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Processo n.º 174/2022 Data do acórdão: 2022-4-28 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– sanção de inibição efectiva de condução
– art.o 109.o, n.o 1, da Lei do Trânsito Rodoviário
– motorista de profissão
– conduta de condução de embater em transeunte na passadeira
– elevadas exigências da prevenção geral
S U M Á R I O
1. No caso, ainda que o arguido seja um motorista de profissão com subsistência da sua vida dependente desta ocupação, estas circunstâncias já ficam, evidentemente, neutralizadas pelas muito elevadas exigências da prevenção geral da conduta de condução automóvel de embater, mesmo que por negligência, em transeunte na passadeira de via pública, razões por que não se pode suspender a sanção de inibição de condução em sede do n.o 1 do art.o 109.o da Lei do Trânsito Rodoviário.
2. Aliás, é nos compreensíveis inconvenientes a resultar da execução da inibição de condução para a vida quotidiana da pessoa assim punida que se reflectem também propriamente as consequências jurídicas da sua acima referida conduta de condução.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 174/2022
(Autos de recurso penal)
(Da reclamação para conferência da decisão sumária do relator)
Recorrente (arguido): A




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com a sentença proferida a fls. 384 a 396v do Processo Comum Singular n.° CR5-20-0401-PCS do 5.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base apenas na parte em que se decidiu não suspender a execução da sanção de interdição (de oito meses) de condução aplicada devido à prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física por negligência no exercício da condução, p. e p. pelo art.º 142.o, n.o 1, do Código Penal, conjugado com os art.os 93.o, n.o 1, e 94.o, alínea 1), da Lei do Trânsito Rodoviário (doravante abreviada como LTR), veio o arguido A, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para rogar a suspensão, por seis meses, daquela pena acessória, alegando, na sua essência, o seguinte, para o efeito (cfr. com mais detalhes, o teor da motivação de recurso, apresentada a fls. 409 a 431 dos presentes autos correspondentes):
– o Tribunal recorrido aplicou a inibição de condução, sem atender à possibilidade de suspensão dessa sanção prevista no art.o 109.o da LTR, tendo desconsiderado, pois, em especial, a situação profissional e económica do próprio arguido ora recorrente que, como resulta provado nos autos, é motorista de táxi, sendo unicamente dessa actividade que retira os rendimentos necessários à sua subsistência;
– no caso, verificam-se os pressupostos que têm sido considerados pela jurispruduência do TSI para que seja considerada a existência de motivos atendíveis conducente à suspensão da execução da sanção de inibição de condução;
– a não suspensão da inibição de condução é excessiva e desproporcional e viola o art.o 109.o, n.o 1, da LTR.
Ao recurso respondeu o Digno Delegado do Procurador (a fls. 456 a 464 dos presentes autos) no sentido de não provimento.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 489 a 490 dos autos), pugnando pela manutenção do julgado.
Após feito o exame preliminar dos autos, foi proferida decisão sumária de rejeição do recurso (a fls. 492 a 494), por entendida manifesta improcedência do mesmo.
Notificado, veio o arguido reclamar para conferência dessa decisão de rejeição do recurso, alegando, no essencial, no seu petitório de fls. 499 a 514, que, a montante, o seu recurso não devia ser considerado manifestamente improcedente, e, a jusante, a decisão sumária violou, por erro de interpretação, o disposto nos art.os 48.o do Código Penal e 109.o, n.o 1, da LTR, devendo, pois, passar a ser suspensa a execução da sanção de interdição de condução.
Sobre a matéria dessa reclamação, opinou a Digna Procuradora-Adjunta a fl. 516 a 516v, no sentido de improcedência da reclamação.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se o seguinte:
1. A sentença recorrida pelo arguido ficou proferida a fls. 384 a 396v dos autos, cuja fundamentação fáctica se dá por aqui integralmente reproduzida.
2. Segundo a factualidade aí dada por provada: o táxi conduzido pelo arguido ora recorrente embateu, em 14 de Maio de 2020, cerca das três horas e quinze minutos da tarde, na ofendida numa passadeira para peões em via pública, causando a esta ferimentos que demandaram três meses para convalescença; o arguido não tem antecedentes criminais, tem 4.a classe da instrução primária como habilitações académicas, e trabalha como taxista, com três mil patacas de rendimento mensal actual, sem pessoas a seu cargo.
3. A decisão do relator, proferida a fls. 2066 a 2073v, tem por fundamentação o seguinte teor:
– <<[…] De antemão, é de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao ente decisor do recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, vê-se que o arguido se insurgiu contra a decisão de não suspensão da execução da sua sanção de inibição de condução.
Tem entendido este TSI, em muitos recursos anteriores congéneres, que só se colocará a hipótese de suspensão da execução da sanção de inibição de condução, quando a pessoa arguida for um motorista de profissão e tiver a sua subsistência a depender dessa profissão. Nota-se que deste rumo jurisprudencial, não resulta que há que suspender a execução deste tipo de sanção acessória sempre que a pessoa arguida for um motorista de profissão e tiver a sua subsistência a depender dessa profissão, posto que se trata de uma hipótese, e não certeza, de suspensão.
No caso, ainda que o arguido seja um motorista de profissão com subsistência da sua vida dependente desta ocupação, estas circunstâncias já ficam, evidentemente, neutralizadas pelas muito elevadas exigências da prevenção geral da conduta de condução automóvel de embater, mesmo que por negligência, em transeunte na passadeira de via pública, razões por que não se pode suspender a sanção de inibição de condução em sede do n.o 1 do art.o 109.o da LTR. De frisar que é nos compreensíveis inconvenientes a resultar da execução da inibição de condução para a vida quotidiana da pessoa assim punida que se reflectem também propriamente as consequências jurídicas da sua acima dita conduta de condução.
Improcede manifestamente o recurso, o qual deve ser rejeitado nos termos dos art.os 407.o, n.o 6, alínea b), e 410.o, n.o 1, do Código de Processo Penal, sem mais indagação por desnecessária, até também pelo espírito da norma do n.o 2 deste art.o 410.o.>>.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Veio o arguido reclamar para conferência da decisão tomada pelo relator pela qual foi rejeitado o seu recurso, por manifestamente improcedente.
Começou ele por defender que o seu recurso não é manifestamente improcedente.
Pois bem, cumprindo agora conhecer do objecto inicial do recurso em conferência (posto que a reclamação para conferência da decisão de rejeição do recurso não pode implicar a alteração do objecto do próprio recurso), já não é mister aquilatar do “grau de improcedência” do seu recurso.
Assim, directamente sobre o mérito do recurso:
Vistas todas as circunstâncias fácticas já apuradas pela Primeira Instância, concorda-se efectivamente com as seguintes considerações tecidas na fundamentação da decisão de rejeição do recurso: <>.
Assim sendo, sem mais indagação por desnecessária ou prejudicada, não pode ser suspensa a sanção de inibição de condução do arguido.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar improcedente a reclamação do arguido recorrente.
Custas da reclamação pelo arguido, com duas UC de taxa de justiça.
Comunique o presente acórdão (com cópia da sentença recorrida) à ofendida.
Macau, 28 de Abril de 2022.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chao Im Peng
(Segunda Juíza-Adjunta)



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