Processo nº 867/2021
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 17 de Fevereiro de 2022
Recorrente: A
Recorrida: B, S.A.
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
A, com os demais sinais dos autos,
vem instaurar acção declarativa em processo comum do trabalho contra
B S.A.,
também, com os demais sinais dos autos
Pedindo a condenação desta a pagar-lhe as quantias de:
a) MOP49.614,00, a título de trabalho extraordinário prestado, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento relativo ao período de 01/10/2011 a 31/08/2018;
b) MOP33.076,00, a título de descanso compensatório não gozado, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento relativo ao período de 01/10/2011 a 31/08/2018;
c) MOP86.575,00, pela prestação de trabalho ao sétimo dia em cada período de sete dias de trabalho consecutivo acrescida de juros até efectivo e integral pagamento relativo ao período de 01/10/2011 a 31/08/2018;
d) MOP86.575,00, a título de descanso compensatório não gozado, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal, relativo ao período de 01/10/2011 a 31/08/2018.
Proferida sentença, foi a Ré condenada a pagar ao Autor no valor total de MOP71,374.22 sendo:
- Remuneração a título de trabalho extraordinário no montante de MOP49.399,22;
- Remuneração a título de descanso compensatório semanal e férias no montante de MOP21,975.00; e,
nos termos do artº794º, nº4 do CC, em conjugação com a uniformização de jurisprudência decretada no acórdão do TUI nº 69/2010, a quantia é acrescida de juros legais contados a partir da data da decretação da sentença até integral e efectivo pagamento.
Não se conformando com a decisão proferida na parte relativa à condenação da Ré no pagamento da compensação devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, uma vez que a forma de cálculo usada se distancia da que tem vindo a ser usada por este Tribunal de Segunda Instância e do trabalho extraordinário, vem o Autor interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:
1. Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação da Ré (B) na compensação devida ao Autor, ora Recorrente, pelo trabalho prestado durante 30 minutos para além do período normal de trabalho e pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho) à luz da Lei n.º7/2008;
2. In casu, impõe-se apreciar a interpretação que o Tribunal a quo levou a cabo a respeito dos art. 38.º e n.º 2 do art. 42.º da Lei n.º 7/2008, e que conduziu à condenação da Ré (B) numa quantia muito inferior à reclamada pelo Autor em sede de Petição Inicial;
Mais detalhadamente.
3. Resulta da matéria de facto provada que:
- Desde o início da relação de trabalho até 31/08/2018, por ordem da Ré, o Autor está obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno (8.º);
- Entre 01/10/2011 a 31/08/2018, o Autor compareceu ao serviço da Ré (B) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, tendo permanecido às ordens e instruções dos seus superiores hierárquicos (...) (10.º);
- A Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno (11.º);
- A Ré (B) nunca conferiu ao Autor o gozo de um descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado (12.º).
4. Não obstante a referida factualidade assente, entendeu o Tribunal a quo não ter aplicação o disposto no art. 38.º da Lei n.º 7/2008, porquanto a situação dos autos não se poder subsumir em qualquer das suas previsões normativas. Sem razão, porém, está o ora Recorrente em crer;
5. Com efeito, resulta da matéria de facto que o Autor não era livre de comparecer, ou não, durante o referido período que antecedia o início de cada turno. Estava obrigado a fazê-lo porque assim lhe era imposto pela Ré (B) e com carácter de regularidade, convertendo uma situação que a Lei quis como excepcional num regime regra e sem que exista um qualquer registo a comprovar a voluntariedade e/ ou consentimento do ora Recorrente;
6. Por outro lado, ficou provado que a Ré (B) nunca conferiu ao Autor o gozo de um período de descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado;
7. A este concreto respeito, na falta de voluntariedade, será sempre de aplicar a solução constante do n.º 1 e/ ou do n.º 2 do art. 38.º da Lei n.º 7/2008, razão pela qual deve a Ré (B) ser condenada a pagar ao Autor a quantia de MOP$32,961.50 a título de descanso compensatório, em consequência do trabalho extraordinário prestado, correspondente ao seguinte:
- Entre 01/10/2011 a 20/07/2015 - (MOP$7,500/30 dias/B horas) X 0.5 hora X 1148 dias = Mop$17,966.20;
- Entre 21/07/2015 a 20/07/2018 - (MOP$7,875/30 dias/B horas) X 0.5 hora X 914 dias = Mop$14,995.30.
8. Ao não entender assim, está o Recorrente em crer ter existido uma errada aplicação da norma em questão (leia-se, do art. 38.º da Lei n.º 7/2008) pelo Tribunal a quo, o que em caso algum poderá deixar de conduzir, nesta parte, à nulidade da decisão recorrida, o que desde já e para os legais e devidos efeitos se invoca e requer.
Acresce que,
9. Resulta da matéria de facto assente que:
- Desde 01/10/2011 a 31/08/2018, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos (13.º);
- Entre 01/10/2011 a 31/08/2018, a Ré (B) não fixou ao Autor em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas (...) (15.º);
- Entre 01/10/2011 a 31/08/2018 (...), a Ré (B) nunca solicitou ao Autor autorização para que o período de descanso não tivesse uma frequência semanal (16.º);
- 01/10/2011 a 31/08/2018 a Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia extra pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo (17.º);
- Entre 01/10/2011 a 31/08/2018 a Ré (B) nunca pagou ao Autor uma qualquer pelo trabalho prestado (em) dia de descanso compensatório não gozado (18.º).
10. Não obstante a referida matéria de facto provada, com vista a apurar o valor que o Autor tinha a receber relativamente ao trabalho prestado em dia de descanso semanal, o tribunal a quo seguiu o seguinte raciocínio: dividiu o número dos dias de trabalho prestados pelo Autor e descontou os dias em que o Autor havia descansado ao 8.º dia, após a prestação de sete dias de trabalho consecutivos, apurando que o Autor terá direito a auferir a diferença entre os dois;
11. E a ser assim, salvo o devido respeito, está o ora Recorrente em crer existir um erro de julgamento traduzido, entre outro, no facto de se acreditar que a douta Decisão não ter fados para se poder chegar a tal resultado, nem os mesmos constavam da Base Instrutória;
12. Ou melhor, o que impunha apurar era os dias de trabalho em que o Autor prestou trabalho para a Ré em cada 7.º dia, após 6 dias consecutivos de trabalho e não apurar a diferença entre o trabalho prestado ao 7.º dia com os dias de não trabalho que o Autor gozou no 8.º dia após 7 dias de trabalho consecutivo, e consequentemente nada havia a descontar aquando do apuramento do montante indemnizatório, a tal respeito;
13. De onde, salvo melhor opinião, deve a Recorrida (B) ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$85,862,50, a título de falta de marcação e gozo de descanso semanal, acrescido da quantia de MOP$85,862,50 a título de descanso compensatório não gozado - e não só de apenas Mop$21,975,00, correspondente ao seguinte:
- Entre 01/10/2011 a 20/07/2015 - MOP$7,500/30 dias X (1311 dias / 7 dias) = Mop$46,750.00 X 2;
- Entre 21/07/2015 a 31/08/2018 - MOP$7,875/30 dias X (1044 dias / 7 dias) = Mop$39,112.50 X 2.
14. Ao não entender assim, está o Recorrente em crer ter existido uma errada aplicação da norma em questão (leia-se, do art. 43.º da Lei n.º 7/2008) pelo Tribunal de Primeira Instância, o que em caso algum poderá deixar de conduzir, nesta parte, à nulidade da decisão recorrida, o que desde já e para os legais e devidos efeitos se invoca e requer.
Contra-alegando veio a Recorrida pugnar para que fosse negado provimento ao recurso, apresentando as seguintes conclusões:
I. Veio o Autor, ora Recorrente, insurgir-se contra a decisão proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base na parte em que julgou parcialmente improcedente os pedidos deduzidos a título de descanso compensatório adicional referente aos 30 minutos para além do período normal de trabalho e a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho) e descanso compensatório não gozado, por entender que a sobredita decisão enferma de erro de aplicação de Direito quanto à concreta forma de cálculo da sobredita compensação e, nessa medida, mostra-se em violação do preceituado dos artigos 38º e ainda do nº 2 do art.º 42º da lei n.º 7/2008.
II. O Recorrente entende que, por essa razão, deve a douta Sentença Recorrida ser julgada nula e substituída por outra que decida em conformidade com a melhor interpretação dos referidos normativos
III. Com mui respeito, nada há apontar à Decisão Recorrida, onde é feita uma correcta interpretação e aplicação dos preceituados do n.º 1 do artigo 38º (conforme pedido na p. i.) e nº 2 do art.º 42º da lei nº 7/2008.
IV. Alega o Recorrente que o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto no n.º 1 do artigo 38.º da lei n.º 7/2008, e ser condenada a pagar ao Autor o montante de MOP$32,961.50 pelo descanso compensatório adicional referente aos 30 minutos para além do período normal de trabalho.
V. Após analisar o artigo 38, n.º 1 da Lei n.º 7/2008, que menciona que as situações previstas no artigo 36º, n.º 2 das alíneas 1) e 2), não nos parece que o Recorrente tenha qualquer tipo de razão.
VI. Ficou demonstrado o briefing era usado para efeitos de transição de turnos, mormente, para que os colegas que se encontravam no final do turno pudessem entregar aos que iam começar um novo turno os instrumentos de trabalho, tais como o “walkie talkie”.
VII. O trabalhador não tem direito a qualquer período de descanso compensatório, sempre que o trabalho extraordinário seja prestado por solicitação prévia do empregador e obtido o consentimento do trabalhador.
VIII. Além disso, o trabalho antecipado de 30 minutos por dia, já foi considerado como trabalho extraordinário e a, ora Recorrida, condenada a pagar o montante de acordo com o calculo de 1.5 do salario por hora.
IX. O descanso compensatório adicional é somente atribuído em algumas situações que estão previstas do n.º 1 no artigo 38º da Lei n.º 7/2008, conforme o Autor pede na sua petição, nem sempre que se recebe horas extraordinárias tem direito a descanso compensatório adicional.
X. Assim não nos parece, existir as situações previstas no artigo 36º, n.º 2, alínea 1) e 2) e do artigo 38º, n.º 2 da Lei n.º 7/2008, logo a Ré não precisa de prestar a compensação adicional pelas horas extraordinárias do trabalho.
XI. Parece-nos que o Tribunal a quo entendeu bem ao não condenar a ora Recorrida no pagamento do descanso compensatório adicional, pelo que nesta parte o recurso terá necessariamente de improceder.
XII. Alega ainda, o Recorrente que o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto no n.º 2 do artigo 42.º da Lei n.º 7/2008 por ter condenado a Ré, ora Recorrida, a pagar ao Autor apenas a quantia de MOP$21,975.00 pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho) em vez do valor de MOP$85,862.50 uma vez que não resulta da Lei n.º 7/2008 que a concessão ao trabalhador de um dia de descanso ao 8º dia possa ser considerado como descanso semanal e não ficou provado, nem foi alegado pela Ré nos articulados, que a actividade desenvolvida pela Ré, por si só, torne inviável, o gozo pelo Autor do descanso semanal em cada período de sete dias.
XIII. Não assiste razão ao Recorrente pois nada há a apontar à decisão proferida nesta parte pelo douto Tribunal Judicial de Base.
XIV. Diga-se, desde logo que, quanto à actividade da empresa a mesma é pública e notória - é actividade de Casino e de laboração contínua -, ou seja, de vinte e quatro horas sobre vinte e quatro horas, como o Recorrente bem sabe pois foi guarda de segurança de um casino, pelo que não haveria necessidade de fazer mais qualquer outra prova nos autos.
XV. Nem se diga que pela matéria dada como provada aos quesitos 4º, Sº, 14º e 15º da sentença pois bem sabe o Recorrente porque alegou nos artigos 28º e 40º da sua petição inicial que após sete dias de trabalho consecutivo o Autor Recorrente gozava um período de vinte e quatro horas de descanso, o que foi confirmado pela testemunha ouvida em audiência de discussão e julgamento e ainda conforme consta da fundamentação na resposta dada à matéria de facto.
XVI. Assim, se o Recorrente gozou efectivamente de um dia de dispensa ao trabalho em cada oitavo dia, o cômputo efectuado a final pelo douto Tribunal a quo de compensar o Recorrente pelo trabalho prestado ao sétimo dia de trabalho consecutivo entre 01/10/2011 e 31/08/2018, não poderia ter sido calculado de modo diferente.
XVII. No que respeita às compensações pelos dias de descanso semanal, com a entrada em vigor em 01/01/2009 da Lei nº. 7/2008, o legislador deixou de exigir o gozo consecutivo do descanso semanal por cada quatro semanas, conforme se prevê no nº 2 do art.º 42º da Lei nº 7/2008, isto é: «O gozo do período de descanso pode não ter frequência semanal em caso de acordo entre as partes ou quando a natureza da actividade da empresa o torne inviável, casos em que o trabalhador tem direito a gozar um período de descanso remunerado de quatro dias por cada quatro semanas.».
XVIII. Sendo que, dispõe o art.º 43º, n.ºs 1, 2 e 4 do mesmo diploma: «1. O empregador pode determinar que o trabalhador preste trabalho em dia de descanso, independentemente do seu consentimento, quando: (...) 3) Quando a prestação do trabalho seja indispensável para garantir a continuidade do funcionamento da empresa. 2. A prestação de trabalho nos termos do número anterior confere ao trabalhador o direito a gozar um dia de descanso compensatório, fixado pelo empregador, dentro dos trinta dias seguintes ao da prestação de trabalho e o direito a: 1) Auferir um acréscimo de um dia de remuneração de base ou gozar, dentro de trinta dias, um dia de descanso compensatório para os trabalhadores que auferem uma remuneração mensal; 4. Caso não goze o dia de descanso compensatório previsto no número anterior, o trabalhador tem direito a: 1) Auferir um acréscimo de um dia de remuneração de base, para os trabalhadores que auferem uma remuneração mensal».
XIX. No caso dos autos e como supra se referiu, a lei admite a concessão do descanso em cada oitavo dia como descanso semanal nos termos do nº 2 do art.º 42º da lei nº 7/2008.
XX. Ora, conforme o alegado pelo Recorrente nos artigos 46º e 47º da Contestação, e como supra se referiu, por razões associadas às exigências do funcionamento da respectiva empresa, bem como, em função da natureza do sector de actividade da ora Recorrida - Casino - que é de laboração contínua, poderá o empregador ter a necessidade de fixar e atribuir esses dias de descanso semanal não ao sétimo dia, mas num outro dia do mês.
XXI. E o mesmo se diga relativamente à compensação adicional referente ao descanso compensatório pelo trabalho prestado entre 01/10/2011 e 31/08/2018, também não tem razão o ora Recorrente.
XXII. Conforme foi já decidido em processos em tudo idênticos ao dos presentes autos, com a entrada em vigor da lei nº 7/2008, o legislador deixou de exigir o gozo consecutivo do descanso semanal por cada quatro semanas.
XXIII. Nos presentes autos, uma vez que a lei nº 7/2008 permite que o descanso semanal possa ocorrer em cada oitavo dia nos termos do art.º 42º, n. 2º da lei n.º 7/2008, o Autor apenas terá direito a receber um acréscimo de um dia de remuneração de base mais um outro dia de remuneração de base a título de compensações pelo dia de descanso compensatório não gozado.
XXIV. É que o Recorrente já gozou de um dia de dispensa remunerado em cada oitavo dia, após a prestação de sete dias de trabalho consecutivo, conforme resulta do alegado pelo Autor na sua petição inicial.
XXV. Nesta medida, verificando-se no caso sub judice uma das situações previstas no n.º 2 do artigo 42º e no artigo 43º da Lei n.º 7/2008 e resultando da matéria de facto dado como provada que o Recorrente descansou ao 8º dia, bem andou o douto Tribunal a quo ao atribuir ao Recorrente de uma compensação de MOP$21,975.00.
Foram colhidos os vistos.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO
1. Factos
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
- Desde 01/10/2011 até 31/08/2018 o Autor esteve ao serviço da Ré (B), prestando funções de "guarda de segurança", enquanto trabalhador não residente. (A)
- Entre 01/10/2011 a 31/07/2012, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n. 06743/IMO/GRH/2011 (Cfr. fls. 19, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (B)
- Entre 01/08/2012 a 31/07/2013, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n. 11206/IMO/GRH/2012 (Cfr. fls. 20, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (C)
- Entre 01/08/2013 a 20/07/2014, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n. 14932/IMO/GRH/2013 (Cfr. fls. 21, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (D)
- Entre 21/07/2014 a 20/07/2015, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n. 16331/IMO/GRH/2014 (Cfr. fls. 22, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (E)
- Entre 21/07/2015 a 20/07/2016, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n. 21493/IMO/GRH/2015. (F)
- Entre 21/07/2016 a 20/07/2017, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n 20355/IMO/GRH/2016. (G)
- Entre 21/07/2017 a 20/07/2018, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n. 15014/IMO/DSAL/2017. (H)
- Entre 21/07/2018 a 31/08/2018, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.° 13336/IMO/DSAL/2018. (I)
- E entre 01/10/2011 a 20/07/2015 a Ré (B) pagou ao Autor a quantia de MOP$7,500,00, a título de salário de base mensal. (J)
- O Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela Ré. (1º)
- Era a Ré quem fixava o local e o horário de trabalho do Autor, de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades. (2º)
- Durante todo o período de trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e instruções da Ré. (3º)
- Entre 01/10/2011 e 31/08/2018, o Autor prestou trabalho diariamente, sem prejuízo de 24 dias de férias anuais por cada ano civil e dispensas de trabalho não remuneradas, nomeadamente entre 08/10/2013 e 31/10/2013 (24 dias), entre 14/10/2014 e 01/11/2014 (19 dias), entre 13/10/2015 e 10/11/2015 (29 dias), entre 22/10/2016 e 15/11/2016 (25 dias) e entre 18/04/2017 e 11/05/2017 (24 dias), bem como um dia de descanso no oitavo dia após cada sete dias de trabalho consecutivos durante ao serviço da Ré. (4° e 5º)
- Entre 21/07/2015 a 31/08/2018, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$7.875,00, a título de salário de base mensal. (6° e 7º)
- Desde o início da relação de trabalho até 31/08/2018, por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (8) Durante o referido período de tempo, tinha lugar um briefing (leia-se, uma reunião) entre o Team Leader (leia-se, Chefe de turno) e os "guardas de segurança", na qual eram inspeccionados os uniformes de cada um dos guardas e distribuído o trabalho para o referido turno, mediante a indicação do seu concreto posto dentro do Casino. (9º)
- Entre 01/10/2011 a 31/08/2018, o Autor compareceu ao serviço da Ré (B) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos, sem prejuízo da resposta aos quesitos 4° e 5°. (10°)
- A Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno. (11°)
- A Ré (B) nunca conferiu ao Autor o gozo de um descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado. (12°)
- Desde 01/10/2011 a 31/08/2018, o Autor prestou a sua actividade segurança para a Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (13°)
- A que se seguia um período de vinte e quatro horas de não trabalho, em regra, no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (14°)
- Entre 01/10/2011 e 31/08/2018, a Ré (B) não fixou ao Autor em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da resposta aos quesitos 4° e 5°. (15°)
- Entre 01/10/2011 a 31/08/2018- descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau a Ré (B) nunca solicitou ao Autor autorização para que o período de descanso não tivesse uma frequência semanal. (16º)
- Entre 01/10/2011 e 31/08/2018 a Ré (B) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia extra pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (17º)
- Entre 01/10/2011 a 31/08/2018 a Ré (B) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia pelo trabalho dia de descanso compensatório não gozado. (18)
- Por razões associadas às exigências do funcionamento da respectiva empresa, bem assim, em função da natureza do sector de actividade da Ré- Casino - que é de laboração contínua. (19)
2. Do Direito
O objecto do presente recurso versa sobre o cálculo da indemnização devida pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal não gozados e do trabalho extraordinário relativo ao período de 01.10.2011 a 31.08.2018.
Vejamos então.
Sobre esta questão na decisão recorrida diz-se o seguinte:
«(…)
Sobre os direitos e obrigações envolvidos na relação de trabalho antes da data de 31/12/2008, aplica-se por analogia o DL nº 24/89/M, em relação aos direitos e obrigações da relação de trabalho posterior a essa data aplica-se por analogia o artº 20º da Lei nº 21/2009 e da Lei nº 7/2008.
Quanto à remuneração do trabalho extraordinário, nos termos do artº 33º, nºs 1 e 5 da Lei nº 7/2008, em conjugação com a jurisprudência de Macau, a duração de trinta minutos por dia destinados à preparação para o início do trabalho e à conclusão de serviços não acabados, esse tempo aplica-se apenas em situação casual e não como organização de rotina para prolongar o horário normal do trabalho, nos termos do artº 37º, nº 1, o cálculo é de 1.5 da remuneração normal do trabalho prestado.
No processo em apreço, o Autor dentro do horário normal de trabalho foi organizado a comparecer 30 minutos de antecedência, esta forma de procedimento trata-se de situação de prolongamento do horário de trabalho, portanto os 30 minutos devem considerar trabalho extraordinário, que por sua vez o Autor tem o direito de receber a remuneração do trabalho extraordinário calculada em 1.5. Porém, como não surgiu a situação prevista nos artºs 36º, nº 2 e 38º da Lei nº 7/2008, pelo que a Ré não necessita de conceder descanso compensatório face às horas extraordinárias prestadas pelo Autor.
Relativamente à imputação da Ré de não ter cumprido a situação de um compensação de um dia de descanso em cada sete dias prevista nos artºs 42º, nº 2 e 43º, nº s 1, 2 e 4 da Lei nº 7/2008, o legislador excluiu o gozo consecutivo de 4 dias de descanso semanal, bem como, do mesmo modo estipulou que o trabalhador que preste trabalho em dia de descanso semanal, para além de receber a remuneração original, tem ainda direito de receber o dobro da remuneração e um dia de descanso compensatório que pode converter em dinheiro.
Neste caso, em cada oito dias de trabalho prestado pelo Autor é que tinha um dia de descanso, este procedimento é considerado gozo efectivo de descanso semanal, pelo que a Ré só necessita de calcular a diferença entre os dias de descanso semanal a que o Autor devia gozar (cada 7 dias, um dia de descanso) e que efectivamente gozou (cada 8 dias, um dia de descanso) para lhe compensar os dias de descanso semanal e as férias.
(…)».
Quanto ao período a partir de 01.10.2011, verifica-se que contrariamente ao que estipula o artº 42º da Lei nº 7/2008 a Ré B não fixou ao Autor um período de descanso de 24 horas em cada semana (ou período de 7 dias).
O Autor trabalhava consecutivamente durante 7 dias e descansava ao 8º dia, conforme resulta da matéria de facto assente.
Relativamente a esta matéria tem «Este TSI tem entendido de forma unânime, que o trabalho prestado no sétimo após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho em cada semana deve ser qualificado como trabalho prestado no dia do descanso semanal, não obstante o Autor ter gozado um dia de descanso ao oitavo dia.
A razão de ser consiste em “o trabalhador não pode prestar mais do que seis dias de trabalho consecutivos, devendo o dia de descanso ter lugar, no máximo, no sétimo dia, e não no oitavo, nono ou noutro dia do mês, salvo acordo das partes em sentido contrário, no que toca ao momento de descanso a título de “compensação”, mas o critério para este efeito é sempre o período de sete dias como uma unidade” (cfr. Ac. do TSI, Proc. nº 89/2020, de 16/04/2020).
Assim, o descanso remunerado do trabalhador no oitavo dia não pode ser qualificado como descanso semanal sem acordo das partes ou quando a natureza da actividade da empresa não torne inviável o gozo no sétimo dia, antes deve ser qualificado como dia de descanso compensatório pelo trabalho prestado no dia de descanso semanal a que se alude o nº 2 do artº 43º da Lei nº 7/2008.
Tem o Autor já gozado os dias de descanso compensatório a que se alude o nº 2 do artº 43º da Lei nº 7/2008, só fica por pagar-lhe o acréscimo de uma remuneração de base correspondente aos (…) dias de trabalho prestado no descanso semanal.» - cfr. Ac. do TSI, Proc. nº 83/2021, de 29.04.2021.
Pelo que, de acordo com o que tem vindo a ser o entendimento deste TSI, e tendo em consideração a matéria de facto apurada, tendo o Autor já gozado o dia de descanso compensatório a que teria direito (o descanso ao 8º dia), pelo trabalho prestado ao 7º dia tem este direito a receber apenas o acréscimo da remuneração correspondente a um dia de trabalho nos seguintes valores:
- Entre 01.10.2011 e 20.07.2015 por (1311/7) 187 dias de trabalho ao 7º dia, tem a receber MOP46.750,00 (MOP7.500,00/30x187);
- Entre 21.07.2015 e 31.08.2018 por (1044/7) 149 dias de trabalho ao 7º dia, tem a receber MOP39.112,50 (MOP7.875,00/30x149);
Tudo no valor global de MOP85.862,50.
Cálculo da indemnização devida pelo trabalho extraordinário.
Vem também interposto recurso da sentença recorrida porquanto na indemnização em que a Ré B foi condenada pelo trabalho extraordinário prestado não foi considerado o direito ao descanso compensatório consagrado.
Relativamente a esta matéria alegava o Autor na p.i. – e agora em sede de recurso – que tendo sido prestado trabalho extraordinário para além do direito à remuneração do mesmo, tem ainda o trabalhador direito a descanso compensatório nos termos do artº 38º da Lei nº 7/2008.
É a seguinte a redacção do preceito em causa:
Artigo 38.º
Descanso compensatório
1. Nas situações previstas nas alíneas 1) e 2) do n.º 2 do artigo 36.º, o trabalhador tem direito a gozar um descanso adicional, remunerado nos termos gerais, com uma duração:
1) Não inferior a vinte e quatro horas, se o período de trabalho atingir o respectivo limite diário máximo;
2) Proporcional ao período de trabalho prestado, se o período de trabalho não atingir o respectivo limite diário máximo.
2. O disposto no número anterior aplica-se à situação prevista na alínea 3) do n.º 2 do artigo 36.º se o trabalhador prestar trabalho extraordinário durante dois dias consecutivos.
3. O direito ao descanso compensatório é gozado nos quinze dias seguintes ao da prestação do trabalho extraordinário, em dia escolhido pelo trabalhador, com a concordância do empregador.
4. Na falta de acordo entre trabalhador e empregador quanto ao dia em que o descanso compensatório deve ser gozado, o mesmo é fixado pelo empregador.
Os nºs 1) e 2) do nº 2 do artº 36º estipulam que:
«2. O empregador pode determinar que o trabalhador preste trabalho extraordinário, independentemente do seu consentimento, quando:
1) Se verifiquem casos de força maior, caso em que o período de trabalho diário não pode exceder dezasseis horas;
2) O empregador esteja na iminência de prejuízos importantes, caso em que o período de trabalho diário não pode exceder dezasseis horas;»
No caso em apreço não se alega, nem se demonstra que o trabalho extraordinário prestado o haja sido por alguma daquelas razões, pelo que, bem se andou na decisão recorrida ao não conceder compensação alguma a este título uma vez que o Autor não tinha direito ao descanso compensatório.
III. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos:
- Concede-se parcialmente provimento ao recurso interposto pelo Autor, quanto à condenação da Ré revogando a sentença recorrida na parte respeitante à compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e em consequência condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP85.862,50 a título de descanso semanal acrescida dos juros moratórios fixados nos termos daquela decisão a qual em tudo o mais se mantém, negando-se provimento ao recurso no remanescente.
Custas pelo Autor e Ré na proporção do decaimento.
Registe e Notifique.
RAEM, 17 de Fevereiro de 2022
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
Lai Kin Hong
Fong Man Chong
867/2021 CÍVEL 20