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Processo nº 4/2022
Data do Acórdão: 12MAIO2022


Assuntos:

Notificações na matéria fiscal
Dilação
Contribuinte residente fora da RAEM


SUMÁRIO

A dilação prevista na regra geral consagrada no artº 75º do CPA não se aplica nas notificações por virtude do disposto em legislação de natureza fiscal efectuadas de acordo com o disposto na parte final do artº 3º/3 do Decreto-Lei n.º 16/84/M.


O relator



Lai Kin Hong

Processo nº 4/2022


Acórdão em conferência na Secção Cível e Administrativa no Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I

No âmbito dos autos de recurso contencioso fiscal nº 3006/21-CF, que corre os termos no Tribunal Administrativo, foi proferida a seguinte sentença julgando improcedente o recurso:
I. Relatório
  Recorrente A LIMITED, melhor identificada nos autos,
  interpôs o presente recurso contencioso fiscal contra
  Entidade Recorrida COMISSÃO DE REVISÃO DO IMPOSTO COMPLEMENTAR DE RENDIMENTOS DA DIRECÇÃO DOS SERVIÇOS DE FINANÇAS que, pela sua deliberação tomada em 3 de Dezembro de 2020, não se pronunciou sobre a sua reclamação apresentada em 16/11/2020, e manteve a matéria colectável do exercício de 2019 em MOP20,886,900.00.
  Alegou a Recorrente, com os fundamentos a fls. 24 a 42 dos autos, em síntese:
  - a tempestividade da reclamação apresentada contra a fixação de rendimentos.
  Concluiu, pedindo a anulação do acto recorrido e a consequente condenação da Recorrida na tomada da decisão sobre a reclamação apresentada e na prática dos actos necessários à correcta decisão.
*
  A Recorrida contestou, com os fundamentos a fls. 111 a 122 dos autos, pugnando-se pela improcedência do recurso.
*
  Ambas as partes apresentaram alegações facultativas, mantendo as conclusões anteriormente formuladas.
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  No parecer final, o digno Magistrado do Ministério Público emitiu o parecer com fundamentos a fls. 175 a 177 dos autos, promovendo que fosse julgado improcedente o recurso, com a absolvição da Recorrida dos pedidos, cujo teor se transcreve no seguinte:
  “倘若沒有理解錯誤,本案唯一需要解決的問題,就是司法上訴人A LIMITED向被訴實體財政局所得補充稅複評委員會就其在2019年度評定的可課稅收益的金額提出的聲明異議是否逾期提出,尤其是對其情況是否適用《行政程序法典》第75條規定的延期期間。
*
  我們的意見如下:
  關於司法上訴人主張的延期,根據《行政程序法典》第75條規定:
  “如利害關係人居住在外地或身處外地,則法律在未考慮此情節下所定之期間,在下列期間經過後方開始進行:(…)”
  換言之,只有當相關法律在規範相關行為期間及計算規則時沒有考慮到利害關係人的住所不在澳門的情節時,才有需要適用上述延期的制度。
*
  關於稅務通知的規則,主要由第16/84/M號法令及第15/96/M號法律規範。
  根據第16/84/M號法令(沒有正式中文公報版本)第3條規定:
  “1. Os avisos ou notificações deverão ser enviados para a residência indicada pelo contribuinte nas declarações por si apresentadas no âmbito do respectivo imposto ou contribuição.
  2. Quando haja sido indicada mais de uma residência, é suficiente o envio da notificação ou aviso para uma delas.
  3. Se o contribuinte tiver domicílio fora do Território, ficam dispensadas as notificações ou avisos que lhe devam ser enviadas, excepto se aquele, nas respectivas declarações, tiver indicado endereço para efeitos fiscais em Macau.
  4. Na hipótese prevista na primeira parte do número anterior, o conteúdo do aviso ou da notificação será afixado em edital na respectiva repartição de Finanças concelhia, considerando-se para todos os efeitos que o contribuinte teve dele conhecimento na data da respectiva afixação.”
  從上述條文可見,立法者針對稅務程序的通知手續的效率要求似乎比一般行政程序的要求更高,因為上述條文清楚規定,行政當局只需按照納稅人在遞交有關稅務範圍的聲明書內指出的任何一項住址或在澳門的通訊地址以單掛號郵遞方式作出相關通知或通傳,換言之,即使通知或通傳不成功,行政當局似乎是沒有義務調查納稅人的最新下落及以其他方式作出通知或通傳;而且,如果納稅人申報的住址不在澳門,亦沒有提供在澳門的通訊地址,行政當局就不用發出信件,而是可以直接以告示形式將通知或通傳的內容張貼於財政局,並且在有關張貼當日視為納稅人已知悉有關內容。
  按照上述法令的內容,立法者清楚就納稅人的住址或通訊地址是否在澳門或外地的情況作出規範,那麼,除有更好理解之外,我們看不到就第16/84/M號法令規範的事宜有適用《行政程序法典》第75條規定的延期期間的可能。
  另外,根據第15/96/M號法律第3條(通知及計算期限的規則)規定:
  “一、三月二十四日第16/84/M號法令所定出的通知及通告制度,在稅務上不採用行政程序法典第六十六條及第六十九條的規定。
  二、為着行政程序法典第七十一條a項規定的效力,三月二十四日第16/84/M號法令第二條第三款規定所推定通知的發出,即視作行政申訴期限的開始。”
  上述條文提及的行政程序法典,當然是指已被廢止的舊《行政程序法典》,而單純按照上述條文的援引,似乎第15/96/M號法律並沒有排除適用關於延期的規定,因為關於延期的條文是規定在舊《行政程序法典》第72條。
  然而,上述條文第2款清楚引用了第16/84/M號法令第2條第3款,也就是說,只要行政當局有按照第16/84/M號法令的規則以單掛號方式作出通傳或通知(要麼納稅人申報住址在澳門,要麼納稅人申報住址不在澳門,但有提供在澳門的通訊地址),則不管納稅人的住址是不是在澳門,提出行政申訴的期限也必須在相關推定通知之日起開始計算!也就是說,第15/96/M號法律作出上述規範時實際上也考慮了納稅人的住所是不是在澳門的情節。
  故此,我們認為,在稅務範圍的行政申訴的期限不適用《行政程序法典》第75條規定的延期。
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  另外,司法上訴人似乎還辯稱其在相關申報表及申報書提供的澳門地址只是用作通訊用途,不能排除適用《行政程序法典》第75條規定的延期;但我們認為這沒有道理,因為司法上訴人亦清楚表示其提供在澳門的通訊地址是為了避免出現第16/84/M號法令第3條第4款規定的告示通知或通傳的情況,亦即司法上訴人提供相關的通訊地址的目的正好就是第16/84/M號法令第3條第3款後部分規定的為着稅務之目的而提供的澳門地址,被訴實體以該澳門地址向司法上訴人以單掛號郵遞方式作出通知完全符合第16/84/M號法令及第15/96/M號法律的規定,並須適用相關行政申訴期限的計算方法。
*
  故此,被訴實體在2020年9月30日以單掛號郵遞方式將2019年度的收益評定通知書郵寄給司法上訴人提供的澳門通訊地址,司法上訴人依法在5天後推定獲得通知,即2020年10月5日,並可在15天內提出申駁,但司法上訴人僅在2020年11月16日才提出申駁,明顯已超過法定期限,相關申駁屬逾期提出。
  基於此,我們認為,被訴行為不存在上訴人主張的違法瑕疵,建議裁定司法上訴的理由不成立,維持被訴行為。
  基於司法上訴人提出的撤銷請求不成立,則其一併提出的命令作出依法應為之行政行為的請求亦應予不成立。”
*
  Este Tribunal é o competente em razão da matéria e da hierarquia.
  As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária e de legitimidade “ad causam”.
  O processo é o próprio.
  Inexistem nulidades, ou questões prévias que obstem a apreciação “de meritis”.
***

II. Fundamentação

  1. Matéria de facto provada
  Considera-se provada por documentos a seguinte factualidade pertinente:
  - Em 31/3/2020, a ora Recorrente apresentou a declaração do Imposto Complementar de Rendimentos – Grupo “B”, modelo M/1, para efeitos de fixação do imposto complementar de rendimentos referente ao exercício de 2019 e nela indicou como seu endereço de aviso – XXXXXXXXXXXXXXXXX, MACAU (cfr. consta de fls. 2 e v do P.A.).
  - Nessa declaração, a Recorrente consignou que teve lucro tributável o resultado do exercício no valor de MOP20,886,919.97 (ibid.).
  - Em 10/6/2020, a Comissão de Fixação fixou o rendimento colectável no valor de MOP20,886,900.00 (cfr. consta de fls. 1 do P.A.).
  - Em 17/7/2020, o Director dos Serviços de Finanças procedeu à liquidação do imposto, determinando a colecta no valor de MOP2,134,428.00 (cfr. consta de fls. 3 do P.A.).
  - Em 30/9/2020, ao referido endereço indicado pela Recorrente foi efectuada a notificação sob registo postal da matéria colectável fixada mediante o modelo M/5 e esta apresentou, em 16/11/2020 a reclamação da fixação da matéria colectável dirigida à Comissão de Revisão do Imposto Complementar (cfr. consta de fls. 53 a 68v do P.A.).
  - Em 3/12/2020, a Comissão de Revisão do Imposto Complementar deliberou não se pronunciar por extemporaneidade da reclamação, tendo sido a Recorrente notificada mediante o ofício n.º 011/CRIC/2020, de 14 de Dezembro de 2020, cujo teor se transcreve no seguinte:
   “Analisada a reclamação interposta pela contribuinte supra referenciada, deliberou a Comissão de Revisão, não se pronunciar, uma vez que o prazo da entrega da reclamação é de 20 dias sobre a data do registo do aviso postal enviado ao contribuinte (n.º 3 do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 16/84/M de 24 de Março e dos artigos 3º e 4º da Lei n.º 15/96/M de 12 de Agosto). Conforme os dados da Administração Fiscal foi enviado o modelo M/5 do rendimento colectável da ora reclamante e processado pelos Correios no dia 30/9/2020. E só no dia 16/11/2020 é que a contribuinte procedeu à entrega da referida reclamação.
  Nesta conformidade, mantém-se o rendimento colectável de MOP$ 20,886,900.00.
  Nos termos do artigo 68º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, informa-se que da deliberação de Comissão de Revisão, cabe recurso contencioso de anulação – n.º 2 do artigo 80º do Regulamento do Imposto Complementar de Rendimentos.
  O recurso acima referenciado é interposto para o Tribunal Administrativo – artigo 82º do mesmo diploma.
  O prazo para a interposição do recurso é de 45 dias contados da notificação – artigo 7º da Lei n.º 15/96/M de 12 de Agosto.
  Desta deliberação cabe ainda reclamação graciosa, nos termos do artigo 76º do Regulamento do Imposto Complementar de Rendimentos, a dirigir a esta Comissão de Revisão, no prazo de 15 dias, conforme o disposto no artigo 77º do mesmo Regulamento.” (cfr. consta de fls. 142v e 143 do P.A.).
➢ Em 1/2/2021, a Recorrente interpôs o presente recurso contencioso fiscal.
***

  2. O direito aplicável
  
  Como se vê, a única questão cuja resposta urge encontrar aqui consiste em saber se a reclamação interposta em 16/11/2020 da fixação da matéria colectável foi ou não tempestiva.
  
  Na tese da ora Recorrente, tal reclamação foi tempestiva pelas razões que se sintetiza no seguinte:
  - A notificação da fixação de rendimento deveria ocorrer em 5/10/2020, no quinto dia posterior ao registo postal da notificação de 30/9/2020;
  - À parte disso, tendo a Recorrente sua sede em país fora da Ásia, a contagem do prazo de 15 dias para a apresentação da reclamação previsto no artigo 4.º da Lei n.º 15/96/M, de 12 de Agosto, apenas deveria iniciar finda a dilação de 30 dias prevista no artigo 75.º, alínea c) do CPA;
  - Aliás, o facto de a Recorrente ter indicado um endereço de Macau na sua declaração de início de actividade não afasta a dilação, apenas tem por efeito prevenir a dispensa de notificação pela via postal prevista no artigo 3.º, n.º 3 do DL n.º 16/84/M, de 24 de Março.
  
  Vejamos.
  
  Desde logo, estando em causa o acto da fixação do rendimento colectável, o artigo 43.º, n.º 3 do Regulamento do Imposto Complementar de Rendimentos (doravante designado por RICR), aprovado pela Lei n.º 21/78/M de 9 de Setembro, com nova redacção introduzida pelo DL n.º 37/84/M de 28 de Abril, impõe a sua notificação ao contribuinte “através de aviso conforme o modelo M/5, que será enviado sob registo postal.” Assim, por força do artigo 1.º do DL n.º 16/84/M, quanto ao modo como se deve proceder à notificação ou aviso deste acto, dá-se lugar à aplicação do regime previsto neste diploma.
  
  Os artigos 2.º e 3.º do DL n.º 16/84/M têm a seguinte redacção:
“Artigo 2.º
  1. As notificações ou avisos, referidos no artigo anterior, serão efectuados sem aviso de recepção.
  2. Na emissão de qualquer aviso ou notificação mencionar-se-á no canto superior esquerdo do seu rosto ou do correspondente sobrescrito, o serviço competente, bem como o nome do respectivo funcionário, que assinará estas menções.
  3. As notificações e avisos efectuados nos termos dos números anteriores, presumem-se feitos no quinto dia posterior ao do registo postal, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja.
  4. A presunção do número anterior só pode ser ilidida pelo avisado ou notificado quando o facto da recepção do aviso ou notificação ocorra em data posterior à presumida, por razões imputáveis aos serviços postais, para o que aqueles requererão que, à sua custa, seja requisitada aos mesmos serviços informação sobre a data em que foi promovida a entrega.

Artigo 3.º
  1. Os avisos ou notificações deverão ser enviados para a residência indicada pelo contribuinte nas declarações por si apresentadas no âmbito do respectivo imposto ou contribuição.
  2. Quando haja sido indicada mais de uma residência, é suficiente o envio da notificação ou aviso para uma delas.
  3. Se o contribuinte tiver domicílio fora do Território, ficam dispensadas as notificações ou avisos que lhe devam ser enviadas, excepto se aquele, nas respectivas declarações, tiver indicado endereço para efeitos fiscais em Macau.
  4. Na hipótese prevista na primeira parte do número anterior, o conteúdo do aviso ou da notificação será afixado em edital na respectiva repartição de Finanças concelhia, considerando-se para todos os efeitos que o contribuinte teve dele conhecimento na data da respectiva afixação.”

  Como é fácil de constatar, o legislador nas duas normas supracitadas determinou como se deve efectuar as notificações do acto de natureza fiscal e quando se considera as notificações como efectuadas, conforme as hipóteses de ter o contribuinte ou não residência em Macau.
  - Se o contribuinte tiver a residência em Macau e tiver indicado esta residência nas declarações por si apresentadas no âmbito do respectivo imposto ou contribuição (no caso do contribuinte do Imposto Complementar de Rendimentos, os contribuintes sendo pessoa colectiva devem mencionar nas declarações anuais “a sede ou estabelecimento principal do Território” – conforme previsto no artigo 10.º, n.º 2, alínea a) do RICR), a notificação efectuada por carta registada e remetida para aquela residência indicada, presume-se efectuada no “quinto dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte nos casos em que o referido terceiro dia não seja dia útil” – cfr. os artigos 2.º, n.ºs 3 e 4 e 3.º, n.º 1 do dito diploma legal;
  - Se o contribuinte tiver a residência fora de Macau, e não obstante tiver indicado endereço em Macau para efeitos fiscais, valerá, para a notificação dos actos tributários, a mesma regra acima referida – cfr. o artigo 3.º, n.º 3 do dito diploma legal (Tratando-se da cobrança do imposto complementar de rendimentos, a prévia indicação de um endereço em Macau nas declarações da contribuinte resultou ainda da exigência legal plasmada no artigo 12.º, n.º 4 do RICR, nos termos dos quais “Quando o contribuinte tenha domicílio ou sede fora do Território, da declaração modelo M/1 deverá constar para efeitos fiscais, a indicação de um endereço em Macau, sem a qual a respectiva declaração se considerará como não apresentada.”);
  - Se o contribuinte tiver a residência fora de Macau, sem que no entanto tenha indicado o seu endereço em Macau para efeitos fiscais, ficam relativamente a ela dispensadas as notificações, procedendo-se, ao invés disso, à afixação em edital do conteúdo do aviso ou da notificação na respectiva repartição de Finanças. Neste caso, considera-se o contribuinte notificado na data da respectiva afixação – cfr. o artigo 3.º n.ºs 3 e 4 do dito diploma legal.

  No caso dos autos em apreço, é incontroverso que a Recorrente, ao momento da apresentação da sua declaração anual em 31/3/2020, tinha indicado nela um endereço –“XXXXXXXXXXXXXXXXXX, Macau”. Tenha ou não a mesma sua sede societária em Macau, tal indicação efectuada deve, necessariamente, relevar para os efeitos fiscais, nos termos do disposto das normas referidas.
  
  Nesta linha, uma vez que a notificação do rendimento colectável foi efectuada por registo postal e mais do que disso, foi, comprovadamente, remetida para o endereço indicado nas declarações feitas no âmbito do imposto complementar de rendimentos, é suficiente para operar o funcionamento da presunção prevista no citado artigo 2.º, n.º 3 do DL n.º 16/84/M. Neste caso, considera-se, em favor da notificanda, ocorrida a notificação da fixação de rendimento em 6/10/2020, isto é no primeiro dia útil seguinte ao quinto dia posterior ao do registo postal (porque este 5/10/2020 recaiu no dia de tolerâncias do ponto aos trabalhadores de Administração Pública aprovado por despacho do Chefe do Executivo de 5/6/2019). Foi o que defendeu a própria Recorrente.
  
  Porém, o que é incompreensível e paradoxal no nosso caso, é que a mesma, quem pretendeu aproveitar aquele “benefício” do prazo concedido pela presunção legal, a partir, precisamente, de uma notificação postal dirigida ao endereço por si indicado, chegou a negar a relevância fiscal desta indicação já feita, dizendo que a mesma “tem, como único propósito a viabilização das comunicações com a DSF, prevenindo a dispensa de notificação pela via postal ao abrigo do n.º 3, do artigo 3.º do DL n.º 16/84/M” e defendendo, ao mesmo tempo, a introdução do acréscimo do tempo em virtude da dilação prevista no artigo 75.º do CPA, “enquanto a faculdade de indicar endereço para envio de avisos e conhecimentos garante que as notificações ao contribuinte estrangeiro continuam a ser realizadas pela via postal, o artigo 75.º do CPA implica o adiamento no início de contagem de prazos facultando, na prática, um acréscimo de tempo para que esses contribuintes possam efectivar o seu direito de defesa apesar de se encontrarem radicados no exterior, pelo que aquela faculdade não preclude esta dilação.” (cfr. se alega nos artigos 35.º e 37.º da p.i.)

  Como vimos atrás, tanto as normas especiais previstas pelo DL n.º 16/84/M, como as correspondentes no próprio RICR, introduziram uma regulamentação exaustiva conforme os contribuintes domiciliados em Macau ou fora, em matéria de notificação dos actos tributários. Inexiste nenhuma margem, face às normas vigentes, para se recorrer subsidiariamente aos preceitos legais constantes do CPA, designadamente, o artigo 75.º onde se prevê a dilação na contagem do prazo para os interessados que residirem ou se encontrarem fora de Macau. Evidentemente, em caso da aplicação deste preceito, tornar-se-ia esvaziada da utilidade da indicação de endereço exigida nas normas fiscais, que tiveram em vista, justamente, acautelar a eficácia dos actos tributários praticados relativamente aos contribuintes sem domicílio em Macau.
  
  Nestes termos expostos, deve-se improceder o recurso interposto.
*
  Quanto ao pedido condenatório da Recorrente cumulado neste recurso, no sentido de ser determinada na tomada da decisão sobre a reclamação apresentada, em substituição do acto recorrido, cumpre dizer o seguinte:
  A figura jurídica da cumulação de um pedido principal de impugnação anulatória com um outro pedido de condenação, prevista no artigo 24.º, n.º 1, alínea a) do CPAC não foi concebida para qualquer recurso contencioso, mas trata-se de um instrumento próprio para impugnar apenas os actos positivos de conteúdo ambivalente, por ser mais eficaz e adequado. (cfr. neste sentido, VIRIATO LIMA e ÁLVARO DANTAS, Código de Processo Administrativo Contencioso, Anotado, CFJJ, 2015, p. 71)
  
  Quando, como sucedeu no caso vertente, o recurso contencioso tenha por objecto um acto de conteúdo meramente negativo – ou seja, o acto que rejeitou a pretensão da reclamação interposta por causa da intempestividade, segundo a norma do artigo 160.º, alínea d) do CPA – não é possível neste recurso a cumulação do pedido de determinação da prática do acto devido, além da razão acima exposta, por ser incompatível com o disposto da norma do art.º 103.º, n.º 2 do CPAC, onde se dispõe que “A acção prevista no número anterior apenas pode ser proposta quando do indeferimento tácito ou do acto administrativo praticado não tenha sido interposto recurso contencioso.”

  Dito por outros termos, quando tenha sido interposto recurso contencioso, se não é possível a propositura de uma outra acção principal para obter a condenação na prática de acto legalmente devido, então a lógica congruente imporá também que seja afastada a possibilidade da cumulação do mesmo pedido no recurso de anulação.
  
  Portanto, seja ou não o pedido cumulado efectivamente fundado, o que nos impõe neste caso, é a absolvição da instância da Recorrida quanto a este pedido pela cumulação ilegal em violação do disposto do artigo 24.º, n.º 1, alínea a) do CPAC.
***

  III. Decisão
  Assim, pelo exposto, decide-se:
  - Julgar improcedente o presente recurso contencioso com a consequente manutenção do acto recorrido.
  - Absolver a Recorrida da instância quanto ao pedido da condenação na prática de acto administrativo legalmente devido.
*
  Custas pela Recorrente, com taxa de justiça de 6UC.

Não se conformando com essa sentença, veio a recorrente A Limited recorrer da mesma concluindo que:
A. O presente recurso tem por objecto a Sentença proferida pelo Tribunal a quo na parte em que esta julgou improcedente o recurso contencioso apresentado (o "Recurso Contencioso") e decidiu manter o acto recorrido, nos termos do qual a Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos (a "Comissão de Revisão"), deliberou não se pronunciar sobre a reclamação contra a fixação do rendimento colectável relativo ao exercício de 2019, no montante de MOP20.886.900,00, com base na sua suposta extemporaneidade.
B. A questão central do presente recurso é, fundamentalmente, a de saber se as dilações previstas no artigo 75º do CPA se mantêm aplicáveis aos contribuintes sem sede ou representação em Macau, ou se, pelo contrário, este "benefício" deixa de lhes ser aplicável, por e simplesmente, porque estes se veem obrigados por lei a facultar um endereço para efeitos de recepção de avisos fiscais em Macau, sob pena de a mesma notificação se fazer por via edital.
C. A notificação é um acto ou documento pelo qual se transmite a alguém um facto que lhe diz respeito ou se lhe comunica a necessidade de participar em determinada diligência ou de exercer certo direito.
D. Por seu turno, a dilação trata-se de um verdadeiro prazo - designado prazo dilatório -, o qual, atendendo a determinadas situações que reclamam tratamento específico, difere para um momento posterior o inicio da contagem do prazo geral aplicável ao caso - designado prazo peremptório -, acumulando-se a este e contando-se como um só.
E. Tal como no regime processual civil, o legislador administrativo consagrou, no artigo 75º do CPA, prazos dilatórios sempre que a pessoa a citar/notificar tenha residência ou se encontre em lugar fora de Macau, o que traduz a intenção do legislador de colmatar, por via da dilação as dificuldades acrescidas e decorrentes da circunstância do interessado se ver obrigado a intervir em processo que decorre num local em que ele não reside, o que, naturalmente, prejudica o exercício da sua defesa.
F. Assim, embora tenha uma natureza distinta da notificação, com ela não se confundido, a dilação cumpre uma função complementar daquela, assegurando a possibilidade efectiva de a pessoa notificada poder exercer os seus direitos substantivos ou processuais, pela concessão de um prazo adicional que visa compensar uma outra circunstância que pesa desfavoravelmente na possibilidade efectiva de exercício daqueles direitos, in casu, a distância geográfica.
G. DL n.º 16/84/M de 24 de Março consagra o regime jurídico a que devem obedecer as notificações e avisos dos actos de natureza fiscal, limitando-se a regular aspectos respeitantes à forma das notificações e avisos, às menções a efectuar, bem como a sua perfeição e o local onde devem ser efectuadas.
H. No que diz respeito a contribuintes estrangeiros, as únicas realidades acauteladas pelo DL n.º 16/84/M são as respeitantes ao modo (registo postal sem aviso de recepção ou via edital) e ao local de realização das notificações e avisos (afixação na repartição de finanças ou envio para o endereço indicado para efeitos fiscais em Macau) a efectuar a esses contribuintes.
I. Por conseguinte, o DL n.º 16/84/M de 24 de Março não contém uma regulamentação exclusiva, sequer, do regime das notificações, muito menos um regime que exclua logicamente a aplicação das normas relativas às dilações, previstas no art. 75º do CPA. Tal diploma surge num contexto histórico em que ainda não existia sequer um Código de Procedimento Administrativo ou lei em vigor que regulamentasse, em termos gerais, em matéria fiscal ou administrativa, o regime das notificações dos actos tributários.
J. De então para cá, vários diplomas, incluindo dois Códigos de Procedimento Administrativo, que introduziram desenvolvimentos e aperfeiçoamentos significativos que complementam o DL 16/84/M e que indiscutivelmente se aplicam. Entender, conforme afirma o Tribunal recorrido, que o DL 16/84/M regula de forma exaustiva todas as matérias atinentes às notificações por força de um suposto princípio de especialidade seria ignorar toda a evolução jurídica e conduziria a resultados manifestamente inaceitáveis.
K. A conclusão de que o DL16/84/M não regula de forma exaustiva (nem essa foi a sua pretensão) todas as matérias respeitantes às notificações e avisos fiscais é demonstrada designadamente em relação às seguintes matérias:
a) A definição dos actos que devam ser notificados aos particulares, uma vez que tal matéria é ditada pelas normas fiscais aplicáveis às específicas relações jurídicas tributárias.
b) O conteúdo das notificações em matéria tributária não prescinde das exigências previstas no artigo 70º do CPA, não obstante o disposto no artigo 2º, nº 2, do DL 16/84/M dispor sobre alguns requisitos (adicionais) da notificação.
c) A duração e dilação dos prazos para os particulares exercerem os direitos (ou cumprirem os deveres) relativos aos actos notificados é matéria que não se encontra regulada no DL 16/84/M.
L. Daí que, ao limitar-se a regular questões relacionadas com a sua forma, perfeição e local de realização das notificações e avisos, o DL n.º 16/84/M não afasta a aplicação subsidiária do CPA para todas as situações juridicamente relevantes a que o diploma não dá resposta, designadamente, quanto à aplicação das dilações previstas no artigo 75º do CPA, e aplicáveis aos casos em que o interessado não resida ou não se encontre na Região Administrativa Especial de Macau.
M. Tal é expressamente confirmado pelo disposto no artigo 3º, nº 1, da Lei n.º 15/96/M de 12 de Agosto, que veio expressamente afastar "a aplicação, em matéria fiscal, do disposto nos artigos 66.º e 69.º do Código do Procedimento Administrativo (correspondentes aos actuais artigos 69º e 72º do CPA vigente), do que resultam duas conclusões óbvias:
i. A primeira, é que ao contrário do que argumenta o Tribunal a quo na Sentença, o DL n.º 16/84/M de 24 de Março não é "exaustivo", caso contrário, o legislador não teria sentido a necessidade de, doze anos após a publicação desse diploma, vir estipular que um par de normas do CPA não são aplicáveis em sede de procedimento fiscal; e
ii. A segunda conclusão, é que, se o legislador afastou somente os artigos 66º e 69º do CPA, os restantes continuam a ser aplicáveis em matéria fiscal, sempre que tal se revele adequado.
N. Por conseguinte, o artigo 75º do CPA, que consagra as dilações aplicáveis aos interessados que residam ou se encontrem fora de Macau, mantém-se aplicável, pois que a Lei n.º 15/96/M de 12 de Agosto não o inseriu no elenco de normas que considera afastadas no âmbito do procedimento fiscal.
O. Se assim é em abstracto, importa então apurar se, em concreto e considerando a ratio da norma, o artigo 75º do CPA se deverá continuar quando os contribuintes não residentes indicam uma morada, para efeitos fiscais, na RAEM.
P. Decorre do artigo 8º do Código Civil, que embora se deva basear na letra da lei, a tarefa de interpretação deve ir para além do elemento literal desta, devendo ter em conta, nomeadamente, a razão de ser da norma e os fins por ela visados, bem como a unidade do sistema jurídico.
Q. Com o devido respeito, o Tribunal recorrido lavra em profundo equívoco quando considera que (sic) "em caso de aplicação [do artigo 75º do CPA] tornar-se-ia esvaziada de utilidade [d]a indicação de endereço exigida nas normas fiscais, que tiveram em vista, justamente acautelar a eficácia dos actos tributários praticados relativamente aos contribuintes sem domicílio em Macau". Com efeito, a eficácia do acto administrativo, atribuída pela perfeição do acto de notificação, não se confunde, esgota ou colide com a atribuição de um prazo dilatado para o exercício de direitos por quem não tem domicílio na RAEM, por forma a superar as dificuldades inerentes à distância geográfica com o lugar onde decorre o procedimento.
R. O propósito do artigo 75º do CPA, tal como abundantemente referido pela doutrina e jurisprudência, quer da RAEM, quer comparada, é a de "compensar" as dificuldades inerentes à distância geográfica, à diferença de ordenamentos jurídicos, de língua, e à necessidade de encontrar, na RAEM, o apoio necessário para exercer os direitos relativos ao acto notificando.
S. Tal doutrina determina que, quando os interessados residam ou se encontrem fora de Macau, as dilações são sempre de aplicar, a não ser que o respectivo prazo já atenda a essa circunstância, i.e., já contemple uma extensão do prazo, por forma a compensar o facto desses sujeitos terem residência ou sede fora de Macau, ou não se encontrarem no Território.
T. É pois, do senso comum, que as dificuldades práticas daqueles que, não tendo sede ou residência em Macau, se veem obrigados a intervir em procedimento administrativo local, são incomparavelmente superiores às daqueles que aqui residem, deixando-os expostos aos riscos do esgotamento do prazo e da preclusão dos seus direitos. seguro dizer, portanto, que a ratio do artigo 75º do CPA é o de possibilitar um exercício efectivo dos direitos de defesa por parte daqueles que não se encontram em Macau, através do adiamento do início da contagem dos prazos a que se encontram adstritos, bem como o de garantir condições de plena igualdade entre tais sujeitos e os que aqui residem.
U. Tais dificuldades e necessidade da respectiva tutela não são afastadas quando, nos termos do artigo 3º do DL n.º 16/84/M, o contribuinte haja facultado um "endereço para efeitos fiscais em Macau", caso em que a notificação será endereçada para esse local. A alternativa para o contribuinte que não tenham domicílio na RAEM ser notificado por via edital ou indicar uma morada na RAEM para onde possa ser enviada a notificação postal. Isto porque o legislador afastou expressamente a notificação dos actos para fora da RAEM.
V. Tal norma visa a simplificação do procedimento tributário, dispensando a DSF a ter que proceder ao envio de correio para outras jurisdições, o que levaria a que o acto de notificação ficasse à merce da eficiência de serviços postais estrangeiros.
W. No entanto, a mera circunstância de o DL n.º 16/84/M conferir ao contribuinte a possibilidade de facultar um endereço para efeitos fiscais em Macau, não faz desaparecer as razões que levaram o legislador a consagrar as dilações do artigo 75º do CPA.
X. Com efeito, apesar do contribuinte estrangeiro passar a dispor de um endereço de correio em Macau para recepção de notificações e avisos fiscais, as circunstâncias referidas acima e que motivaram a consagração das dilações, sobrevivem, ou seja, aquele continua a ter que intervir num procedimento que corre termos numa jurisdição estrangeira, processado numa língua desconhecida e ao qual será aplicado um direito que lhe é estranho, em que a consulta do processo, a reunião de material probatório e a presença em eventuais diligências continuam a mostrar-se absolutamente impraticáveis, sem o auxílio de um mandatário judicial, previamente contratado e devidamente mandatado para o efeito.
Y. Com efeito, pese embora o contribuinte estrangeiro passe a poder ser notificado no endereço indicado em Macau, ele continua radicado num país distante e numa jurisdição diferente, o que, naturalmente dificulta o conhecimento e o exercício dos direitos que lhe competem.
Z. Consequentemente, o contribuinte estrangeiro, ou mesmo o contribuinte residente que se encontre prolongadamente fora da RAEM, tal como defendem o Dr. Lino José Baptista Rodrigues Ribeiro e o Dr. José Cândido de Pinho, continua a necessitar das dilações de dez, vinte ou trinta dias, previstas no artigo 75º, de modo a compensar as dificuldades resultantes do seu distanciamento em relação ao Território de Macau, e por forma a garantir um exercício efectivo dos seus direitos.
AA. Deste modo, o elemento determinante da aplicação da dilação prevista no artigo 75º do CPA é o lugar do domicílio do notificando ou onde o mesmo se encontra e não o lugar para onde é efectuada a notificação fiscal, desde logo porque no regime do DL 16/84/M não há lugar à realização de quaisquer notificações para fora de Macau.
BB. A manter-se o entendimento do Tribunal recorrido, qualquer notificação, incluindo a edital, não mereceria a aplicação de qualquer dilação, o que constituiria um tratamento profundamente desigual entre contribuintes com domicílio na RAEM e aqueles que aqui não dispõem de qualquer presença.
CC. Caso o artigo 75º não fosse aplicável, proceder-se-ia a um tratamento discriminatório e injustificado dos contribuintes sem sede ou residência em Macau, e violar-se-ia de forma grosseira os princípios da igualdade e do acesso à justiça, em especial no domínio do processo tributário, cuja natureza particularmente abrasiva dos direitos dos particulares reclamaria precisamente uma tutela eficaz dos direitos de reacção dos particulares.
DD. Uma solução que permitisse a aplicação das dilações no procedimento civil, penal e administrativo, e as excluísse no procedimento tributário seria altamente inconsistente e prejudicial da harmonia e da unidade do sistema jurídico de Macau.
EE. Deste modo, a Recorrente não nega a relevância fiscal da indicação de um endereço em Macau para efeitos da perfeição das notificações e avisos da DSF. Simplesmente entende que essa indicação não afasta a aplicação das dilações previstas no artigo 75º do CPA, sendo relevante apenas no sentido de permitir o envio de correio para o endereço facultado em Macau ao invés de para sede do contribuinte no estrangeiro.
FF. Tal como sucede na restante legislação processual vigente em Macau, o benefício do prazo resultante das presunções de notificação, coexiste e complementa-se com as dilações previstas na lei, ao invés de as excluir.
GG. Como tal, a Recorrente deve beneficiar da dilação de 30 dias prevista na alínea c) do artigo 75º do CPA, em virtude de estar sediada no Reino Unido e de não ter qualquer tipo de presença ou representação física ou legal em Macau.
HH. Atendendo a que o último dia do prazo para impugnar a fixação de rendimentos ocorria a 19.11.2020, a Reclamação contra a Fixação de Rendimentos mostra-se tempestiva, devendo a DSF admiti-Ia e emitir pronúncia sobre a mesma.
Nestes termos, e nos demais de Direito aplicáveis, deve o presente recurso ser julgado procedente, e, consequentemente, ser revogada a decisão recorrida, substituindo-a por outro que determine a anulação do Acto Recorrido com todos as consequências legais.
Mois se requerendo a V. Exas. que se dignem ordenor os demois termos dos presentes outos até final, assim se cumprindo o Consueta
JUSTIÇA!

Notificada das alegações, a Administração fiscal recorrida respondeu pugnando pela improcedência do recurso jurisdicional.

Subidos os autos a esta segunda instância e devidamente tramitados, o Ministério Público emitiu oportunamente em sede de vista o seu seguinte parecer, pugnando pela improcedência do recurso:
  No recurso jurisdicional em apreço, a recorrente pediu a revogação da douta sentença em escrutínio, pela qual o MM.º Juiz a quo julgou im-procedente o recurso contencioso e, quanto ao pedido da condenação na prática do acto administrativo legalmente devido, absolveu da instância a entidade recorrida que é in casu a Comissão de Revisão do ICR.
  Ponderando atenciosamente a petição inicial, a contestação, as duas alegações facultativas, a sentença in quaestio e as alegações do presente recurso jurisdicional, colhemos que a única questão a resolver consiste em indagar se a Reclamação da ora recorrente junto da Comissão de Re-visão podia beneficiar a dilação consagrada no art.75.º do CPA?
*
  E o art.3.º do D.L. n.º16/84/M prevê categoricamente: 1. Os avisos ou notificações deverão ser enviados para a residência indicada pelo contribuinte nas declarações por si apresentadas no âmbito do respectivo imposto ou contribui-ção. 2. Quando haja sido indicada mais de uma residência, é suficiente o envio da notificação ou aviso para uma delas. 3. Se o contribuinte tiver domicílio fora do Território, ficam dispensadas as notificações ou avisos que lhe devam ser envia-das, excepto se aquele, nas respectivas declarações, tiver indicado endereço para efeitos fiscais em Macau. 4. Na hipótese prevista na primeira parte do número anterior, o conteúdo do aviso ou da notificação será afixado em edital na respec-tiva repartição de Finanças concelhia, considerando-se para todos os efeitos que o contribuinte teve dele conhecimento na data da respectiva afixação.
  Sendo norma imperativa, o n.º1 deste art.3.º torna indiscutível que para se determinar a residência de qualquer contribuinte – seja pessoa sin-gular ou colectiva, basta atender o sítio por si indicado nas declarações suas no âmbito do respectivo imposto ou contribuição. Daí decorre que se ficarem em sítios diferentes as residências declaradas pelo mesmo contri-buinte para diversos impostos ou contribuições, então, cada residência releva para o correspondente impostos ou contribuições.
  Tal n.º1 representa, em primeiro lugar, que os contribuintes gozam da liberdade de indicar a sua residência fiscal e fica auto-responsabilizado pela sua indicação, e de outra banda, que a Administração Fiscal fica vinculada a respeitar a indicação pelo contribuinte da sua residência.
  No caso sub judice, vale realçar que a Declaração M/1 apresentada pela recorrente em 31/03/2021 indica, de forma clara e concludente, que o seu endereço de aviso se situa na «XXXXXXXXXXXXX, Macau», e o representante legal quem assinou nessa Declaração tem o BIR n.ºXXXXXX (doc. de fls.2 do P.A.).
  Tudo isto leva-nos a extrair que para o imposto complementar de rendimentos, o endereço fiscal da recorrente está no local supra aludido que foi indicado por ela própria na sobredita Declaração M/1, e por isso mesmo é insignificante a matéria alegada no art.4.º da petição.
  Nesta linha de raciocínio, parece-nos que para efeitos de deduzir a Reclamação junto da Comissão de Revisão do o imposto complementar de rendimentos, o recorrente não tinha legitimidade de arrogar a dilação prescrita no art.75.º do CPA, pelo que a douta sentença recorrida não é censurável, e o presente recurso jurisdicional não merece provimento.
*
  Estipula o art.75.º do CPA: Se os interessados residirem ou se encontrarem fora do Território, os prazos fixados na lei, se não atenderem já a essa circunstância, so-mente se iniciam depois de decorridos: .... O que revela concludentemente que a não ponderação dessa circunstância pelo legislador constitui pressuposto inultrapassável e, a contrario sensu, não hão lugar à aplicação desta dila-ção caso a dita “circunstância” tenha sido atendida pelo legislador. E na nossa óptica, a ponderação desta circunstância não significa que o legisla-dor tenha de estabelecer prazos mais alargados para os contribuintes que tenham residência fora de Macau do que para os contribuintes locais.
  O disposto nos n.º3 e n.º4 do art.3.º do D.L. n.º16/84/M revela que o legislador estipula diferentes formas de notificação para contribuintes com residência em ou fora de Macau, e diferentes regimes da notificação presumida; e o n.º4 permite a entender que o legislador quer estimular e premiar que os contribuintes “estrangeiros” tenham endereços fiscais em Macau. Daí decorre que quanto às formas de notificação e ao regime da notificação presumida, o legislador não consagra benefício ou privilégio para contribuintes com residência fora de Macau.
  Bem, o n.º1 do art.3.º da Lei n.º15/96/M estipula definidamente que o regime de notificações e avisos estabelecidos no D.L. n.º16/84/M afasta a aplicação, em matéria fiscal, do disposto nos arts.69.º e 72.º do actual CPA; e à luz do n.º2 do art.3.º acima, a notificação presumida de acordo com o n.º3 do art.2.º deste Decreto-Lei vale, para todos os contribuintes, como evento aludido na alínea a) do art.74.º do actual CPA.
  No seio da doutrina e jurisprudência, é pacífico o entendimento de que os prazos de interposição de recurso contencioso fiscal consagrados no art.7.º da Lei n.º15/96/M se aplicam indistintamente a todos os contri-buintes, sejam com residência fora de Macau, sejam em Macau. O que aconselha a inferir que os prazos consignados nos arts.4.º e 6.º desta Lei seguem à idêntica ratio e à mesma regra de aplicação.
  Com todo o respeito pela melhor opinião em sentido contrário, in-clinamos a colher que o legislador do D.L. n.º16/84/M e a Lei n.º15/96/M atendeu devidamente à sobredita “circunstância”, e sendo legislações es-pecíficas em matéria fiscal, estes dois diplomas legais consagra regime sui generis que, nesta matéria, prevalecem sobre o CPA.
  Chegando aqui, somos levados a concluir que, na nossa modesta opinião, as pessoas singulares ou colectivas sujeitos ao imposto comple-mentar de rendimentos cuja residência ou sede fica fora de Macau não podem beneficiar a dilação contemplada no art.75.º do actual CPA.
***
  Por todo o exposto acima, somos do parecer do não provimento do presente recurso jurisdicional.

Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.

II

Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).

Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, ex vi dos artºs 1º e 149º/1 do CPAC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.

In casu, não há questões que nos cumpre conhecer ex oficio.

Nas conclusões tecidas nas alegações do recurso jurisdicional, a recorrente vem insistir na sua teses quanto à questão de saber se ela poderia beneficiar da dilação prevista no artº 75º do CPA na reclamação dirigida à comissão de revisão do imposto complementar.

Para nós, esta única questão colocada e delimitada nas conclusões de recurso já foi correcta e exaustivamente debatida no Douto parecer do Ministério Público acima integralmente transcrito, com que estamos inteiramente de acordo, não nos resta outra alternativa melhor do que a de aproveitarmos integralmente esse parecer, convertendo-o na fundamentação do presente recurso para julgar improcedente o presente recurso jurisdicional.

Resumindo e concluindo:

A dilação prevista na regra geral consagrada no artº 75º do CPA não se aplica nas notificações por virtude do disposto em legislação de natureza fiscal efectuadas de acordo com o disposto na parte final do artº 3º/3 do Decreto-Lei n.º 16/84/M.

Tudo visto resta decidir.

III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam julgar improcedente o presente recurso jurisdicional e manter na íntegra a sentença recorrida.

Custas pela recorrente, com taxa de justiça fixada em 6 UC.

Notifique.

RAEM, 12MAIO2022
Lai Kin Hong
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
*
Mai Man Ieng

Ac. 4/2022-1