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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------------
--- Data: 03/03/2022 --------------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Chan Kuong Seng --------------------------------------------------------------------------

Processo n.º 146/2022
(Autos de recurso penal)
Recorrente): A, Limitada
(A有限公司)




DECISÃO SUMÁRIA NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA
1. Inconformada com a sentença condenatória proferida a fls. 216 a 222 do Processo de Contravenção Laboral n.o LB1-21-0062-LCT do Juízo Laboral do Tribunal Judicial de Base, veio a arguida sociedade comercial denominada A, Limitada recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), alegando, no essencial, na sua motivação apresentada em original a fls. 253 a 256 dos autos, que tal decisão padecia do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (porquanto esse Tribunal não deveria ter dado por provado que a remuneração-base do trabalhador dos autos era de MOP20.000,00), e que fosse como fosse constando no clausulado do contrato de trabalho então assinado pela ora recorrente e o mesmo trabalhador a convenção das partes no sentido de a compensação pecuniária da prestação do trabalho extraordinário estar abrangida no salário-base mensal, já não deveria fazer questão a falta de compensação pecuniária de trabalho extraordiário, termos pelos quais deveria o montante da remuneração-base desse trabalhador passar a ser considerada como sendo de MOP10.000,00, com novo cálculo, com base neste montante, da compensação pecuniária do trabalho extraordinário então prestado pelo mesmo, se se entendesse dever haver essa compensação.
Ao recurso, respondeu a Digna Delegada do Procurador a fls. 273 a 276v dos presentes autos correspondentes, no sentido de improcedência do recurso.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta, em sede de vista, parecer a fls. 285 a 287 dos autos, opinando também pela improcedência do recurso.
Cumpre rejeitar o recurso, nos termos permitidos pelos art.os 407.o, n.o 6, alínea b), e 410.o, n.o 1, do Código de Processo Penal (CPP), dada a manifesta improcedência do mesmo.
2. Do exame dos autos, sabe-se que a sentença ora recorrida ficou proferida a fls. 216 a 222, cuja fundamentação fáctica e probatória se dá por aqui integralmente reproduzida.
3. De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao ente decisor do recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesse enquadramento, conhecendo:
Embora a recorrente tenha assacado à decisão condenatória ora recorrida o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada aludido na alínea a) do n.o 2 do art.o 400.o do CPP, a argumentação concretamente tecida na sua motivação do recurso tem a ver propriamente com a questão de falta ou insuficiência da prova, razões por que há que decidir do recurso através da indagação da existência, ou não, do vício de erro notório na apreciação da prova.
Sempre se diz que há este vício, referido na alínea c) do n.o 2 do art.o 400.o do CPP, quando o tribunal sentenciador, de forma patente, tiver violado normas jurídicas sobre o valor legal da prova, ou violado regras da experiência da vida humana em normalidade de situações, ou ainda violado as leges artis a observar no julgamento da matéria de facto.
A propósito da temática da apreciação da prova, é de relembrar, desde já, os seguintes preciosos ensinamentos veiculados no MANUAL DE PROCESSO CIVIL (2.ª Edição, Revista e Actualizada, Coimbra Editora, 1985, páginas 470 a 472), de autoria de ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO E NORA:
– < […]
Há, todavia, algumas excepções ao princípio da livre apreciação da prova, que constituem como que justificados resíduos do sistema da prova legal.
[…]
Mas convém desde já conhecer os diferentes graus de convicção do julgador criados pelos meios de prova e precisar o seu alcance prático.
Quando qualquer meio de prova, não dotado de força probatória especial atribuída por lei, crie no espírito do julgador a convicção da existência de um facto, diz-se que foi feita prova bastante – ou que há prova suficiente – desse facto.
Se, porém, a esse meio de prova um outro sobrevier que crie no espírito do julgador a dúvida sobre a existência do facto, a prova deste facto desapareceu, como que se desfez. Nesse sentido se afirma que a prova bastante cede perante simples contraprova, ou seja, em face do elemento probatório que, sem convencer o julgador do facto oposto (da inexistência do facto), cria no seu espírito a dúvida séria sobre a existência do facto.
Assim, se a parte onerada com a prova de um facto conseguir, através de testemunhas, de peritos ou de qualquer outro meio de prova, persuadir o julgador da existência do facto, ela preencheu o ónus que sobre si recaía. Porém, se a parte contrária (ou o próprio tribunal) trouxer ao processo qualquer outro elemento probatório de sinal oposto, que deixe o juiz na dúvida sobre a existência do facto, dir-se-á que ele fez contraprova; e mais se não exigirá para destruir a prova bastante realizada pelo onerado, para neutralizá-la […]>>.
No caso concreto dos autos, após vistos, em global e de modo crítico, os elementos probabórios referidos na fundamentação probatória da decisão recorrida, não se vislumbra que seja manifestamente desrazoável o resultado do julgamento da matéria de facto feito pelo Tribunal recorrido, pelo que é de respeitar o julgado desse Tribunal sentenciador, o qual, aliás, já explicou congruente e convincentemente, sobretudo no terceiro parágrafo da página 13 do texto da sua sentença (a fl. 218 dos autos), as razões de dar por provado que a remuneração-base do trabalhador ofendido era de MOP20.000,00.
E ante toda a matéria de facto dada por provada com prova suficiente na sentença, tem que decair também a subsidiarianente invocada tese de (à luz do convencionado no clausulado do contrato de trabalho) desnecessidade de pagamento de trabalho extraordinário.
Do acima exposto, deve ser efectivamente calculada a compensação pecuniária do trabalho extraordinário com base no valor da remuneração-base mensal de MOP20.000,00 (e não no valor, preconizado pela recorrente, de MOP10.000,00).
É, pois, evidentemente infundado o recurso, sem mais indagação por desnecessária, até também pelo espírito da norma do n.o 2 do art.o 410.o do CPP.
4. Dest’arte, decide-se em rejeitar o recurso, por manifestamente improcedente.
Custas do recurso tudo a cargo da recorrente, com duas UC de taxa de justiça e quatro UC de sanção pecuniária (pela rejeição do recurso), entrando também na regra das custas a quantia de honorários fixada em duas mil patacas no despacho judicial de fl. 258 a favor da Ex.ma Defensora Oficiosa de então da recorrente (pelo trabalho desta na feitura e apresentação da motivação do recurso).
Após o trânsito em julgado, comunique o resultado da decisão do recurso ao trabalhador ofendido.
Macau, 3 de Março de 2022.
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Chan Kuong Seng
(Relator)



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