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Processo n.º 416/2021 Data do acórdão: 2022-5-12 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– ofensa à integridade física
– agredir com garrafa de vidro partida
– exigências da prevenção geral
– aplicação da pena de prisão
– art.o 64.o do Código Penal
S U M Á R I O
1. Ante o circunstancialismo fáctico descrito como provado na decisão recorrida, em sintonia com o qual o 1.o arguido usou uma garrafa de vidro por si partida no chão para perseguir o 2.o arguido, e uma terceira pessoa ora ofendida acabou por ficar ferida por essa garrafa no segundo dedo da mão direita com ruptura de nervo, o que veio a demandar a este indivíduo seis meses de tempo para convalescença, o grau de ilicitude dessa conduta do 1.o arguido é relativamente elevado, ainda que tenha agido ele apenas com dolo eventual na ofensa corporal contra este indivíduo.
2. Assim sendo, por razões de prementes exigências de prevenção geral deste tipo de conduta do 1.o arguido, não se pode optar, em sede do art.o 64.o do Código Penal, pela pena de multa em detrimento da pena de prisão, na punição dos seus actos de ofensa à integridade física contra o 2.o arguido e aquele indivíduo.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 416/2021
(Recurso em processo penal)
Recorrente: Ministério Público
Recorrido: 1.o Arguido A




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA
REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I. RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido inicialmente a fls. 387 a 398 do Processo Comum Colectivo n.° CR3-19-0153-PCC do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (com rectificação de lapsos manifestos de escrita a fl. 404) apenas na parte respeitante à medida da pena do 1.o arguido A, veio o Digno Delegado do Procurador recorrer para este Tribunal de Segunda Instância, para pedir que se passasse a condenar esse arguido em três meses de prisão pela prática de um crime de ofensa simples à integridade física contra o ofendido B, e em dois meses de prisão pela prática de um crime de ofensa simples à integridade física contra o 2.o arguido C, e, em cúmulo jurídico dessas duas penas, finalmente em quatro meses de prisão única, a ser suspensa na execução por um ano (cfr. a motivação do recurso de fls. 416 a 420v dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso, respondeu o 1.o arguido recorrido (a fls. 432 a 440 dos presentes autos), no sentido de improcedência do recurso.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 473 a 474v), pugnando pelo provimento do recurso.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se o seguinte:
1. O acórdão ora recorrido encontrou-se inicialmente proferido a fls. 387 a 398 dos autos (com rectificação de lapsos manifestos de escrita a fls. 404), cuja fundamentação fáctica se dá por aqui integralmente reproduzida como fundamentação fáctica do presente acórdão de recurso.
2. Segundo a factualidade dada por provada nesse acórdão: O 1.o arguido A (ora recorrido) chegou a levantar uma garrafa de vidro e a parti-la no chão e, subsequentemente, a pegar na mesma garrafa assim partida para perseguir o 2.o arguido C, e o ofendido B foi impedir a conduta do 1.o arguido, mas acabou por ficar ferido na mão por aquela garrafa (cfr. o facto provado 5), tendo essa conduta do 1.o arguido causado a este ofendido ferimento com ruptura de nervo no segundo dedo da mão direita, o que veio a demandar a este ofendido seis meses de tempo para convalescença (cfr. o facto provado 9).
3. O Tribunal recorrido decidiu em aplicar ao 1.o arguido, um delinquente primário em Macau, 90 (noventa) dias de multa pela prática, em autoria material, com dolo eventual, de um crime consumado de ofensa simples à integridade física contra o referido ofendido, bem como 120 (cento e vinte) dias de multa pela prática, em autoria material, como dolo directo, de um crime consumado de ofensa simples à integridade física contra o 2.o arguido, e finalmente, em cúmulo jurídico dessas duas penas de multa, 180 (cento e oitenta) dias de multa única, à quantia diária de cem patacas, no total, pois, de MOP18.000,00 (dezoito mil patacas) de multa, convertível em 120 (cento e vinte) dias de prisão, no caso de não pagamento nem de substituição pelo trabalho.
III. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Na motivação do recurso, o Digno Delegado do Procurador entendeu que em vez da pena de multa, deveria ser escolhida a pena de prisão para a punição penal do 1.o arguido.
Para este Tribunal de recurso, ante o circunstancialismo fáctico descrito como provado no facto provado 5 (em sintonia com o qual o 1.o arguido usou uma garrafa de vidro por si partida no chão para perseguir o 2.o arguido) e a circunstância fáctica provada (descrita no facto provado 9) de o ofendido B acabar por ficar ferido por essa garrafa de vidro partida no segundo dedo da mão direita com ruptura de nervo, o que veio a demandar a este ofendido seis meses de tempo para convalescença, o grau de ilicitude dessa conduta do 1.o arguido é relativamente elevado, ainda que tenha agido ele apenas com dolo eventual na ofensa corporal contra este último ofendido.
Assim sendo, por razões de prementes exigências de prevenção geral deste tipo de conduta do 1.o arguido, não se pode optar pela pena de multa em detrimento da pena de prisão, na punição dos actos do 1.o arguido de ofensa corporal do 2.o arguido e daquele ofendido (cfr. o critério material plasmado no art.o 64.o do Código Penal (CP), em matéria de escolha da espécie da pena a aplicar).
Cumpre, pois, proceder à nova medida da pena do 1.o arguido, nos termos e aos critérios dos art.os 40.o, n.os 1 e 2, e 65.o, n.os 1 e 2, do CP, dentro da moldura de um mês a três anos de prisão aplicável a cada um dos seus dois crimes de ofensa simples à integridade física em causa (cfr. os art.os 41.o, n.o 1, e 137.o, n.o 1, do CP).
Ponderando, para o efeito, toda a facualidade já dada por provada no acórdão recorrido, é de passar a condenar o 1.o arguido em três meses de prisão pelo crime de ofensa simples à integridade física contra o ofendido B, e em dois meses de prisão pelo crime do mesmo tipo legal contra o 2.o arguido, e, em cúmulo jurídico dessas duas penas operado nos termos do art.o 71.o, n.os 1 e 2, do CP, finalmente na pena única de quatro meses de prisão, que pode ser suspensa na sua execução por um ano (cfr. o art.o 48.o, n.o 1, do CP), atenta sobretudo a falta de antecedentes criminais do 1.o arguido em Macau.
IV. DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar provido o recurso do Ministério Público, passando, por conseguinte, a condenar o 1.o arguido A:
– em dois meses de prisão pela prática, em autoria material, com dolo directo, de um crime consumado de ofensa simples à integridade física contra o 2.o arguido C, p. e p. pelo art.o 137.o, n.o 1, do Código Penal;
– e em três meses de prisão pela prática, em autoria material, com dolo eventual, de um crime consumado do mesmo tipo legal contra o ofendido B;
– e em cúmulo jurídico dessas duas penas, finalmente na pena única de quatro meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano.
Custas do recurso pelo 1.o arguido, com duas UC de taxa de justiça e oitocentas patacas de honorários a favor do seu Ex.mo Defensor Oficioso.
Comunique o presente acórdão (com cópia do acórdão recorrido) ao 2.o arguido, ao referido ofendido e ao Corpo de Polícia de Segurança Pública.
Macau, 12 de Maio de 2022.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chao Im Peng
(Segunda Juíza-Adjunta)



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