Processo n.º 375/2021
(Autos de recurso contencioso)
Data: 28/Julho/2022
Recorrente:
- A
Entidade recorrida:
- Secretário para a Segurança
Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
A, com sinais nos autos, notificado do despacho do Exm.º Secretário para a Segurança que lhe aplicou a pena disciplinar de demissão, dele não se conformando, interpôs o presente recurso contencioso de anulação de acto, formulando na petição de recurso as seguintes conclusões:
“I. Vem a petição de recurso contencioso interposto contra a Entidade Recorrida, o Exmo. Senhor Secretário para a Segurança, que, no âmbito do Processo Disciplinar n.º 36/2019-2.6-DIS, proferiu uma decisão de aplicação ao Recorrente de pena de demissão, prevista nas disposições conjugadas dos artigos 219º, alínea g), 224º, 238º, n.º 2, alínea i), 240º, alínea c) e 228º, todos do EMFSM.
II. Estamos perante uma decisão disciplinar punitiva de demissão a um agente dos Serviços de Alfândega que, em determinada altura, e por razões sérias de saúde, teve de se ausentar do serviço por longos períodos, sendo que desde sempre comprovou devidamente o seu estado de saúde através dos atestados médicos emitidos pelos médicos que o iam assistindo, e que foram sucessivamente apresentados para justificar as respectivas faltas.
III. O Recorrente ingressou nos Serviços de Alfândega em Novembro de 1994, e está actualmente destacado na Divisão de Fiscalização Alfandegária das Ilhas, com a categoria de Verificador de Primeira Alfandegário, a exercer funções no Posto Alfandegário do Terminal Marítimo de Passageiros da Taipa.
IV. O Recorrente sempre foi um funcionário diligente, zeloso, responsável e respeitado no seio dos Serviços de Alfândega, com uma carreira imaculada, tendo sempre merecido avaliação de Bom e Muito Bom.
V. Por força de um acidente de trabalho ocorrido há uns anos, enquanto executava uma perseguição na montanha, o Recorrente sofreu de contusão na região lombar e desde essa altura, passou a sofrer de fortes dores na região da coluna lombar, também denominada por lombalgia.
VI. Dores essas que com o passar dos anos se vieram a agravar cada vez mais, e que se passaram a estender ao membro inferior direito, causando a maioria das vezes adormecimento e paralisia do pé direito e que impedem o Recorrente de estar em pé ou sentado por períodos prolongados, e impedem também de caminhar por períodos prolongados, designadamente não conseguindo suportar os normais trabalhos de patrulha com armas, treinos físicos e testes, afectando de forma séria e grave a sua a vida profissional e pessoal, tornando-se assim incapacitantes.
VII. Por força dessa doença, no ano de 2018, o Recorrente recorreu a consultas médicas e efectuou exames radiológicos que vieram diagnosticar uma inflamação degenerativa da coluna vertebral, e lesões nos discos intervertebrais lombares.
VIII. A partir desse momento passou a efectuar tratamento médico e fisioterapia, bem como a tomar a medicação que lhe era prescrita pelo seu médico assistente, mas apesar disso não viu melhorada a sua situação de saúde, pelo que teve que recorrer à situação de baixa médica.
IX. Desde o dia 03/09/2017 que o Recorrente está na situação de baixa médica, situação essa que se prolongou até ao dia 13/08/2020, data em que regressou ao serviço.
X. O Recorrente foi sendo apresentado a diversas Juntas de Saúde, que ao longo dos tempos, e em face dos atestados, médicos e relatórios médicos apresentados pelo Recorrente, foram confirmando a sua doença, nomeadamente durante o período compreendido entre 03/09/2017 e 28/06/2019.
XI. Contudo, ainda hoje se desconhece se a Junta de Saúde confirmou ou não a doença durante o período de 29/06/2019 a 03/10/2019, porquanto o Recorrente nunca foi notificado dessa decisão pela Junta de Saúde, nem por via oral, nem por qualquer outra forma.
XII. No dia 22/08/2019 o Recorrente foi notificado pelos Serviços de Alfândega do teor do parecer da Junta de Saúde de 28/06/2019, segundo o qual, de acordo com o atestado médico do dia 09/05/2019 apresentado pelo Recorrente, este teria uma incapacidade de trabalho de 8%, e sugeria que regressasse ao trabalho.
XIII. E através dessa comunicação os Serviços de Alfândega notificaram-no da decisão da Junta de Saúde e da sugestão para regressar ao trabalho.
XIV. A sugestão da Junta de Saúde em que o Recorrente podia regressar ao trabalho vai contra aquilo que está vertido no atestado médico de 09/05/2019, onde o médico assistente diz expressamente que “tendo em conta que as dores nas costas ainda estão em recuperação, ele ainda não está apto para regressar ao trabalho.” e bem assim contra os subsequentes atestados médicos que continuam a recomendar a baixa médica.
XV. Os Serviços de Alfândega levaram quase 2 meses a notificar o Recorrente daquele parecer da Junta de Saúde, o que não se pode aceitar como razoável.
XVI. A notificação dos Serviços de Alfândega não anexam o parecer da Junta de Saúde, o que, para além de violar os dispositivos legais aplicáveis à notificação dos actos administrativos, também não é aceitável.
XVII. Dessa notificação nada resulta quanto ao período de 28/06/2019 a 03/10/2019, até porque essa Junta ocorreu em Junho de 2019.
XVIII. Até à presente data o Recorrente desconhece se as suas ausências por doença durante o período de 29/06/2019 a 03/10/2019, devidamente justificadas por atestado médico, foram ou não confirmadas pela Junta de Saúde, porquanto nunca foi notificado desse resultado, oralmente ou por qualquer outro meio.
XIX. Como continuasse a padecer da doença que lhe havia sido diagnosticada, e de dores incapacitantes, o Recorrente estava incapaz para regressar ao serviço, e como tal recorreu novamente à situação de baixa médica apresentado para esse efeito os competentes atestados médicos justificativos das suas ausências.
XX. Foi posteriormente surpreendido pela instauração de um processo disciplinar, notificado em 27/11/2019, alegadamente decorrente de faltas ao serviço injustificadas.
XXI. A notificação de 22 de Agosto de 2019, efectuada pelos Serviços de Alfândega, apenas revela a percentagem de incapacidade do recorrente, 8%, apenas sugere que pode regressar ao trabalho e nada revela ou refere sobre a confirmação, ou não, da doença.
XXII. E considerando que o recorrente apenas foi informado sobre o resultado dessa Junta de Saúde realizada em 28/06/2019, no dia 22/08/2019, sem a junção do registo de inspeção da Junta de Saúde, como supra se alegou e está devidamente comprovado nos autos, mal se percebe como é que os Serviços de Alfândega vêm considerar que as faltas ao serviço, pelo menos desde 28/06/2019 até 22/08/2019, são consideradas injustificadas.
XXIII. Além de não fazer o menor sentido, aplicam os Serviços de Alfândega um efeito retroactivo a uma comunicação que foi feita apenas no dia 22/08/2019.
XXIV. O Recorrente foi sendo apresentado a diversas Juntas de Saúde, que ao longo dos tempos, e em face dos atestados médicos e relatórios médicos apresentados pelo Recorrente, foram confirmando a sua doença.
XXV. Nem as Juntas de Saúde, nem mesmo os Serviços de Saúde, notificaram ou deram a conhecer ao Recorrente o teor das respectivas deliberações, fosse de que modo fosse, o que viola o disposto no art. 105º, n.º 7 do ETAPM.
XXVI. Ainda que se admita que o Recorrente tenha tido conhecimento da Junta de Saúde de 28 de Junho de 2019 (referida no art. 7º da acusação) por notificação dos Serviços e de Alfândega de 22 de Agosto de 2019, a vingar o entendimento da Entidade Recorrida, já nesta altura (decorrido mais de 2 meses) tinha o Recorrente cometido a infracção disciplinar de ausência ilegítima que lhe está a ser imputada, isto é, faltas injustificadas desde o dia 28 de Junho de 2019.
XXVII. Dessa notificação efectuada pelos Serviços de Alfândega, que nem tão pouco juntou cópia do parecer da Junta de Saúde, apenas lhe foi comunicado o conteúdo desse parecer, onde era apenas sugerido (sic) que regressasse ao trabalho.
XXVIII. Relativamente às ausências ao serviço durante o período compreendido entre o dia 27 de Agosto de 2019 e 3 de Outubro de 2019, desconhecendo-se quais as Juntas de Saúde que estão em causa, porquanto na decisão final nada é referido em concreto, apenas se efetuando referências genéricas e vagas a “nova reunião da Junta de Saúde” – alegadamente consideradas pela Junta de Saúde de 6 de Setembro de 2019 e de 18 de Outubro de 2019, importa salientar que o Recorrente nunca foi notificado dessas deliberações, nem pela Junta de Saúde, nem pelos Serviços de Saúde, nem pelos Serviços de Alfândega.
XXIX. Nessa altura o Recorrente desconhecia por completo que as Juntas de Saúde não haviam confirmado as suas ausências desde o dia 28 de Junho de 2019, pelo que não poderia estar ciente de que estaria a violar o dever de assiduidade.
XXX. A instauração do processo disciplinar por despacho do dia 12 de Novembro de 2019, notificado ao recorrente em 27/11/2019, foi assim completamente inusitada e sem qualquer fundamento.
XXXI. Acerca das ausências ao serviço durante o período de 29/06/2019 a 3/10/2019, somente em 3 de Dezembro de 2019 é que o Recorrente tomou conhecimento, na sequência de um interrogatório a que estava a ser sujeito no âmbito deste processo disciplinar, da não confirmação da doença por parte da Junta de Saúde.
XXXII. Mais uma vez, nem a Junta de Saúde nem os Serviços de Saúde, nem os serviços de Alfândega notificaram o Recorrente de qualquer deliberação abarcando este período, isto é, de 29/06/2019 a 3/10/2019, fosse por que modo fosse.
XXXIII. A decisão recorrida assenta em deliberações que efectivamente não a podem suportar, nomeadamente na deliberação de 28/06/2019, que não delibera sobre qualquer período, nunca foi dada a conhecer ao Recorrente pela Junta e saúde ou pelos serviços de Saúde, tendo sido apenas dada a conhecer ao recorrente em 22/08/2019 pelos serviços de Alfândega e de uma forma incompleta, sem lhe ter sido aposto o registo da Junta de saúde realizada em 28/06/2019, e as deliberações de 6/09/2019 e de 18/10/2019 que também nunca foram dadas a conhecer ao Recorrente e que não confirmam, respectivamente, os períodos compreendidos entre 29/06/2019 a 27/08/2019 e 27/08/2019 a 03/10/2019.
XXXIV. Acresce que nas Juntas médicas a que foi sujeito de 28/06/2019, 6/09/2019 e 18/10/2019, submetido nos termos do artigo 104º, n.º 1, al. a), pelo que a Junta tinha apenas o dever de se pronunciar sobre a aptidão do trabalhador regressar ao Serviço, visto que não estava em causa nenhuma situação que indiciasse uma actuação fraudulenta, mas apenas o facto do Recorrente ter atingido o limite de 60 dias de ausência ao serviço por motivo de doença justificada.
XXXV. A decisão recorrida assenta em deliberações que efectivamente não a podem suportar.
XXXVI. A decisão recorrida mostra-se ambígua, pouco clara e bastante confusa quanto aos períodos das ausências do Recorrente, sem referência sequer quanto ao número de dias dessas mesmas ausências – apenas invocando que excedeu largamente 5 dias consecutivos, e mais importante, não se consegue descortinar qual o período de supostas faltas injustificadas que a decisão recorrida teve em conta, isto é, se foi o primeiro período de 28 de Junho de 2019 até uma data que se desconhece, que previsivelmente poderá ser o dia 26/08/2019, ou se teve apenas em consideração o segundo período, de 27/08/2019 até 3/10/2019, ou por outro lado se teve em consideração todo e um único período compreendido entre 29/06/2019 a 03/10/2019.
XXXVII. Na verdade, mal se percebe, com o devido e necessário respeito, a que nova reunião da Junta de Saúde refere o Exmo. Sr. Secretário para a Segurança, porquanto o recorrente foi, posteriormente, presente a inúmeras Juntas de Saúde como bem atestam os autos do processo disciplinar.
XXXVIII. As referências que são efectuadas a duas Juntas de Saúde, desconhece o Recorrente a que Juntas se refere o Exmo. Sr. Secretário para a Segurança, pois o Recorrente foi presente, posteriormente, a diversas Juntas de Saúde.
XXXIX. Na decisão punitiva final não predominam critérios de certeza, mal se percebendo por que factos em concreto está o Recorrente a ser sancionado disciplinarmente e, nesse sentido, não pode obviamente existir uma convicção firme e segura da prática ao agente dos factos que lhe são atribuídos de uma forma vaga.
XL. Acresce que o relatório do instrutor – que nunca foi dado a conhecer ao aqui Recorrente – abordava outros períodos, bem como a nota de culpa, que não foram considerados na decisão final, ficando o aqui Recorrente sem perceber, efectivamente, o que motivou em concreto esta decisão disciplinar.
XLI. A decisão recorrida não espelha aquilo que foi considerado pelo Senhor Instrutor no relatório final, para onde a decisão recorrida nunca remete.
XLII. A decisão é pouco clara (se não mesmo omissa) quanto aos períodos de supostas faltas injustificadas que se teve em conta para a aplicação da sanção disciplinar.
XLIII. A decisão não é clara, não é concreta, não define com exactidão os factos que suportam a sanção disciplinar.
XLIV. A Entidade Recorrida deveria expor com total clareza os factos que suportam a sua decisão, não devendo deixar o Recorrente sem perceber com exactidão aquilo que lhe é apontado para poder reagir.
XLV. É por isso evidente que a entidade recorrida violou o seu dever de fundamentação a que está vinculada nos termos do artigo 282º, n.º 1 do EMFSM em conjugação com o disposto nos artigos 113º, 114º e 115º do CPA.
XLVI. Da factualidade supra exposta resultam vícios no procedimento administrativo da Junta de Saúde que jamais poderão servir qualquer decisão punitiva em prejuízo do Recorrente, sendo certo que, como veremos, o Recorrente é completamente alheio a esses vícios.
XLVII. Há um dever de notificar o interessado do resultado do parecer da Junta de Saúde e respectivo acto de homologação, em cumprimento do disposto no artigo 68º e 70º do CPA.
XLVIII. Os Serviços de Saúde omitiram claramente o seu dever de notificação.
XLIX. Relativamente às ausências por doença durante o período compreendido entre os dias 29/06/2019 e 03/10/2019, ainda hoje continua o Recorrente sem saber se as mesmas foram ou não confirmadas pela respectiva Junta de Saúde.
L. Donde não se lhe poderá assacar a imputação da violação do dever de assiduidade, tal como o faz a decisão recorrida.
LI. Se as deliberações da Junta de Saúde não foram comunicadas ao Recorrente, então a decisão recorrida está inquinada com o vício e violação de lei por erro nos pressupostos de facto.
LII. A decisão recorrida, ao decidir como decidiu, parte do pressuposto de que as deliberações foram comunicadas ao Recorrente, o que é falso.
LIII. Não se lhe poderá assacar a imputação da violação do dever de assiduidade, tal como o faz a decisão recorrida.
LIV. Nem se diga que a notificação escrita fica dispensada nos termos do art. 69º do CPA em virtude da intervenção do Recorrente no procedimento, pois tal interpretação é manifestamente ilegal.
LV. O Recorrente em momento algum ficou ciente de qualquer deliberação da Junta ou de qualquer ordem de regresso ao serviço, pois os médicos que a compõe limitam-se a receber os documentos e a dar por concluída a diligência, sem qualquer esclarecimento do que quer seja.
LVI. Desde que o ora Recorrente começou a impugnar contenciosamente as deliberações das Juntas de Saúde junto do Tribunal Administrativo, invocando precisamente essa falta de notificação como vício invalidante dessas deliberações, as próprias Juntas de Saúde passaram a notificar o Recorrente por escrito.
LVII. A decisão recorrida viola o disposto na al. b), do n.º 1 do art. 69º do CPA.
LVIII. O Senhor Instrutor veio solicitar junto dos Serviços de Saúde a informação por parte daqueles serviços se as Juntas de Saúde, entre outras, dos dias 28/06/2019, 06/09/2019 e 18/10/2019 notificaram o Recorrente do resultado dessas juntas de forma verbal ou escrita.
LIX. E os Serviços de Saúde limitaram-se a responder, a fls. 660 do processo administrativo, que procederam à notificação nos termos do n.º 7 do artigo 105º do ETAPM, contudo, os Serviços de Saúde não apresentaram qualquer prova ou meio de prova para efectivamente virem provar o que alegam, ou seja, que os resultados das sucessivas Juntas de Saúde foram notificados ao Recorrente.
LX. E ainda que a Junta de Saúde ou os Serviços de Saúde tivessem cumprido com o seu dever de notificação, essa notificação não faria incorrer o Recorrente na obrigação de se apresentar ao serviço.
LXI. É manifestamente abusiva a conclusão vertida na decisão recorrida quando aí se diz que o Recorrente, se mais não fora pela não prorrogação da situação de doença, ficou sempre ciente do dever de se apresentar ao serviço.
LXII. Ainda que o Recorrente tivesse sido notificado, o que não sucedeu, nunca o Recorrente poderia de aqui concluir que houvesse alguma ordem de regresso ao serviço.
LXIII. O procedimento de submissão do Recorrente ás Juntas de Saúde foi de tal forma atabalhoado que foi a própria Administração quem criou uma confusão em todo o processo que só veio prejudicar o Recorrente.
LXIV. Veja-se que só em 6 de Setembro de 2019 veio a Junta de Saúde apreciar as ausências do período entre 29/06/2019 e 27/08/2019, e, depois, em 18 de Outubro de 2019, veio a Junta de Saúde apreciar as ausências entre 27/08/2019 e 3/10/2019, querendo atribuir-lhe um efeito retroactivo relativamente à ausência ao serviço – justificada por atestado médico aceite pelos Serviços de Alfândega – pelo que nem seria possível ao Arguido depreender que as suas ausências estavam injustificadas, e que devesse, em determinada altura, regressar ao serviço.
LXV. Importa ainda considerar que os Serviços de Alfândega levaram quase dois (2) meses a dar conhecimento ao Recorrente da deliberação de 28 de Junho de 2019.
LXVI. Há neste procedimento uma clara violação do princípio da adequação e eficiência procedimental plasmado no artigo 12º do CPA, que não poderá jamais resultar em prejuízo do Recorrente.
LXVII. Caso tivesse tomado conhecimento mais cedo dos pareceres da Junta de Saúde e de eventuais ordens de regresso ao serviço, o Recorrente poderia diligenciar de imediato pelo regresso ao serviço, não obstante estar munido de atestados suficientes que demonstram a existência de doença séria, grave e incapacitante para exercer o seu trabalho.
LXVIII. Tivesse a administração sido diligente, o Recorrente nunca incorreria em eventuais faltas injustificadas, e nessa medida, há no procedimento uma clara violação do disposto no artigo 105 do ETAPM e artigo 12º do CPA que não poderá prejudicar o Recorrente em sede disciplinar.
LXIX. A Administração desrespeitou in casu um dever de decisão e de notificação, e violou o princípio da eficiência e desburocratização, o que é gerador de uma ilegalidade e que inquina o acto recorrido no vicio de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito.
LXX. Em matéria de ausência por doença, diz o art. 100º do ETAPM, que as respectivas faltas são justificadas pelo órgão competente de cada Serviço, mediante apresentação de atestado médico (al. a)).
LXXI. A Junta de Saúde, nesse caso, e ao abrigo do art. 105º, n.º 1, al. a) do ETAPM, pronuncia-se sobre a aptidão do trabalhador em regressar ao serviço.
LXXII. A Junta que reúne nos termos do disposto no art. 104º, n.º 1, al. a) do ETAPM apenas decide se o funcionário está ou não apto para regressar ao serviço (art. 105º, n.º 1, al. a)), nada decide quanto à confirmação ou não da doença.
LXXIII. O período de ausência até essa junta será sempre considerado como motivo de doença justificada, tal como preceitua o art. 104º, n.º 1, al. a) do ETAPM.
LXXIV. Se o funcionário voltar a adoecer nos 7 dias uteis seguintes, deverá ser chamado a uma nova Junta, a que podemos designar de 2ª Junta, e essa Junta apenas tem competência para confirmar ou não a doença, tal como diz o art. 105º, n.º 2, in fine.
LXXV. Essa 2ª junta, reunida nos termos do disposto no art. 105º, n.º 2, não tem competência para determinar se as faltas ao serviço dadas anteriormente são ou não justificadas.
LXXVI. In casu, as Juntas de Saúde de 16 de Agosto de 2019, de 18 de Outubro de 2019, de 12 de Junho de 2020, de 31 de Julho de 2020, de 21 de Agosto de 2020 e de 6 de Outubro de 2020 reuniram nos termos do disposto no art. 104º, n.º 1, al. a) do ETAPM.
LXXVII. Assim, o resultado que decorre dessas Juntas de Saúde apenas poderá ser o de considerar o trabalhador apto ou não a regressar ao trabalho, e a Junta não tem a competência para considerar as faltas injustificadas nos períodos ali elencados. Essas faltas, tal como diz o art. 104º, n.º 1, al. a), são motivadas por doença justificada.
LXXVIII. Estamos assim perante uma manifesta discrepância entre o conteúdo ou objecto do acto e as normas jurídicas que lhe são aplicáveis, o que constitui um vício de violação de lei, vício esse assumindo in casu a vertente de erro de direito.
LXXIX. A decisão recorrida incorre uma vez mais em vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, por violação do disposto no art. 104º, n.º 1, al. a), 105º, n.º 1, al. a), n.º 2 e 5 do ETAPM, e também por violação do princípio da legalidade plasmado no art. 3º do CPA, segundo o qual a administração deve actuar em obediência à lei e ao direito.
LXXX. O conceito de “ausência ilegítima” adoptado pelo legislador, definido como um deixar de comparecer ao serviço “injustificadamente” – que não se confunde, todavia, com o conceito de faltas justificadas/injustificadas adoptado pela lei laboral – está pensado para aqueles casos em que o militarizado se abstém pura e simplesmente de comparecer ao serviço, sem qualquer motivo aparente, ou sem a preocupação de explicar o porquê da sua ausência.
LXXXI. O Recorrente encontrava-se, e encontra-se, efectivamente impossibilitado de voltar ao trabalho porque estava, e está, doente.
LXXXII. Todos os atestados médicos que se juntam e já constantes dos autos do processo disciplinar provam isso mesmo, a doença incapacitante do Recorrente para trabalhar.
LXXXIII. O Recorrente nunca teve intenção de faltar ao trabalho, não foi uma opção sua, mas uma necessidade resultante da sua doença clinicamente provada.
LXXXIV. O Recorrente nunca se inteirou dos motivos pelos quais os médicos que compuseram as referidas Juntas de Saúde não confirmaram a doença do Recorrente.
LXXXV. O Recorrente nunca recebeu em tempo e de uma forma clara qualquer notificação ou instrução por parte dos Serviços de Alfândega no sentido de regressar ao serviço, e quando recebeu uma notificação nesse sentido, a mesma vinha desacompanhada da decisão proferida pela Junta de Saúde e apenas lhe foi notificada dois meses após a realização da mesma Junta de saúde, isto é, da Junta de Saúde de 28 de Junho de 2019.
LXXXVI. Tanto mais que posteriormente a essa notificação elaborada pelos Serviços de Alfândega, em 22 de Agosto de 2019, o Recorrente – porque estava doente – foi apresentando posteriores atestados médicos que atestavam a sua doença e os mesmos foram sendo recebidos e aceites pelos Serviços de Alfândega, tendo o mesmo regressado ao trabalho no dia 13/08/2020, como atesta o mapa de turno a fls. 296 do processo disciplinar.
LXXXVII. A decisão recorrida assenta em premissas, em pressupostos de facto, manifestamente errados, designadamente quando se afirma que “… ficou sempre ciente do dever de se apresentar ao serviço …”.
LXXXVIII. Ao suportar-se na premissa de que o Recorrente foi notificado ou que recebeu ordens para se apresentar ao serviço, a decisão recorrida parte de pressupostos de facto manifestamente errados, que não aconteceram.
LXXXIX. Há, por conseguinte, uma divergência entre os factos que a entidade administrativa teve em conta para decidir como decidiu, e a sua real ocorrência.
XC. Incorre também em erro nos pressupostos de direito porquanto não se verifica a situação de ausência ilegítima ao serviço plasmada no artigo 13º, n.º 2, alínea b) e no artigo 238º, n.º 2, alínea i), ambos do EMFSM.
XCI. Se é certo que o conceito de inviabilização da manutenção da relação funcional se concretiza através de juízos de prognose em que a Administração goza de ampla liberdade de apreciação.
XCII. Não é menos certo é que esse juízo terá necessariamente de assentar em factos concretos, factos esses que deverão ser tidos em conta, o que não sucede in casu.
XCIII. Em momento algum do procedimento disciplinar sub judice foi apontado e fundamentado qualquer motivo de falta de competência ou de falta de idoneidade moral do Arguido, ora Recorrente, que são os requisitos que presidem à inviabilidade da continuidade da relação laboral.
XCIV. Era ao autor do despacho punitivo a quem competia alegar e provar que as alegadas infracções inviabilizariam a manutenção da situação jurídico-funcional do Recorrente, o que não sucedeu in casu.
XCV. O acto recorrido é omisso quanto à fundamentação do conceito de insustentável a manutenção do vínculo funcional, donde a entidade recorrida também aqui violou o seu dever de fundamentação.
XCVI. Não resultam do acto recorrido fundamentos concretos sobre a razão pela qual a entidade recorrida optou pela pena de demissão e não pela pena de aposentação compulsiva.
XCVII. É por isso evidente que a entidade recorrida violou o seu dever de fundamentação a que está vinculada nos termos do artigo 282º, n.º 1 do EMFSM em conjugação com o disposto nos artigos 114º e 115º do CPA.
XCVIII. As alegadas infracções não são susceptíveis de inviabilizar a manutenção da situação jurídico-funcional, i.e., o seu vínculo profissional não se encontra comprometido, não tendo havido quebra do vínculo de confiança com os respectivos superiores hierárquicos, nem a sua personalidade se revela inadequada ao exercício das funções públicas que desempenha.
XCIX. Pelo que, também nesta parte, a decisão punitiva padece do vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de Facto e de Direito, o que conduz à suz inevitável anulação, nos termos do artigo 124º do CPA.
C. Não resulta do acto recorrido o motivo pelo qual a Entidade Recorrida optou pela pena mais gravosa de demissão e não por pena disciplinar menos gravosa, designadamente a pena de suspensão ou de aposentação compulsiva, previstas nos artigos 222º e 223º do EMFSM, respectivamente, pois que os requisitos e pressupostos de aplicação das mesmas estão preenchidos in casu.
CI. A decisão punitiva padece de erro grosseiro na avaliação da culpa da Recorrente e de manifesta violação do princípio da proporcionalidade, que decorre do princípio da culpa, devendo a pena corresponder ao grau do desvalor da conduta do infractor, tendo em conta todas as circunstâncias relacionadas com a prática da infracção, devendo ser proporcional à gravidade da conduta disciplinarmente ilícita e atendendo-se a todo o circunstancialismo atenuante.
CII. A decisão recorrida não considerou factos essenciais para a aplicação de uma decisão justa, equitativa e proporcional, como são as circunstâncias atenuantes da conduta do Recorrente.
CIII. Destacam-se os mais de 20 anos de bons serviços como funcionário público sem qualquer reparo, com lealdade e dedicação.
CIV. O Recorrente sempre pautou a sua conduta pessoal e profissional por um código ético rigoroso, sendo uma pessoa de reconhecido mérito, capacidade de trabalho e sempre consciente da importância e dignidade que é o serviço público, sempre desempenhou o seu cargo com um comportamento “EXEMPLAR” e tendo sido consecutivamente avaliado com a classificação de “Bom”, tendo sido alvo de louvores.
CV. Os factos que servem de fundamento a este processo disciplinar, e por sua vez à pena disciplinar de demissão que lhe foi aplicada, são um caso único no seu longo e exemplar currículo.
CVI. Sempre reuniu o respeito e bom nome por parte dos seus colegas de profissão, incluindo os seus superiores hierárquicos.
CVII. A haver infracção esta foi praticada sem qualquer intenção por parte do Recorrente, pois como se disse, em momento algum de todo este processo bastante confuso e atabalhoado de submissão às sucessivas Juntas de saúde, o Recorrente ficou ciente de que deveria regressar ao serviço.
CVIII. Inexiste culpa do Recorrente e não havendo culpa não existe infracção disciplinar, e logo, não pode haver punição.
CIX. Os factos imputados ao Recorrente não revelam qualquer culpa grave, ou negligência grosseira, no cumprimento dos seus deveres, antes pelo contrário, o Recorrente foi vítima dos vícios do procedimento de submissão às sucessivas Juntas de Saúde.
CX. O seu comportamento nem tão pouco teve qualquer tipo de repercussões na imagem dos Serviços de Alfândega.
CXI. A actuação da Administração Pública é total e manifestamente desproporcional e inadequada.
CXII. A decisão de demissão tem um forte impacto na vida do Recorrente, com nefastos efeitos patrimoniais e não patrimoniais de difícil reparação.
CXIII. A Entidade Recorrida ignorou os factos supra elencados que atenuam sobremaneira a actuação do Recorrente e que justificam a aplicação de uma pena que não a mais gravosa, como sendo a de demissão.
CXIV. Verifica-se um erro manifesto na escolha da medida sancionatória aplicada, em claro desrespeito pelo princípio da proporcionalidade.
CXV. A decisão ora recorrida enferma do vício de violação de lei, por violação dos princípios da proporcionalidade, adequação e justiça consagrado nos artigos 5º, n.º 2, e 7º do CPA, pela total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários no que respeita à aplicação da pena de demissão, o que gera a sua anulabilidade.
Nestes termos e nos melhores de Direito,
Requer-se a V. Exa. se digne anular a decisão proferida pelo Exmo. Senhor Secretário para a Segurança em 26 de Março de 2021 (por Despacho n.º 020/SS/2021), por se mostrar inquinada dos seguintes vícios:
- vício de forma por falta de fundamentação;
- vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito;
- vício de violação de lei por violação do princípio da proporcionalidade, adequação e justiça.
Para tanto,
Requer a V. Exa. se digne ordenar a citação da Entidade Recorrida para, querendo, contestar o presente recurso contencioso no prazo legal, nos termos do disposto no artigo 52º e seguintes do CPAC, com a indicação que deverá remeter a estes autos o respectivo processo (administrativo) disciplinar génese destes autos, nos termos do disposto no artigo 55º do CPAC.”
*
Regularmente citada, apresentou a entidade recorrida contestação, tendo formulado as seguintes conclusões:
“a. O recorrente constituiu-se em ausência ilegítima, violando o dever de assiduidade – artigo 13º, n.º 2, al a) do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau – na sequência das reuniões da Junta de que entendeu não ser a doença impeditiva de comparecer ao serviço, conforme descrito no despacho recorrido, faltando mais de 5 dias consecutivos, sem qualquer justificação.
b. O recorrente sempre esteve ciente da deliberação da Junta de Saúde, comunicada na sua presença e cuja consequência só poderia ser o regresso ao serviço, o que o recorrente entendeu, porquanto prosseguiu a apresentação de atestados médicos, desnecessários no caso de a Junta de Saúde lhe ter confirmado e prorrogado o estado de doença impeditiva de comparecer ao serviço.
c. Não obstante, e por mera cautela, sempre se dirá que, mesmo após a notificação, em 22 de Agosto de 2019, da homologação da deliberação pelo Director dos Serviços de Saúde, o arguido manteve-se ausente, em afrontoso desrespeito pelo dever de assiduidade, contrariando e lesando o interesse público.
d. Foram ponderadas as atenuantes que favorecem o recorrente, porém tal não afastou a justiça de punição com a pena de DEMISSÃO, o que resulta, aliás, da vinculação legal – alínea i) do n.º 2 do artigo 238º, ambos do Estatuto dos Militarizados das Forças da alínea c) do seu artigo 340º.
e. Ao recorrente, na sua qualidade de arguido, foi proporcionado o direito de defesa, que exerceu.
Termos em que, e nos mais de direito que V. Exas, como sempre, suprirão,
Deve o presente recurso ser julgado improcedente por decaimento dos vícios que lhe são imputados, mantendo-se a decisão recorrida.”
Oportunamente, apresentaram o recorrente e a entidade recorrida alegações facultativas, reiterando as razões já deduzidas nos seus articulados.
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Corridos os vistos, cumpre decidir.
O Tribunal é o competente.
O processo é o próprio.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas, estão devidamente representadas e têm interesse processual.
Não existem questões prévias, excepções nem nulidades que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
Resulta provada dos elementos constantes dos autos, designadamente do processo administrativo, a seguinte matéria de facto com pertinência para a decisão do recurso:
O recorrente é verificador de primeira alfandegário dos Serviços de Alfândega.
Pelo menos desde 14 de Fevereiro de 2018, o recorrente esteve ausente ao serviço tendo apresentado os seguintes atestados médicos referentes aos seguintes períodos:
- 14.2.2018 a 3.1.2019 (fls. 148 a 190 do P.A.);
- 29.1.2019 a 10.10.2019 (fls. 191 a 227 do P.A.);
- 15.10.2019 a 23.1.2020 (fls. 228 a 242 do P.A.);
- 11.2.2020 a 2.7.2020 (fls. 243 a 263 do P.A.);
- 21.7.2020 a 17.8.2020 (fls. 264 a 267 do P.A.);
- 19.8.2020 a 1.9.2020 (fls. 268 a 269 do P.A.);
- 5.9.2020 a 21.9.2020 (fls. 270 a 272 do P.A.).
O recorrente apresentou os atestados médicos acima descritos com vista a justificar a sua ausência por doença.
O recorrente compareceu às inspecções realizadas pela Junta de Saúde, tendo esta deliberado confirmar as faltas por doença entre o período de 14.2.2018 e 28.6.2019. (fls. 58, 60, 64, 66, 68 e 74 do P.A.)
Na inspecção realizada pela Junta de Saúde no dia 28.6.2019, o recorrente foi informado verbalmente pela presidente da Junta de que podia retomar o seu posto de trabalho a partir do dia seguinte. (fls. 72 do P.A.)
O recorrente não se apresentou ao serviço no dia seguinte.
Devidamente homologado pelo Director dos Serviços de Saúde, o recorrente foi notificado, por escrito, da homologação no dia 22.8.2019. (fls. 463 do P.A.)
No dia 6.9.2019, o recorrente voltou a comparecer à Junta de Saúde, tendo o mesmo sido informado verbalmente pela presidente da Junta de que não foi confirmado o período de ausência por doença compreendido entre 29.6.2019 e 27.8.2019, mantendo a opinião de que o recorrente podia retomar o seu posto de trabalho a partir de 29.6.2019. (fls. 74 do P.A.)
Devidamente homologado, não foi dado conhecimento ao recorrente do acto de homologação praticado pelo Director dos SSM.
No dia 18.10.2019, o recorrente compareceu novamente à Junta de Saúde, e foi informado verbalmente pela presidente da Junta de que não foi confirmado o período de ausência por doença compreendido entre 27.8.2019 e 3.10.2019. (fls. 76 do P.A.)
Devidamente homologado, não foi dado conhecimento ao recorrente do acto de homologação praticado pelo Director dos SSM.
Em 21.11.2019, foi ordenada a instauração do processo disciplinar contra o recorrente que correu termos sob o n.º 36/2019-2.6-DIS. (fls. 1 do P.A.)
Oportunamente, foi deduzida acusação em processo diciplinar contra o recorrente.
Submetidos os autos ao Exm.º Secretário para a Segurança, foi proferido o seguinte despacho: (fls. 685 a 686 do P.A.)
“DESPACHO Nº 020/SS/2021
Processo Disciplinar n.º 36/2019-2.6-DIS
Arguido: Verificador de Primeira Alfandegário n.º XXXXXX, A
Da matéria constante da Acusação deduzida contra o arguido, Verificador de Primeira Alfandegário n.º XXXXXX, A, dos Serviços de Alfândega, nos presentes autos, colhem-se como abundantemente provados os seguintes factos:
O arguido foi submetido à Junta de Saúde no dia 28 de Junho de 2019, a qual pese embora a incapacidade para o trabalho, fixada em 8%, atestada por documento médico apresentado, deliberou no sentido de que o mesmo deveria voltar ao serviço, razão pela qual não lhe atribuiu mais dias de doença, como faria se considerasse o exercício de funções, mesmo que moderado, inconveniente ou prejudicial para o seu estado de saúde.
O arguido, se mais não fora pela não prorrogação da situação de doença – nos termos no n.º 3 do artigo 105º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau (ETPAM), aprovado pelo Dec Lei 87/89/M, de 21 de Dezembro, a Junta de Saúde pode determinar a permanência na situação de doença por sucessivos períodos de 30 dias -, ficou sempre ciente do dever de se apresentar ao serviço, o que não fez, antes tendo prosseguido a apresentação de atestados médicos, até ser presente a nova reunião da Junta de Saúde, ignorando sempre o seu resultado. E, mesmo que não tivesse ficado ciente dessa obrigação, por ocasião da realização da Junta de Saúde subsiste nos autos provado que o arguido se manteve ausente após ter sido notificado, em 22 de Agosto, da homologação da sobredita deliberação, sendo que, em nova reunião da Junta de Saúde, lhe foram injustificadas as faltas entre 27 desse mês e 3 de Outubro, todas estas datas referentes ao ano de 2019.
O arguido infringiu, assim, por forma plúrima, o dever de assiduidade previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 13º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau (EMFSM), aprovado pelo Decreto Lei n.º 66/94/M, de 30 de Dezembro e, por exceder largamente os 5 dias consecutivos de faltas injustificadas no mesmo ano civil, colocou-se na situação de ausência ilegítima, a que se refere a alínea i) do n.º 2 do seu artigo 238º, com referência ao disposto nos n.ºs 2 e 5, respectivamente dos artigos 90º e 105º do citado ETAPM.
O arguido afrontou de forma deliberada e indesculpável uma decisão que se lhe impunha como obrigação a cumprir. O seu comportamento absentista demonstra não ter condições para a manutenção do vínculo funcional, nomeadamente por falta de identificação com o dever de assiduidade e com a obrigação de disponibilidade para o exercício de funções, especialmente quando se compara este tipo de conduta com a entrega ao serviço público protagonizada pela generalidade dos seus colegas, sendo – até por critérios de justiça relativa -, de excluir a aplicação da pena expulsiva de aposentação compulsiva, não obstante contar mais de 15 anos de serviço, em face da atitude relapsa demonstrada, e cuja gravidade inculca um elevado grau de censura ético-jurídica designadamente ao persistir num de grau incapacidade física não clinicamente comprovado.
Nestes termos, ouvido o Conselho de Justiça e Disciplinar, o Secretário para a Segurança, no uso dos poderes executivos que lhe advêm do n.º 1 da Ordem Executiva n.º 182/2019, com referência à competência disciplinar atribuída pelo Anexo G ao artigo 211º do EMFSM, ponderado que foi, também, o circunstancialismo atenuante designadamente aquele a que se referem as alíneas b) e h) do n.º 2 do artigo 200º do citado EMFSM,
Pune o arguido, Verificador de Primeira Alfandegário n.º XXXXXX, A, com a pena disciplinar de DEMISSÃO, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 219º, alínea g) e 224º, 238º n.º 2 al. i) e 240º al c), com os efeitos do artigo 228º, todos os normativos citados do EMFSM.”
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Aberta vista ao Ministério Público, foi emitido pelo Digno Procurador-Adjunto o seguinte douto parecer:
“在起訴狀及陳述詞中,司法上訴人皆請求中級法院撤銷保安司司長閣下第020/SS/2021號批示(卷宗第91-92頁)。為支持其訴求,司法上訴人提出如下理由:被訴實體的批示欠缺說明理由,出現事實及法律前提錯誤的瑕疵,違反適度原則、適當原則及公正原則。
被訴批示之內容是:因司法上訴人2019年8月21日至10月3日之不正當缺勤,依據《澳門保安部隊軍事化人員通則》第219條g項、第224條、第238條第2款i項及第240條c項的規定,對他科處「撤職」處分。
*
作為行政行為有效性的形式要件,說明理由(fundamentação)規定在《行政程序法典》第114至116條。第115條允許(行政機關採用)援引式說明理由(fundamentação por remissão),該條所確立的(說明理由須具備的)要件是:同文本(contextual)、清晰、明確、連貫、充分 (Lino Ribeiro e José Cândido de Pinho: Código do Procedimento Administrativo de Macau – Anotado e Comentado, pp. 637 a 642)。
性質上,說明理由係指顯然能夠為行政決定及證明性闡述或判斷提供依據的論述,具有形式上獨立的意義(見終審法院在第14/2002號上訴中之裁判)。值得指出,理論與司法見解的共識是:行政行為的理由說明是一個相對概念和彈性要求,取決於行政行為的法定類型以及其置身其中的情勢與狀況,其判斷標準在於令一個擁有正常理解能力及一般洞察力的相對人能夠明晰及理解行政當局作出某個行政行為的事實基礎與法律依據,且不得脫離或無視具體利害關係人的特定狀況和理解能力(見中級法院在第112/2005號上訴中之裁判,葡萄牙最高行政法院在第44302號上訴中之裁判)。
同樣值得指出的是,上述“共識”意味著說明理由有合理界限,不要求鉅細無遺。終審法院一再重申,不要求法院對證據作考證性審查(參見終審法院在第9/2001號、第10/2002號、第11/2003號和第11/2011號上訴中之裁判),我們相信這一理念亦適用於行政機關。無論如何,我們認同的一個精闢見解是:即使行政行為的理由說明並不豐富,但如仍能讓所針對的人了解其請求不獲批准的原因,那麼該行為不存有欠缺理由說明或理由說明不足的瑕疵(見終審法院在第12/2017號上訴中之裁判)。
關於理由說明之含義與要件,澳門《行政程序法典》第115條第1款與第2款規定:一、說明理由應透過扼要闡述有關決定之事實依據及法律依據,以明示方式作出;……。二、採納含糊、矛盾或不充分之依據,而未能具體解釋作出該行為之理由,等同於無說明理由。
由此可見,理由說明之目標和量度是明示、扼要地闡述(有關決定之)事實依據及法律依據。質言之,理由說明僅僅要求扼要、清晰、連貫和充分地闡述(有關決定之)事實依據及法律依據是什麼,它不要求論證事實依據及法律依據的合理性與存在理由,這不僅旨在避免墜入“對理由說明再予以理由說明”的循環論證,而且因為“依據”自身是否合理與充分是實質/內容(substância/conteúdo)判斷,不是形式問題。
眾所周知“扼要”這個詞意味著簡潔明了,無須面面俱到。職是之故,行政法理論和司法見解一以貫之、不厭其詳地指出:第115條第2款所規定之“充分”是一個相對概念(conceito relativo),不要求行政機關窮盡其所作之行政行為的一切根據,一般標準是能讓一個普通利害關係人還原相關行為作出者的認知和評價過程(終審法院在第56/2017號,第35/2018號和第139/2019號程序中之裁判)。就此,終審法院明確指出(終審法院在第22/2017號程序中之裁判):即使行政行為的理由說明並不豐富,但如仍能讓所針對的人了解其請求不獲批准的原因,那麼該行為不存有欠缺理由說明或理由說明不足的瑕疵。
在我們看來,同樣值得指出:理由說明之目標與宗旨皆在於讓具體利害關係人知悉(cognoscer)特定行政行為的事實依據與法律依據,尤其是讓利害關係人明白(compreender)相關行政機關的認知和評價過程,知悉有別於認同或曰贊同,不贊同無損知悉和了解行政行為的事實依據與法律依據。
遵循終審法院的精湛司法見解,在完全尊重不同觀點的前提下,我們傾向於認為:司法上訴人在起訴狀第79條、第80條、第82條及第84條所說之論點屬苛求,所以不成立。的確,被訴批示中明確指出:E, mesmo que não tivesse ficado ciente dessa obrigação, por ocasião da realização da Junta de Saúde subsiste nos autos provado que o arguido se manteve ausente após ter sido notificado, em 22 de Agosto, da homologação da sobredita deliberação, sendo que, em nova reunião da Junta de Saúde, lhe foram injustificadas as faltas entre 27 desse mês e 3 de Outubro, todas estas datas referentes ao ano de 2019。
身為已擁有豐富的人生閱歷、警務經驗,深信司法上訴人對公共實體的行政程序具備一定的了解,更何況他因病缺勤已久,因此我們有理由相信司法上訴人具備足夠的理解能力知道被訴批示中所指的“Junta de Saúde”是指那一部門。而且他作為當事人比任何人更為清楚被訴批示所指的缺勤時間,故此,被訴行政行為不存在欠缺說明理由的瑕疵。
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首先有必要指出,終審法院的精闢立場是(舉例而言,參見終審法院在第137/2021號及第141/2021號程序中之合議庭裁判):一、健康檢查委員會的意見書須經“衛生局局長確認”(根據第81/99/M號法令第8條第2款f項的明文規定),這樣,應當得出的結論是,具有“行政行為”之“性質”並產生此類行為的典型法律“效果”,特別是具有典型的“約束效果”並對其相對人必然具有“強制性”的行為,是(對意見書予以)“確認的行為”。二、因此,健康檢查委員會…的 (單純)意見書,儘管已被適當及實際通知給其相對人(即現上訴人),但卻並未使得其有“義務”(於翌日)返回部門工作,不妨礙其繼續按照前文所轉錄的《澳門公共行政工作人員通則》第100條a項的規定以醫生檢查證明作為其因病缺勤的合理解釋 (原因在於,一如前述,這項“義務”僅在就衛生局局長對上述意見書所作的“行政確認行為”作出通知時方產生,而有關通知直到…才作出)。
就本案而言,從行政卷宗第72頁、第74頁、第76頁、第116頁不容置疑地證實司法上訴人知悉健康檢查委員會對他的相關專科醫生為其進行的工作能力評估結果及委員會一致認為他目前健康狀況可返回工作崗位一事,並且知道他所提交的醫療報告未能證實其於2019年6月29日至2019年8月27日、自2019年8月27日至2019年10月3日以及至2020年5月29日至2020年7月28日期間的缺勤為合理因病缺勤,不予確認,而相關的健康檢查委員會的意見書於同日經局長或副局長確認。
的確,不容忽視的是(參見終審法院在第141/2021號程序中之合議庭裁判):由於確認行為是產生約束效果的行政行為,影響了工作人員的法律地位,所以有必要根據《行政程序法典》第68條的規定對該行為作出通知。本案中,從行政卷宗第463頁可以看到,海關根據健康檢查委員會對司法上訴人作出之審查記錄,確切通知了他有關健康檢查委員會對其作出的意見以及他應返回部門繼續擔任職務一事。
基於上述事實,顯而易見,司法上訴人2019年8月27日至10月3日之缺勤屬於不合理缺勤符合終審法院之司法見解闡明之全部前提:1)- 健康檢查委員會的意見書,2)- 衛生局局長對上述意見書作出了確認,3)- 海關向司法上訴人做出了通知。鑒於此,我們認為被訴批示不存在事實前提錯誤。
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再者,第164/DRH/2019號的報告書不容置疑地顯示(見P.A.第2-3頁):司法上訴人自2018年2月14日開始一直處於因病缺勤的狀況,健康檢查委員會對他於2019年6月29日至2019年10月3日(共97天)之缺勤的意見為“不是”合理因病缺勤。不僅如此,值得一提的是:他自2020年5月29日至2020年7月28日(共61天)之缺勤,同樣被定性為“不屬”合理因病缺勤(參見P.A.第116頁)。這不容置疑地意味著,不合理缺勤累計達158天。
鑑於上述97天之缺勤被定性為“不是”合理因病缺勤。司法上訴人的不正當缺勤已遠遠超過《公共行政作人員通則》第315條第2款f項所規定的上限(limite máximo),即:在同一曆年內,無合理解釋而連續缺勤二十日或間斷缺勤三十日。須知,澳門《保安部隊軍事化人員通則》第238條第2款i項明文規定:在同一曆年內不正當缺勤連續五日或間歇十日導致“強迫退休”或“撤職”之處分。該《通則》第240條c項確鑿援引第238條第2款i項,關於第240條之含義,終審法院精闢指出:對於《澳門保安部隊軍事化人員通則》第240條中所規定的行為只能科處撤職處分(見終審法院在第11/2019號和第41/2020號程序中之合議庭裁判)。訴諸語法,這裡的“只能”意味著:撤職是唯一合法的紀律處分,別無其他,科處撤職處分是“受拘束”權力。
依據上述司法見解,我們有理由相信:針對《保安部隊軍事化人員通則》第240條列舉的違紀行為,撤職是唯一合法的紀律處分;質言之,第240條賦予行政當局之權力是受拘束權力;有鑑於此,本案之系爭批示作為毋庸置疑的受拘束行政行為,基於事物自身之屬性,必然不會觸犯適度原則。
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綜上所述,謹此建議法官閣下:宣判司法上訴人敗訴,駁回其全部訴求。”
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Vejamos o caso.
Ao recorrente foi aplicada a pena disciplinar de demissão imputando-lhe a não observância do dever de assiduidade previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 13º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau (EMFSM).
Refere-se no despacho recorrido que, tendo o recorrente sido submetido à Junta de Saúde no dia 28.6.2019, esta deliberou que o mesmo deveria voltar ao serviço e, tendo ficado ciente do dever de se apresentar ao serviço, o recorrente não o fez, antes veio continuar a apresentar atestados médicos. Mais se invoca no despacho recorrido que, mesmo que ele não tivesse ficado ciente dessa obrigação de se apresentar ao serviço, o recorrente foi notificado da homologação da deliberação da Junta no dia 22.8.2019, daí que as faltas dadas entre 27.8.2019 e 3.10.2019 seriam injustificadas.
Prevê o n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 81/99/M que “A verificação ou confirmação das doenças e das incapacidades é feita pela Junta de Saúde e pela Junta de Revisão.”
Mais estatui a alínea a) do n.º 2 do mesmo artigo que “Compete à Junta de Saúde, entre outros, verificar ou confirmar, nos termos da lei, as situações de doença do pessoal dos serviços públicos, tendo em vista a justificação de faltas ou fixação de incapacidades resultantes de doença ou acidente.”
E, por outro lado, determina a alínea f) do n.º 2 do artigo 8.º do mesmo diploma legal que “Compete ao Director dos SSM, em especial, homologar os pareceres das juntas médicas.”
Conforme se decidiu no Acórdão do Venerando TUI, no âmbito do Processo n.º 137/2021:
“Aliás, como se viu, este parecer da Junta de Saúde – como a própria expressão “parecer” o sugere – está sujeito a “homologação do Director dos Serviços de Saúde”, (nos termos expressamente previstos no art. 8°, n.° 2, alínea f) do D.L. n.° 81/99/M), mostrando-se, assim, (natural) concluir que é o “acto de homologação” (do parecer), e não o referido parecer, que reveste a “natureza” (e produz os “efeitos” jurídicos típicos) de um “acto administrativo”, ou seja, (e em especial), o típico “efeito vinculativo”, com a sua necessária “obrigatoriedade” para o seu destinatário, impondo-se, desta forma, considerar, igualmente, que – como in casu sucedeu – o (mero) parecer da Junta de Saúde datado de 05.07.2019 (e que foi efectivamente comunicado ao ora recorrente), não o constituiu no “dever” de regressar ao trabalho no dia seguinte, não o impedindo de continuar a justificar as suas faltas por doença através de atestados médicos nos termos previstos na atrás transcrita alínea a) do art. 100° do E.T.A.P.M., (já que, como se referiu, tal “dever” e “impedimento” só se constituiu com a notificação do “acto – administrativo – de homologação” do dito parecer praticado Director dos Serviços de Saúde, o que só veio a suceder em “25.10.2019”; cfr., “matéria de facto”).”
No caso sub judice, o recorrente foi submetido à Junta de Saúde no dia 28.6.2019, e nesse dia foi deliberado que o mesmo podia regressar ao seu posto de trabalho.
Entretanto, o recorrente só foi notificado da homologação daquele parecer da Junta no dia 22.8.2019, ou seja, só a partir dessa data é que a deliberação produz efeitos jurídicos na esfera jurídica do recorrente.
Em bom rigor, o recorrente devia regressar ao serviço logo no dia seguinte, mas não o fez.
De facto, o recorrente continuou a apresentar atestados médicos para justificar a sua ausência ao serviço.
Nos dias 6.9.2019 e 18.10.2019, o recorrente voltou a comparecer à Junta de Saúde, tendo o mesmo sido informado verbalmente pela presidente da Junta de que não foram confirmados os dias de ausência por doença relativamente aos períodos de 29.6.2019 a 27.8.2019 e de 27.8.2019 a 3.10.2019.
Devidamente homologados, não foi dado conhecimento ao recorrente desses dois actos de homologação praticados pelo Director dos SSM.
Preceita-se o artigo 105.º do ETAPM o seguinte:
“1. Para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo anterior, a Junta de Saúde deve pronunciar-se sobre:
a) A aptidão do trabalhador em regressar ao serviço, no caso da alínea a);
b) (…)
c) (…)
2. O trabalhador que, tendo sido considerado apto pela Junta de Saúde para regressar ao serviço, volte a adoecer, no decurso dos 7 dias úteis seguintes, deve ser imediatamente mandado apresentar à mesma Junta, para efeitos de confirmação da doença.
3.(…)
4.(…)
5. Se a Junta de Saúde considerar ter existido uma situação indiciadora de fraude ou não confirmar a doença nos termos do n.º 2, os dias de ausência são havidos como faltas injustificadas, aplicando-se ao trabalhador o disposto no n.º 2 do artigo 90.º
6.(…)
7. O parecer da Junta de Saúde deve ser comunicado ao trabalhador no próprio dia e enviado ao respectivo serviço imediatamente após ter sido homologado.”
Ora bem, é verdade que na inspecção efectuada pela Junta de Saúde no dia 28.6.2019 foi deliberado que o recorrente podia regressar ao serviço, mas o mesmo só tomou conhecimento do respectivo despacho de homologação no dia 22.8.2019, pelo que deveria, em princípio, regressar ao serviço no dia seguinte, i.e., no dia 23.8.2019.
Como o recorrente continuou a apresentar atestados médicos, a Junta tinha que voltar a apreciar a situação, e se continuava a não confirmar os dias de ausência, as faltas (mesmo que fossem justificadas com atestados médicos) eram consideradas como injustificadas, nos termos previstos no n.º 5 do artigo 105.º do ETAPM.
No caso vertente, o recorrente foi notificado no dia 22.8.2019 da homologação do parecer da Junta de Saúde de que teria que regressar ao serviço (logo no dia 29.6.2019), mas como ele continuava a apresentar atestados médicos, a Junta de Saúde voltou a inspeccionar o recorrente nos dias 6.9.2019 e 18.10.2019, e nessas duas vezes não foram confirmadas as respectivas faltas por doença.
Nos termos dos artigos 68.º e 69.º do Código do Procedimento Administrativo, estatui-se que devem ser notificados aos interessados os actos administrativos que, entre outros, impunham deveres, sujeições ou sanções, ou causem prejuízos, só podendo ser a mesma dispensada quando sejam praticados oralmente na presença dos interessados ou quando o interessado, através de qualquer intervenção no procedimento, revele perfeito conhecimento do conteúdo dos actos em causa.
Conforme o citado Acórdão do TUI, o parecer da Junta de Saúde não reveste a natureza de verdadeiro acto administrativo, antes consiste num mero acto opinativo, só o é o acto de homologação do Sr. Director.
Por o acto de homologação praticado pelo Director dos Serviços de Saúde constituir um acto pressuposto da decisão da sanção disciplinar, na medida em que o recorrente não foi notificado daqueles dois actos de homologação em que não confirmavam os dias de ausência reportados, respectivamente, aos períodos de 29.6.2019 a 27.8.2019 e de 27.8.2019 a 3.10.2019, não se pode considerar que aqueles dias de ausência são havidos como faltas injustificadas, ao abrigo dos termos previstos nos artigos 105.º, n.º 5 e 7 e 90.º, n.º 2, ambos do ETAPM.
A nosso ver, até ao momento em que o(s) acto(s) de homologação do Director dos Serviços de Saúde fosse(m) levado(s) ao conhecimento do trabalhador, ora recorrente, este ainda não estava obrigado a regressar ao serviço no dia seguinte nem estava impedido de continuar a justificar as faltas por doença através da apresentação de atestados médicos nos termos da alínea a) do artigo 100.º do ETAPM.
Isto posto, uma vez que o recorrente apresentou atestados médicos para justificar as faltas ao serviço, carece de fundamento legal o entendimento e a conclusão de que o mesmo esteve na situação de ausência ilegítima, daí que, enfermando o acto administrativo impugnado do vício de violação de lei, deve o mesmo ser anulado.
Face ao decidido, prejudicado fica o conhecimento das restantes questões suscitadas.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, o Colectivo de Juízes deste TSI acorda em julgar procedente o recurso contencioso interposto pelo recorrente A, anulando o acto administrativo impugnado.
Sem custas face à isenção subjectiva da entidade recorrida.
Registe e notifique.
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RAEM, 28 de Julho de 2022
Tong Hio Fong
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
Lai Kin Hong
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Mai Man Ieng
Recurso Contencioso 375/2021 Página 1