--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). -----------------------
--- Data: 28/01/2022 ---------------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Chan Kuong Seng -----------------------------------------------------------------------------
Processo n.º 80/2022
(Autos de recurso penal)
Recorrente: Ministério Público
Arguida recorrida: A (A)
DECISÃO SUMÁRIA NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA
1. Inconformada com a sentença proferida a fls. 114 a 117v do Processo Comum Singular n.° CR4-21-0241-PCS do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, absolutória da arguida A, aí já melhor identificada, da acusada prática, em autoria material, de um crime consumado de fuga à responsabilidade, p. e p. pelo art.o 89.o da Lei do Trânsito Rodoviário (LTR), veio a Digna Delegada do Procurador junto desse Tribunal recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), através da motivação apresentada a fls. 124 a 126 dos presentes autos correspondentes, para pedir a condenação da arguida no crime acusado, com medida da respectiva pena, por entender ser aplicável ao parque de estabelecimento público em causa nos autos o regime sancionatório de fuga à responsabilidade previsto na LTR.
Não respondeu a arguida ao recurso.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer a fls. 136 a 138, opinando principalmente pela inaplicabilidade do referido regime sancionatório de fuga à responsabilidade aos factos ocorridos dentro do parque de estacionamento público dos autos.
Cumpre decidir sumariamente do objecto do recurso, dada a simplicidade da questão a decidir, nos termos permitidos pelo art.o 621.o, n.o 2, do Código de Processo Civil, ex vi do art.o 4.o do Código de Processo Penal.
2. Do exame dos autos, sabe-se o seguinte:
A sentença ora recorrida ficou proferida a fls. 114 a 117v dos autos, cuja fundamentação fáctica se dá por aqui integralmente reproduzida.
Nessa sentença, o Tribunal autor da sentença entendeu não ser aplicável ao parque de estacionamento público dos autos o regime legal da LTR, pelo que decidiu em absolver a arguida do acusado crime de fuga à responsabilidade tipificado nesta Lei, apesar de ter julgado por provados todos os factos descritos na acusação então deduzida pelo Ministério Público (a fls. 77 a 78) contra a arguida.
Na audiência de julgamento, a arguida confessou integralmente e sem reservas os factos acusados.
A conduta da arguida causou MOP500,00 de dano à sociedade comercial gestora do parque de estacionamento público dos autos, e pagou indemnização a esta após a notificação policial.
A arguida não é motorista de profissão, e tem a seu cargo duas pessoas menores.
A arguida não tem antecedentes criminais.
3. A nível do Direito, sobre a questão nuclear de saber se a todo o acidente de viação ocorrido em parque de estabelecimento público é aplicável a norma incriminatória do art.o 89.o da LTR, já se pronunciou, no sentido afirmativo, o TSI nos acórdãos de 16 de Novembro de 2017 do Processo n.o 941/2016, de 10 de Maio de 2018 do Processo n.o 203/2018 e de 5 de Julho de 2018 do Processo n.o 738/2017, e, mais recentemente, de 13 de Janeiro de 2022 do Processo n.o 895/2021, de maneira que na esteira dessa jurisprudência repetida na questão jurídica em causa, há que passar a condenar a arguida no crime de fuga à responsabilidade do art.o 89.o da LTR por que vinha acusada pelo Ministério Público, porquanto toda a factualidade já dada por provada na sentença absolutória ora recorrida preenche cabalmente este tipo-de-ilícito, quer objectiva quer subjectivamente falando.
Este crime de fuga à responsabilidade é punível, no caso de se optar pela aplicação da pena de multa, com 10 a 120 dias de multa (cfr. o art.o 45.o, n.o 1, do Código Penal e o art.o 89.o da LTR).
Realiza-se que, nos termos do art.o 64.o do Código Penal, é de aplicar pena de multa à arguida, que é delinquente primária.
Na medida concreta da pena aos padrões vertidos nos art.os 40.o, n.os 1 e 2, e 65.o, n.os 1 e 2, do Código Penal, atendendo em especial a que a arguida já pagou a indemnização à sociedade comercial ofendida, sendo de diminuto valor o dano causado, afigura-se equilibrada a imposição de 15 dias de multa (convertível em 10 dias de prisão, no caso de não pagamento nem substituição por trabalho, nos termos do art.o 47.o, n.o 1, do Código Penal), à quantia diária de cem patacas, o que perfaz a multa total de mil e quinhentas patacas. Além disso, tem que levar a arguida a pena acessória de inibição efectiva de condução por dois meses e quinze dias, fixada à luz do art.o 94.o, alínea 2), da LTR, dentro da respectiva moldura de dois meses a três anos de inibição (de facto, só se colocaria a hipótese de suspensão da execução deste tipo de sanção acessória nos termos do art.o 109.o, n.o 1, da LTR, se a arguida fosse um motorista de profissão, com rendimento dependente da condução de veículos – cfr. o rumo jurisprudencial até agora seguido neste TSI, na esteira do acórdão, de entre outros, de 17 de Julho de 2008 no Processo n.o 424/2008).
Por fim, nota-se que como a arguida não deve ser absolvida em primeira instância, as custas do processo no Tribunal recorrido (incluindo duas UC de taxa de justiça ora fixada e a quantia de mil e trezentas patacas de honorários já atribuída na sentença recorrida para a Ex.ma Defensora Oficiosa que a defendeu na audiência de julgamento) passarão a ficar tudo por conta da arguida, embora ela não precise de suportar as custas do presente recurso.
4. Dest’arte, decide-se sumariamente em julgar procedente o recurso do Ministério Público, passando, por conseguinte, a condenar a arguida A como autora material, na forma consumada, de um crime de fuga à responsabilidade do art.o 89.o da Lei do Trânsito Rodoviário, na pena principal de quinze dias de multa (convertível em dez dias de prisão, no caso de não pagamento nem substituição por trabalho), à quantia diária de cem patacas, no total, pois, de mil e quinhentas patacas de multa, para além da pena acessória de inibição efectiva de condução por dois meses e quinze dias.
Sem custas no presente recurso, mas as custas do processo no Tribunal recorrido passarão tudo por conta da arguida (incluindo duas UC de taxa de justiça ora fixada e a quantia de mil e trezentas patacas de honorários já atribuída na sentença recorrida para a Ex.ma Defensora Oficiosa que a defendeu na audiência de julgamento).
Fixam em setecentas patacas os honorários da Ex.ma Defensora Oficiosa da arguida (por causa da presente lide recursória), a suportar pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Após o trânsito em julgado, comunique a presente decisão (com cópia também da sentença recorrida) ao Departamento de Trânsito do Corpo de Polícia de Segurança Pública e à Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego, e comunique o resultado do recurso à sociedade comercial ofendida.
Macau, 28 de Janeiro de 2022.
_________________________
Chan Kuong Seng
(Relator)
Processo n.º 80/2022 Pág. 1/5