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Processo nº 513/2022/A
(Suspensão de Eficácia)

Data: 29 de Julho de 2022
Requerentes: A e B
Entidade Requerida: Secretário para os Transportes e Obras Públicas
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO
  
  A e B, ambos com os demais sinais dos autos,
  vêm requerer a suspensão de eficácia do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 24.05.2022 que ordenou aos Requerentes que demolissem as obras ilegais com os fundamentos constantes do requerimento inicial e que em síntese no que concerne ao prejuízo de difícil reparação se traduz em que apesar de serem proprietários da fracção autónoma em causa não sabiam da existência das ditas obras das quais não são proprietários pelo que podem incorrer em responsabilidade criminal por destruição de coisa alheia e que a demolição daquelas implica a demolição das obras ilegais realizadas nas partes comuns do condomínio pelo que a sua realização depende de autorização prévia da assembleia geral do condomínio, concluindo que os demais requisitos para que seja decretada a providência se verificam.
  Citado o órgão administrativo requerido para contestar veio este fazê-lo concluindo que nada se invoca quanto ao prejuízo de difícil reparação, pugnando pelo indeferimento do pedido.
  
  Pela Ilustre Magistrada do Ministério Público foi emitido parecer com o seguinte teor:
  «Os requerentes A e B vieram instaurar o presente procedimento cautelar de suspensão de eficácia do acto praticado pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP) que indeferiu o seu recurso hierárquico necessário, mantendo-se o despacho do director substituto da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) que ordenou aos Requerentes a demolição das obras ilegais e a reposição dos locais afectados.
  De acordo com o disposto no artigo 121º, nº1 do CPAC, a suspensão de eficácia dos actos administrativos que tenham conteúdo positivo ou que, tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva é concedida quando se verifiquem os seguintes requisitos: (i) a execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso contencioso; (ii) a suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente produzido pelo acto; (iii) do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
  Estes requisitos do decretamento da providência cautelar da suspensão de eficácia são de verificação cumulativa. A não verificação de qualquer um deles torna desnecessária a apreciação dos restantes, sem prejuízo, no entanto, do disposto nos nºs 2, 3 e 4 do citado artigo 121º do CPAC (cfr. Viriato Lima, Álvaro Dantas: Código de Processo Administrativo Contencioso Anotado, CFJJ 2015, pp. 340 a 359, José Cândido de Pinho: Manual de Formação de Direito Processual Administrativo Contencioso, CFJJ 2013, pp.305 e ss., e cfr., entre outros, o Ac. do TUI no processo n.º 90/2019).
  E bem, o requisito da al. a) do n.º1 do art.121.º do CPAC (a execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso) tem sempre de se verificar para que a suspensão da eficácia do acto possa ser concedida, excepto quando o acto tenha a natureza de sanção disciplinar. (cfr. Acórdãos no TUI nos. Processos n.º 33/2009, n.º 58/2012 e n.º 108/2014)
  No caso em apreço, da análise do requerimento apresentado, parece-nos que, não se mostra preenchido o requisito do decretamento da suspensão de eficácia que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 121º do CPAC.
  E, em princípio, cabe a requerente o ónus de demonstrar, mediante prova verosímil e susceptível de objectiva apreciação, o preenchimento do requisito consagrado na alínea a) do referido n.º1 , por aí não se estabelecer a presunção do prejuízo de difícil reparação (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º 2/2009, Acórdãos do TSI nos Processos n.º 799/2011 e n.º 266/2012/A). “Não se pode paralisar a actividade da Administração se o requerente não alegar e provar sumariamente que a execução do acto lhe causa prejuízo de difícil reparação” (cfr. Acórdão do TUI no processo n.º 33/2009).
  Não se pode considerar tal ónus cumprido com a mera utilização de expressões vagas e genéricas irredutíveis a factos a apreciar objectivamente. Terá de tornar credível a sua posição, através do encadeamento lógico e verosímil de razões convincentes e objectivos. (cfr. Acórdãos do ex-TSJM de 23/06/1999 no Processo n.º 1106, do TUI nos Processos n.º 33/2009 e n.º 16/2014, do TSI no Processo n.º 266/2012/A)
  No caso sub judice, para o Tribunal decretar a suspensão de eficácia do acto que determinou a ordem da demolição das obras ilegais, os Requerentes têm de alegar factos concretos que possam demonstrar que tal ordem lhe irá causar previsivelmente prejuízos de difícil reparação.
  No entanto, dos argumentos aduzidos sobretudo nos arts.6º a 21º do Requerimento não se verifica a demonstração inequívoca de que os Requerentes alegaram factos concretos e susceptíveis de apreciação objectiva que possam comprovar o prejuízo de difícil reparação, nem da existência desses prejuízos. Daí decorre que não se pode considerar verificado o pressuposto consagrado na alínea a) do nº 1 do art.121º do CPAC.
  Na verdade, o que os Requerentes estão a fazer nos seus argumentos é apenas inspirar um receio infundado, em vez de alegar ou demonstrar os factos que se justificam a providência requerida.
  Já que a propósito da argumentação de não serem autores das obras ilegais e de carecer da autorização prévia dos condomínios não tem nada a ver com um prejuízo exigidos, na medida em que, sendo actuais proprietários do respectivo imóvel, o não pré-conhecimento de tais obras não justifica a isenção do dever jurídico de cumprir a obrigação de demolir as obras de modificação e amplicação ilegais existentes no interior do seu imóvel. Aliás, o alegado receio de incorrer no crime de dano é óbvio e absolutamente infundado, uma vez que a demolição de tais obras ilegais e a reposição dos locais afectados, não visam “danificar”, “destruir” ou “desfigurar” nem “alterar” a estrutura do edifício, mas tão-só restituir a respectiva estrutura conforme com o projecto primitivo.
  Assim, sem necessidade de maiores considerandos, parece-nos que a inverificação do apontado requisito de que depende o decretamento da providência da suspensão de eficácia deve conduzir ao respectivo indeferimento.
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  Pelo exposto, salvo melhor opinião, parece ao Ministério Público que deve ser indeferido o pedido de suspensão de eficácia em apreço.».
  
II. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
  
  O Tribunal é o competente.
  O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.
  As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
  Não existem outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer.
  
III. FUNDAMENTAÇÃO

a) Factos

1. Por despacho de 24.05.2022 do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas foi indeferido o recurso hierárquico interposto pelos aqui Requerentes com os fundamentos constantes da informação nº 2059/53/DJU/2022 cuja cópia consta de fls. 8 a 13 destes autos e aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais;
  
b) Do Direito
  
  De acordo com o disposto no artº 120º do CPAC «a eficácia dos actos administrativos pode ser suspensa quando os actos:
  a) Tenham conteúdo positivo;
  b) Tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente».
  No caso dos autos o acto em causa é manifestamente de conteúdo positivo.
  Por sua vez o CPAC no seu artº 121º consagra os requisitos para que a suspensão seja concedida, a saber:
Artigo 121.º
(Legitimidade e requisitos)
  1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
  a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
  b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
  c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
  2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
  3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
  4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
  5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessados façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.
  
  Vejamos então.
  
  No caso em apreço foi ordenado aos Requerentes que demolissem as obras ilegais realizadas na fracção de que são proprietários e que consistiu na demolição de parte da placa que separava esta fracção autónoma da parte comum do condomínio que fica no piso inferior e destinada a estacionamento bem como a demolição das escadas de acesso entre os dois pisos e das paredes e portões que fecham os parques de estacionamento para veículos ali indicados.
  Ou seja, o que foi ordenado aos Requerentes foi que demolissem as obras ilegais existentes na sua fracção e também realizadas na parte comum do edifício.
  Por sua vez o que os Requerentes invocam como prejuízo de difícil reparação é que podem incorrer em responsabilidade criminal por destruírem coisa alheia uma vez que não foram eles quem fez as obras pelo que, estas não lhes pertencem, para além de que não têm autorização da Assembleia Geral do condomínio para fazerem inovações nas partes comuns.
  Ora, como já sobejamente consta da fundamentação do despacho cuja suspensão se requer, bem como do Douto Parecer da Ilustre Magistrada do Ministério Público sendo os Requerentes os donos da fracção autónoma em causa na qual foram feitas obras ilegais a ligá-la a uma parte comum do condomínio e emparedamento desta mesma parte comum, é irrelevante que as mesmas (as obras) hajam sido feitas por si ou sejam do seu conhecimento, impendendo sobre si (os requerentes) a obrigação de as demolir se assim foi ordenado dado que essas obras estão feitas em coisa sua e da qual se assumem proprietários, pelo que, são donos do “todo”, sendo irrelevante para o caso que as obras hajam sido feitas por si, por terceiros ou anteriores proprietários.
  Da mesma sorte que, não estando em causa a realização de inovação alguma nas partes comuns do condomínio, mas antes a reposição das partes comuns no seu estado original, não colhe a argumentação de que as obras de demolição necessitam de ser autorizadas pela Assembleia Geral, uma vez que não está aqui em causa a realização de qualquer inovação, mas a destruição daquilo que se inovou e para que não se estaria autorizado.
  Destarte, consistindo o invocado prejuízo de difícil reparação na hipótese de poderem incorrer em responsabilidade criminal pelo crime de dano por “não serem os donos das obras” e porque não estão autorizados a realizar “obras de inovação nas partes comuns” falece a argumentação com que tentaram fundamentar a existência daquele (do prejuízo de difícil reparação).
  Assim sendo, e nada mais de concreto se invocando a título de prejuízo de difícil reparação, acompanhamos integralmente o Douto Parecer da Ilustre Magistrada do Ministério Público no sentido de que se impõe concluir não estar verificado o requisito da al. a) do nº 1 do artº 121º do CPAC.
  Destarte, aceitando-se que no caso em apreço não resulta que da suspensão resultasse grave lesão do interesse público, nem tão pouco indícios da ilegalidade do recurso o que nos conduz a dar por verificados os requisitos das alíneas b) e c) do nº 1 do artº 121º do CPAC, sendo os requisitos previstos no nº 1 deste artº 121º cumulativos, à míngua do da alínea a), impõe-se concluir no sentido do indeferimento da providência pedida.
  
IV. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos indefere-se o pedido de suspensão de eficácia do acto.
  
  Custas a cargo dos Requerentes fixando-se a taxa de justiça em 4Uc´s.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 29 de Julho de 2022
  
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Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro Ma Iek
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Lai Kin Hong
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Fong Man Chong
  


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