Processo nº 183/2021
Data do Acórdão: 27JAN2022
Assuntos:
Acção especial de prestação de contas
Non-liquet na questão da prova
Ónus de prova
SUMÁRIO
Na acção especial de prestação de contas em que as contas apresentadas foram contestadas pela parte que tem o direito de as exigir, o non-liquet na questão da prova quanto aos valores concretos das contas indicados pela parte que tem o dever de as prestar deve ser valorado contra essa parte a quem compete o ónus de prova nos termos do disposto no artº 335º/2 do Código Civil.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 183/2021
Acordam em conferência na Secção Cível e Administrativa no Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I
A intentou a acção especial de prestação de contas contra B, ambos devidamente identificados nos autos.
A acção foi registada com o nº CV2-16-0099-CPE e correu os seus termos no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base.
Citada, a Ré contestou a obrigação de prestar contas por inverificação dos pressupostos processuais de uma acção especial de prestação de contas.
Cumprido o contraditório, foi proferido o despacho julgando improcedente a contestação e determinada a prestação de contas no prazo de 20 dias, sob pena de não poder contestar as contas que o Autor apresente.
Inconformado com esse despacho que julgou improcedente a contestação, a Ré recorreu do mesmo para este TSI.
Admitido o recurso, fixados a ele o regime de subida imediata e o efeito suspensivo, motivado e feito subir ao TSI, o recurso acabou por ter sido julgado improcedente por Acórdão de 07DEZ2017, ora constante das fls. 119 a 122v..
Baixados os autos à primeira instância, foi a Ré notificada para apresentar as contas, conforme o ordenado no despacho proferido em 02MAR2017 a fls. 68 a 70v pelo Tribunal da 1ª instância que, em sede de recurso, foi confirmado e mantido pelo Acórdão do TSI datado de 07DEZ2017.
Notificada, a Ré apresentou as contas mediante o requerimento ora constante das fls. 130 e s.s..
Notificado das contas apresentadas pela Ré, o Autor contestou.
Seguindo-se os termos do processo ordinário e realizado o julgamento de matéria de facto, veio a final a ser proferida a seguinte sentença de direito julgando apresentadas as contas e improcedente o pedido de restituição dos saldos formulado pelo Autor:
I – 敍述部份:
A,離婚,中國籍,持澳門居民身份證編號51XXXX1(7),居於澳門XX巷XX號XX XX樓XX;
針對
B,已婚,中國籍,持澳門居民身份證編號74XXXX2(9),居於澳門XX馬路XX花園第XX座XX樓XX;
提起本賬目提交程序
聲請人提交了第2至3背頁文件,要求被聲請人於30天期內提交賬目,否則不可對聲請人提交的賬目作出爭執。
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被聲請人獲傳喚後提交了第58至59頁之答辯,要求駁回原告請求提交賬目的申請。
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本院審理聲請人的請求後,裁定被聲請人負有提交賬目的義務,被聲請人因而提交了卷宗第132至134頁的賬目。
針對上指賬目,聲請人提出了第202至205頁之爭執。
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在事宜、等級及地域方面,本法院對此案有管轄權。
不存在不可補正之無效。
訴訟雙方具有當事人能力及訴訟能力,且具有正當性。沒有無效、抗辯或妨礙審查本案實體問題且依職權須即時解決的先決問題。
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本院依法由合議庭主席以合議庭形式對本訴訟進行公開審理。
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II – 事實:
經查明,本院認定如下事實:
已確之事實:
- 2004年2月6日,原告買入位於Avenida XX n.º XX edifício XX Garden, Bloco n.º XX, 5º andar “B”, em Macau的獨立單位。(已確之事實A)項)
- 原告要求被告代表前者出售上述A.項的獨立單位 “B5”、收取有關買賣價金、註銷抵押登記,以及向C銀行償還借款。(已確之事實B)項)
- 被告接受上述要求,並要求原告向其發出一份具特別授權的授權書。(見卷宗第49及50頁,有關內容在此視為完全轉錄。)(已確之事實C)項)
- 於2008年1月29日,基於代表原告出售上述 “B5” 獨立單位,被告收到的買賣價金為港幣990,000元,折合澳門幣1,021,185元。(已確之事實D)項)
- 原告及被告的女兒D (兩人分別為1/2的所有權人) 已出售位於澳門XX馬路XX花園第XX座6樓B單位,且兩人已將收到的價金平分。(已確之事實E)項)
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調查基礎內容:
- 於2007年,聲請人及被聲請人女兒D打算購買位於澳門XX馬路XX花園第XX座6樓B單位,當時該單位的所有權人已收取一名預約買受人的定金,金額則未能查明。(調查基礎內容第1點)
- 在經聲請人及D的同意下,被聲請人墊支上述定金用作賠償予上述的預約買受人。(調查基礎內容第2點)
- 於2007年11月23日聲請人及D購買上述6樓B單位,買賣公證書記載的價金為MOP400,000.00,辦理買賣的公證費、印花稅、不動產轉移印花稅及登記費的金額則未能查明。(調查基礎內容第3點)
- 上條款項經聲請人及D同意下均由被聲請人墊支。(調查基礎內容第4點)
- 被聲請人代表聲請人辦理取消及清償已證事實A.項所指的5樓B單位的意定抵押並向銀行支付了MOP280,305.82。(調查基礎內容第5點)
- 被聲請人還代表聲請人支付取消該單位的抵押公證費及登記費,有關金額未能查明。(調查基礎內容第5點)
- 上述MOP280,305.82由被聲請人墊支。(調查基礎內容第7點)
- 上述公證費及登記費由被聲請人墊支。(調查基礎內容第8點)
- 於2008年3月26日,聲請人與D在澳門結婚,為此聲請人向被聲請人給予禮金,有關金額未能查明。(調查基礎內容第9點)
- 聲請人與D結婚及女兒朱月妍出生的開支包括購買婚戒、女兒滿月酒及日本東京一星期旅行等費用,有關金額未能查明。(調查基礎內容第11點)
- 為裝修位於澳門XX馬路XX花園第XX座6樓B的家庭居所,被聲請人墊支了相關費用,但金額未能查明。(調查基礎內容第12點)
- 聲請人同意被聲請人從出售上述5樓B單位所得的價金MOP1,021,185.00中扣除待證事實第2條至8條及12條答案所指由被聲請人墊支的開支。(調查基礎內容第13點)
- 雙方經結算後,被聲請人已向聲請人返還扣除待證事實第2至8條及12條答案所指的開支後剩下的餘款。(調查基礎內容第14點)
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III – 法律理據:
聲請人提起本訴訟程序要求被聲請人提交涉案兩個獨立單位的結算賬目,並向聲請人返還倘有之餘款及相關利息。
按聲請狀,於2007年,聲請人與被聲請人女兒D因有意締結婚姻遂購入位於澳門XX馬路XX花園第XX座 “B6” 獨立單位作為二人的新居,為此,被聲請人墊支了有關樓款; 其後,在聲請人的要求下,被聲請人代為出售位於Avenida XX n.º XX edifício XX Garden, Bloco n.º XX “B5” 獨立單位、收取價金、註銷抵押登記及償還銀行貸款。雖然被聲請人已向聲請人表示已將出售 “B5” 所收取的樓款全數用於上述費用上,已無任何餘款可返還,惟被聲請人至今仍未向聲請人提交有關結算賬目。
就上述兩次買賣,被聲請人提交賬目時指出,在代表聲請人出售 “B5”時,被聲請人收取了MOP1,021,185.00的價金、支付了MOP940.00的手續費,償還了MOP300,000.00的樓宇貸款; 於聲請人購買 “B6” 時,被聲請人除墊支了MOP400,000.00的價金及MOP10,100.00的手續費外,還因此單位的賣方早已承諾將之出售予另一買方,故在聲請人同意下,被聲請人向該買方賠償了MOP200,000.00。
此外,被聲請人又謂聲請人同意被聲請人從上述收取的樓款中扣除聲請人承諾給予被聲請人出嫁女兒的禮金共MOP80,000.00、聲請人因結婚及女兒出世而生的開支共MOP150,000.00及 “B6” 的裝修費共MOP150,000.00。
針對被聲請人提交的賬目,聲請人提出爭執,包括質疑 “B6” 的另一買方及賠償是否存在、指 “B5” 的樓宇貸款及 “B6” 的裝修費少於被聲請人所指的金額,否認曾承諾向被聲請人給予任何婚嫁禮金,又指結婚及女兒出生的支出全由聲請人承擔,被聲請人從沒有墊支任何款項。
聲請人又指 “B6” 單位為聲請人及被聲請人女兒共同購入,各占二分之一業權,因此有關開支應由二人攤分。
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《民事訴訟法典》第879條規定,“提交帳目之訴得由有權要求提交帳目之人提起,或由有義務提交帳目之人提起,而該訴訟之標的為查明及通過由管理他人財產之人所取得之收入及所作之支出,以及在有需要時判處其支付所計得之結餘。”
從上文簡述,可見雙方均認同被聲請人代聲請人收取出售 “B5” 的價金MOP1,021,185.00及支付與之相關的若干費用; 此外,雙方亦承認聲請人於購買 “B6” 時,被聲請人代支付了若干費用,但二人未能就具體項目及金額達成共識; 與聲請人結婚及其女兒出生有關的某些開支,雙方亦無法取得一致見解。
基於雙方的主張,本院須處理被聲請人提供的各項費用是否存在及其金額,此等費用應否一併載於聲請人要求的賬目內及聲請人有否權利收取任何款項。
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庭審後,證實聲請人要求被聲請人代其出售 “B5” 單位,被聲請人除代收取相等於MOP1,021,185.00的買賣價金外、還代支註銷抵押登記的費用,但金額未能查明,並向C銀行償還借款MOP280,305.82。
針對 “B6” 單位,於2007年,聲請人及被聲請人女兒D決定購買該單位時,其業權人已收取一名預約買受人的定金,金額則未能查明,因此,在聲請人及D的同意下,被聲請人墊支未查明金額的定金用作賠償予原先的預約買受人; 於2007年11月23日聲請人及D購買 “B6”時,在聲請人及D的同意下,由被聲請人墊支有關費用,包括MOP400,000.00的樓款及金額未能查明的公證費、印花稅、不動產轉移印花稅及登記費; 為裝修此單位,被聲請人又墊支了金額未能查明的裝修費。
有關婚嫁禮金、與結婚及女兒出生有關的費用等主張,被聲請人未能證明聲請人同意其於 “B5” 的樓款中扣除此等費用; 因此,被聲請人提交的賬目不應載有此等開支。
按此,涉案的收支具體情況如下:
收入
支出
項目
MOP
項目
MOP
出售 “B5”
1,021,185.00
“B5” 樓貸還款
280,305.82
“B5” 註銷抵押
未查明
“B6” 定金賠償
未查明
“B6”樓款
400,000.00
公證費、印花稅、不動產轉移印花稅、登記費
未查明
“B6” 裝修費
未查明
總數
1,021,185.00
>680,305.82
按上述收支,金額能確定的支出為MOP680,305.82,低於被聲請人收取的MOP1,021,185.00,差額為MOP340,879.18 ($1,021,185.00 - $680,302.82)。
倘若 “B6” 單位的開支應由聲請人及被聲請人女兒共同分擔,各付一半費用,則上述的收支將如下:
收入
支出
項目
MOP
項目
MOP
出售 “B5”
1,021,185.00
“B5” 樓貸還款
280,305.82
“B5” 註銷抵押
未查明
“B6” 定金賠償
未查明 (1/2)
“B6”樓款
200,000.00
公證費、印花稅、不動產轉移印花稅、登記費
未查明 (1/2)
“B6” 裝修費
未查明 (1/2)
總數
1,021,185.00
>480,305.82
按此,金額能確定的支出為MOP480,305.82,與MOP1,021,185.00 的收入相比,差額為MOP540,879.18。
可是,已證事實反映被聲請人同時墊支了涉案兩項買賣手續的相關費用及 “B6” 的裝修費,雖然金額未能查明,但此點證明倘有的餘款必然少於MOP340,879.18或MOP540,879.18。
在此基礎上,本院實難以認定扣除上述開支後是否仍有餘款及確定其金額。
雖然如此,由於已證事實已反映雙方經結算後,被聲請人已向聲請人返還扣除該等開支後的結餘,不論上述難題能否獲得解決,聲請人亦不能要求被聲請人向其返還餘款。
基此,本院應視被聲請人已提交本案所指的賬目,但聲請人要求被聲請人返還結餘的請求則因被聲請人已返還餘款而不能成立。
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IV – 裁 決:
據上論結,本法庭視本個案所指之賬目已被提交; 駁回聲請人A針對被聲請人B提出返還賬目結餘之請求,開釋被聲請人。
訴訟費用由聲請人承擔。
依法作出通知及登錄本判決。
Notificado e inconformado com a sentença, o Autor recorreu para este TSI, concluindo e pedindo que:
I. Da preterição da audiência prévia - A decisão ora recorrida constituiu para a Recorrente uma decisão-surpresa, devendo ser declarada nula (art.º 122.º, n.º, al. d), do CPA) ou anulada (art.º 122.º, n.º, al. d), do CPA) por violação do disposto nos artigos 59.º, 86.º, n.º 1, 88.º, n.º 1, 10.º, 93.º, n.º 1, 94.º (ou 95.º), 96.º (à contrário) e 97.º, todos do CPA. (sic)
II. Deverão por isso serem alteradas as respostas dadas aos quesitos 13.º e 14.º de "Provado que" para "Não provado" ou anulada a decisão recorrida nos termos e para os efeitos do art.º 629.º, n.º 4, do CPC,
III. Na resposta ao quesito 13 da Base instrutória [1] o Tribunal a quo deu como provado que o Autor consentiu que a Ré descontasse o valor das despesas mencionadas nas respostas dos quesitos 2.º a 8.º e 12.º da Base Instrutória do montante de MOP1.021.185.00 do preço de venda da fracção "B5".
IV. Ora, tal resposta ao quesito 13.º pressupunha o apuramento prévio do valor das despesas mencionadas nas respostas dos quesitos 2.º a 8.º e 12.º da Base Instrutória, dado o objecto do consentimento ser o valor do desconto consentido.
V. Isto porque o valor das despesas que o Autor terá consentido que fosse descontado ao preço de venda da fracção "B5", cuja prova competia à Ré (art.º 335.º, n.º 2, do Cód. Civil, ex vi do ar.º 437.º, do CPC), consiste num facto fundamental da defesa indispensável à resposta positiva aos quesitos 13.º e 14.º da base instrutória e por conseguinte, à boa decisão da causa.
VI. Mais, na resposta ao quesito 14.º ficou provado que, após a liquidação pelas partes, a Requerida devolveu ao Autor o montante remanescente resultante do desconto das despesas mencionadas nas respostas dos quesitos 2.º a 8.º e 12.º.
VII. Mas não foi isso que foi perguntado no quesito 14.º da base instrutória, pelo que a resposta é manifestamente deficiente.
VIII. Acresce que a resposta ao quesito 14.º da base instrutória se trata de matéria de facto conclusiva pelo que deverá considerar-se como não escrita nos termos do art.º 549.º, n.º 4, do CPC.
IX. Por outro lado, como é que o tribunal a quo podia saber qual foi o montante remanescente resultante do desconto das despesas mencionadas nas respostas dos quesitos 2.º a 8.º e 12.º. (e se o mesmo foi realmente devolvido) se não se apurou o valor parcelar ou total dessas despesas?
X. Deverão por isso serem alteradas as respostas dadas aos quesitos 13.º e 14.º de "Provado que" para "Não provado" ou anulada a decisão recorrida nos termos e para os efeitos do art.º 629.º, n.º 4, do CPC,
XI. e repetido o julgamento quanto à parte da decisão viciada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 629.º, n.º 4 do CPC, por deficiência das respostas aos quesitos 13.º e 14.º e contradição (na parte relativa ao valor das despesas) com as dos quesitos 1.º, 3.º, 6.º, 9.º, 11.º e 12.º, da base instrutória.
XII. Subsidiariamente, sempre haveria falta de fundamentação das respostas aos quesitos 13.º e 14.º da base instrutória, a matéria de facto foi decidida pelo acórdão de 6/07/2020.
XIII. Assim, por se tratarem de factos essenciais à boa decisão da causa, deve, na sequência do provimento deste recurso, ordenar-se, nos termos do artigo 629.º, n.º 5 do CPC, a baixa dos autos ao Tribunal a quo para os efeitos consignados em tal norma, designadamente para que o Meritíssimo Juiz fundamente a resposta aos quesitos 13.º e 14.º da base instrutória, indicando a razão de ciência das testemunhas, e fazendo o exame crítico do seu depoimento, mesmo para tanto tenha de repetir a prova produzida.
XIV. A resposta aos quesitos 1.º e 2.º da Base Instrutória deverá ser alterada de "Provado para "Não provado ".
XV. Primeiro, porque os factos perguntados e pressupostos nestes dois quesitos, designadamente no que respeita à existência do contrato-promessa, do valor do sinal nele previsto, da sua resolução e da quitação do sinal penitencial supostamente pago pela Ré,
XVI. se tratam de factos para cuja prova se exige documento escrito, conforme resulta do disposto do art.º 404.º, n.º 1 e 2, ex vi do art.º 866.º, ambos do Cód. Civil, ex vi do art.º 94.º, n.º 1, do Código do Notariado e do art.º 430.º, n.º 1 776.º, n.º 1 e 2, ambos do Cód. Civil.
XVII. Ora, a prova testemunhal produzida, desacompanhada de prova documental que a corroborasse, não satisfaz o disposto nos art.os 558.º, n.º 2, ex vi do art.º 882.º, n.º 2 e 883.º, n.º 5, todos do CPC, pelo que nunca a resposta aos quesitos 1.º e 2.º da Base Instrutória poderia ter sido positiva.
XVIII. Por outro lado, O tribunal a quo não refere nenhum fundamento que consinta o controlo da razoabilidade da sua convicção sobre o julgamento de cada um dos factos provados e pressupostos nas respostas aos quesitos 13.º e 14.º da base instrutória.
XIX. A fundamentação usada é, a nosso ver, insuficiente, já que impede, por forma absoluta a este tribunal de recurso, o exame do processo lógico ou racional que esteve subjacente à decisão, desde logo se desconhecendo a razão de ciência das testemunhas e por outro lado não se sabendo porque é que foram considerados isentos e coerentes os seus depoimentos face à patente “amnésia selectiva” que o seu depoimento por demais evidencia.
XX. Ora, uma tal fundamentação em que não se indica a razão de ciência das testemunhas, nem se faz o respectivo exame crítico do seu depoimento, viola manifestamente o disposto no art.º 556.º, n° 2, do CPC e não deve ser premiado.
XXI. Assim, por recair sobre factos essenciais à boa decisão da causa, deve, na sequência do provimento deste recurso, ordenar-se, nos termos do artigo 629.º, n.º 5 do CPC, a baixa dos autos ao Tribunal a quo para os efeitos consignados em tal norma, designadamente para que o Meritíssimo Juiz da 1.º Instância fundamente a resposta aos quesitos 13.º e 14.º da base instrutória, indicando a razão de ciência das testemunhas, e fazendo o exame crítico do seu depoimento, mesmo que para tanto tenha de repetir a prova produzida.
XXII. Por outro lado, a resposta aos quesitos 1.º e 2.º da base instrutória deveria ter sido negativa ("Não provado").
XXIII. Primeiro, por causa da “amnésia selectiva” que fulminou as testemunhas E e F, conforme resulta das passagens da gravação do depoimento reproduzido no corpo destas alegações, o que viola o disposto no art.º 539.º, n.º 1, do CPC e torna os seus depoimentos absolutamente inverosímeis.
XXIV. Segundo, porque do depoimento da testemunha D (filha da Ré e ex-mulher do Autor) apenas resulta que que ela e o Autor concordaram na compra da fracção B6, conforme resulta das passagens da gravação do depoimento reproduzido no corpo destas alegações.
XXV. Terceiro, porque a prova testemunhal produzida não satisfaz o disposto nos art.os 558.º, n.º 2, ex vi do art.º 882.º, n.º 2 e 883.º, n.º 5, todos do CPC.
XXVI. Quarto, porque segundo o art.º 882.º, n.º 2, do CPC: “As contas são apresentadas em duplicado e instruídas com os documentos justificativos.”
XXVII. Ora, nenhuma prova documental foi produzida no sentido de demonstrar a existência do sinal penitencial referido na resposta ao quesito 1.º, nem do valor (ou da quitação do seu pagamento) referido na resposta ao quesito 2.º da base instrutória,
XXVIII. Não podia, pois, o tribunal a quo ter presumido que o mesmo foi descontado do montante de MOPl.021.185.00 do preço de venda da fracção "B5", por tal ilação violar o disposto no artigo 558.º, n.º 2, do CPC, ex vi dos art.ºs 404.º, n.º 2, 866.º e 430.º, n.º 1, todos do Cód. Civil e no disposto no art.º342.º, do mesmo diploma e nos art.os 882.º, n.º 2,883.º, n.º 5 e 437.º, todos do CPC.
XXIX. Quinto, porque da fundamentação de que «次名證人僅能指出在聲請人表示有意購買“6B”時,其已承諾將之出售予他人並收取了定金,故聲請人當時向該買家作出了賠償»(sublinhado nosso) não basta para dar como provado que o Recorrente se tivesse comprometido com a segunda testemunha no sentido de pagar certo valor do sinal a título de indemnização, conforme resulta das passagens da gravação do depoimento reproduzido no corpo destas alegações da própria testemunha F, que revela nunca ter conhecido o Autor, ora Recorrente, nem ouvido o seu nome.
XXX. Sétimo, porque a fundamentação do acórdão da matéria de facto de que: «被聲請人最後兩名證人(皆為其女兒,其中一名同為聲請人前妻)能詳述被聲請人如何協助聲請人出售和買入上述兩個單位以至墊付有關費用箇中情節,尤以購入“6B”單位的部份,由於二人證言與有關書證及雙方的訴辯書狀就被聲請人墊支買賣及裝修費用的陳述相符,其言可信,因此本院採納有關證言並認定相關事實。» (sublinhado nosso) não basta para dar como provado que a Ré tivesse realmente antecipado os valores em causa.
XXXI. Isto por tal conclusão violar o disposto no artigo 558.º, n.º 2, do CPC, ex vi dos art.os 404.º, n.º 2, 866.º e 430.º, n.º 1, todos do Cód. Civil e no disposto no art.º 342.º, do mesmo diploma e nos art.os 882.º, n.º 2, 883.º, n.º 5 (segunda parte, a contrario) e 437.º, todos do CPC.
XXXII. Também a resposta aos quesitos 3.º, 4.º, 6.º e 8.º, 12.º e 13.º da base instrutória deverá ser alterada de "Provado para "Não provado ".
XXXIII. Primeiro, porque à prova produzida pela Ré quanto a esta matéria foi produzida contraprova nos termos e para os efeitos do art.º 339.º do Cód. Civil pelo Autor, designadamente o depoimento da G conforme resulta das passagens da gravação do depoimento reproduzido no corpo destas alegações.
XXXIV. Primeiro, no que se toca às despesas de remodelação para a casa de morada de família dos cônjuges, ora o Recorrente e a D, as testemunhas supra identificadas negaram que ela tivesse sido especialmente decorada e revelaram que somente se colocaram alguns móveis básicos, tais como sofá, televisão e armários ...
XXXV. Tudo isto contraria ao que alegou a ora Recorrida que disse ter adiantado o pagamento de MOP150.000,00 para o efeito.
XXXVI. Segundo, porque competia ora Recorrida o ónus de prova de demonstrar quais os tipos de obra de remodelações realizadas, bem como o valor concreto delas.
XXXVII. Nunca, porém, a ora Recorrida forneceu nenhuma prova documental, tais como os respectivos recibos, fotografias da casa, etc., pelo que não se apuraram os factos constantes nos quesitos 3.º, 4.º, 6.º e 8.º, 12.º e 13.º. Terceiro, mesmo que entenda que tivesse a ora Recorrida adiantado o pagamento das despesas decorrentes tanto do notariado e do registo, cuja prova exige documento escrito (guia de depósito de emolumentos - art. 45.º, n.º, al. j), do Código do Notariado e conta do acto - art.º 154.º, n.º 1, do Cód. do Registo Predial),
XXXVIII. como da remodelação da casa, como o valor concreto das mesmas não foi apurado, tal valor indeterminado não podia ter sido “descontado do preço da venda da fracção “B5” nem, por conseguinte, podia a Recorrida ter sido absolvida do pedido, por lhe competir a prova, por documento escrito, dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado pelo Autor (art.º 335.º, n.º 2, do Cód. Civil).
XXXIX. Também a resposta ao quesito 14.º da base instrutória deverá ser alterada de "Provado" para "Não provado ".
XL. Primeiro porque do depoimento da testemunha H conforme resulta das passagens da gravação do depoimento reproduzido no corpo destas alegações que ela não sabe o que se passou, enquanto do depoimento da G conforme resulta das passagens da gravação do depoimento reproduzido no corpo destas alegações que a Ré não revelou ao ora Recorrente que o verdadeiro o valor recebido pela venda da "B5" foi de novecentos mil dólares de Hong Kong.
XLI. E se o não fez, foi porque ela não queria que ele soubesse que ela embolsara a diferença de MOP92.385,00.
XLII. Há, pois, de considerar duvidoso por força do disposto no art.º 339.º do Código Civil,[2] que a ora Recorrida tivesse revelado ao Autor a existência do sinal em dobro supostamente paga ao credor das testemunhas ou deduzido tal valor ao verdadeiro preço da venda de MOP1.021.185,00 (que ocultou ao Autor) e, por conseguinte que o Autor tivesse concordado com uma situação de que não tinha conhecimento!
XLIII. Os factos objecto do depoimento da testemunha H foram, portanto, tornados duvidosos nos termos e para os efeitos do art.º 339.º do Cód. Civil pelo depoimento da testemunha G, pelo que a resposta ao quesito 14.º da base instrutória o Tribunal deveria ter sido “Não provado”.
XLIV. Mas, independentemente da contraprova que foi feita, sempre subsistem dúvidas se todas as despesas invocadas pela ora Recorrida existiram, se foram consentidas pelo Autor e se foram realmente pagas por ela.
XLV. Primeiro, porque não foi feita qualquer "liquidação", sendo evidente que a segunda parte da resposta ao quesito 14.º da base instrutória pressupunha a demonstração da sua 1.ª parte, ou seja, a demonstração prévia da liquidação dos valores das despesas.
XLVI. Sucede que a demonstração da liquidação pressupõe o apuramento prévio das despesas, cuja justificação é exclusivamente documental (art.º 882.º, n.º 5, do CPC) excepto nos casos em que tal não seja costume (art.º 883.º, n.º 5, do CPC), o que não é o caso, pelo que não podia a resposta ao quesito 14.º ter sido afirmativa.
XLVII. Segundo, porque as testemunhas da Ré ouvidas em juízo, não disseram nem "como", nem "quando", nem "onde" é que a Ré pagou o saldo remanescente ao Autor na sequência da "liquidação" dos valores em causa.
XLVIII. Logo, a resposta ao quesito 14.º da base instrutória viola o disposto no art.º 342.º do Cód. Civil porque resulta de uma presunção judicial ilegal, dado que o "facto base" donde parte o Tribunal a quo não só foi objecto de contraprova nos termos e para os efeitos do art.º 339.º do Cód. Civil, como não resulta demonstrado no depoimento das testemunhas da Ré.
XLIX. As provas produzidas em juízo não consentem assim a presunção de que a quantia em causa já tivesse sido liquidada após o divórcio, entre o ora Recorrente e a D, e a divisão da fracção "B6".
L. Tal presunção, viola o disposto do no artigo 558.º, n.º 1 e 2, do CPC, por não respeitar o disposto nos art.os 404.º, n.º 2, 866.º e 430.º, n.º 1, todos do Cód. Civil e no disposto no art.º 342.º, do mesmo diploma e nos art.os 882.º, n.º 2, 883.º, n.º 5 ( 2.a parte, a contrario) e 437.º, todos do CPC.
LI. Terceiro, porque se mantém a dúvida insanável sobre a sinceridade e exactidão dos depoimentos das testemunhas xxx e xxx de que tenha havido um pagamento efectivo do sinal em dobro indemnizatório.
LII. Desde logo, porque ambas revelaram total desconhecimento quanto às condições de tempo, modo e lugar em que tal “pagamento” teria ocorrido, inexistindo prova de que tal contrato-promessa tenha sequer existido, uma vez que dele não foi produzida cópia nos autos, nem o mesmo foi participado à Direcção dos Serviços de Finanças para efeito de pagamento do imposto do selo, nem foi feita prova da sua resolução por arrependimento, nem da quitação do sinal penitencial supostamente pago ao promitente fiel.
LIII. Quarto, outrossim, as terceira e quarta testemunhas, já que delas participou do negócio, baseando-se os seus depoimentos nas palavras da sua mãe, a ora Recorrida, que foi a única pessoa que participou e controlou todo o processo e cuja relação com elas é tão forte, nomeadamente a D, ora ex-mulher do Recorrente, que esta continuou a viver com ela mesmo depois de ter casado com o ora Recorrente.
LIV. É o que conforme resulta das passagens da gravação do depoimento reproduzido no corpo destas alegações.
LV. Face ao teor das passagens dos depoimentos supra transcritos é duvidoso que o Autora tenha "acertado as contas" com a sogra, pelo que devia o Tribunal a quo ter observado o disposto no artigo 437.º, do CPC, ex vi do art.º 335.º, n.º 2 e 339.º, ambos do Cód. Civil.
LVI. Quinto, porque a resposta afirmativa ao quesito 14.º exigia a prova, por documento escrito, dos factos nela pressupostos (designadamente, do contrato promessa, da sua resolução e da quitação do pagamento do sinal penitencial) subjacente às respostas aos quesitos 1.º, 2.º e 13.º (na parte relativa ao contrato-promessa) da base instrutória.
LVII. Ora, ao abrigo do art.º 335.º, n.º 2 do CC, o ónus da prova compete àquele contra quem a invocação é feita. Tal significa que impendia sobre a Recorrida o ónus da prova do contrato-promessa, cuja suposta resolução pelas 1.ª e 2.a testemunhas terá justificado o pagamento da indemnização referida na resposta ao quesito 2.º da base instrutória.
LVIII. Sucede que tal contrato, resolução, quitação do pagamento do sinal penitencial e consentimento do ora Recorrente no sentido de que a Recorrida assumisse essa dívida das 1.ª e 2.a testemunhas como sua (dele) e a pagasse, nos termos e para os efeitos do art.º 590.º do Cód. Civil só podia ter sido provado por documento escrito, conforme resulta do disposto no art.º 558.º, n.º 2, do CPC, ex vi do art.º 404.º, n.º 1 e 2, ex vi do art.º 866.º, ambos do Cód. Civil, ex vi do art.º 94.º, n.º 1, do Código do Notariado e do disposto nos art.ºs 776.º, n.º 1 e 342.º, do Cód. Civil e nos art.os 882.º, n.º 2, 883.º, n.º 5 ( 2.a parte, a contrario) e 437.º, todos do CPC.
LIX. Contudo, a ora Recorrida não ofereceu prova bastante para comprovar isso, nomeadamente documental, sendo que o único documento que conseguiu produzir foi a própria escritura de compra e venda de fls. 144 a 146, e nada mais!
LX. E, por tanto, segundo o disposto no art.º 335.º, n.º 2, do Cód. Civil, como a Recorrida não conseguiu comprovar os factos que invocou ou vencer a dúvida sobre eles gerada, deveriam tais factos, máxime o pagamento da indemnização ao promitente vendedor, o consentimento e a "liquidação", terem sido considerados não provados.
LXI. Sexto, mesmo que se entenda que existiu tal pagamento efectivo do sinal em dobro pela ora Recorrida e o ora Recorrente tivesse dado consentimento nesse sentido, ainda assim tal valor (e o valor das restantes despesas porque indeterminado) não podia ter sido descontado do preço da venda da fracção "B6" por força do art.º 437.º do CPC.
NESTES TERMOS e nos mais de Direito, deverá ser dado provimento ao presente recurso, com as legais consequências.
Vossas Ex.as decidirão, porém, como for de lei e JUSTIÇA!
Notificada das alegações de recurso, a Ré não respondeu.
II
Foram colhidos os vistos.
Então apreciemos.
Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.
In casu, não houve questões de conhecimento oficioso.
De acordo com o vertido nas conclusões tecidas na petição do recurso final, o Autor, ora recorrente, reagiu contra a sentença recorrida, por vários meios, empregados numa relação de subsidiariedade, quais são:
i. pedir a anulação da decisão sobre os pontos da matéria de facto que indicou, com fundamento na deficiência, e a consequente repetição do julgamento nos termos autorizados pelo artº 594º/4 do CPC;
ii. pedir para considerar não escrita a resposta dada ao quesito 14º da base instrutória por constituir uma conclusão de facto ou mero juízo de valor, ao abrigo do disposto no artº 549º/4 do CPC;
iii. arguir a nulidade de falta de fundamentação da decisão da matéria de facto quanto às respostas dadas aos quesitos 13º e 14º da base instrutória; ou
iv. impugnar a matéria de facto.
Não obstante formulados numa relação de subsidiariedade, os pedidos identificados nos i. e ii. podem e devem ser apreciados em conjunto, dado o relacionamento das questões neles suscitadas.
Então vejamos.
Na presente acção especial de prestação de contas, o que levou o Tribunal a quo a proceder à audiência de julgamento é a circunstância de as contas apresentadas pela Ré terem sido contestadas pelo Autor.
Submetida ao julgamento, a matéria controvertida saiu parcialmente apurada.
Concretamente falando, apenas algumas contas parcelares foram dadas por provadas.
E em relação às restantes, não obstante comprovada a realização de despesas pela Ré para custear determinados actos em nome do Autor, o certo é que não foi apurado o valor exacto das mesmas.
Confrontado com o non liquet do valor de algumas das despesas cuja realização ficou comprovada, o Tribunal a quo acabou por decidir a favor da Ré, com base essencialmente na resposta dada ao quesito 14º, tendo fundamentado a decisão favorável à Ré nos termos seguintes:
按此,金額能確定的支出為MOP480,305.82,與MOP1,021,185.00 的收入相比,差額為MOP540,879.18。
可是,已證事實反映被聲請人同時墊支了涉案兩項買賣手續的相關費用及 “B6” 的裝修費,雖然金額未能查明,但此點證明倘有的餘款必然少於MOP340,879.18或MOP540,879.18。
在此基礎上,本院實難以認定扣除上述開支後是否仍有餘款及確定其金額。
雖然如此,由於已證事實已反映雙方經結算後,被聲請人已向聲請人返還扣除該等開支後的結餘,不論上述難題能否獲得解決,聲請人亦不能要求被聲請人向其返還餘款。
基此,本院應視被聲請人已提交本案所指的賬目,但聲請人要求被聲請人返還結餘的請求則因被聲請人已返還餘款而不能成立。
Ou seja, independentemente do apuramento dos valores concretos daquelas despesas realizadas pela Ré, para o Tribunal a quo, apesar de toda a prova recolhida, não podendo embora considerar-se provados os valores de determinadas contas parcelares e portanto na falta de certeza quanto à existência ou não dos saldos positivos, o facto provado de que as partes já acertaram as contas entre si deve determinar a improcedência do pedido da restituição dos eventuais saldos formulado pelo Autor.
Todavia, para o Autor, ora recorrente, não tendo sido apuradas as quantias parcelares exactas adiantadas pela Ré para custear as várias despesas em nome do Autor em cumprimento do mandato celebrado com ele, o Tribunal a quo não poderia ter julgado assente a matéria conclusiva da resposta ao quesito 14º da base instrutória.
Decidindo como decidiu, a sentença padece da nulidade da deficiência de facto e da contradição entre pontos da matéria de facto.
Por outro lado, o recorrente imputa também à decisão de facto o vício da falta de fundamentação das respostas dadas aos quesitos 13º e 14º.
Na óptica do recorrente, nos termos em foi decidido, a sentença fica viciada e o Tribunal ad quem deve fazer corresponder à sentença qualquer das seguintes consequências jurídicas:
* Considerar a resposta ser considerada não escrita nos termos prescritos no artº 549º/4 do CPC;
* Anular a resposta dada ao quesito 14º e passar a julgar não provada a matéria do mesmo quesito;
* Anular oficiosamente a decisão de facto nos termos e para os efeitos do disposto no artº 629º/4 do CPC, por deficiência das respostas dadas aos quesitos 13º e 14º da base instrutória e contradição entre estas e as dadas aos quesitos 1º, 3º, 6º, 9º, 11º, 12º da base instrutória e repetir o julgamento quanto à parte decisão de facto viciada; ou
* Determinar que o tribunal de primeira instância fundamente as respostas dadas aos quesitos 13º e 14º, indicando a razão de ciência das testemunhas e fazendo o exame crítico do seu depoimento, mesmo para tanto tenha de repetir a prova produzida.
Quid juris?
Reza o artº 549º/4 do CPC que têm-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito
Por aplicação analógica, deverá ter-se por não escrita a resposta dada a um quesito que tenha matéria conclusiva e não factual – cf. Ac. 08JUN1989 da Relação de Évora, in BMJ, 388º - 629, aqui citado a título da doutrina no direito comparado.
Ora, a resposta dada ao quesito 14º tem o teor seguinte:
雙方經結算後,被聲請人已向聲請人返還扣除待證事實第2至8條及12條答案所指的開支後剩下的餘款。
Ou seja, já foi restituído ao Autor o resto do montante após a dedução do valor das despesas realizadas.
Não obstante ter contido um certo substrato factual, o teor da resposta é essencialmente integrado por juízos conclusivos.
Trata-se efectivamente de uma afirmação conclusiva que se teria de ser baseada num resultado de cálculo que pressupõe o apuramento dos valores de cada uma das despesas realizadas.
Assim, se não tiverem sido apurados esses valores ditos parcelares, a matéria da resposta ao quesito 14º não pode deixar de ser meramente conclusiva e dever ter-se por não escrita, nos termos prescritos no artº 549º/4 do CPC.
Procede o primeiro pedido do recorrente.
Resta saber qual deverá ser a solução a ser dada na sequência da eliminação da resposta ao quesito 14º da matéria assente?
Determinar a repetição do julgamento para apuramento dos valores das despesas comprovadamente realizadas pela Ré?
Ou limitamo-nos a condenar a Ré na diferença, havendo-a, entre o preço da venda da fracção no valor de MOP$1.021.185,00, entregue à Ré, e a soma dos valores de todas as despesas realizadas pela Ré em nome do Autor, que vier a ser liquidada em execução de sentença, nos termos do artigo 564º/3 do CPC?
Para nós, ambas as soluções não são legalmente admissíveis.
Pois, se ordenássemos ou o novo julgamento ou a liquidação em execução de sentença, no fundo estaríamos a determinar materialmente a repetição do julgamento da matéria de facto já submetida ao julgamento e dada por não provada, na tentativa de eliminar o non-liquet de determinados factos controvertidos.
Todavia, entendemos que, fora das reduzidas situações expressamente previstas no artº 629º do CPC, não somos autorizados a ordenar a repetição do julgamento de facto com vista a apurar de novo uma matéria já julgada não provada!
Na verdade, o non-liquet da matéria de facto não justifica a repetição do julgamento.
Pois o novo julgamento da matéria já julgada só se justifica se tiver sido considerado mal julgado pelo Tribunal superior por via de recurso.
O que não é o caso, ou pelo menos, na questão em apreço, o recorrente não impugnou a matéria de facto provada.
Para nós, a solução deverá ser encontrada nas regras sobre o ónus de prova, tal como defende e bem o recorrente.
Como a lei não estabeleceu regras especiais sobre a repartição do ónus de prova no processo especial de prestação de contas, é de recorrer às regras gerais.
Ora, reza o artº 335º do CC que:
1. Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
2. A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita.
3. Em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do direito.
In casu, foi decidido por despacho confirmado por Acórdão do TSI de 07DEZ2017, ora constante das fls. 119 a 122v., já transitado em julgado, que o Autor tem direito de exigir as contas e à restituição dos eventuais saldos de contas, ao passo que a Ré tem o dever de as prestar.
Assim, face ao disposto do acima citado artº 335º/2 do CC, à Ré cabe o ónus da prova das contas e os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito à restituição dos saldos das contas invocado pelo Autor, uma vez que a Ré, enquanto mandatária, teria o dever de alegar e provar a existência e os valores das despesas realizadas em nome do mandante.
Aliás, a um mandatário não é inexigível guardar ou memorizar os meios de prova capazes de demonstrar a realização das despesas em nome do mandante e os seus valores.
Não tendo procedido desta maneira, correria a risco de sofrer as consequências desfavoráveis, nomeadamente quando confrontado com o pedido de prestar contas, tal com sucede in casu com a Ré.
Não tendo sido comprovados os factos impeditivos ou extintivos do direito do Autor à restituição dos eventuais saldos, apoiada no ora comprovado direito de exigir as contas, o non-liquet dos valores das despesas realizadas em nome do Autor pela Ré deve ser valorado em desfavor da Ré a quem competia o ónus de prova dos tais factos.
Portanto, não obstante comprovada sua realização, aquelas despesas cujos valores ficaram não provados não podem ser tidas em conta contra o Autor.
Assim, deve ser reconhecido ao Autor o direito à restituição dos saldos, consistente na diferença entre o preço da venda da fracção no valor de MOP$1.021.185,00, entregue à Ré, e o valor de MOP$480.305,82, que é soma dos montantes concretamente comprovados das despesas realizadas pela Ré em nome do Autor.
Em conclusão:
Na acção especial de prestação de contas em que as contas apresentadas foram contestadas pela parte que tem o direito de as exigir, o non-liquet na questão da prova quanto aos valores concretos das contas indicados pela parte que tem o dever de as prestar deve ser valorado contra essa parte a quem compete o ónus de prova nos termos do disposto no artº 335º/2 do Código Civil.
Tudo visto, resta decidir.
IV
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em julgar procedente o recurso, revogando a sentença recorrida na parte que absolveu a Ré e passando a condenar a Ré a pagar ao Autor o valor de MOP$540.879,18, acrescido de juros legais a contar a partir da data do presente Acórdão até ao integral pagamento.
Custas pela Ré, em ambas as instâncias.
Registe e notifique.
RAEM, 27JAN2022
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Lai Kin Hong
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Fong Man Chong
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Ho Wai Neng
1 Fica provado que o Requerente consentiu em a Requerida descontar do montante de MOP1.021.185.00, o preço de venda da referida fracção "B5", as despesas mencionadas nas respostas dos quesitos 2.° a 8.° e 12.° da Base Instrutória que foram adiantadas pela Requerida.
2 «4. A contraprova serve, por conseguinte, para a parte contrário criar um estado de incerteza acerca da verdade dos "mesmos factos" sobre os quais a outra parte tem o respectivo ónus probatório. Não é necessário persuadir o juiz que o facto em apreço não é verdadeiro. A parte contrária para fazer contraprova, pode, por exemplo, oferecer testemunhas suas para responderem à matéria dos artigos da Base Instrutória cuja prova incumbe fazer à parte que a invocou.» Cf. JOÃO GIL DE OLIVEIRA e JOSÉ CÃNDIDO DE PINHO, "Código civil de Macau: anotado e comentado, jurisprudência", Parte geral, Livro I, Volume V, Centro de Formação Jurídica e Judiciária de Macau, 2018, pág. 193, nota 4.
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Ac. 183/2021-1