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Processo nº 934/2021
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 20 de Janeiro de 2022
Recorrente: A
Recorrida: B, S.A.
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO

  A, com os demais sinais dos autos,
  vem instaurar acção declarativa em processo comum do trabalho contra
  C, SARL e
  B S.A.,
  também com os demais sinais dos autos.
  Pedindo a condenação destas a pagar-lhe a quantia de MOP156.186,00 e MOP656.891,00 respectivamente, acrescida dos juros legais até integral e efectivo pagamento.
  Proferida sentença, foram as Rés condenadas a pagar ao Autor as seguintes:
  - a 1.ª Ré a pagar ao Autor, a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$113,675.02, sendo:
  - MOP$14,780.00 a título de subsídio de alimentação (relativo ao período de 04/07/2001 a 21/07/2003);
  - MOP$25,372.33 a título de subsídio de efectividade (relativo ao período de 04/07/2001 a 21/07/2003);
  - MOP$19,055.00 a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal (relativo ao período de 04/07/2001 a 31/12/2002);
  - MOP$19,055.00 a título de falta de marcação e gozo de um dia de descanso compensatório pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal (relativo ao período de 04/07/2001 a 31/12/2002);
  - MOP$6,180.00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado (relativo ao período de 04/07/2001 a 21/07/2003);
  - MOP$19,029.25 a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento (relativo ao período de 04/07/2001 a 21/07/2003);
  - MOP$10,203.44 pela prestação de, pelo menos, 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo (relativo ao período de 04/07/2001 a 21/07/2003); e
  - a 2.ª Ré a pagar ao Autor, a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$504,719.89, sendo:
  - MOP$24,800.00 a título de subsídio de alimentação (relativo ao período de 22/07/2003 a 31/12/2006);
  - MOP$86,863.33 a título de subsídio de efectividade (relativo ao período de 22/07/2003 a 31/07/2010);
  - MOP$65,147.50 a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento (relativo ao período de 22/07/2003 a 31/07/2010);
  - MOP$25,524.69 pela prestação de, pelo menos, 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo (relativo ao período de 22/07/2003 a 31/12/2008);
  - MOP$78,576.24 pela prestação de, pelo menos, 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo (relativo ao período de 01/01/2009 a 31/12/2019);
  - MOP$44,832.49 a título de descanso compensatório não gozado, em consequência do trabalho extraordinário prestado (relativo ao período de 01/01/2009 a 31/12/2019);
  - MOP$58,195.00 a título do trabalho prestado, após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias (pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal) (relativo ao período de 22/07/2003 a 31/12/2008);
  - MOP$120,780.64 a título do trabalho prestado, após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias (pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal) (relativo ao período de 01/01/2009 a 31/12/2019).
  Mais se condena a 2.ª Ré a pagar ao Autor o montante correspondente ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatório entre 22/07/2003 a 31/12/2008, a liquidar em execução de sentença.
  Às quantias supra mencionadas acrescerão juros moratórios à taxa legal a contar da data da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório até integral e efectivo pagamento.
  Absolvem-se no mais as Rés do pedido.
  Não se conformando com a decisão proferida na parte relativa à condenação das Rés no pagamento da compensação devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e feriado obrigatório, uma vez que a forma de cálculo usada se distancia da que tem vindo a ser usada por este Tribunal de Segunda Instância, vem o Autor interpor recurso, formulando as seguintes conclusões e pedidos:
1) Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação das Recorridas na atribuição de uma compensação devida ao Recorrente pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e, bem assim, pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado à luz do DL n.º 24/89/M, de 3 de Abril;
2) Pelas razões que adiante melhor se expõem, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de direito quanto às concretas formas de cálculo devidas pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado e, deste modo, se mostra em violação ao disposto nos artigos 17.º, 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, razão pela qual se impõe que a mesma seja julgada nula e substituída por outra que decida em conformidade com a melhor interpretação a conferir aos referidos preceitos;
Em concreto,
3) Entendeu o Tribunal a quo ser de sufragar o entendimento seguido pelo Tribunal de Última Instância e, em consequência, condenar as Rés a pagar ao Autor apenas ao correspondente ao valor de um salário em singelo no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso semanal durante todo o período da relação laboral;
4) Porém, salvo melhor opinião, ao proceder à condenação da Ré apenas em singelo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julga da nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
5) Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, para além do valor relativo ao próprio dia de trabalho prestado;
6) Trata-se, de resto, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma uniforme pelo Tribunal de Segunda Instância, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: (salário diário X n.º de dias devidos e não gozados X 2);
7) In casu, resultando da matéria de facto provada que “entre 04/07/2001 a 31/12/2002 o Autor prestou 74 dias de trabalho efectivo junto da 1.ª Ré (C) nos dias de descanso semanal” e, bem assim, “que a 1.ª Ré (C) nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal” - deve a 1ª Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$38,110.00 a título do dobro do salário - e não só apenas de MOP$19,055.00 correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer.
Acresce que,
8) Resulta igualmente da matéria de facto provada que: “entre 22/07/2003 a 31/12/2008 o Autor prestou 226 dias de trabalho ao sétimo dia para a 2.ª Ré (B), após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho” e, bem assim, “que a 2.ª Ré (STM) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo” - deve a 2.ª Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$116,390.00 a título do dobro do salário - e não só apenas de MOP$58,195.00 correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer.
Sem prescindir,
9) Entendeu o douto Tribunal a quo que na determinação da quantia devida pelas Rés ao Autor a título de trabalho prestado nos dias de feriados obrigatórios o Autor terá direito a receber das Rés as compensações compostas pela remuneração em singelo, acrescida do dobro dessa remuneração;
10) Ora, tendo o Tribunal a quo explicitado que pelo dobro da retribuição se deve entender o equivalente a mais um dia de salário em singelo (nos termos que têm vindo a ser seguidos pelo TUI nos Acs. 28/2007, 29/2007, 58/2007 e 40/2009) tal significa que, neste particular, a douta Sentença igualmente se afasta do entendimento que tem vindo a ser sufragado pelo Tribunal de Segunda Instância - nos termos do qual se entende que a fórmula mais correcta de interpretar o referido preceito será conceder ao Autor, ora Recorrente, um “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito” - o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal - e não somente o dobro da retribuição normal como parece ter decidido o Tribunal Judicial de Base;
11) Em concreto, resultando provado que durante o período da relação laboral o Recorrente prestou trabalho para a 1ª Recorrida (C) durante 12 dias de feriados obrigatórios, deve a 1ª Recorrida (C) ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$9,270.00 a título do triplo do salário - e não só apenas de MOP$6,180.00, o que desde já e para os legais e devidos efeitos se requer.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. encarregar-se-ão de suprir, deve a douta Sentença ser julgada nula e substituída por outra que atenda às fórmulas de cálculo tal qual formuladas pelo Autor na sua Petição Inicial e relativas ao trabalho prestado em dia de descanso semanal e feriado obrigatório, assim se fazendo a já costumada JUSTIÇA!
  Contra-alegando vieram as Recorridas pugnar para que fosse negado provimento ao recurso, apresentando as seguintes conclusões:
I. Veio o Autor, ora Recorrente, insurgir-se contra a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base no que respeita à fórmula de cálculo seguida pela douta decisão recorrida quanto à compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e em dia de feriado obrigatório, por entender que, nesse particular, a sobredita decisão enferma de erro de aplicação de Direito e, nessa medida, mostra-se em violação do preceituado nos artigos 17.º, 19.º e 20.º do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril;
II. Com o mui devido respeito, nada há nada a apontar á Decisão Recorrida, onde é feita uma correcta interpretação e aplicação do preceituado nos artigos 17.º, 19.º e 20.º do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril;
III. Quanto à forma de cálculo adoptada pelo Tribunal a quo para apuramento da compensação pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriados obrigatórios remunerados nada há a apontar à Decisão Recorrida, que mais não é do que a fórmula que é sufragada pelo Tribunal de Última Instância;
IV. Nos termos do preceituado no artigo 17.º, n.º 6, alínea a) do Decreto-lei nº 24/89/M, estando em causa o pagamento do trabalho em dias de descanso semanal, pelo dobro da retribuição normal, tendo o Recorrente sido pago já em singelo, importa ter em conta esse salário já pago e pagar apenas o que falta (e não o dobro);
V. A tese defendida pelo Recorrente nas suas doutas alegações subverte por completo a letra da lei e, a seguir-se tal tese, onde se lê que o trabalhador que aufira um salário mensal tem o direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal quando presta trabalho nos dias de descanso semanal, ler-se-ia que o pagamento em apreço deveria corresponder ao triplo da retribuição normal;
VI. A Decisão em Recurso para além de encontrar total sustentação na letra da lei, encontra­a também na jurisprudência unânime do Tribunal de Última Instância de Macau, nos Acórdãos proferidos no âmbito dos processos n.º 40/2009, n.º 58/2007 e n.º 28/2007 e, bem assim, naquele que foi já entendimento unânime no Tribunal de Segunda Instância no Acórdão de 29.03.2001 no processo n.º 46/2001, para cuja fundamentação se remete;
VII. Diga-se aliás, que, em face da redacção conferida pela Lei 7/2008 ao artigo 43º, nº 2, 1), tornou-se evidente a opção legislativa no sentido de compensar o trabalhador pela prestação do trabalho em dia que seria de descanso com um dia (e não dois) de remuneração de base;
VIII. E, bem assim, naquele que foi já entendimento unânime no Tribunal de Segunda Instância no Acórdão de 29.03.2001 no processo n.º 46/2001, de cujo sumário se aprende que “Não obstante, o trabalhador obrigado a trabalhar no dia de descanso deve auferir, para além do seu salário normal outro tanto equivalente àquele dia.” (destacado nosso);
IX. Diga-se aliás, que, em face da redacção conferida pela Lei 7/2008 ao artigo 43º, nº 2, 1), tornou-se evidente a opção legislativa no sentido de compensar o trabalhador pela prestação do trabalho em dia que seria de descanso com um dia (e não dois) de remuneração de base;
X. Se o trabalhador já recebeu a remuneração só terá de receber o “equivalente a 100% dessa mesma remuneração a acrescer ao salário já pago” (neste sentido vide “Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau”, Miguel Pacheco Arruda Quental, Pág. 283 e 284);
XI. Do mesmo modo, de acordo com o n.º 1 do artigo 20.º do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, se o trabalhador prestar trabalho no dia de feriado obrigatório, para além do salário que já recebeu em singelo, terá direito a uma compensação equivalente ao dobro desse salário e não ao triplo, como pretende o Recorrente;
XII. Aliás, neste sentido vai o Venerando Tribunal de Última Instância nas decisões proferidas nos processos n.º 40/2009, n.º 58/2007 e n.º 28/2007, para cuja fundamentação se remete e de onde resulta claramente que tendo o trabalhador sido remunerado em singelo pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, o mesmo só terá direito a auferir o dobro da sua retribuição;
XIII. O Recorrente foi sempre remunerado pela sua prestação de trabalho em dias de feriados obrigatórios no valor de um dia de salário normal diário, pelo que o mesmo apenas teria direito a receber o dobro do salário normal diário por cada dia de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório;
XIV. Pelo que e, face a todo o exposto, não tem o Recorrente qualquer razão no recurso que apresenta, devendo o mesmo ser julgado totalmente improcedente.
  Quanto ao recurso interposto contra 1ª Recorrida (C), não foi admitido pelo Tribunal a quo por não se verificar o pressuposto previsto no artigo 583º, nº 1 do CPC.
  
  Foram colhidos os vistos.
  
  Cumpre, assim, apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO
  
1. FACTOS

A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
1. O Autor foi recrutado pela D, Lda. para exercer funções de “guarda de segurança” para a C, ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 6/2000, aprovado pelo Despacho n.º 02401/IMO/SEF/2000, de 30/11/2000. (A)
2. Entre 04/07/2001 a 21/07/2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (C), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (B)
3. Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da C para a 2.ª Ré (B), com efeitos a partir de 22/07/2003. (C)
4. Desde 22/07/2003 até ao presente o Autor presta trabalho para a 2.ª Ré (B).(D)
5. Entre 22/07/2003 e 31/07/2010 o Autor exerceu as suas funções para a 2.ª Ré (B), do Contrato de Prestação de Serviços n.º 6/2000. (E)
6. O Autor sempre respeitou os períodos, os horários e os locais de trabalho fixados pelas Rés. (F)
7. Entre 04/07/2001 a 21/07/2003 a 1.ª Ré (C) pagou ao Autor a quantia de HK$7,500.00, a título de salário de base mensal. (G)
8. Entre 22/07/2003 a 31/07/2010 a 2.ª Ré (B) pagou ao Autor a quantia de HK$7,500.00, a título de salário de base mensal. (H)
9. Entre 01/08/2010 a 20/07/2015 a 2.ª Ré (B) pagou ao Autor a quantia de MOP$7,500.00, a título de salário de base mensal. (I)
10. Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, a 2.ª Ré (B) pagou ao Autor a quantia de MOP$7,785.00, a título de salário de base mensal. (J)
11. Entre 21/07/2018 a 31/12/2019, a 2.ª Ré (B) pagou ao Autor a quantia de MOP$10,000.00, a título de salário de base mensal. (K)
12. Entre 04/07/2001 a 31/12/2019, o Autor gozou de dias de férias anuais por cada ano civil e de dias de dispensa ao trabalho não remunerados, nomeadamente durante o período entre 03/09/2002 a 26/09/2002, 04/09/2003 a 27/09/2003, 08/07/2004 a 31/07/2004, 14/08/2005 a 15/08/2005, 04/08/2005 a 27/08/2005, 26/08/2006 a 29/09/2006, 18/01/2007 a 19/01/2007, 01/05/2007 a 02/05/2007, 15/08/2007 a 17/08/2007, 18/08/2007 a 15/09/2007, 30/08/2008 a 04/10/2008, 03/02/2009 a 04/02/2009, 29/08/2009 a 22/09/2009, 04/12/2010 a 04/01/2011, 10/12/2011 a 17/01/2012, 20/08/2013 a 17/09/2013, 24 dias em 2014, 23/01/2015 a 21/02/2015, 01/04/2016 a 08/05/2016, 11/06/2016 a 12/06/2016, 08/04/2017 a 22/05/2017, 12/08/2017 a 13/08/2017, 04/01/2018 a 05/02/2018, 14/07/2018 a 13/08/2018, 04/01/2019 a 05/01/2019 e, 20/05/2019 a 20/06/2019. (1.º)
13. Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços 6/2000 ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para as Rés, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $600.00 patacas mensal por pessoa de subsídio de alimentação”. (2.º)
14. Entre 04/07/2001 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (3.º)
15. Entre 22/07/2003 a 31/12/2006, a 2.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (4.º)
16. Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 6/2000 ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para as Rés até 31/07/2010, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço. (5.º)
17. Entre 04/07/2001 a 31/07/2010, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (6.º)
18. Entre 04/07/2001 a 21/07/2003, a 1.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (7.º)
19. Entre 22/07/2003 a 31/07/2010, a 2.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (8.º)
20. Entre 04/07/2001 a 31/12/2002, a 1.ª Ré (C) nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (9.º)
21. Em concreto, entre 04/07/2001 a 31/12/2002, o Autor prestou 74 dias do trabalho efectivo junto da 1.ª Ré (C) nos dias de descanso semanal. (10.º)
22. Entre 04/07/2001 a 31/12/2002, a 1ª Ré (C) nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal. (11.º)
23. Entre 04/07/2001 a 31/12/2002, a 1.ª Ré (C) nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório, em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (12.º)
24. Entre 04/07/2001 e 21/07/2003, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a 1.ª Ré (C) durante 12 dias de feriado obrigatório, correspondente aos seguintes. (13.º)
FERIADOS
ANOS

2001
2002
2003
1 DE JANEIRO
0
1
1
3 DIAS DE ANO
0
3
3
NOVO CHINÊS



1 DE MAIO
0
1
1
1 DE OUTUBRO
1
1
0
25. Entre 04/07/2001 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado pelo Autor nos referidos dias de feriado obrigatórios. (14.º)
26. Entre 22/07/2003 a 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a 2.ª Ré (B) durante os feriados obrigatórios. (15.º)
27. Entre 22/07/2003 a 31/12/2008, a 2.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (16.º)
28. Entre 04/07/2001 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (C) procedeu a uma dedução no valor de HK$750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (17.º)
29. Entre 22/07/2003 a 31/07/2010, a 2.ª Ré (B) procedeu a uma dedução no valor de HK$750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (18.º)
30. A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego.(19.º)
31. Entre 04/07/2001 a 31/12/2019, por ordem das Rés, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (20.º)
32. Durante o referido período de tempo, tinha lugar um briefing (leia-se, uma reunião) entre o Team Leader (leia-se, Chefe de turno) e os “guardas de segurança”, na qual eram inspeccionados os uniformes de cada um dos guardas e distribuído o trabalho para o referido turno, mediante a indicação do seu concreto posto dentro do Casino. (21.º)
33. Entre 04/07/2001 a 21/07/2003, o Autor compareceu ao serviço da 1.ª Ré (C) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início dos 634 dias/turnos que prestou para a Ré, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. (22.º)
34. Entre 22/07/2003 a 31/12/2008, o Autor compareceu ao serviço da 2.ª Ré (B) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início dos 1586 dias/turnos que prestou para a Ré, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. (23.º)
35. Entre 01/01/2009 a 31/07/2010, o Autor compareceu ao serviço da 2.ª Ré (B) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início dos 482 dias/turnos que prestou para a Ré, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos.
Entre 01/08/2010 a 20/07/2015, o Autor compareceu ao serviço da 2.ª Ré (B) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início dos 1446 dias/turnos que prestou para a Ré, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. (24.º)
36. Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, o Autor compareceu ao serviço da 2.ª Ré (B) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início dos 828 dias/turnos que prestou para a Ré, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. (25.º)
37. Entre 21/07/2018 a 31/12/2019, o Autor compareceu ao serviço da 2.ª Ré (B) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início dos 413 dias/turnos que prestou para a Ré, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. (26.º)
38. As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia pela prestação de mais 30 minutos que antecediam o início de cada turno. (27.º)
39. Entre 01/01/2009 a 31/12/2019, a 2.ª Ré (B) nunca conferiu ao Autor o gozo de um descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado. (28.º)
40. Desde 22/07/2003 até 31/12/2019, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a 2ª Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos, a que se seguia um período de vinte e quatro horas de descanso compensatório, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (29.º)
41. Entre 22/07/2003 a 31/12/2008, o Autor prestou 226 dias de trabalho ao sétimo dia para a 2.ª Ré (B) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (30.º)
42. Entre 22/07/2003 a 31/12/2008 a 2.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (31.º)
43. Entre 22/07/2003 a 31/12/2008, a 2.ª Ré (B) fixou ao Autor um total de 226 dias de descanso compensatório, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (32.º)
44. Entre 01/01/2009 a 31/07/2010, o Autor prestou 68 dias de trabalho ao sétimo dia, para a 2.ª Ré (B) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho.
Entre 01/08/2010 a 20/07/2015, o Autor prestou 206 dias de trabalho ao sétimo dia, para a 2.ª Ré (B) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (33.º)
45. Entre 21/07/2015 a 20/07/2018, o Autor prestou 125 dias de trabalho ao sétimo dia, para a 2.ª Ré (B) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (34.º)
46. Entre 21/07/2018 a 31/12/2019, o Autor prestou 58 dias de trabalho ao sétimo dia, para a 2.ª Ré (B) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (35.º)
47. Entre 01/01/2009 a 31/12/2019 a 2.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (36.º)
48. Entre 01/01/2009 a 31/12/2019, a 2.ª Ré (B) fixou ao Autor um total de 457 dias de descanso compensatório, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (37.º)
49. As Rés pagaram sempre ao Autor o salário correspondente ao trabalho prestado nos dias de descanso semanal em singelo, caso este tenha trabalhado em tal dia. (38.º)
  
  2. DO DIREITO
  
  O objecto do presente recurso versa sobre o cálculo da indemnização devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal entre 22.07.2003 e 31.12.2008.
  
  Vejamos então.
  
  Sobre esta questão na decisão recorrida diz-se o seguinte:
  Compensação pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias (Compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal)
  O Autor ainda pretende ser indemnizado pelos dias de descanso semanal, no período decorrido entre 22/07/2003 e 31/12/2019.
  Ficou provado que o Autor prestou a sua actividade de segurança para a 2.ª Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos, a que se seguia um período de vinte e quatro horas de descanso compensatório, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno.
  Em concreto, entre 22/07/2003 a 31/12/2008, o Autor prestou 226 dias de trabalho ao sétimo dia para a 2.ª Ré (B) após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. Contudo, a 2.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo.
  O artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M de 3 de Abril dispõe, no seu n.º1, que todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26.º.
  O artigo 18.º do mesmo Decreto-Lei prevê as excepções do referido artigo: sempre que, em função da natureza do sector de actividade, se revele inviável a observância do n.º 1 do artigo anterior, deverá ser concedido aos trabalhadores um descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, o qual não deverá ser inferior ao que resultaria de uma média semanal de 24 horas.
  No caso em apreço, mesmo que considerando a natureza do sector de actividade (guarda de segurança), a 2.ª Ré concedeu ao Autor um descanso consecutivo de vinte e quatro horas, após cada sete dias de trabalho consecutivos, obviamente não se verificando o disposto no artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M. Assim, tem que se considerar que o Autor prestou trabalho junto da 2.ª Ré em dia de descanso semanal nos termos do artigo 17.º, n.º1 do mesmo Decreto-Lei.
  O n.º6 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 32/90/M de 9 de Julho, dispõe, pois, que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago: a) aos trabalhadores que auferem salário mensal, pelo dobro da retribuição normal.
  Então, deve calcular os valores da indemnização a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, segundo a fórmula: (Salário diário) x (n.º de dias devidos e não gozados) x 2.
  Há, todavia, que ponderar a circunstância de a 2.ª Ré ter pago o valor em singelo, pelo que aos valores apurados se tem de deduzir o montante pago em singelo pela 2.ª Ré1, sob pena de estar o Autor a ser pago, não pelo dobro, mas pelo triplo do valor diário devido, o que a lei manifestamente não prevê2.
  Vejamos, então, quais os valores que deveriam ter sido pagos a este trabalhador e não foram, partindo dos valores de retribuição diários que lhe eram devidos, segundo a fórmula (Salário diário) x (n.º de dias devidos e não gozados):
Período
Salário diário
N.º de dias não gozados
Quantia indemnizatória
22/07/2003 a 31/12/2008
HKD$250.00
226
MOP$58,195.00
  Assim num total de MOP$58,195.00.
  Por outro lado, ficou provado que entre 22/07/2003 a 31/12/2008, a 2.ª Ré (B) já fixou ao Autor um total de 226 dias de descanso compensatório, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal.
  Pelo que é de indeferir o pedido da indemnização a título de descanso compensatório não gozado relativo ao período de 22/07/2003 a 31/12/2008.
  Nesta parte a sentença recorrida seguiu o entendimento de que o trabalho prestado em dia de descanso semanal era remunerado pelo dobro, considerando que a aplicação do factor de multiplicação 2 inclui a remuneração normal devida por esse dia, pelo que, tendo o Autor/Recorrente sido pago por esse dia e tendo trabalhado em dia de descanso semanal, havia apenas que receber mais o valor correspondente a um dia de trabalho.
  Contudo, não tem sido esse o entendimento sufragado por este Tribunal de Segunda Instância.
  Consagra o artº 17º do Decreto-Lei nº 24/89/M, na redacção introduzida pelo nº 32/90/M o seguinte:
«Artigo 17º
(Descanso semanal)
  1. Todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26º
  2. O período de descanso semanal de cada trabalhador será fixado pelo empregador, com devida antecedência, de acordo com as exigências do funcionamento da empresa.
  3. Os trabalhadores só poderão ser chamados a prestar trabalho nos respectivos períodos de descanso semanal:
  a) Quando os empregadores estejam na eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
  b) Quando os empregadores tenham de fazer face a acréscimos de trabalho não previsíveis ou não atendíveis pela admissão de outros trabalhadores;
  c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável e insubstituível para garantir a continuidade do funcionamento da empresa.
  4. Nos casos de prestação de trabalho em período de descanso semanal, o trabalhador tem direito a um outro dia de descanso compensatório a gozar dentro dos trinta dias seguintes ao da prestação de trabalho e que será imediatamente fixado.
  5. A observância do direito consagrado no nº 1 não prejudica a faculdade de o trabalhador prestar serviço voluntário em dia de descanso semanal, não podendo, no entanto, a isso ser obrigado.
  6. O trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago:
  a) Aos trabalhadores que auferem salário mensal, pelo dobro da retribuição normal;
  b) Aos trabalhadores que auferem salário determinado em função do resultado efectivamente produzido ou do período de trabalho efectivamente prestado, pelo montante acordado com os empregadores, com observância dos limites estabelecidos nos usos e costumes.».
  A questão que se coloca consiste em saber se quando a lei fala em “dobro da retribuição normal” está a pensar apenas em o trabalho ser pago pela retribuição normal que seria devida pelo dia de descanso acrescida do equivalente à remuneração devida por mais um dia, ou se se pretende dizer que o “trabalho” prestado em dia de descanso semanal é pago com a retribuição equivalente ao dobro do que aquilo que seria devido por um dia de trabalho normal, sem prejuízo do trabalhador continuar a ter direito a receber o valor que já era devido por esse dia em que devia ter descansado.
  Tem vindo a ser entendimento deste tribunal que a remuneração devida é igual ao dobro da remuneração normal., sem descontar o valor que é pago ao trabalhador por esse dia ainda que não trabalhasse.
  A respeito de descanso semanal referem José Bento da Silva e Miguel Quental, em Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau, 2006, que: «As razões que justificam a existência de um dia de descanso prendem-se com motivos de ordem física e psíquica (recuperar do desgaste provocado por uma semana de trabalho), de ordem familiar (aproveitar esse dia para conviver com a própria família) e também por razões de ordem social e cultural (esse período permite o convívio com amigos, a participação em manifestações de carácter público, ou para que o trabalhador possa tratar de assuntos do seu próprio interesse junto, por ex. de repartições públicas, etc.).
  A fixação do período de descanso semanal, nos termos do nº 2 do art. 17º, cabe ao empregador, e deve ser realizado (fixado) “com devida antecedência de acordo com as exigências de funcionamento da empresa”. Assim, e embora seja a entidade patronal quem tem o poder para determinar o dia de descanso semanal dos seus trabalhadores, tal fixação está, no entanto, subordinada às exigências de funcionamento da empresa. O que se compreende, atendendo a que no Território o normal é as empresas funcionarem todos os dias, inexistindo um dia de paralisação da actividade, logo torna-se necessário escalonar os dias de descanso semanal dos trabalhadores por forma a que a empresa se possa manter em funcionamento todos os dias da semana.
  Como se referiu, a lei determina que o descanso semanal deve ser fixado com a “devida antecedência”: quer isto dizer que a entidade patronal deve avisar o trabalhador do seu dia de descanso com a antecedência suficiente, para que este possa organizar a sua vida de modo a poder usufruir efectivamente de todos os benefícios relacionados com o dia de descanso.».
  O trabalho prestado em dia de descanso semanal reveste carácter excepcional, ainda que seja voluntariamente prestado, sendo as normas respectivas de carácter imperativo.
  O trabalhador tem sempre o direito a receber a remuneração correspondente ao dia de descanso nos termos do artº 26º nº 1 do Decreto-Lei 24/89/M.
  Destarte, tem este tribunal vindo a entender que quando na al. a) do nº 6 do artº 17º do indicado diploma legal se diz que “o trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago (…) pelo dobro” se está a consagrar o valor remuneratório do trabalho efectivamente prestado e indisponibilidade de gozar o dia de descanso semanal, independentemente e para além da remuneração desse dia à qual o trabalhador, como já se referiu, sempre teria direito.
  Em igual sentido se disse no Acórdão deste tribunal de 27.02.2020 proferido no processo 1247/2019: «Não faria, aliás, sentido que fosse de outra maneira. Na verdade, se o trabalhador, mesmo sem prestar serviço nesse dia de descanso (v.g., domingo), sempre auferiria o correspondente valor (a entidade patronal não lho poderia descontar, visto que o salário é mensal), não faria sentido que, indo trabalhar nesse dia, apenas passasse a receber em singelo o trabalho efectivamente prestado. Seria injusto que apenas se pagasse ao trabalhador esse dia de serviço, que deveria ser de folga e descanso. Que vantagem teria então o trabalhador por prestar serviço a um domingo, se, além do que receberia mesmo sem trabalhar, apenas lhe fosse pago o valor do trabalho efectivamente prestado nesse dia de folga como se tratasse de um dia normal de trabalho?!
  Por isso é que o legislador previu que o trabalho efectivamente prestado nesses dias pelo trabalhador, além do valor que já lhes seria devido em qualquer caso, fosse compensado em dobro pelo valor da retribuição normal diária. Quando a lei fala em dobro refere-se, obviamente, à forma de remunerar esse serviço efectivamente prestado nesses dias de descanso, sem prejuízo, como é bom de ver, do valor da remuneração a que sempre teria direito correspondente a cada um desses dias de descanso e que já recebeu.
  Significa isto, assim, que a 1ª instância não poderia ter descontado o valor em singelo já recebido pelo Recorrente.
  Trata-se, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma quase uniforme por este TSI, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: salário diário X nº de dias devidos e não gozados X 2.».
  Assim sendo, sem necessidade de outras considerações e sendo esta a Jurisprudência consagrada de forma unânime nos Acórdãos proferidos por este tribunal, impõe-se decidir em conformidade, revogando a decisão recorrida nesta parte e substituindo-a por outra que respeite a indicada forma de cálculo da remuneração devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal.
  Da factualidade apurada resulta que o salário mensal do Autor era de HKD7.500,00 (8) e na sentença sob recurso considerou-se que o Autor trabalhou 226 dias de descanso semanal até 31.12.2008 (41), pelo que, lhe é devida a remuneração igual a HKD113.000,00 (HKD7.500,00:30x2x226), equivalente a MOP116.390,003.
  
III. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos decide-se em conceder provimento ao recurso interposto pelo Autor, revogando a sentença recorrida na parte respeitante à compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, condenando a 2ª Ré por essa razão a pagar ao Autor o montante de MOP116.390,00 acrescida dos juros moratórios fixados nos termos daquela decisão a qual em tudo o mais se mantém.
  
  Custas pela 2ª Ré/Recorrida.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 20 de Janeiro de 2022
  Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
  Lai Kin Hong
  Fong Man Chong




1 Cf., neste preciso sentido, Acórdão do TUI de 27 de Fevereiro de 2008, onde, avaliando uma situação semelhante envolvendo a aqui Ré nos presentes autos, afirma: « ... tem razão a Ré ao dizer que o autor já recebeu o salário normal correspondente ao trabalho nesses dias de descanso, pelo que, agora, só tem direito a outro tanto, e não ao dobro, como se decidiu no Acórdão recorrido, que não explica, aliás, porque não levou em conta o salário já pago. E que está em causa o pagamento do trabalho em dia de descanso semanal, pelo dobro da retribuição normal, mas o autor foi pago já em singelo.» Temos conhecimento do sentido adoptado a este respeito pelo Tribunal de Segunda Instância, nomeadamente, no Acórdão tirado nos autos de Processo 138/2011, com o qual, no entanto, sempre salvaguardando o seu douto entendimento, não concordamos.
2 Cremos, sempre salvaguardando opinião contrária, que a previsão constante do art. 43.°, n.º 2, 1) da Lei n.º 7/2008, de 18/8/2008, traduz uma clarificação muito relevante a este respeito, tornando mais clara ainda a orientação legislativa, no sentido de compensar o trabalhador pela prestação do trabalho em dia que seria de descanso com um dia (e não dois) de remuneração de base; não seria muito compreensível, num território que se aproxima paulatinamente de novos padrões normativos, que, nesta matéria, sinalizasse um retrocesso tão drástico relativamente ao diploma anterior.
3 Pela aplicação do factor 1,03.
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934/2021 CÍVEL 1