposta dada ao artº 15º.
Na óptica da 1ª Ré, os factos vertidos nos mesmos quesitos deveriam ser dados como não provados.
Quid juris?
Como é sabido, segundo o princípio da livre apreciação das provas previsto n° 1 do artigo 558.º do CPC, “O tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”.
A justificar tal princípio e aquilo que permite a existência do mesmo, temos que o Tribunal a quo beneficia não só do seu prudente juízo e experiência, como da mais-valia de um contacto directo com a prova, nomeadamente, a prova testemunhal, o qual se traduz no princípio da imediação e da oralidade.
Sobre o princípio da imediação ensina o Ilustre Professor Anselmo de Castro (in Direito Processual Civil, I, 175), que “é consequencial dos princípios da verdade material e da livre apreciação da prova, na medida em que uma e outra necessariamente requerem a imediação, ou seja, o contacto directo do tribunal com os intervenientes no processo, a fim de assegurar ao julgador de modo mais perfeito o juízo sobre a veracidade ou falsidade de uma alegação”.
Já Eurico Lopes Cardoso escreve que “os depoimentos não são só palavras, nem o seu valor pode ser medido apenas pelo tom em que foram proferidas. Todos sabemos que a palavra é só um meio de exprimir o pensamento e que, por vezes, é um meio de ocultar. A mímica e todo o aspecto exterior do depoente influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe.” (in BMJ n.º 80, a fls. 220 e 221)
Por sua vez Alberto dos Reis dizia, que “Prova livre quer dizer prova apreciada pelo julgador seguindo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei. Daí até à afirmação de que o juiz pode decidir como lhe apetecer, passando arbitrariamente por cima das provas produzidas, vai uma distância infinita. (...) A interpretação correcta do texto é, portanto, esta: para resolver a questão posta em cada questão, para proferir decisão sobre cada facto, o tribunal aprecia livremente as provas produzidas, forma sua convicção como resultado de tal apreciação e exprime-a na resposta. Em face deste entendimento, é evidente que, se nenhuma prova se produziu sobre determinado facto, cumpre ao tribunal responder que não está provado, pouco importando que esse facto seja essencial para a procedência da acção” (in Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora IV, pago 570-571.)
É assim que “(...) nem mesmo as amarras processuais concernentes à prova são constritoras de um campo de acção que é característico de todo o acto de julgar o comportamento alheio: a livre convicção. A convicção do julgador é o farol de uma luz que vem de dentro, do íntimo do homem que aprecia as acções e omissões do outro. Nesse sentido, princípios como os da imediação, da aquisição processual (artº 436º do CPC), do ónus da prova (artº 335º do CC), da dúvida sobre a realidade de um facto (artº 437º do CPC), da plenitude da assistência dos juízes (artº 557º do CPC), da livre apreciação das provas (artº 558º do CPC), conferem lógica e legitimação à convicção. Isto é, se a prova só é "livre" até certo ponto, a partir do momento em que o julgador respeita esse espaço de liberdade sem ultrapassar os limites processuais imanentes, a sindicância ao seu trabalho no tocante à matéria de facto só nos casos restritos no âmbito do artºs. 599º e 629º do CPC pode ser levada a cabo. Só assim se compreende a tarefa do julgador, que, se não pode soltar os demónios da prova livre na acepção estudada, também não pode hipotecar o santuário da sua consciência perante os dados que desfilam à sua frente. Trata-se de fazer um tratamento de dados segundo a sua experiência, o seu sentido de justiça, a sua sensatez, a sua ideia de lógica, etc. É por isso que dois cidadãos que vestem a beca, necessariamente diferentes no seu percurso de vida, perante o mesmo quadro de facto, podem alcançar diferentes convicções acerca do modo como se passaram as coisas. Não há muito afazer quanto a isso.” (Ac. do TSI de 20/09/2012, proferido no Processo nº 551/2012)
Deste modo, “A reapreciação da matéria de facto por parte desta Relação tem um campo muito restrito, limitado, tão só, aos casos em que ocorre flagrantemente uma desconformidade entre a prova produzida e a decisão tomada, nomeadamente quando não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação” (Ac. do STJ de 21/01/2003, in www.dgsi.pt)
Com efeito, “não se trata de um segundo julgamento até porque as circunstâncias não são as mesmas, nas respectivas instâncias, não bastando que não se concorde com a decisão dada, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de erro na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efectivamente, no caso, foram produzidos.(...).” (Ac. do RL de 10/08/2009, in www.dgsi.pt.)
Ou seja,
Uma coisa é não agradar o resultado da avaliação que se faz da prova, e outra bem diferente é detectarem-se no processo de formação da convicção do julgador erros claros de julgamento, incluindo eventuais violações de regras e princípios de direito probatório.
No caso em apreço, o Tribunal a quo justificou a sua convicção pela forma seguinte:
“…
   A convicção do Tribunal baseou-se no depoimento prestado pela 2ª Ré (apreciado na sua globalidade, não se limitando nas declarações confessórias), no depoimento das testemunhas ouvidas em audiência que depuseram sobre os quesitos da base instrutória, nos documentos de fls. 10 a 72 e 106 a 110, 149 dos autos, cujo teor se dá reproduzido aqui para todos os efeitos legais, o que permite formar uma síntese quanto à veracidade dos apontados factos.
   Em especial, sobre os factos de depósito feito pelo Autor na tesouraria da Sala VIP XXX, está junto aos autos o documento de fls. 69, cópia de talão de depósito de fichas emitido a favor do Autor em nome da 1ª Ré, extraída do processo inquérito nº10653/2015. Segundo a 1ª testemunha B, ex-funcionário da 1ª R que trabalhava na tesouraria da Sala VIP XXX em causa, deu conta o modo de operação do depósito e levantamento das fichas de jogo pelo cliente, dizendo que o referido talão é, mais ou menos, semelhante com os talões de depósito habitualmente emitido pela XXX, tendo vaga impressão do nome do Autor, sendo ele cliente da sala VIP; a outra testemunha C era funcionária da 1ª Ré mas trabalhava noutra sala VIP, depus de modo semelhante quanto à prática habitual da emissão do talão de depósito quando o cliente vier fazer depósito na sala VIP. A testemunha D, agente da PJ que tinha intervindo na investigação do caso do XXX no inquérito acima referido, deu conta de que diversos clientes do XXX queixaram de ter proceder o depósito sem tinham sido restituído o dinheiro depositado, lembrando um deles com o nome do Autor, e a investigação revela que alguns queixosos recebiam juros remuneratórios pelos depósitos e outros sem a menção de juros, mas não se lembrou do caso do Autor. Tendo em conta o depoimento das testemunhas, o talão de depósito do Autor foi emitido de modo semelhante com a prática habitual do XXX e a 1ª testemunha lembrou o Autor que era cliente, assim como o agente da PJ reconheceu que o Autor fez queixa junto PJ por falta de restituição do depósito. Em conjugação dessas provas, acreditamos que o Autor fez a entrega do HKD$10.000.000,00 na sala VIP e na sequência desse acto, foi emitido o talão de depósito como prova do depósito e que o depósito não foi levantado. Assim, deram-se por provados os factos dos quesitos dos 9º a 11º, 15º a 18º, 20º, 25º e 26º.
   Quanto aos factos do motivo de depósito do Autor, se a XXX recebeu o fundo público por meio de pagamento de juros remuneratórios, com vista a captar mais jogadores, particularmente em cooperação e com autorização da 2ª Ré, excepto o depoimento vago do agente da PJ, referindo que haviam alguns casos desse género, não foram produzidas provas concretas de que a 1ª Ré pagou juros ao Autor por depósito, menos o conhecimento ou consentimento da 2ª Ré, não sendo suficiente para suportar os factos de motivo que levou o Autor a proceder o depósito nem o pagamento de juros remuneratórios pela 1ª Ré, assim, deram-se por não provados os factos dos quesitos dos 2º a 6º, 8º, 12º a 14º, 19º. Baseado no documento de fls. 149 emitido pela Autoridade de Monetário de Macau, é bastante para dar respostas dadas aos quesitos 27º e 28º.
   Baseado nas declarações confessórias da 2ª Ré, assim como o facto já assente da alínea G), deu-se por provado o facto do quesito 1º.
   Relativamente aos factos de interpelação, temos apenas a carta do advogado (doc. de fls. 70) que certificou a interpelação por escrito à 1ª Ré, para além da prova escrita, não havendo provas que demonstram o Autor fez outras interpelações, assim, apenas se deu como provado o facto do quesito 24º e não se deram por provados os factos dos quesitos 21º a 23º.
   Não se deu por provado o facto do quesito 29º por não ter produzido prova nesse sentido.
…”.
Ora, analisados todos os elementos probatórios existentes nos autos, bem como a fundamentação da formação da convicção, não se detecta algum erro manifesto de julgamento, nem violação de regras e/ou princípios de direito probatório por parte do Tribunal a quo.
Na realidade, tendo em conta o documento junto a fls. 69 dos autos (cópia do recebido do depósito), conjugado com os depoimentos das testemunhas da Autora ouvidas na audiência de julgamento, nada podemos censurar a decisão da matéria de facto a quo quanto aos quesitos 15.º, 16.º, 17.º e 18.º da Base Instrutória, resultante do princípio da livre apreciação supra referido.
Face ao expendido, é de negar provimento ao recurso nesta parte.
2. Do mérito da causa:
A decisão recorrida tem o seguinte teor:
“…
   Cumpre analisar os factos e aplicar o direito.
   Nos presentes autos, fundamentou a Autora que a 1ª ré era promotora de jogo, titular da licença com o nºE***, a qual era autorizada pela 2ª Ré para exercer actividade de promoção de jogo no casino YYY, tendo para esse efeito, aí instalado a Sala VIP XXX com tesouraria autónoma. Para aliciamento de mais jogadores para jogar na respectiva Sala VIP, a 1ª Ré anunciar o aceite de depósito público com pagamento de juros remuneratórios, com o conhecimento e autorização da 2ª Ré. Em 01/05/2014, a Autor acordou com a 1ª Ré no depósito do montante total de HKD$10.000.000,00, com o pagamento de juros, à taxa mensal de 1.5%, na referida Sala VIP, tendo esta emitido um talão de depósito nº******79. A Autora tinha recebido os juros pagos pela 1ª Ré no valor total de HK$1.950.000,00, até Setembro de 2015, altura em que a Autora exigiu o levantamento do valor depositado mas foi recusado pela 1ª Ré.
   Pretendeu, a título principal, a condenação da 1ª Ré na restituição dessa quantia com os juros moratórios no cumprimento da obrigação de depositário ou a título subsidiário, a declaração da nulidade do contrato depósito celebrado com a 1ª Ré e consequentemente, a restituição da quantia que a este foi entregue pela Autora. Em qualquer dos casos, incumbe também a 2ª Ré a obrigação solidária pela restituição, por ser esta concessionária de jogo e nessa qualidade, assume a responsabilidade de indemnizar aos terceiros os danos causados pelos actos da 1ª Ré, ao abrigo do disposto do artº 23º e 29º do Regulamento Administrativo nº6/2002.
   Na contestação, a 1ª Ré negou, peremptoriamente, que tinha recebido depósito público com o pagamento de juros remuneratórios, impugnando que tinha recebido o montante da Autora o alegado HKD$10.000.000,00.
   Enquanto a 2ª Ré pugnou que o artº29º do Regulamento Administrativo nº 6/2002 visa estabelecer um princípio de responsabilização perante o Governo das concessionárias pelas actividades desenvolvidas nos casinos pelos promotores de jogo, não sendo a Autora governo e o acto de captação do fundo público pela 1ª Ré não é acto violador das normas reguladoras relativas à exploração dos jogos de fortuna e azar, não há lugar a responsabilização solidária da 2ª Ré pela obrigação da indemnização assumida pela 1ª Ré perante a Autora.
   Depósito
   A Autora alegou que a 1ª Ré, para atrair os clientes para jogar no casino, aceitou fundo público com o pagamento de juros remuneratórios de 1.5% e por isso, entregou o montante de HKD$10.000.000,00 na sala VIP XXX explorada por essa Ré, tendo esta emitido um talão de depósito com o nº******79 como suporte de depósito e tendo a Autora recebido dessa Ré juros remuneratórios no valor de HKD1.950.000,00.
   Dispõe-se o artº1111º do C.C., “Depósito é o contrato pelo qual uma das partes entrega à outra uma coisa, móvel ou imóvel, para que o guarde, e a restitua quando for exigida.”
   Feito o julgamento, está provado que foi entregue pela Autora à 1ª Ré a quantia total de HKD$10.000.000,00, tendo o funcionário desta lhe emitido um talão de depósito de fichas nº******79.
   Por outro lado, vem comprovado que cada vez que a 1ª Ré recebia ficha de jogo, ou, numerários, do cliente, para depósito, emitiu a este um recibo de depósito, chamado por “certificado de depósito ou talão de depósito”, após a recepção efectiva dos mesmos. A emissão de recibo pela 1ª Ré é para comprovar que os numerários ou fichas de jogo entregues pelos clientes correspondiam aos seus valores.
   Portanto, com a emissão do talão de depósito pela 1ª Ré faz convencer que a entrega feita pela Autora tem por propósito de que fica à guarda da Ré a importância quantia de HKD$10.000.000,00. Existe entre eles acordo de depósito.
   Validade de depósito
   Foi levantada pela própria Autora a questão da validade do depósito, visto que a 1ª Ré não está habilitada para recepção de depósito do público.
   Dispõe-se o artº16º, nº1 do D.L. nº93/99/M, que “Só as instituições de crédito regularmente constituídas e autorizadas nos termos do presente diploma ou em legislação especial podem exercer uma actividade que compreenda a recepção, do público, de depósito ou outros fundos reembolsáveis.” A recepção não autorizada de depósito ou outros fundos reembolsáveis do público é tipificado como ilícito criminal, nos termos do artº121º do mesmo diploma.
   Portanto, se o acto de recepção de depósito praticado pela 1ª Ré enquadra-se no artº121º do D.L. nº93/99/M, o depósito entre a Autora e a 1ª Ré será contrário à lei, o acordo entre a Autora e a 1ª Ré será nulo, de acordo com o disposto do artº273º, nº1 do C.C.
   No entanto, no caso em apreço, não vem comprovado que a 1ª Ré aceitou do público de depósitos e levantamento de fichas de jogos ou de fundos nem que a Autora fez depósito com o propósito de receber juros oferecidos pela 1ª Ré, assim, o depósito não poderá consubstanciar-se na noção da captação do fundo público, pelo que o depósito entre a 1ª Ré e a Autora não é inválido.
   Incumprimento
   De acordo com o disposto do artº1112º e artº113º c) do C.C., o depositário tem a obrigação de restituição da coisa entregue quando for exigido.
   Conforme os factos assentes, ficou provado que a Autora, mediante o seu advogado, enviou uma carta à 1ª Ré, exigindo-lhe a restituir a quantia de HKD$10.000.000,00 no prazo de 10 dias, mas a 1ª Ré não levantou a carta lhe dirigida.
   De harmonia com o disposto do artº1 do artº216º do C.C., a declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida. O nº2 do mesmo artigo prevê que “E também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida.”
   No caso, a Autora tentou a dar conhecimento, por carta, à 1ª Ré, exigindo a entrega do dinheiro depositado, a carta não foi levantada por esta, se não fosse a omissão da Ré, a carta deveria ser recebida por esta em tempo oportuno, portanto, é por culpa exclusiva da 1ª Ré é que a carta não tinha sido recebida. De acordo com o preceito acima referido, é de considerar como eficaz em relação à 1ª Ré três dias após o envio da carta pela Autora em 3 de Julho de 2018.
   Tenho a Autora exigido à 1ª Ré a restituição do dinheiro depositado, devendo esta a restituir desde 6 de Julho de 2018, não o tendo feito, houve inadimplemento da obrigação pela 1ª Ré
   Assim, é de julgar procedente o pedido de restituição em relação à 1ª Ré.
   … ”.
Inalterada a decisão da matéria de facto, nada a censurar a decisão do mérito do Tribunal a quo quanto à condenação da 1ª Ré.
Assim, ao abrigo do nº 5 do artº 631º do CPCM, negamos provimento ao recurso com os fundamentos invocados na decisão impugnada.
*
(II) Da Autora:
Na óptica da Autora, o Tribunal a quo cometeu um erro de julgamento ao absolver a 2ª Ré do pedido.
Pois, para ela, a 2ª Ré deveria ser condenada solidariamente com a 1ª Ré no pagamento da quantia depositada ao abrigo do artº do artº 23º, nº 3 da Lei nº 16/2001, bem como dos artºs 29º e 30º do RA nº 6/2002, por não ter cumprido o seu dever de fiscalização.
Quid júris?
Dispõe o nº 3 do artº 23º da Lei nº 16/2001 o seguinte:
Artigo 23.º
Promotores de jogo
1. …
2. …
3. Perante o Governo, é sempre uma concessionária a responsável pela actividade desenvolvida nos casinos pelos promotores de jogo, seus administraXXXs e colaboraXXXs e pelo cumprimento por parte deles das normas legais e regulamentares, devendo para o efeito proceder à supervisão da sua actividade.
4. …
5. …
6. …
7. …
Por sua vez, os artºs 29º e 30º do RA nº 6/2002 têm as seguintes redacções:
Artigo 29.º
Responsabilidade das concessionárias
   As concessionárias são responsáveis solidariamente com os promotores de jogo pela actividade desenvolvida nos casinos pelos promotores de jogo e administraXXXs e colaboraXXXs destes, bem como pelo cumprimento, por parte dos mesmos, das normas legais e regulamentares aplicáveis.
Artigo 30.º
Obrigações das concessionárias
   Sem prejuízo de outras previstas no presente regulamento administrativo e em demais legislação complementar, constituem obrigações das concessionárias:
1. Enviar, até ao dia 10 de cada mês, à Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos, uma relação discriminada relativa ao mês antecedente dos montantes das comissões ou outras remunerações por si pagas a cada promotor de jogo, bem como dos montantes de imposto retidos na fonte, acompanhada de toda a informação necessária à verificação dos respectivos cálculos;
2. Enviar, em cada ano civil, de 3 em 3 meses, à Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos a lista referida no n.º 3 do artigo 28.º;
3. Comunicar à Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos qualquer facto que possa afectar a solvabilidade dos promotores de jogo;
4. Manter em dia a escrita comercial existente com os promotores de jogo;
5. Fiscalizar a actividade dos promotores de jogo, nomeadamente quanto ao cumprimento das suas obrigações legais, regulamentares e contratuais;
6. Comunicar às autoridades competentes qualquer facto que possa indiciar a prática de actividade criminosa, designadamente de branqueamento de capitais, por parte dos promotores de jogo;
7. Proporcionar um relacionamento são entre os promotores de jogo junto dela registados;
8. Pagar pontualmente as comissões ou outras remunerações acordadas com os promotores de jogo;
9. Cumprir pontualmente as suas obrigações fiscais.
Este Tribunal tem entendido que a responsabilidade solidária da concessionária de jogo de fortuna e azar só existe quando o depósito em causa tem conexão com a promoção da actividade de jogo e azar ( Acs. do TSI, Procs. nºs 563/2021 e 820/2019).
No caso em apreço, a Autora alegou na petição inicial que o depósito em causa visa para obter juros à taxa mensal de 1.5% (cfr. artºs 24º a 31º da petição inicial).
Contudo, esta versão do depósito não foi comprovada.
Ficamos assim sem saber a causa do depósito.
Será que a partir do facto de que o depósito foi realizado no Casino, mais concretamente, na Sala de VIP da 1ª Ré, tiramos a ilação judicial de que o mesmo foi realizado com conexão da actividade de jogo?
A resposta, para nós, não deverá ser afirmativa, tendo em conta o circunstancialismo concreto do presente caso – a Autora ter configurado a causa de pedir no depósito com vista a obter juros, e não no depósito para actividade de jogo.
Pois, se tirarmos, por hipótese, a ilação judicial de que o depósito for realizado com conexão da actividade de jogo, estamos a admitir uma causa de pedir diferente da alegada pela própria Autora, não obstante tal alegação não se encontrar comprovada, o que viola os princípios dispositivo e da estabilidade da instância, legalmente previstos nos artºs 5º e 212º do CPCM.
Nesta conformidade e não tendo elementos que permitem concluir o depósito tem conexão com a actividade da exploração de jogo, não podemos condenar a 2ª Ré, na qualidade da concessionária de jogo, a pagar solidariamente a quantia depositada ao abrigo do artº do artº 23º, nº 3 da Lei nº 16/2001, bem como dos artºs 29º e 30º do RA nº 6/2002.
Face ao exposto, é de negar provimento do recurso da Autora com fundamentos algo diversos.
*
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento aos recursos interpostos pelas Autora e 1ª Ré, confirmando a sentença recorrida.
*
Custas pelas Autora e 1ª Ré.
Notifique e registe.
*
RAEM, aos 02 de Dezembro de 2021.

(Relator)
Ho Wai Neng

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong

(Segundo Juiz-Adjunto)
Rui Carlos dos Santos Pereira Ribeiro



7
770/2021