Processo n.º 650/2021
(Autos de recurso contencioso)
Relator: Fong Man Chong
Data : 05 de Maio de 2022
Assuntos:
- Sentença de absolvição em processo criminal e seus efeitos no processo administrativo
SUMÁRIO:
Perante a sentença de absolvição da prática do crime de falsificação de documento (por motivo de alegado casamento falso) proferida num processo-crime, em que foram arguidos o cônjuge e a Recorrente, e, atendendo à presunção prevista no artigo 579º do CPC, é de admitir a existência de vínculo matrimonial entre a Recorrente e o seu cônjuge, já que os indícios carreados pela Entidade Recorrida não são bastantes para ilidir tal presunção, ao decidir não renovar o BIRM da Recorrente, alegando que esta não tinham comunhão de vida com o seu cônjuge, há assim erro nos pressuposto de facto, o que constitui razão bastante para anular a decisão recorrida.
O Relator,
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Fong Man Chong
Processo n.º 650/2021
(Autos de recurso contencioso)
Data : 05/Maio/2022
Recorrente : A (A)
Entidade Recorrida : Secretário para a Segurança
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ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I – RELATÓRIO
A (A), Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando do despacho do Secretário para a Segurança, datado de 10/06/2021, que indeferiu o seu pedido de autorização de residência na RAEM, veio, em 27/07/2021, interpor o presente recurso contencioso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 3 a 8, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. 針對被上訴決定,司法上訴人認為存有事實認定錯誤及適用法律錯誤的瑕疵。
2. 被訴實體在被上訴決定中所持之事實依據有二,一是認為司法上訴人與其丈夫XBB沒有共同生活,二是認為因XBB正在服刑,司法上訴人申請居留許可與其團聚的目的不具有可行性,而且不具有澳門居民身份亦不妨害利害關係人前往監獄探視XBB及為其提供生活所需。
3. 針對被訴實體第一項事實依據,必須指出,司法上訴人與丈夫XBB存在真實的婚姻關係,而且在XBB到監獄服刑前一直共同生活。
4. 司法上訴人與XBB在2013年初已經同居,後來在2013年5月發現司法上訴人懷孕,夫妻均認為懷上了XBB的孩子。
5. 隨後司法上訴人與XBB在2013年7月8日結婚,而其後女兒XCC亦在2014年1月3日出生,從時間上可以顯示二人是因為司法上訴人懷孕而結婚。
6. 再者,女兒XCC與XBB同姓,假如婚姻為虛假,作為母親的司法上訴人不可能願意自己的女兒使用陌生男子的姓氏。
7. 本案卷宗內亦有不少司法上訴人、XBB及女兒的家庭照片以及家庭居所的照片,均可顯示夫妻二人婚姻關係的真實性以及共同生活的痕跡。
8. 由XBB在路環監獄開始服刑截至2020年1月,司法上訴人共探訪XBB56次,且司法上訴人多次向XBB提供日常用品以及現金存款,以讓XBB在路環監獄使用。
9. 如果是單純的假結婚,司法上訴人根本不會浪費時間、金錢和精力在XBB身上,而XBB亦不會願意在監獄與司法上訴人多次見面及接受司法上訴人提供的物品及金錢。
10. 以上種種,均已充份顯示司法上訴人與其丈夫XBB曾一起共同生活,以及夫妻之間的同甘共苦的舉動。
11. 基於此,對於被訴實體認為司法上訴人與XBB沒有共同生活,從而不符合第4/2003號法律第9條2款3項的前提,存有事實認定錯誤的瑕疵。
12. 根據《行政程序法典》第124條,謹請 法官閣下撤銷被上訴決定。
13. 至於被訴實體的第二項事實依據,司法上訴人亦不能認同。
14. 第一,申請家庭團聚時,無論是司法上訴人還是XBB根本沒有預想到日後XBB會在監獄服刑。
15. 申請家庭團聚的目的,只是夫妻二人及女兒可以一同到澳門一起生活,以及為女兒在澳門升學作打算,這亦是司法上訴人的合理期待。
16. 第二,透過澳門《基本法》第38條及第43條以及第6/94/M號法律《家庭政策綱要法》第1至3條所保護的基本權利的家庭權,其內涵包括保護家庭、維護家庭統一和穩定。
17. 而家庭團聚是基於人道關懷的理由,讓分隔兩地的夫妻不再分離,夫妻得以團聚並共同生活。
18. 必須指出,監獄服刑並不會妨礙家庭團聚的可行性。
19. 若司法上訴人獲批逗留許可,將便利司法上訴人以及正在澳門服刑的丈夫之間的溝通與關懷,使他們的情感以及家庭維繫方面更加穩固。
20. 故此,被訴實體認為司法上訴人的逗留許可申請不符合第4/2003號法律第9條2款3項的規定所指之目的是錯誤的,同時亦漠視了司法上訴人與XBB的家庭權以及家庭團聚的合理期待。
21. 被上訴決定存有適用法律錯誤,根據《行政程序法典》第124條,謹請 法官閣下撤銷被上訴決定。
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Citada a Entidade Recorrida, o Senhor Secretário para a Segurança veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 21 a 26, tendo formulado as seguintes conclusões:
1) 上訴人針對保安司司長於2021年6月10日作出的、不批准其居留許可申請的批示提起本司法上訴;
2) 在所提交的上訴狀中,上訴人指被上訴批示在認定事實和法律適用方面存在錯誤,認為按照《行政程序法典》第124條,屬可撤銷;
3) 上訴人認為,被上訴批示認定其與XBB沒有共同生活的情況,存在事實認定錯誤的瑕疵;
4) 經綜合分析有關的行政卷宗資料,包括上訴人與XBB所申報的住址、治安警察局的相關調查報告、兩人所作聲明筆錄的內容以及出入境紀錄等,被上訴批示認定上訴人與XBB在澳門沒有共同生活,且不能令行政當局相信兩人曾在中國內地一起生活,並未存在任何事實認定錯誤的情況;
5) 上訴人還指,被上訴批示認為上訴人藉申請居留許可與XBB團聚的目的不具有可行性,和認定上訴人即使不具有澳門居民身分亦不妨礙其探視XBB及在需要時為XBB提供生活所需,繼而認為不符合第4/2003號法律第9條第2款3項的規定,存有適用法律錯誤的瑕疵;
6) 根據資料顯示,XBB自2017年11月入獄後,上訴人多次到澳門監獄作探視、傳遞物品及存放現金,顯然,上訴人具有澳門居民身分與否非為其前往澳門監獄探視以及為XBB提供生活所需的前提,這正如被上訴批示所指;
7) 關於以家庭團聚作為申請居留許可的目的方面,本澳眾多的司法見解一貫認為,對於以家庭團聚為由提出的居留申請,但事實上卻並未與配偶一起在澳共同生活,毫無疑問使居留申請失去其意義;
8) 考慮到XBB目前正在澳門監獄服刑,毫無疑問,上訴人申請居留許可以便與XBB團聚的目的並不具有可行性;
9) 因此,不存在上訴人所指稱的法律適用錯誤的情況;
10) 基於不存在任何事實認定錯誤和法律適用錯誤之處,故此,被上訴決定亦無上訴人所指稱的可撤銷的瑕疵。
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O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o douto parecer de fls. 89 a 91, pugnando pelo improvimento do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – FACTOS
São os seguintes elementos, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
1. 司法上訴人與XBB在2012年底成為情侶,並在2013年初開始同居。
2. 司法上訴人與XBB於2013年7月8日在中國珠海市民政局登記結婚。(見行政卷宗第42頁)
3. 結婚後,司法上訴人與XBB在中國廣東省珠海市香洲區......大道...號......新城...棟...房的家庭居所居住。(見行政卷宗第11至23頁、第24至30頁以及第67至82頁的家庭合照及家庭居所的照片)
4. 於2014年1月3日,司法上訴人在澳門誕下女兒XCC,而司法上訴人與XBB一起到澳門民事登記局為XCC辦理出生登記。(見行政卷宗第62頁案件編號CR1-18-0368-PCC判決書經查明的事實第九點及第十點)
5. 在女兒出生後,司法上訴人、XBB及女兒XCC一同居住在上述位於珠海市的居所。(見行政卷宗第11至23頁、第24至30頁以及第67至82頁的家庭合照及家庭居所的照片)
6. 為了使司法上訴人來澳團聚,XBB向中國內地有權限當局為司法上訴人申請辦理來澳手續,隨後亦開展了通報澳門及由澳門身份證明局審批申請的程序。(見行政卷宗第61頁背頁案件編號CR1-18-0368-PCC判決書經查明的事實第五至七點)
7. 直至2017年,女兒XCC開始來澳上學,為方便照顧女兒,司法上訴人、XBB及女兒XCC居住在澳門......里......口......大廈...樓...的單位,周末會一起回到珠海的家庭居所居住。
8. 上述單位是XDD(XBB的哥哥)委託林連有(XBB的姐姐XEE的丈夫)去承租的,而XDD讓司法上訴人、XBB及女兒XCC在這個單位居住。
9. 2017年11月10日,XBB因涉及一宗販毒案件而被警方截獲。(見行政卷宗第62頁案件編號CR1-18-0368-PCC判決書經查明的事實第八點)
10. XBB在上述販毒案件自2017年11月11日起服刑,刑期為六年三個月。(見行政卷宗第44頁XBB在獄證明書)
11. 在2017年11月至2020年1月期間,司法上訴人共探訪了身在監獄的XBB56次。(見行政卷宗第31頁探訪許可證的資料以及第54頁懲教管理局局長在2020年2月27日發出的司法上訴人進出監獄資料)
12. 在探訪期間,司法上訴人按XBB的需要提供其所需的生活用品供XBB日常使用。(見行政卷宗第32至34頁背頁探訪傳遞物品清單以及現金存放單據)
13. 在澳門初級法院案件編號CR1-18-0368-PCC一案中,對於控告XBB及司法上訴人涉嫌假結婚而觸犯第6/2004號法律第18條第2款的「-偽造文件罪」,於2019年10月18日獲判無罪。(見行政卷宗第59至64頁案件編號CR1-18-0368-PCC判決書,判決內容在此視為全部轉錄)
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- O despacho recorrido tem o seguinte teor:
批示
事項:居留申請
利害關係人:A
利害關係人,內地居民,申請居留許可與丈夫團聚。
利害關係人先後兩次就行政當局不批准居留許可的意向表達意見,內容在此予以完全轉載。
根據卷宗所載治安警察局第7910/2017-P.222.03/4G號報告書內容,利害關係人的丈夫XBB當時報稱在澳門沒有固定住址,在內地居住於中山坦洲......大街...號。A在澳門居住於......里......口......大廈...樓...,內地的住址則為珠海......新城...期...棟......室。XBB承認無論在澳門還是在內地從沒有和A共同居住,而且,根據警方隨後的調查亦證實兩人在澳門並沒有共同生活。
經向負責調查的警員作出查詢,XBB當時反應正常,對答如流,和常人無異,不存在神智不清的情況。
2020年6月治安警察局對申請人夫婦在珠海的生活環境和相關情況分別向兩人作出了解。根據詢問筆錄和調查報告(在此視為完全轉戰),對於兩人曾經在一起生活存在極大疑問,特別是,兩人對於共同生活四年多的住宅單位(即所報稱的珠海......新城...期...棟......室)的間隔(X居然不知道主臥帶洗手間)、曾否共居於同一房間、X是否有陪同利害關係人產檢及是否曾照顧女兒,以及X手抱女兒坐於私家車的前後座位等的回答完全不一致,而這些情況並不是會隨著時間流逝而輕易淡忘的無關緊要的生活瑣碎。
事實上,就A和XBB是否共同生活,沒有甚麼比當事人本人的陳述更為直接和更為可信,因此,同意治安警察局的意見無須聽取利害關係人第二次聽證時所列證人的陳述。
目前,XBB正在路環監獄服刑。
由於利害關係人夫婦在澳門沒有共同生活,也不能令行政當局相信兩人曾在內地一起生活,再加上XBB現正在服刑,利害關係人申請居留許可與其團聚的目的不具有可行性。另外,即使不具有澳門居民身份亦不妨礙利害關係人前往監獄探視XBB,以及在需要時為其提供生活所需。
基上,經考慮第4/2003號法律第9條2款3項規定,決定不批准有關居留許可申請。
保安司司長
YYY
二零二一年六月十日
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IV – FUNDAMENTOS
A propósito das questões suscitadas pelo Recorrente, o Digno. Magistrado do MP junto deste TSI teceu as seguintes doutas considerações:
“(…)
1.
A, melhor identificada nos autos, veio interpor recurso contencioso do acto administrativo datado de 10 de Junho de 2021 praticado pelo Secretário para a Segurança que indeferiu o seu pedido de autorização de residência na Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China (RAEM), pedindo a respectiva anulação.
A Entidade Recorrida apresentou contestação na qual concluiu pela improcedência do recurso.
2.
(i)
A Recorrente requereu a autorização de residência na RAEM para se poder reunir ao seu marido, XBB. Tal autorização foi indeferida com base, essencialmente, em dois fundamentos. Em primeiro lugar, a Administração considerou que a Recorrente e o seu marido nunca coabitaram entre si, nem no Interior da China, nem na RAEM. Além disso, e este é o segundo fundamento do acto recorrido, ponderando que XBB se encontra a cumprir pena de prisão no Estabelecimento Prisional de Coloane, a Administração entendeu que a finalidade da reunião familiar não tinha viabilidade enquanto fundamento daquela autorização.
(ii)
Começa a Recorrente por imputar ao acto recorrido o vício do erro nos pressupostos de facto, alegando que manteve uma vida em comum com o XBB.
Cremos, no entanto, e salvo o devido respeito, que dos elementos recolhidos pela Administração no decurso do procedimento administrativo que culminou com o acto de indeferimento agora impugnado, resulta, até abundantemente, que, não obstante o vínculo jurídico do casamento que existe entre ambos, a Recorrente e o XBB não mantiveram, seja no Interior da China, seja em Macau, a verdadeira comunhão de vida que caracteriza o matrimónio.
Por outro lado, os depoimentos das testemunhas inquiridas pelo Tribunal não lograram, em nosso modesto entender, constituir contraprova com força bastante para abalar aquela conclusão, do mesmo modo não se mostrando suficiente para esse efeito a sentença de absolvição da prática do crime de falsificação de documento proferida no processo n.º CR1-18-0368-PCC em que foram arguidos XBB e a Recorrente.
Assim, demonstrando-se que a Recorrente, apesar do vínculo conjugal, não coabitou nem coabita com o seu marido, não enferma o acto do erro nos pressupostos de facto invocado pela Recorrente.
(iii)
O segundo fundamento do presente recurso consiste num alegado erro da Administração na aplicação da lei ao ter considerado que o pedido de autorização de residência da Recorrente não preenche a finalidade prevista no artigo 9.º, n.º 2, alínea 3) da Lei n.º 4/2003.
Salvo o devido respeito, não nos parece.
A norma do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 4/2003, nos termos da qual, «o Chefe do Executivo pode conceder autorização de residência na RAEM», é uma norma de competência cuja configuração estrutural que não é frequente, uma vez que lhe falta a parte da previsão ou da hipótese.
Na verdade, em geral, as normas e as normas de competência administrativa em particular, por isso que são normas com programação condicional, têm uma estrutura que comporta uma hipótese ou previsão na qual se estabelecem os pressupostos, ou seja, os factos da vida real e as situações jurídicas cuja ocorrência vai desencadear a intervenção administrativa e uma estatuição na qual se indica o conteúdo dessa intervenção, aquilo que a Administração pode ou deve fazer em face da situação verificada (cfr. PEDRO COSTA GONÇALVES, Manual de Direito Administrativo, Volume I, Coimbra, 2019, p. 173).
Ora, como dissemos, à norma do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 4/2003 falta a previsão dos pressupostos cuja verificação pode dar lugar à intervenção administrativa ali prevista, ou seja, à concessão da autorização de residência por parte do Chefe do Executivo. Estamos, pois, perante uma norma de competência que confere aquilo a que alguma doutrina designa de «discricionariedade aberta», uma vez que através dela, o Chefe do Executivo é investido no poder de proceder a uma «determinação substancial do interesse público», uma vez que, embora nela tal não esteja expressamente dito, está, porém, implícito que aquele órgão administrativo pode, por razões de interesse público ou de conveniência, conceder a autorização de residência em Macau. Mas a substanciação desse interesse é deferida, integralmente, à Administração. É o Chefe do Executivo que, segundo o seu critério, tem o poder de determinar ou identificar a presença de um interesse, de uma razão de mérito ou de oportunidade e, na sequência disso, caso assim o entenda, conceder a autorização de residência a quem a tenha requerido (os «aspectos» referidos no n.º 2 do artigo 9.º da Lei n.º 4/2003 não constituem verdadeiros pressupostos justificativos da intervenção administrativa em causa. Esta discricionariedade aberta, embora muito próxima da chamada «discricionariedade livre», não se confunde com esta e por isso, não obstante a sua elevada amplitude, o seu exercício não deixa de estar sujeito a critérios jurídicos e, portanto, nessa medida, a algum controlo judicial. Neste mesmo sentido, acolhendo o nosso entendimento e a propósito, justamente da norma do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 4/2003, veja-se o Acórdão do Tribunal de Última Instância de 19.03.2021, processo n.º 8/2021).
No caso em apreço, e na parte concretamente questionada pela Recorrente, a Administração entendeu ser de indeferir o pedido de autorização de residência por considerar que, dada a circunstância de o XBB se encontrar a cumprir pena de prisão no Estabelecimento Prisional de Coloane, a reunião familiar não teria viabilidade enquanto fundamento substantivo da concessão da autorização de residência, nada impedindo aquela, no entanto, de continuar a efectuar visitas, se assim o entender, sem que para isso se mostre necessária a falada autorização.
Significa isto, se bem interpretamos o acto administrativo recorrido, que, embora a finalidade invocada pela Recorrente para fundamentar os pedidos de autorização de residência tenha sido o reagrupamento familiar, a Administração considerou que, estando demonstrando no procedimento administrativo que o marido da requerente se encontra a cumprir pena de prisão, nenhum interesse público, nenhuma razão de mérito ou conveniência existe para justificar a concessão da autorização de residência na RAEM com tal fundamento.
Ora, como se sabe, a intervenção sindicante do Tribunal relativamente a este juízo administrativo cinge-se à verificação da observância dos chamados critérios jurídicos do exercício da discricionariedade, nomeadamente, os princípios gerais da actividade administrativa e em especial os princípios da imparcialidade e da proporcionalidade e bem assim o respeito pelos direitos fundamentais dos interessados.
Tendo isto presente, estamos em crer que o acto recorrido não infringiu tais critérios, não se mostrando ao contrário do que foi alegado no artigo 47.º da petição inicial do recurso, que o mesmo, de forma intoleravelmente desproporcionada ou parcial, tenha afectado direitos fundamentais da Recorrente ou sequer do seu filho ou de XBB, nomeadamente aqueles que estão consagrados nos artigos 38.º e 43.º da Lei Básica e nos artigos 1.º a 3.º da Lei n.º 6/94/M, de 1 de Agosto.
Além disso, porque estamos no âmbito do exercício de um poder discricionário, é sabido que não cabe ao Tribunal sindicar o mérito da decisão administrativa que considerou não se justificar uma autorização de residência com fundamento em reagrupamento familiar numa situação em que um dos cônjuges se encontra a cumprir pena de prisão. É à Administração e só a ela que, no exercício de valorações próprias e autónomas, compete avaliar, tendo em vista a concreta prossecução do interesse público, se, em tal situação, se justifica ou não autorizar a residência. Por isso, também não pode acolher-se, em nosso modesto entender, a invocação do vício de erro na interpretação da alínea 3) do n.º 2 do artigo 9.º da Lei n.º 4/2003 que foi feita pela Recorrente.
3.
Deve, pois, face ao exposto, ser julgado improcedente o presente recurso contencioso.
É este, salvo melhor opinião, o parecer do Ministério Público..”
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Quid Juris?
Ora, a leitura que o Digno. Magistrado do MP fez dos factos tem a sua lógica, só que, globalmente analisados os factos considerados provados, a conclusão a que chegamos será diferente, pois, de entre os outros, importa destacar os seguintes elementos provados:
“(…)
2. 司法上訴人與XBB於2013年7月8日在中國珠海市民政局登記結婚。(見行政卷宗第42頁)
3. 結婚後,司法上訴人與XBB在中國廣東省珠海市香洲區......大道...號......新城...棟...房的家庭居所居住。(見行政卷宗第11至23頁、第24至30頁以及第67至82頁的家庭合照及家庭居所的照片)
4. 於2014年1月3日,司法上訴人在澳門誕下女兒XCC,而司法上訴人與XBB一起到澳門民事登記局為XCC辦理出生登記。(見行政卷宗第62頁案件編號CR1-18-0368-PCC判決書經查明的事實第九點及第十點)
5. (…)
6. 為了使司法上訴人來澳團聚,XBB向中國內地有權限當局為司法上訴人申請辦理來澳手續,隨後亦開展了通報澳門及由澳門身份證明局審批申請的程序。(見行政卷宗第61頁背頁案件編號CR1-18-0368-PCC判決書經查明的事實第五至七點)
7. 直至2017年,女兒XCC開始來澳上學,為方便照顧女兒,司法上訴人、XBB及女兒XCC居住在澳門......里......口......大廈...樓...的單位,周末會一起回到珠海的家庭居所居住。
8. (…)
9. 2017年11月10日,XBB因涉及一宗販毒案件而被警方截獲。(見行政卷宗第62頁案件編號CR1-18-0368-PCC判決書經查明的事實第八點)
10. XBB在上述販毒案件自2017年11月11日起服刑,刑期為六年三個月。(見行政卷宗第44頁XBB在獄證明書)
11. 在2017年11月至2020年1月期間,司法上訴人共探訪了身在監獄的XBB56次。(見行政卷宗第31頁探訪許可證的資料以及第54頁懲教管理局局長在2020年2月27日發出的司法上訴人進出監獄資料)
12. 在探訪期間,司法上訴人按XBB的需要提供其所需的生活用品供XBB日常使用。(見行政卷宗第32至34頁背頁探訪傳遞物品清單以及現金存放單據)
13. 在澳門初級法院案件編號CR1-18-0368-PCC一案中,對於控告XBB及司法上訴人涉嫌假結婚而觸犯第6/2004號法律第18條第2款的「-偽造文件罪」,於2019年10月18日獲判無罪。(見行政卷宗第59至64頁案件編號CR1-18-0368-PCC判決書,判決內容在此視為全部轉錄)
(…)”.
Perante este quadro factual, principalmente a decisão de absolvição da prática pelo cônjuge (XBB) da Recorrente de um crime de falsificação de documentos (por motivo de casamento falso), é de admitir que existem relações matrimoniais entre a Recorrente e o cônjuge (XBB) por força do artigo 579º do CPC, à Entidade Recorrida cabe alegar e provar a inexistência de tais relações. O que não foi feito, aliás, as provas carreadas pela Entidade Recorrida não são suficientes para nos convencer de que inexista tal casamento, subsistindo a presunção decorrente do normativo citado. Eis também uma questão da convicção do julgador.
Por outro lado, o depoimento prestado pelas testemunhas (ex. a irmã do cônjuge (XBB) da Recorrente) revela que a Recorrente tem sido tratada pelos familiares do cônjuge como verdadeira membro da família e nas festividades chinesas havia convívio entre a Recorrente e os familiares, o que reforça a nossa ideia de que se mantém a relação matrimonial entre a Recorrente e o cônjuge, não obstante este estar a cumprir uma pena de prisão, existindo assim um erro nos pressupostos de facto quando a Entidade Recorrida decidiu não renovar o BIRM da Recorrente, alegando a inexistência de relação matrimonial, o que é razão bastante para anular a decisão recorrida.
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Síntese conclusiva:
Perante a sentença de absolvição da prática do crime de falsificação de documento (por motivo de alegado casamento falso) proferida num processo-crime, em que foram arguidos o cônjuge e a Recorrente, e, atendendo à presunção prevista no artigo 579º do CPC, é de admitir a existência de vínculo matrimonial entre a Recorrente e o seu cônjuge, já que os indícios carreados pela Entidade Recorrida não são bastantes para ilidir tal presunção, ao decidir não renovar o BIRM da Recorrente, alegando que esta não tinham comunhão de vida com o seu cônjuge, há assim erro nos pressuposto de facto, o que constitui razão bastante para anular a decisão recorrida.
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Tudo visto, resta decidir.
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V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em julgar procedente o recurso, anulando-se a decisão recorrida.
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Sem custas por isenção subjectiva.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 05 de Maio de 2022.
(Relator)
Fong Man Chong
(Segundo Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong
Mai Man Ieng
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