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Processo nº 797/2021
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 24 de Fevereiro de 2022
Recorrente: A (Recurso Interlocutório e Recurso Final)
Recorrida: B, S.A.
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO
  
  A, com os demais sinais dos autos,
  vem instaurar acção declarativa em processo comum do trabalho contra
  B, S.A., também, com os demais sinais dos autos
  Pedindo a condenação desta a pagar-lhe as quantias de
a) MOP6.180,00, a título de subsídio de efectividade, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento relativo ao período de 04/02/2010 a 31/07/2010;
b) MOP4.635,00, a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento relativo ao período de 04/02/2010 a 31/07/2010;
c) MOP73.314,00, a título de trabalho extraordinário prestado, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento relativo ao período de 04/02/2010 a 31/12/2019;
d) MOP48.876,00, a título de descanso compensatório não gozado, entre, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento relativo ao período de 04/02/2010 a 31/12/2019;
e) MOP127.889,50, pela prestação de trabalho ao sétimo dia em cada período de sete dias de trabalho consecutivo acrescida de juros até efectivo e integral pagamento relativo ao período de 04/02/2010 a 31/12/2019;
f) MOP127.889,50, a título de descanso compensatório não gozado, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal, relativo ao período de 04/02/2010 a 31/12/2019;
  Após a prolacção do despacho saneador veio o Autor a fls. 231 a 242 requerer o aumento do pedido em consequência de em face dos documentos juntos pela Ré ter concluído que o salário que lhe foi pago por esta Ré é superior ao por si invocado.
  Em sede de audiência de discussão e julgamento foi aquele aumento do pedido indeferido.
  Não se conformando com aquele despacho veio o Autor interpor recurso do mesmo apresentando as seguintes conclusões:
1. Versa o presente recurso sobre o Despacho proferido pelo em sede audiência de discussão e julgamento na parte em que foi indeferido o aumento de pedido formulado pelo Autor na sequência da junção pela Ré dos documentos que o Autor havia solicitado e relativos aos salários e demais compensações que o mesmo auferiu da Ré durante a relação de trabalho com a Ré.
Mais detalhadamente.
2. Entendeu o Tribunal a quo indeferir o aumento de pedido formulado pelo Autor por entender que o valor da remuneração se tratava de um facto pessoal que o Autor não poderia desconhecer;
3. Porém, contrariamente ao pressuposto pelo Tribunal a quo, o Autor não detinha na altura da feitura da petição inicial conhecimento “integral” dos montantes que formavam a sua “remuneração de base”, nem tinha, igualmente, obrigação de os conhecer em pormenor;
4. Ou melhor, aquando da proposição da Acção em juízo o Autor não dispunha na sua posse os “registos de dados” (leia-se, os recibos de salário) cuja junção oportunamente requereu e que, posteriormente, foram juntos pela Ré;
Depois,
5. Conforme é facilmente perceptível, acaso o Autor tivesse na sua posse os “registos de dados” relativos ao valor dos salários de base e demais remunerações por si auferidas ao longo da relação de trabalho com a Ré, o Autor não teria solicitado à Ré (nem ao Tribunal) a junção dos mesmos registos;
6. De onde se conclui que, apenas porque o Autor não dispunha dos referidos “registos de dados” os mesmos foram solicitados e, uma vez juntos pela Ré, o Autor ficou em condições de “completar” os pedidos por si formulados em sede de Petição Inicial.
Acresce que,
7. Conforme resulta dos documentos juntos pela Ré, a “remuneração de base” do Autor é composta por salário de base (base salary), subsídio mensal (monthly allowance) e subsídio de alojamento (housing allowance), tratando-se de montantes que variam mensalmente;
8. Porém, o Autor desconhecia, em concreto, o valor das demais “prestações periódicas” pagas pela Ré mensalmente ao Autor e sem as quais o Autor não estaria em condições de reclamar da Ré a totalidade das quantias que lhe são devidas, v.g., a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, ou pela falta de gozo de dia de descanso compensatório.
9. De onde, apenas depois de a Ré ter junto aos autos a informação solicitada (e após ter sido judicialmente ordenada a fazê-lo) tomou-se possível ao Autor reformular os valores anteriormente pedidos em sede de Petição Inicial, tendo por base as quantias remuneratórias efectivamente pagas pela Ré ao longo do decorrer da relação de trabalho;
Sem prescindir,
10. No aumento formulado, o Autor limitou-se a aditar ao valor do salário de base as demais “prestações periódicas” que igualmente formam a chamada remuneração de base, maxime o subsídio de alojamento (“housing allowance”) e o subsídio mensal (“monthly allowance”), mantendo inalterado tudo o que havia alegado em sede de Petição Inicial quanto ao número de dias de trabalho prestado ou quanto ao número de dias em que foi dispensado do trabalho;
11. Tudo somado, tratou-se apenas e tão-só de uma alteração quantitativa do montante anteriormente reclamado em sede de Petição Inicial e, como tal, de um simples desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo, em qualquer dos casos “virtualmente” contido no pedido inicial e com origem na mesma causa de pedir (em concreto, no contrato de trabalho), contrariamente ao que terá sido o entendimento do Tribunal a quo;
12. De onde, ao invés do concluído pelo Tribunal Judicial de Base, não se trata da formulação de novos pedidos, nem de pedidos formulados com base “noutros títulos”, com referência a outras “relações jurídicas” e/ou com base em “novas e/ ou distintas causas de pedir”;
13. Pelo contrário, tratou-se do mero desenvolvimento do pedido primitivo, formulado antes do encerramento da discussão em primeira instância, razão pela qual não se vê razões para que o mesmo não tivesse sido aceite, o que desde já se requer;
14. Pelo exposto, salvo o devido respeito, tratando-se de um mero desenvolvimento do pedido primitivo, isto é, do pedido originariamente formulado em sede de Petição Inicial, não se vê razão para que o mesmo não tivesse sido admitido, nos termos do n.º 2 do art. 217.º do CPC, ex vi art. 1.º do CPT;
15. A não entender assim, deve ser julgado nulo e de nenhum efeito o douto Despacho, na parte em que indefere o aumento do pedido oportunamente formulado, porque injustificado e carecido de fundamento legal.
  Contra-alegando veio a Ré apresentar as seguintes conclusões:
I. Veio o Recorrente no Recurso a que ora se responde insurgir-se contra o douto Despacho proferido em sede de audiência de discussão e julgamento realizada no dia 19/04/2021, em que foi indeferido o aumento do pedido apresentado pelo Autor em 15/04/2021, na sequência dos documentos que foram juntos aos autos pela Ré, em 27/01/2021, relativos aos salários e demais compensações que o Autor auferiu durante a relação de trabalho com a Ré, por considerar o sobredito Despacho de indeferimento injustificado e carecido de fundamento legal, motivo pelo qual no entendimento do Autor deverá ser julgado nulo e de nenhum efeito.
II. Com mui devido respeito, nada há nada a apontar ao Despacho Recorrido.
III. Em 15/04/2021, veio o Autor requerer a ampliação do pedido em mais MOP125,331.39, referente ao quantum indemnizatório peticionado a título do trabalho extraordinário prestado; descanso compensatório não gozado; pela prestação de trabalho ao sétimo dia em cada período de sete dias de trabalho consecutivo; e descanso compensatório não gozado em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal, no período compreendido entre 01/02/2010 a 31/12/2019, o que fez ao abrigo do disposto nos artigos 16.º do CPT e 217.º do CPC.
IV. O Autor veio sustentar a referida ampliação nos documentos n.ºs 6 a 124 juntos pela Ré, que alegadamente provam que o Autor, ao longo da sua relação laboral, auferiu montantes salariais diferentes, superiores, aos por si indicados na petição inicial, reformulando, assim, o anteriormente alegado nos artigos 26.º e seguintes da Petição Inicial, isto é, reformulando as quantias peticionadas a título de trabalho extraordinário, descanso semanal e compensatório.
V. O Autor mais não faz do que alterar os factos alegados na petição inicial, os factos essenciais das suas pretensões.
VI. O Autor está a alterar os factos essenciais e concretizadores do direito que invoca, do seu pedido, alterando o pedido anteriormente formulado por forma a ampliar o valor inicialmente peticionado, o que nos termos do disposto no artigo 217.º, n.º 1, do CPC, apenas poderá ser feito na réplica, ou mais precisamente na “resposta” a que se refere o artigo 33.º do CPT, porquanto estamos no âmbito de um processo de trabalho.
VII. Sendo este aumento do pedido acompanhado de uma alteração dos factos essenciais alegados no petitório - revestindo-se, por isso, numa nova versão dos factos -, este aumento do pedido não é, obviamente, um desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.
VIII. A ampliação do pedido requerida pelo Autor sustenta-se e é baseada em factos diferentes dos factos invocados na petição inicial, pelo que esta ampliação apenas poderia ter sido requerida e admitida na réplica, rectius na “resposta” a que se refere o artigo 33.º do CPT.
IX. Por conseguinte, bem andou o Tribunal a quo ao ter indeferido a ampliação do pedido na audiência de discussão e julgamento.
X. Acresce que, os documentos n.ºs 6 a 124 juntos pela Ré, que são “payslips” do Autor emitidos pela sua entidade patronal, a Ré, e que se reportam ao período entre 1 de Fevereiro de 2010 a 31 de Dezembro de 2019, não encerram factos que ocorreram posteriormente à data da entrada em juízo da petição inicial do Autor.
XI. Bem pelo contrário, os factos relativos ao não gozo dos dias de descanso compensatório, ou relativos ao trabalho extraordinário prestado, já constavam da petição inicial e já se encontravam quesitados.
XII. De igual modo, o Autor não apresenta um novo pedido, apenas uma alteração do anterior formulado no sentido de ampliar o valor inicialmente peticionado.
XIII. Nesta conformidade, o aumento do pedido também não poderia ser admitido ao abrigo do disposto no artigo 16.º do CPT, que não tem aplicação ao presente caso.
XIV. Vem, ainda, o Autor justificar esta alteração do pedido alegando que aquando da feitura da petição inicial, apenas tinha conhecimento dos valores do seu salário de base e do salário mínimo, desconhecendo o valor das demais quantias por si auferidas e que lhe eram pagas mensalmente pela Ré, não tendo sequer a obrigação de conhecer em pormenor os valores que por si eram auferidos, pelo que, só depois da Ré ter junto aos autos cópias dos recibos de salário relativos ao Autor, é que este ficou a conhecer as demais quantias que lhe foram pagas pela Ré e que auferia.
XV. Salvo o devido respeito, não corresponde à verdade o alegado pelo Autor, porquanto o Autor tinha conhecimento integral de todas as quantias que lhe eram pagas pela Ré.
XVI. Aliás, se o Autor alega que não desconhecia o valor do seu salário de base, bastava consultar a caderneta bancária da respectiva conta bancária onde foram depositadas estas quantias, para que pudesse ter o conhecimento do valor excedente que lhe foi pago pela Ré para além do seu salário de base.
XVII. Assim, bem andou o Tribunal a quo por ter considerado o valor da remuneração como um facto pessoal que o Autor não poderia desconhecer.
XVIII. Mais veio o Autor alegar que a sua “remuneração de base” é composta por salário de base (“base salary”), subsídio mensal (“monthly salary”) e subsídio de alojamento (“housing allowance”).
XIX. Salvo o devido respeito, também neste particular não pode a Ré concordar com o Autor, porquanto as quantias pagas pelo Autor a título de subsídio mensal (“monthly salary”) e subsídio de alojamento (“housing allowance”) não se enquadram na remuneração de base prevista nos termos e no disposto no artigo 59º da Lei n.º 7/2008.
XX. Conforme o previsto no artigo 26º da Lei n.º 21/2009 (Lei da Contratação de Trabalhadores Não Residentes), o direito ao alojamento é um direito especial do trabalhador não residente, podendo ser assegurado pelo empregador ou pela agência de emprego que tenha procedido ao recrutamento, e pode ser satisfeito em dinheiro.
XXI. Sendo certo que, para efeitos de pedido (inicial ou renovação) de autorização para a contratação de trabalhador não residente que é apresentado junto da Direcção dos Serviços para os Assuntos laborais, o montante de subsídio de alojamento pago pelo empregador para assegurar o direito ao alojamento do trabalhador não residente, não é considerado como remuneração de base mensal do trabalhador.
XXII. Pelo que, ao contrário do entendimento do Autor, o subsídio de alojamento ou “housing allowance” não faz parte da sua remuneração de base.
XXIII. E não fazendo parte da “remuneração de base” não podem as quantias pagas pela Ré ao Autor a título de subsídio mensal e subsídio de alojamento serem tidas em consideração para efeitos de apuramento das quantias alegadamente devidas ao Autor a título de trabalho extraordinário, descanso semanal e descanso compensatório.
XXIV. Face a todo o supra exposto, o Recorrente não tem razão no recurso que apresenta, devendo o mesmo ser considerado totalmente improcedente.
*
  Proferida sentença, foi a Ré B condenada a pagar ao Autor a quantia global de MOP111.944,35, sendo MOP5.000,00 a título de subsídio de efectividade; MOP3.862,50 a título de subsídio de alojamento; MOP71.558,52 a título de trabalho extraordinário prestado, relativo ao período de 04.02.2010 a 31.12.2019 e MOP31.523,33 a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e de descanso compensatório, relativo ao período de 04.02.2010 a 31.12.2019, acrescida juros de mora à taxa legal contados conforme fixado no acórdão de uniformização de jurisprudência n.° 69/2010 e absolve-se a Ré dos restantes pedidos.
  Não se conformando com a sentença veio o Autor interpor recurso da mesma apresentando as seguintes conclusões:
1. Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação da Ré (B) na compensação devida ao Autor, ora Recorrente, pelo trabalho prestado durante 30 minutos para além do período normal de trabalho e pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho) à luz da Lei n.º 7/2008;
2. In casu, impõe-se apreciar a interpretação que o Tribunal a quo levou a cabo a respeito dos art. 38.º e n.º 2 do art. 42.º da Lei n.º 7/2008, e que conduziu à condenação da Ré (B) numa quantia muito inferior à reclamada pelo Autor em sede de Petição Inicial;
Mais detalhadamente.
3. Resulta da matéria de facto provada que:
- Desde o início da relação de trabalho até 31/12/2019, por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno (13.º);
- Entre 04/02/2010 a 31/12/2019, o Autor compareceu ao serviço da Ré (B) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, tendo permanecido às ordens e instruções dos seus superiores hierárquicos (...) (4.º, 5.º e 9.º (15.º);
- A Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno (16.º);
- A Ré (B) nunca conferiu ao Autor o gozo de um descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado (17.º).
4. Não obstante a referida factualidade assente, entendeu o Tribunal a quo não ter aplicação o disposto no art. 38.º da Lei n.º 7/2008, porquanto a situação dos autos não se poder subsumir em qualquer das suas previsões normativas. Sem razão, porém, está o ora Recorrente em crer;
5. Com efeito, resulta da matéria de facto que o Autor não era livre de comparecer, ou não, durante o referido período que antecedia o início de cada turno. Estava obrigado a fazê-lo porque assim lhe era imposto pela Ré (B) e com carácter de regularidade, convertendo uma situação que a Lei quis como excepcional num regime regra e sem que exista um qualquer registo a comprovar a voluntariedade e/ou consentimento do ora Recorrente;
6. por outro lado, ficou provado que a Ré (B) nunca conferiu ao Autor o gozo de um período de descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado;
7. A este concreto respeito, na falta de voluntariedade, será sempre de aplicar a solução constante do n.º 1 e/ ou do n.º 2 do art. 38.º da Lei n.º 7/2008, razão pela qual deve a Ré (B) ser condenada a pagar ao Autor a quantia de MOP$47,741.90, a título de descanso compensatório, em consequência do trabalho extraordinário prestado, correspondente ao seguinte:
- Entre 04/02/2010 até 20/07/2015 - MOP$7,500/(30 dias X 8 horas) X 0.5 hora X 1613 dias =Mop$25,243.50;
- Entre 21/07/2015 até 31/03/2019 - MOP$7,875/(30 dias X 8 horas) X 0.5 hora X 1071 dias = Mop$17,564.40;
- Entre 01/04/2019 até 31/10/2019 - MOP$10,000/ (30 dias X 8 horas) X 0.5 hora X 175 dias = Mop$3,648.80;
- Entre 01/11/2019 até 31/12/2019 - MOP$12,100/ (30 dias X 8 horas) X 0.5 hora X 51 dias = 1,285.20;
8. Ao não entender assim, está o Recorrente em crer ter existido uma errada aplicação da norma em questão (leia-se, do art. 38.º da Lei n.º 7/2008) pelo Tribunal a quo, o que em caso algum poderá deixar de conduzir, nesta parte, à nulidade da decisão recorrida, o que desde já e para os legais e devidos efeitos se invoca e requer.
Acresce que,
9. Resulta da matéria de facto: Desde 04/02/2010 a 31/12/2019, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos (18.º);
10. Não obstante a referida matéria de fado provada, com vista a apurar o valor que o Autor tinha a receber relativamente ao trabalho prestado em dia de descanso semanal, o tribunal a quo seguiu o seguinte raciocínio: dividiu o número dos dias de trabalho prestados pelo Autor e descontou os dias em que o Autor havia descansado ao 8.º dia, após a prestação de sete dias de trabalho consecutivos, apurando que o Autor terá direito a auferir a diferença entre os dois;
11. E a ser assim, salvo o devido respeito, está o ora Recorrente em crer existir um erro de julgamento traduzido, entre outro, no facto de se acreditar que a douta Decisão não ter factos para se poder chegar a tal resultado, nem os mesmos constavam da Base Instrutória;
12. Ou melhor, o que impunha apurar era os dias de trabalho em que o Autor prestou trabalho para a Ré em cada 7.º dia, após 6 dias consecutivos de trabalho e não apurar a diferença entre o trabalho prestado ao 7.º dia com os dias de não trabalho que o Autor gozou no 8.º dia após 7 dias de trabalho consecutivo, e consequentemente nada havia a descontar aquando do apuramento do montante indemnizatório, a tal respeito;
13. De onde, salvo melhor opinião, deve a Recorrida (B) ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$247,970,00, a título de falta de marcação e gozo de descanso semanal e de descanso compensatório - e não só de apenas Mop$31,523,33 conforme resulta da Sentença, correspondente ao seguinte:
- Entre 04/02/2010 até 20/07/2015 - MOP$7,500/30 dias X (1843dias/7dias) X 2 = Mop$131,500.00;
- Entre 21/07/2015 até 31/03/2019 - MOP$7,875/30 dias X (1223dias/7dias) = Mop$91,350.00;
- Entre 01/04/2019 até 31/10/2019 - MOP$10,000/30 dias X (199dias/7dias) = Mop$18,666.70;
- Entre 01/11/2019 até 31/12/2019 - MOP$12,100/30 dias X (58dias/7dias) = Mop$6,453.40.
14. Ao não entender assim, está o Recorrente em crer ter existido uma errada aplicação da norma em questão (leia-se, do art. 43.º da Lei n.º 7/2008) pelo Tribunal de Primeira Instância, o que em caso algum poderá deixar de conduzir, nesta parte, à nulidade da decisão recorrida, o que desde já e para os legais e devidos efeitos se invoca e requer;
15. Tudo sem prejuízo do Recurso interposto pelo Autor relativamente ao aumento de pedido formulado na sequência da junção pela Ré dos documentos relativos aos salários do Autor, por se tratar de um mero desenvolvimento do pedido primitivo.
  Contra-alegando veio a Ré apresentar as seguintes conclusões:
I. Veio o Autor, ora Recorrente, insurgir-se contra a decisão proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base na parte em que julgou parcialmente improcedente os pedidos deduzidos a título de descanso compensatório adicional referente aos 30 minutos para além do período normal de trabalho e a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho), por entender que a sobredita decisão enferma de erro de aplicação de Direito quanto à concreta forma de cálculo da sobredita compensação e, nessa medida, mostra-se em violação do preceituado dos artigos 38º e ainda do nº 2 do art.º 42º da Lei n.º 7/2008.
II. O Recorrente entende que, por essa razão, deve a douta Sentença Recorrida ser julgada nula e substituída por outra que decida em conformidade com a melhor interpretação dos referidos normativos
III. Com mui respeito, nada há apontar à Decisão Recorrida, onde é feita uma correcta interpretação e aplicação dos preceituados dos artigos 38º e nº 2 do art.º 42º da Lei nº 7/2008.
IV. Alega o Recorrente que o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto no n.º 1 do artigo 38.º da Lei n.º 7/2008, e ser condenada a pagar ao Autor o montante de MOP$47,741.90 pelo descanso compensatório adicional referente aos 30 minutos para além do período normal de trabalho.
V. Após analisar o artigo 38, n.º 1 da Lei n.º 7/2008, que menciona que as situações previstas no artigo 36º, n.º 2 das alíneas 1) e 2), não nos parece que o Recorrente tenha qualquer tipo de razão.
VI. Ficou demonstrado o briefing era usado para efeitos de transição de turnos, mormente, para que os colegas que se encontravam no final do turno pudessem entregar aos que iam começar um novo turno os instrumentos de trabalho, tais como o “walkie talkie.”
VII. O trabalhador não tem direito a qualquer período de descanso compensatório, sempre que o trabalho extraordinário seja prestado por solicitação prévia do empregador e obtido o consentimento do trabalhador.
VIII. Além disso, o trabalho antecipado de 30 minutos por dia, já foi considerado como trabalho extraordinário e a, ora Recorrida, condenada a pagar o montante de acordo com o calculo de 1.5 do salario por hora.
IX. O descanso compensatório adicional é somente atribuído em algumas situações que estão previstas do n.º 1 no artigo 38º da Lei n.º 7/2008, conforme o Autor pede na sua petição, nem sempre que se recebe horas extraordinárias tem direito a descanso compensatório adicional.
X. Assim não nos parece, existir as situações previstas no artigo 36º, n.º 2, alínea 1) e 2) e do artigo 38º, n.º 2 da Lei n.º 7/2008, logo a Ré não precisa de prestar a compensação adicional pelas horas extraordinárias do trabalho.
XI. Parece-nos que o Tribunal a quo entendeu bem ao não condenar a ora Recorrida no pagamento do descanso compensatório adicional, pelo que nesta parte o recurso terá necessariamente de improceder.
XII. Alega ainda o Recorrente que o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto no n.º 2 do artigo 42.º da lei n.º 7/2008 por ter condenado a Ré, ora Recorrida, a pagar ao Autor apenas a quantia de MOP$31,523.33 pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho) em vez do valor de MOP$247,970.00, uma vez que não resulta da Lei n.º 7/2008 que a concessão ao trabalhador de um dia de descanso ao 8º dia possa ser considerado como descanso semanal e não ficou provado, nem foi alegado pela Ré nos articulados, que a actividade desenvolvida pela Ré, por si só, torne inviável, o gozo pelo Autor do descanso semanal em cada período de sete dias.
XIII. Não assiste razão ao Recorrente pois nada há a apontar à decisão proferida nesta parte pelo douto Tribunal Judicial de Base.
XIV. Diga-se, desde logo que, quanto à actividade da empresa a mesma é pública e notória - é actividade de Casino e de laboração contínua -, ou seja, de vinte e quatro horas sobre vinte e quatro horas, como o Recorrente bem sabe pois foi guarda de segurança de um casino, pelo que não haveria necessidade de fazer mais qualquer outra prova nos autos.
XV. Nem se diga que pela matéria dada como provada aos quesitos 4º, 5º, 9º, 19º e 23º da sentença pois bem sabe o Recorrente porque alegou nos artigos 41º e 55º da sua petição inicial que após sete dias de trabalho consecutivo o Autor Recorrente gozava um período de vinte e quatro horas de descanso, o que foi confirmado pela testemunha ouvida em audiência de discussão e julgamento e ainda conforme consta da fundamentação na resposta dada à matéria de facto.
XVI. Assim, se o Recorrente gozou efectivamente de um dia de dispensa ao trabalho em cada oitavo dia, o cômputo efectuado a final pelo douto Tribunal a quo de compensar o Recorrente pelo trabalho prestado ao sétimo dia de trabalho consecutivo entre 04/02/2010 e 31/12/2019, não poderia ter sido calculado de modo diferente.
XVII. No que respeita às compensações pelos dias de descanso semanal, com a entrada em vigor em 01/01/2009 da lei nº. 7/2008, o legislador deixou de exigir o gozo consecutivo do descanso semanal por cada quatro semanas, conforme se prevê no nº 2 do art.º 42° da lei nº 7/2008, isto é: «O gozo do período de descanso pode não ter frequência semanal em caso de acordo entre as partes ou quando a natureza da actividade da empresa o torne inviável, casos em que o trabalhador tem direito a gozar um período de descanso remunerado de quatro dias por cada quatro semanas.».
XVIII. Sendo que, dispõe o art.º 43°, n.ºs 1, 2 e 4 do mesmo diploma: «1. O empregador pode determinar que o trabalhador preste trabalho em dia de descanso, independentemente do seu consentimento, quando: (…) 3) Quando a prestação do trabalho seja indispensável para garantir a continuidade do funcionamento da empresa. 2. A prestação de trabalho nos termos do número anterior confere ao trabalhador o direito a gozar um dia de descanso compensatório, fixado pelo empregador, dentro dos trinta dias seguintes ao da prestação de trabalho e o direito a: 1) Auferir um acréscimo de um dia de remuneração de base ou gozar, dentro de trinta dias, um dia de descanso compensatório para os trabalhadores que auferem uma remuneração mensal; 4. Caso não goze o dia de descanso compensatório previsto no número anterior, o trabalhador tem direito a: 1) Auferir um acréscimo de um dia de remuneração de base, para os trabalhadores que auferem uma remuneração mensal».
XIX. No caso dos autos e como supra se referiu, a lei admite a concessão do descanso em cada oitavo dia como descanso semanal nos termos do nº 2 do art.º 42º da lei nº 7/2008.
XX. Ora, conforme o alegado pelo Recorrente nos artigos 71º e 72º da Contestação, e como supra se referiu, por razões associadas às exigências do funcionamento da respectiva empresa, bem como, em função da natureza do sector de actividade da ora Recorrente - Casino - que é de laboração contínua, poderá o empregador ter a necessidade de fixar e atribuir esses dias de descanso semanal não ao sétimo dia, mas num outro dia do mês.
XXI. Nesta medida, verificando-se no caso sub judice uma das situações previstas no n.º 2 do artigo 42º da lei n.º 7/2008 e resultando da matéria de facto dado como provada que o Recorrente descansou ao 8º dia, bem andou o douto Tribunal a quo ao atribuir ao Recorrente de uma compensação de MOP$31,523.33.
  
  Foram colhidos os vistos.
  
  Cumpre, assim, apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO

1. Factos

A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
- Entre 04/02/2010 até ao presente o Autor esteve ao serviço da Ré (B), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
- O Autor foi recrutado pela Sociedade D – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. – e, exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/2003 (Cfr. fls. 23 a 28, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (B)
- Entre 04/02/2010 a 31/07/2010 o Autor exerceu as suas funções para a Ré (B), do Contrato de Prestação de Serviço n.º 2/2003. (C)
- Entre 01/08/2010 a 31/07/2011, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 06279/IMO/GRH/2010 (Cfr. fls. 29, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (D)
- Entre 01/08/2011 a 31/07/2012, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 06743/IMO/GRH/2011 (Cfr. fls. 30, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (E)
- Entre 01/08/2012 a 31/07/2013, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 11206/IMO/GRH/2012 (Cfr. fls. 31, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (F)
- Entre 01/08/2013 a 20/07/2014, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 14932/IMO/GRH/2013 (Cfr. fls. 32, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (G)
- Entre 21/07/2014 a 20/07/2015, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 16331/IMO/GRH/2014 (Cfr. fls. 33, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (H)
- Entre 21/07/2015 a 20/07/2016, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 21493/IMO/GRH/2015. (I)
- Entre 21/07/2016 a 20/07/2017, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 20355/IMO/GRH/2016. (J)
- Entre 21/07/2017 a 15/01/2018, o Autor exerceu a sua actividade profissional para a Ré (B) ao abrigo do Despacho n.º 15014/IMO/DSAL/2017. (K)
- E entre 04/02/2010 a 20/07/2015, a Ré (B) pagou ao Autor a quantia de MOP$7.500,00, a título de salário de base mensal. (L)
- Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/2003 ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para as Rés até 31/07/2010, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (M)
- Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (N)
- Desde o início da prestação de trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela Ré. (1.º)
- Era a Ré que fixava o local e o horário de trabalho do Autor, de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades. (2.º)
- Durante todo o período de trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob ordem e instruções da Ré. (3.º)
- Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré, sem prejuízo de 24 dias de férias anuais por cada ano civil e dispensas de trabalho não remuneradas, nomeadamente entre 08/03/2011 e 27/03/2011 (20 dias), entre 09/10/2012 e 30/10/2012 (22 dias), entre 04/06/2013 e 18/06/2013 (15 dias), entre 04/04/2015 e 05/05/2015 (32 dias), entre 12/10/2015 e 13/10/2015 (2 dias), entre 05/11/2015 e 06/11/2015 (2 dias), entre 09/12/2015 e 10/12/2015 (2 dias), entre 24/12/2015 e 25/12/2015 (2 dias), entre 27/01/2016 e 28/01/2016 (2 dias), entre 20/02/2016 e 21/02/2016 (2 dias), entre 07/03/2016 e 08/03/2016 (2 dias), entre 09/04/2016 e 10/04/2016 (2 dias), entre 21/06/2016 e 13/07/2016 (23 dias), entre 01/08/2016 e 02/08/2016 (2 dias), entre 11/09/2016 e 12/09/2016 (2 dias), entre 13/10/2016 e 14/10/2016 (2 dias), entre 07/11/2016 e 08/11/2016 (2 dias) e entre 18/12/2016 e 19/12/2016 (2 dias), entre 04/01/2017 e 05/01/2017 (2 dias), entre 19/01/2017 e 20/01/2017 (2 dias), entre 13/02/2017 e 14/02/2017 (2 dias), entre 09/03/2017 e 10/03/2017 (2 dias) e entre 13/05/2017 e 03/06/2017 (22 dias), entre 15/06/2017 e 16/06/2017 (2 dias), entre 19/07/2017 e 20/07/2017 (2 dias), entre 21/09/2017 e 22/09/2017 (2 dias), entre 26/11/2017 e 27/11/2017 (2 dias) e entre 13/12/2017 e 14/12/2017 (2 dias), entre 22/01/2018 e 23/01/2018 (22 dias), entre 21/03/2018 e 22/03/2018 (2 dias), entre 09/05/2018 e 10/05/2018 (2 dias), entre 28/11/2018 e 29/11/2018 (2 dias) e entre 11/12/2018 e 03/01/2019 (24 dias), entre 24/01/2019 e 25/01/2019 (2 dias), entre 27/02/2019 e 28/02/2019 (2 dias), entre 10/04/2019 e 18/04/2019 (2 dias), entre 19/05/2019 e 20/05/2019 (2 dias), entre 20/06/2019 e 21/06/2019 (2 dias), entre 25/08/2019 e 26/08/2019 (2 dias), entre 24/11/2019 e 25/11/2019 (2 dias), bem como um dia de descanso no oitavo dia após cada sete dias de trabalho consecutivos durante ao serviço da Ré. (4.º, 5.º e 9.º)
- Entre 21/07/2015 a 31/03/2019, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$7.875,00, a título de salário de base mensal. (6.º)
- Entre 01/04/2019 a 31/10/2019, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$10.000,00, a título de salário de base mensal. (7.º)
- Entre 01/11/2019 e 31/12/2019, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$12.100,00, a título de salário de base mensal. (8.º)
- Entre 04/02/2010 e 31/07/2010, a Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de efectividade. (10.º)
- Entre 04/02/2010 e 31/07/2010, a Ré procedeu a uma dedução no valor de HK$750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (11.º)
- A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela Ré e/ ou pela agência de emprego. (12.º)
- Desde o início da relação de trabalho até 31/12/2019, por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (13.º)
- Durante o referido período de tempo, tinha lugar um briefing (leia-se, uma reunião) entre o Team Leader (leia-se, Chefe de turno) e os “guardas de segurança”, na qual era distribuído o trabalho para o referido turno, mediante a indicação do seu concreto posto dentro do Casino. (14.º)
- Entre 04/02/2010 a 31/12/2019, o Autor compareceu ao serviço da Ré (B) com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos, sem prejuízo da resposta aos quesitos 4.º, 5.º e 9.º. (15.º)
- A Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno. (16.º)
- A Ré (B) nunca conferiu ao Autor o gozo de um descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado. (17.º)
- Desde 04/02/2010 a 31/12/2019, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (18.º)
- A que se seguia um período de vinte e quatro horas de não trabalho, em regra, no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (19.º e 23.º)
- Entre 04/02/2010 a 31/12/2019, a Ré não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas em cada semana (leia-se, em cada período de sete dias), sem prejuízo da resposta aos quesitos 4.º, 5.º e 9.º. (20.º)
- Entre 04/02/2010 a 31/12/2019 – descontados os períodos em que o Autor esteve ausente de Macau - a Ré (B) nunca solicitou ao Autor qualquer autorização para que o período de descanso não tivesse uma frequência semanal. (21.º)
- Entre 04/02/2010 a 31/12/2019, a Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia extra pelo trabalho prestado em cada um dos(sic.) sétimo dias(sic.), após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (22.º)
- Por razoes associadas às exigências do funcionamento da respecitva empresa, bem assim, em função da natureza do sector de actividade da Ré - Casino – que é de laboração contínua. (24.º)

2. Do Direito
  
  São dois os recursos interpostos nestes autos, a saber:
1) Do despacho que indeferiu a ampliação do pedido;
2) Da Sentença relativamente ao cálculo:
- Da indemnização devida pela não concessão de descanso compensatório na sequência do trabalho extraordinário prestado pelo Autor.
- Da indemnização pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal.
  
  Vejamos então.
  
1) Do despacho que indeferiu a ampliação do pedido;
  
  É do seguinte teor o despacho recorrido:
  «Em 15 de Abril, o Autor apresentou um requerimento para ampliar o pedido, pelas razões constantes nos presentes autos de fls. 231 e seguintes, à qual a Ré se opôs. Após apreciar e examinar o pedido, de acordo com os art.ºs 1.º, 16.º e 33.º, n.º 4 do CPT e com o art.º 217.º, n.º 1 e n.º 2 do CPC, mesmo que o Autor tenha indicado que apresentava uma mera ampliação do pedido, após a apreciação do respectivo requerimento, o Tribunal entendeu que a ampliação de pedido no requerimento se baseava na intenção do Autor de alterar o salário invocado na petição inicial, em particular o aditamento dos subsídios e considerando os respectivos subsídios como partes integrantes do salário, e de acrescentar a diferença na compensação com base nisso. O Tribunal considerou que, com o respeito das diferentes opiniões, o respectivo requerimento não era uma mera ampliação do pedido, mas também de alteração dos factos da causa de pedir, que só pode ser concedida em processos laborais em duas circunstâncias, em primeiro, a causa de pedir é alterada na Réplica ou na resposta ao processo, e em segundo lugar, quando estão envolvidos alguns factos supervenientes. Em qualquer das circunstâncias o Autor não satisfez, especialmente se o Tribunal não o considerar como um facto superveniente. Uma vez que era impossível que o Autor não soubesse todos os seus subsídios ou todos os seus ganhos durante o período em que foi pago, mesmo que, como o Autor salientou que não tivesse uma nota de salário, mas apenas a Ré tivesse, o Autor tinha o dever de registar o seu próprio salário e ganhos na ausência de uma nota de salário, o Tribunal considerou que a alteração da causa de pedir do requerimento do Autor não preenchia nenhuma destas circunstâncias acima referidas e, por conseguinte, ao abrigo do estatuto acima citado, o Tribunal não admite, portanto, o ampliação do pedido acompanhada com a alteração da causa de pedir.».
  
  O artº 217º do CPC – aplicável “ex vi” artº 1º do CPT – na falta de acordo entre as partes, consagra duas situações que importa distinguir:
  - alteração ou ampliação da causa de pedir;
  - ampliação do pedido;
  Para sabermos se estamos a falar em alteração/ampliação da causa de pedir ou do pedido impõe-se antes ter por assentes os respectivos conceitos (do que é causa de pedir e do que é pedido).
  Sobre o conceito de causa de pedir tivemos oportunidade de escrever no Acórdão deste Tribunal de 4 de Novembro deste ano proferido no processo 431/2021 o seguinte:
  «Sendo a causa de pedir a par com o pedido, um elemento constitutivo do objecto do processo, a sua definição está longe de ser unânime na Doutrina.
  Maria França Gouveia em “A Causa de Pedir Na Acção Declarativa”, Colecção teses, Almedina, Coimbra 2004, de forma exaustiva e para cuja leitura se remete, trata o assunto.
  Distinguindo aquela Autora entre teses monistas e pluralistas, para a teses monistas identifica 3 grupos de noções, sendo que:
  - Um deles identifica a causa de pedir com a qualificação jurídica dos factos, conceito que vem a ser abandonado uma vez que apenas faz sentido quanto ao princípio dispositivo – instituto com o qual a o conceito de causa de pedir também esta relacionado;
  - Um outro grupo que identifica a causa de pedir como o conjunto de factos naturais adquiridos no processo, teoria que também vem a ser abandonada porque a selecção dos factos naturais pressupõe também uma pré-decisão quanto à norma aplicável, sendo que a importação dos factos naturais já pressupõe uma instrumentalização jurídica dos mesmos para a acção, pelo que se entende que este critério também não é praticável;
  - Um terceiro grupo que entende a causa de pedir como o conjunto dos factos essenciais, a qual é a posição unânime na doutrina portuguesa, a qual por sua vez é também fonte de interpretação do direito em Macau.
  Sobre esta matéria veja Autora e Obra citada a pág. 77 a 80:
  «2. Na doutrina portuguesa esta é a posição unânime, normalmente fundamentada no artigo 498.º n.º 4 e quase sempre referenciada à tese da substanciação.
  Manuel de Andrade, entendendo que a nossa lei aderiu à teoria da substanciação, define causa de pedir como “acto ou facto jurídico (contrato, testamento, facto ilícito, etc.) donde o Autor pretende ter derivado o direito a tutelar; o acto ou facto jurídico que ele aduz como título aquisitivo desse direito.”
  Na versão de Alberto dos Reis, “ A causa de pedir é o acto ou o facto central da demanda, o núcleo essencial de que emerge o direito do autor ...”
  Já Castro Mendes se detém um pouco mais na noção, aproximando­se ligeiramente da versão naturalista: a causa de pedir identifica o processo - deve ser alegada de forma a identificar suficientemente um acto ou facto. Aqui há uma certa margem de arbítrio: se o acto for nominado basta o nomen iuris; se inominado, exige-se maior detalhe. Neste último caso a descrição limita-se funcionalmente, isto é, há que identificar o facto ou o acto jurídico de que procede a pretensão em juízo. Castro Mendes é, porém, claro ao dizer, logo de seguida, que a causa de pedir só pode ser alegada com base na sua qualificação jurídica.
  Estas definições de causa de pedir não são porém suficientes para esclarecer o problema e aplicar a noção. No momento da concretização do conceito, as dificuldades surgem, oscilando-se sempre entre uma maior ou menor qualificação dos factos. Por outro lado, atendendo à possibilidade de alteração da qualificação inicial pelo tribunal, esta concepção fica ainda mais comprometida.
  As posições mais recentes procuram, pois, ainda que na mesma linha, um conceito mais preciso e capaz.
  Miguel Teixeira de Sousa entende que “a causa de pedir é constituída pelos factos necessários para individualizar a situação jurídica alegada pela parte e para fundamentar o pedido formulado para essa situação. A causa de pedir é composta pelos factos constitutivos da situação jurídica invocada pela parte, isto é, pelos factos essenciais à procedência do pedido. São essenciais aqueles factos sem cuja verificação o pedido não pode ser julgado procedente.”
  O autor, porém, prevendo as dificuldades advenientes da alteração da qualificação jurídica, afirma que “os factos que constituem a causa de pedir devem preencher uma determinada previsão legal, isto é, devem ser subsumíveis a uma norma jurídica, mas valem independentemente dessa qualificação.”
  Mais recentemente, Miguel Teixeira de Sousa, identificando a causa de pedir com os factos essenciais, define-os como aqueles que “permitem individualizar a situação jurídica alegada na acção”. Os exemplos que apresenta reconduzem os factos essenciais a uma única previsão normativa.
  Diz também o autor que os factos serão essenciais segundo um critério de classificação relativo, ou seja, só mediante um certo objecto processual se poderá saber se determinado facto é essencial, complementar ou instrumental.
  Este entendimento encerra na sua formulação um ciclo vicioso. É que se os factos essenciais se determinam através da causa de pedir, e se essa causa de pedir constitui um dos elementos do objecto, para determiná-lo é necessária ... a causa de pedir. Ou seja, precisa-se do objecto para determinar a causa de pedir e da causa de pedir para determinar o objecto.
  (…)
  Lebre de Freitas utiliza também, para a sua definição de causa de pedir, o conceito de previsão da norma jurídica, “matizado porém com a ideia de que o acontecimento da vida narrado pelo autor é susceptível de redução a um núcleo fáctico essencial, tipicamente previsto por uma ou mais normas materiais como causa do efeito pretendido.”
  Numa definição mais recente, diz que a causa de pedir é “o facto constitutivo da situação jurídica material que [o autor] quer fazer valer”, tratando-se do “facto concreto que o autor diz ter constituído o efeito pretendido”.
  Abrantes Geraldes define causa de pedir como aqueles “factos essenciais que se inserem na previsão abstracta da norma ou normas jurídicas definidoras do direito cuja tutela jurisdicional se busca através do processo civil” ou “é consubstanciada tão só pelos factos que preenchem a previsão da norma que concede a situação subjectiva alegada pela parte.” Tendo consciência que a enunciação da noção não é, porém, suficiente, exemplifica com maior ou menor grau de concretização o que deve ser a causa de pedir em determinados tipos de acções: nas acções baseadas em contratos; nas acções constitutivas em geral; nas acções de anulação e declaração de nulidade, etc., etc..».
  Continuando a acompanhar a mesma Autora as teses pluralistas não vão mais longe do que as noções das teses monistas, apenas com a especialidade de que os conceitos podem variar consoante os princípios processuais, a espécies de acções ou os institutos a aplicar.
  (…)
  Sobre esta questão veja-se Acórdão do STJ de Portugal de 12.05.2017 proferido no processo nº 1565/15.8T8VFR-A.P1S1:
  «2.1.2. O caso julgado como exceção dilatória: da tríplice identidade exigível para a sua aferição
  Conforme ficou referido, para efeitos de exceção, verifica-se o caso julgado quando a repetição de uma causa se dá depois de a primeira ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário (cfr. parte final do nº 1 do artigo 580º do Código de Processo Civil).
  E o nº 1 do artigo 581º do Código de Processo Civil vem estabelecer que se repete a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir, havendo identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica (nº 2 do mesmo preceito), identidade de pedido quando numa e noutra se pretende obter o mesmo efeito jurídico (nº 3 do preceito em análise) e identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico (nº 4 do referido artigo 581º).
  (…)
  Por sua vez, a identidade de pedido é avaliada em função da posição das partes quanto à relação material, podendo considerar-se que existe tal identidade sempre que ocorra coincidência nos efeitos jurídicos pretendidos (ainda que implícitos), do ponto de vista da tutela jurisdicional reclamada e do conteúdo e objeto do direito reclamado.
  E, assim, ocorrerá identidade de pedido se existir coincidência na enunciação da forma de tutela jurisdicional (implícita ou explícita) pretendida pelo autor e do conteúdo e objeto do direito a tutelar, na concretização do efeito que, com a ação, se pretende obter.
  Por último, a identidade de causa de pedir verifica-se quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico concreto, simples ou complexo, de que emerge o direito do autor e fundamenta legalmente a sua pretensão, constituindo um elemento definidor do objeto da acção.
  E, de acordo com a "teoria da substanciação", subjacente ao mencionado nº 4 do artigo 581º do Código de Processo Civil, tal factualidade afirmada pelo autor de que faz derivar o efeito jurídico pretendido terá de traduzir a causa geradora (facto genético) do direito alegado ou da pretensão invocada, de modo a individualizar o objeto do processo e a prevenir assim a repetição da mesma causa.
  Visando a salvaguarda de eventuais relações de concurso que se possam estabelecer entre o objeto da decisão transitada e o do processo ulterior, adianta, ainda, TEIXEIRA DE SOUSA que «o caso julgado abrange todas as qualificações jurídicas do objecto apreciado, porque o que releva é a identidade da causa de pedir (isto é, dos factos com relevância jurídica) e não das qualificações que podem ser atribuídas a esse fundamento1» (in "Estudos sobre o Novo Processo Civil", p. 576).
  (…)
  2.1.3.3. Dos limites temporais a que o caso julgado está sujeito
  Por último, o caso julgado é temporalmente limitado, tomando como referência temporal o momento do encerramento da discussão em 1ª. instância, tal como decorre do disposto no nº 1 do artigo 611º do Código de Processo Civil, pelo que a sentença deve tomar em consideração os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que se produzam posteriormente à propositura da ação, de modo que a decisão corresponda à situação existente no momento do encerramento da discussão.
  Já para as partes, o estabelecido naquele nº 1 do artigo 611º do Código de Processo Civil significa que têm o ónus de alegar os factos supervenientes, ou a verificação superveniente de factos alegados, que ocorram até ao encerramento da discussão em 1ª. instância.
  A relevância desse momento implica, então, a preclusão da invocação, no processo subsequente, das questões não suscitadas no processo em foi proferida a decisão transitada, mas anteriores ao encerramento da discussão e que nele podiam ter sido apresentadas. Ou seja: tal referência temporal do caso julgado consubstancia um momento preclusivo.
  (…)
  Quanto à posição do Autor, CASTRO MENDES ensinava que «sem sombra de dúvida que a pretensão do autor não está sujeita a este efeito preclusivo» e que «… é lícito ao autor em processo civil formular n vezes a mesma pretensão, desde que a baseie em n causas de pedir» (in “Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, p. 179)  
  (…)
  Por outro lado, importa referir o ensinamento de MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA (citado na decisão impugnada), «O âmbito da preclusão é substancialmente distinto para o autor e para o réu. Quanto ao autor, a preclusão é definida exclusivamente pelo caso julgado: só ficam precludidos os factos que se referem ao objeto apreciado e decidido na sentença transitada. Assim, não está abrangida por essa preclusão a invocação de uma outra causa de pedir para o mesmo pedido, pelo que o autor não está impedido de obter a procedência da ação com base numa distinta causa de pedir. Isto significa que não há preclusão sobre factos essenciais, ou seja, sobre factos que são suscetíveis de fornecer uma nova causa de pedir para o pedido formulado.»
  Ou seja, como do exposto decorre a causa de pedir é constituída pelos factos que se invocam com vista a obter o efeito jurídico pretendido que está expresso no pedido.
  Pedido é o efeito que se formula a final e que consiste em depois de considerar provados os factos que se invocaram, se pedir, no nosso caso, a condenação no pagamento de determinada quantia.
  Ampliar ou reduzir o pedido consiste no efeito de aumentar ou reduzir o que se pede o que tanto pode ser a alteração para mais ou menos do valor como até pedir para além daquele efeito um outro, v.g. pedia-se o pagamento numa indemnização e vem aumentar-se ou reduzir-se o valor ou acrescentar-se um pedido de entrega de coisa para além da indemnização. Isto é uma alteração e/ou ampliação do pedido, mas não se mexe nos factos que se invocavam.
  Ora, no caso em apreço o que se vem fazer não é simplesmente aumentar o valor do que se pede, mas alterar o valor do facto “salário base mensal” no período de 01.02.2010 a 30.04.2010 e 21.07.2018 a 30.04.2019 para menos, e no período de 01.01.2015 a 21.07.2015. 01.05.2019 a 20.07.2019 e 01.11.2019 a 31.12.2019 para mais, e, acrescentar um outro facto de que para além daquele valor eram pagos outros valores, a outros títulos que não salário base e que se entende que integram o salário base.
  Alterar o valor que consta do facto e aditar factos novos relativamente a valores que eram pagos e antes não se referiam é uma alteração da causa de pedir, o que nos termos do nº 1 do artº 217º do CPC apenas poderia ter lugar na réplica se o processo a admitir – entenda-se, se for legalmente possível e se se verificar o condicionalismo que a autoriza -, ou se resultar – a ampliação/alteração da causa de pedir - de confissão feita pelo Réu.
  Segundo se invoca, a alteração dos valores do salário base e a adição de outros valores que eram pagos a outros títulos2 resultou dos documentos juntos pela Ré.
  Contudo o valor do salário base que a Ré confessa no artº 3º da sua contestação é o que consta da p.i., pelo que, nem remotamente se pode admitir que aqueles documentos pudessem ser havidos como confissão da Ré.
  De qualquer forma, os documentos em causa foram juntos e notificados ao Autor em 01.02.2021 – cf. fls. 216 - e o Autor apenas em 15.04.2021 veio requerer sob a epígrafe de aumento do pedido o que no nosso entender também é uma alteração da causa de pedir.
  Ora, ainda que se se aceitasse que no caso havia uma confissão da Ré – o que no caso em apreço dada a referida confissão na contestação não aceitamos – e que o Autor poderia ter vindo (e aqui independentemente de haver réplica ou não) ampliar a causa de pedir, o certo é que, o requerimento é apresentado muito para além do prazo de 10 dias após a notificação da junção dos documentos consagrado no artº 103º do CPC “ex vi” artº 1º do CPT, pelo que, ainda que fosse possível, é extemporânea.
  
  Destarte, tratando-se a requerida ampliação do pedido de uma verdadeira alteração da causa de pedir, não havendo lugar nestes autos a resposta à contestação (réplica em processo civil) e não decorrendo de confissão da Ré, não podia a mesma ser admitida, bem se tendo decidido nesse sentido.
  
  Termos em que, se impõe negar provimento a este recurso.
  
2) Da Sentença relativamente ao cálculo

  - Do Recurso quanto à indemnização pela não concessão de descanso compensatório pelo trabalho extraordinário prestado pelo Autor.
  
  Vem também interposto recurso da sentença recorrida pelo Autor quanto à indemnização que pedia pela não concessão de descanso compensatório pelo trabalho extraordinário por si prestado.
  Relativamente a esta matéria alegava o Autor na p.i. – e agora em sede de recurso – que tendo sido prestado trabalho extraordinário para além do direito à remuneração do mesmo, tem ainda o trabalhador direito a descanso compensatório nos termos do artº 38º da Lei nº 7/2008.
  É a seguinte a redacção do preceito em causa:
Artigo 38.º
Descanso compensatório
  1. Nas situações previstas nas alíneas 1) e 2) do n.º 2 do artigo 36.º, o trabalhador tem direito a gozar um descanso adicional, remunerado nos termos gerais, com uma duração:
  1) Não inferior a vinte e quatro horas, se o período de trabalho atingir o respectivo limite diário máximo;
  2) Proporcional ao período de trabalho prestado, se o período de trabalho não atingir o respectivo limite diário máximo.
  2. O disposto no número anterior aplica-se à situação prevista na alínea 3) do n.º 2 do artigo 36.º se o trabalhador prestar trabalho extraordinário durante dois dias consecutivos.
  3. O direito ao descanso compensatório é gozado nos quinze dias seguintes ao da prestação do trabalho extraordinário, em dia escolhido pelo trabalhador, com a concordância do empregador.
  4. Na falta de acordo entre trabalhador e empregador quanto ao dia em que o descanso compensatório deve ser gozado, o mesmo é fixado pelo empregador.
  Os nºs 1) e 2) do nº 2 do artº 36º estipulam que:
  «2. O empregador pode determinar que o trabalhador preste trabalho extraordinário, independentemente do seu consentimento, quando:
1) Se verifiquem casos de força maior, caso em que o período de trabalho diário não pode exceder dezasseis horas;
2) O empregador esteja na iminência de prejuízos importantes, caso em que o período de trabalho diário não pode exceder dezasseis horas;»
  No caso em apreço não se alega, nem se demonstra que o trabalho extraordinário prestado o haja sido por alguma daquelas razões, pelo que, não tinha o Autor direito ao descanso compensatório.
  Assim sendo, não enferma a decisão recorrida de erro de julgamento por não conceder a reclamada indemnização sendo de improceder o recurso.
  
  - Da indemnização devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal.
  
  Quanto a esta matéria, verifica-se que contrariamente ao que estipula o artº 42º da Lei nº 7/2008 a Ré não fixou ao Autor um período de descanso de 24 horas em cada semana (ou período de 7 dias).
  O Autor trabalhava consecutivamente durante 7 dias e descansava ao 8º dia, conforme resulta da matéria de facto assente (resposta dada aos quesitos 4º, 5º e 9º).
  Relativamente a esta matéria tem «Este TSI tem entendido de forma unânime, que o trabalho prestado no sétimo após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho em cada semana deve ser qualificado como trabalho prestado no dia do descanso semanal, não obstante o Autor ter gozado um dia de descanso ao oitavo dia.
  A razão de ser consiste em “o trabalhador não pode prestar mais do que seis dias de trabalho consecutivos, devendo o dia de descanso ter lugar, no máximo, no sétimo dia, e não no oitavo, nono ou noutro dia do mês, salvo acordo das partes em sentido contrário, no que toca ao momento de descanso a título de “compensação”, mas o critério para este efeito é sempre o período de sete dias como uma unidade” (cfr. Ac. do TSI, Proc. nº 89/2020, de 16/04/2020).
  Assim, o descanso remunerado do trabalhador no oitavo dia não pode ser qualificado como descanso semanal sem acordo das partes ou quando a natureza da actividade da empresa não torne inviável o gozo no sétimo dia, antes deve ser qualificado como dia de descanso compensatório pelo trabalho prestado no dia de descanso semanal a que se alude o nº 2 do artº 43º da Lei nº 7/2008.
  Tem o Autor já gozado os dias de descanso compensatório a que se alude o nº 2 do artº 43º da Lei nº 7/2008, só fica por pagar-lhe o acréscimo de uma remuneração de base correspondente aos (…) dias de trabalho prestado no descanso semanal.» - cfr. Ac. do TSI, Proc. nº 83/2021, de 29.04.2021.
  Pelo que, de acordo com o que tem vindo a ser o entendimento deste TSI, e tendo em consideração a matéria de facto apurada, tendo o Autor já gozado o dia de descanso compensatório a que teria direito (o descanso ao 8º dia), pelo trabalho prestado ao 7º dia tem este direito a receber apenas o acréscimo da remuneração correspondente a um dia trabalho nos seguintes valores:
  - Entre 04/02/2010 e 20/07/2015 : MOP7.500,00 / 30 dias x 263 dias (1843 dias / 7 dias) = MOP65.750,00;
  - Entre 21/07/2015 e 31/03/2019 : MOP7.875,00 / 30 dias x 174 dias (1223 dias / 7 dias) – MOP45.675,00;
  - Entre 01/04/2019 e 31/10/2019 : MOP10.000,00 / 30 dias x 28 dias (199 dias / 7 dias) = MOP9.333,33;
  - Entre 01/11/2019 e 31/12/2019 : MOP12.100,00 / 30 dias x 8 dias (58 dias / 7 dias) = MOP3.226,67
  Tudo no valor global de MOP123.985,00
  
III. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos:
  - Nega-se provimento ao recurso do despacho que não admitiu a alteração da causa de pedir;
  - Concede-se parcialmente provimento ao recurso interposto pelo Autor, quanto à condenação da Ré revogando a sentença recorrida na parte respeitante à compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e em consequência condena-se esta a pagar ao Autor a quantia de MOP123.985,00 acrescida dos juros moratórios fixados nos termos daquela decisão a qual em tudo o mais se mantém, negando-se provimento ao recurso no remanescente.
  
  Custas pelos Recorrente e Recorrida na proporção do decaimento.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 24 de Fevereiro de 2022
  Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
  Lai Kin Hong
  Fong Man Chong
1 Realce e sublinhado nossos.
2 Note-se que a qualificação destes outros valores integrarem ou não o conceito de salário base já é uma questão de direito que para aqui não releva.
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797/2021 CÍVEL 35