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Processo nº 63/2022
(Autos de recurso civil e laboral)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Em sede dos Autos de Recurso Civil e Laboral n.° 626/2021 proferiu o Tribunal de Segunda Instância o seguinte veredicto datado de 20.01.2022:

“I) RELATÓRIO
A, ré no processo acima identificado, inconformada com a sentença que a condenou a pagar à autora B, com sinais nos autos, o montante de MOP21.277.068,20, acrescido de juros de mora à taxa legal, recorreu jurisdicionalmente para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“1. Por sentença proferida pelo Tribunal a quo em 8 de Fevereiro de 2021, foi julgada procedente a acção intentada pela autora, ficando a ré condenada no pagamento da quantia de MOP21.277.068,20, consoante o pedido formulado pela autora, e dos juros legais contados a partir da citação.
2. Entendeu a recorrente que a sentença proferida pelo Tribunal a quo padecia do erro na aplicação da lei.
3. O Tribunal a quo determinou, conforme o acórdão proferido pelo TSI, que o subgerente geral da recorrente, 丙 (C), era competente para alterar o preço estipulado no “Acordo de subempreitada da obra”, em representação da recorrente.
4. Todavia, o TSI apenas procedeu à alteração das respostas aos quesitos 4º a 6º e 8º a 13º da base instrutória e passou a considerar como alínea F) dos factos provados a matéria relativa aos quesitos 6º e 12º da base instrutória no que respeita à questão de saber se 丙 (C) era ou não representante da recorrente.
5. Se 丙 (C), como subgerente geral, podia ou não representar a recorrente? Na verdade, essa não é uma questão da matéria de facto, mas sim uma questão da matéria de direito, pelo que a convolação da matéria de facto efectuada pelo Tribunal Colectivo do TSI não prejudica o conhecimento da matéria de direito em causa pelo Tribunal a quo.
6. Verifica-se a insuficiência manifesta de fundamentos de direito na sentença recorrida por se fundamentar meramente na decisão proferida pelo TSI no seu acórdão quanto à matéria em apreço.
7. Porquanto, o acórdão do TSI invocado pela sentença recorrida nunca citou qualquer disposição legal nem procedeu a qualquer aplicação da lei.
8. A sentença recorrida não especificou os fundamentos de direito que sustentassem a decisão, pelo que se deve declarar nula a sentença recorrida.
9. Em caso de discordância dos Venerandos Juízes com a nulidade da sentença recorrida por falta de especificação de fundamentos de direito que sustentem a decisão, solicita-se que seja ponderada a seguinte alegação.
10. Se a recorrente é vinculada pelo acto praticado por 丙 (C)? Questão essa é da matéria de direito e não da matéria de facto, por isso, deve-se proceder a aplicação da lei em conformidade com os factos provados no caso, com vista à produção do correspondente efeito jurídico.
11. In casu, o aumento do preço da obra de subadjudicação, do valor de MOP313.000.000,00 para o valor de MOP365.000.000,00, consiste numa alteração do conteúdo do “Acordo de subempreitada da obra”.
12. Nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 400º do Código Civil, a alteração do conteúdo do contrato só é permitida por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.
13. Os factos provados não demonstram que 丙 (C) seja administrador da recorrente e que a recorrente tenha proposto, mediante autorização da assembleia geral, 丙 (C) como gerente, ao abrigo do n.º 3 do art.º 235º do Código Comercial, pelo que não se apura que 丙 (C) possa praticar todos os actos respeitantes ao exercício da empresa para que se acha proposto, ao abrigo do n.º 1 do art.º 65º do Código Comercial, assim sendo, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 335º do Código Civil, cabe à recorrida o ónus de prova.
14. De acordo com a alínea F) dos factos provados, 丙 (C), como subgerente geral, tem os poderes da divisão do trabalho e da administração da sociedade, por exemplo da elaboração dos contratos de obras, mas não tem os poderes da celebração, alteração ou extinção dos contratos de obras, nomeadamente o aludido poder da representação da sociedade na alteração, juntamente com terceiros, do conteúdo do “Acordo de subempreitada da obra” celebrado.
15. Ora, 丙 (C) não pode, nos termos do disposto nos artigos 235º, 236º e 383º do Código Comercial, representar a recorrente, portanto, a concordância deste com o preço proposto depois da alteração não produz efeito na esfera jurídica da recorrente.
16. A par disso, segundo os depoimentos da testemunha 丁 (D), o então gerente de projecto sénior do projecto de [Hotel(1)], a alteração do diâmetro de estacas não foi solicitada pelo dono da obra, pelo que o dono da obra não iria pagar à recorrente por quaisquer obras adicionais resultantes da alteração do diâmetro de estacas.
17. Mesmo que não tivesse qualquer receita adicional, a recorrente aceitou pagar à subempreiteira, ora recorrida, a quantia de MOP52.000.000,00, como custo adicional (i.e. foram adicionados 16,7% ao custo total), sendo este um acto que desrespeita as regras da experiência comum e a lógica comercial.
18. 丙 (C) não pode, em representação da recorrente, alterar o conteúdo do “Acordo de subempreitada da obra”, pelo que a recorrente e a recorrida devem executar o contrato de acordo com o preço da obra, no valor de MOP313.000.000,00, fixado no inicial “Acordo de subempreitada da obra”, além disso, por ter efectuado o pagamento total do preço da obra, a recorrente não precisará de pagar mais à recorrida pela obra subempreitada mencionada no caso.
19. Em caso de discordância dos Venerandos Juízes com a tese acima exposta, solicita-se que seja ponderada a seguinte alegação.
20. Conforme a alínea W) dos factos provados e o quesito 18º da base instrutória não provado, a dedução ao valor da obra que a recorrida tem direito a receber, deveria ser de MOP43.662.565,24 em vez de MOP40.923.836,18.
21. Por conseguinte, o valor da obra que a recorrida tem direito a receber, é de MOP18.538.412,76 (MOP356.050.200,00 – MOP293.994.710,00 – MOP43.662.565,24 + MOP145.488,00), e não a quantia de MOP21.277.068,20 requerida pela recorrida e confirmada pelo Tribunal a quo.
Pelo exposto, solicita-se aos Venerandos Juízes do TSI que concedam provimento ao recurso interposto pela recorrente e, em consequência:
1. Declarem nula a sentença recorrida por falta de especificação de fundamentos de direito que sustentem a decisão;
2. Se o aludido motivo for julgado improcedente pelos Venerandos Juízes, devido ao provimento do motivo do recurso que defende a verificação do vício de aplicação da lei na sentença recorrida, requer-se que seja ordenada a revogação da sentença do Tribunal a quo, determinando que a recorrente não precisará de pagar mais à recorrida por ter efectuado o pagamento total do valor da obra de subempreitada em causa;
3. Se o motivo supracitado for julgado improcedente pelos Venerandos Juízes, devido ao erro cometido pelo Tribunal a quo na dedução ao valor da obra, requer-se que seja condenada a recorrente a pagar à recorrida uma quantia de dezoito milhões, quinhentas e trinta e oito mil, quatrocentas e doze patacas e setenta e seis avos (MOP18.538.412,76), a título de valor da obra; e
4. Seja condenada a recorrida a sustentar as custas.”
*
Ao recurso respondeu a autora ora recorrida, pugnando pela negação de provimento ao recurso.
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Este TSI no Acórdão proferido no âmbito do Processo n.º 321/2019 alterou parcialmente a matéria de facto provada, bem como anulou a sentença e determinou que se submetesse a julgamento outra matéria de facto que não havia sido julgada, designadamente se a ré só havia adiantado por conta da autora a quantia de MOP40.923.836,18, em vez da quantia de MOP43.662.565,24.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
Realizado novo julgamento, ficou assente a seguinte factualidade:
a) A autora “乙” (em português “B”), de registo comercial e bens móveis sob o n.º XXXXX(SO), é uma companhia de responsabilidade limitada, e exerce actividade de prestação de serviço de qualquer tipo de obra de construção, incluindo obra de fundação.
b) A autora é uma sociedade criada por “B de Hong Kong” em Macau e as duas empresas estão associadas”.
c) A ré “甲” (em português A)”, de registo comercial e bens móveis sob o n.º XXXXX(SO), é uma companhia que exerce actividade de aquisição predial ou investimento de imóveis com encargos fixados, de obras de construções públicas e privadas, de importações e exportações.
d) A ré tinha subadjudicado “[公司(1)]氹仔酒店項目基礎灌注樁2標段分判工程協議書(XXXXXXXX) (Acordo de Subadjudicação (XXXXXXXX) da Obra de Betonagem das Fundações por Estacas do Lote 2 do Projecto do Hotel da Taipa da [Empresa(1)])” em causa.
e) Em 11/01/2014, os representantes da ré e da subempreiteira, 戊 (E) e 己 (F), respectivamente, celebraram o acordo de subempreitada da obra supra referido.
f) 丙 (C) é subgerente-geral da companhia ré, cuja funções principal é proceder a cotações e propostas de concursos, subadjudicações e subempreitadas, fixação do preço de cada item das cotações ou propostas de concursos (BQ – Listagem dos Itens das Obras) e elaboração dos contratos de obras, apreciação e autorização dos montantes das obras, orientações para o pagamento dos montantes das obras, etc.
g) As partes determinaram a forma do pagamento a seguir:
i. Conforme a obra concluída do mês, apresentar o requerimento de pagamento de obra evoluída mensalmente, e cumprir o pagamento, depois de 30 dias da data descrita no requerimento de pagamento;
ii. A Retention (retenção) não deve ser superior a 5% da obra concluída e confirmada do mês, e o valor máximo não pode ser superior a 5% do preço total do contrato de subadjudicação da obra;
iii. Os 50% de Retention (retenção) seriam devolvidos, dentro de 30 dias, após a parctical completion (conclusão efectiva) do trabalho de Sub-sub-Work (subadjudicação). Quanto ao remanescente da retenção seria devolvida dentro de 30 dias, após os 12 meses decorridos, depois da practical completion (conclusão efectiva) do trabalho de Sub-sub-Work (subadjudicação).
h) Até aos meados de Fevereiro de 2016, a ré pagou à autora o montante da obra de MOP293.994.710,00, incluindo.
i) Os MOP313.000.000,00 o preço inicial da obra de subadjudicação fixado no acordo de subempreitada, indicada na alínea d). Este preço é resultante por base do desconto de 5,125% oferecido sobre o preço do concurso da obra de subadjudicação, isto é, MOP329.910.798,00, constante no documento n.º SWFL/14/002, com correspondência às listagens de quantidade de obras (BQ), as fls. T2.B3/1 a T2.B3/11, T2.B3/SUM, e os Terms and Conditions of Quotation (Termos e Condições de Cotação); (resposta ao quesito 1º da base instrutória)
j) O acordo de subempreitada celebrado entre a autora e a ré refere-se à obra indicada em d) e e); (resposta aos quesitos 1º-A e 2º da base instrutória)
k) Até á celebração do acordo referido na alínea i) foram apresentadas várias cotações pela autora à ré; (resposta ao quesito 3º da base instrutória)
l) Em 14.02.2014 a autora remeteu por e-mail a C1, subgerente-geral da ré o documento de fls. 163 a 181 que aqui se dá por reproduzido; (resposta ao quesito 4º da base instrutória com a redacção dada pelo douto acórdão do Venerando TSI)
m) .1 – A cotação apresentada pela autora mereceu a concordância de C1, subgerente-geral da ré. (resposta ao quesito 5º dada pelo douto acórdão do Venerando TSI).
n) A partir de 14.02.2014, a autora deu início ao trabalho da obra de subadjudicação; (resposta ao quesito 7º da base instrutória)
o) .1 – Em 17/02/2014, a ré solicitou à autora a alteração da concepção inicial de estacas, de 1 a 1,2m de diâmetro para 1,5m de diâmetro. (resposta ao quesito 8º dada pelo douto acórdão do Venerando TSI).
p) .2 – A alteração supra referida excedeu o preço unitário da listagem de quantidade de obra (RATE), acordada entre as partes, pelo que a ré solicitou à autora que efectuasse nova cotação. (resposta ao quesito 9º dada pelo douto acórdão do Venerando TSI).
q) Em 27.03.2014 a autora remeteu por e-mail ao subgerente-geral da companhia ré C1 o documento de fls. 219 a 220 que aqui se dá por reproduzido; (resposta ao quesito 10º da base instrutória com a redacção dada pelo douto acórdão do Venerando TSI)
r) A cotação supra referida foi obtida a concordância de C1, subgerente-geral da ré, o qual assinou nos respectivos documentos; (resposta ao quesito 11º da base instrutória com a redacção dada pelo douto acórdão do Venerando TSI)
s) .1 – Conforme o pedido da ré, a autora tinha procedido a obras adicionais no valor de MOP145.488,00. (resposta ao quesito 13º dada pelo douto acórdão do Venerando TSI).
t) Em Maio de 2015 a autora já havia concluído a obra objecto do contrato de subempreitada a que respeitam os autos e entregue a mesma à ré; (resposta ao quesito 14º da base instrutória)
u) O gerente de projecto da ré assinou e confirmou a Nota de Abonos e Descontos SW-013, no qual consta o montante MOP5.531.724,76 que a ré devia pagar; (resposta ao quesito 14º-1 da base instrutória)
v) Em 24.11.2016, a autora através do documento n.º SWFL/T2COTAI/MO/014, informava à ré, que após o cálculo feito, o trabalho efectivamente feito pela autora na obra de subadjudicação, cujo valor de obra é MOP381.135.982,52, deduzindo o desconto de 6,58186508%, concordados entre as partes (ou seja o valor de desconto vale MOP25.085.856,14), então perfazendo o montante da obra de MOP356.050.126,38; (resposta ao quesito 15º da base instrutória)
w) Do preço da obra a ré reteve MOP10.950.000,00 e ao preço da obra foram deduzidos MOP43.662.565,24. (resposta ao quesito 16º da base instrutória)
x) Após a reunião de 14/03/2014 referente ao orçamento da carta SWFL/D/14/007 de 14/2/2014, a autora enviou à ré o documento junto com a petição inicial a fls. 188, sob o n.º 16, propondo a alteração do preço da empreitada para MOP390.715.531,80. (resposta ao quesito 19º).
y) No dia 25/3/2014, via correio electrónico, C1, respondeu via e-mail a H, empregado da autora, dizendo que o orçamento enviado não corresponde ao acordo de ambos os representantes das partes e que depois de rectificar o orçamento, os valores deveriam ser os seguintes:
a) Que depois da rectificação do orçamento, o aumento de 24,8237% recaído sobre o valor de 313.000.000,00 daria o valor de MOP390.698.182,90;
b) Que incidindo sobre este valor o desconto de 6,5775%, o valor final seria de MOP365.000.000,00. (resposta ao quesito 20º).
z) A autora, por correio electrónico de 27/3/2014, respondeu à ré nos termos que constam de fls. 220 afirmando, designadamente que a sua resposta se destinava a confirmar que a ré tinha aceitado a proposta da autora pelo valor de MOP365.000.000,00. (resposta ao quesito 21º).
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Alega a recorrente que a sentença é nula por não ter sido especificados os fundamentos de direito.
Estatui-se na alínea b) do n.º 1 do artigo 571º do Código do Processo Civil que é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
Em boa verdade, há falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão quando se verificar uma ausência total de fundamentação.
Se a fundamentação é deficiente ou incompleta, não há nulidade. A sentença será então, ilegal ou injusta, podendo da mesma ser interposto recurso, nos termos gerais.1
Não basta, pois, que o juiz decida a questão posta; é indispensável que produza as razões em que se apoia o seu veredicto. A sentença, como peça jurídica, vale o que valerem os seus fundamentos. Referimo-nos ao valor doutrinal, ao valor como elemento de convicção, e não ao valor legal. Este deriva, como já assinalámos, do poder de jurisdição de que o juiz está investido.2
No vertente caso, podemos assinalar que tanto os fundamentos de facto como os de direito estão devidamente consignados na sentença final, não se descortinando, assim, a alegada falta de especificação de fundamentos que possa conduzir à nulidade da sentença.
Efectivamente, a recorrente pretende apenas pôr em causa a qualidade funcional do Sr. C1.
Contudo, face à matéria provada, o Sr. C1 é subgerente geral da recorrente e foi nessa qualidade funcional que procedeu a cotações e propostas de concursos, subadjudicações e subempreitadas, fixação do preço de cada item das cotações ou propostas de concurso e elaboração dos contratos de obras, apreciação e autorização dos montantes das obras, orientações para o pagamento dos montantes das obras. Sendo assim, se a recorrente pretende questionar a qualidade daquele indivíduo, é necessário ir pelo caminho de impugnação da matéria de facto.
Pelo que improcede o recurso quanto a esta parte.
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Em segundo lugar, a recorrente vem questionar os poderes de representação do referido Sr. C1.
Ora bem, conforme resulta da matéria de facto provada, o Sr. C1 é subgerente geral da recorrente e foi nessa qualidade funcional que procedeu a cotações e propostas de concursos, subadjudicações e subempreitadas, fixação do preço de cada item das cotações ou propostas de concurso e elaboração dos contratos de obras, apreciação e autorização dos montantes das obras, orientações para o pagamento dos montantes das obras. Trata-se de um facto confessado pela própria recorrente na contestação, pelo que é inalterável.
Uma vez que confessou ser o Sr. C1 seu subgerente geral e que foi nessa qualidade funcional quem tratou da execução dos trabalhos da subempreitada, o facto de vir agora dizer que ela a recorrente não conferiu poderes ao referido indivíduo para acompanhar os trabalhos de execução ou está a mentir ou está a abusar do seu direito na modalidade de venire contra factum proprium.
Aliás, tendo sido provado que o Sr. C1 agiu na qualidade de subgerente geral da recorrente, a falta de requisitos legais quanto à representação mais não seja do que uma excepção peremptória cujo ónus de prova compete à própria recorrente.
Uma vez que a tal questão não foi suscitada pela ré ora recorrente em fase dos articulados, há-de julgar improvido o recurso nesta parte.
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Finalmente, alega a recorrente que houve erro na determinação do valor a deduzir à quantia em dívida.
Mais precisamente, entende a autora que a ré não podia ter deduzido a quantia de MOP43.662.565,24 à quantia em dívida, mas somente o valor de MOP40.923.836,18.
Ou seja, segundo a perspectiva da autora, a dedução só deveria ser de MOP40.923.836,18, enquanto para a ré, há-de descontar a quantia de MOP43.662.565,24.
Por haver dúvida quanto a esse aspecto, foi ordenado pelo TSI, no âmbito do recurso jurisdicional, proceder-se a novo julgamento dessa matéria que não havia sido julgada.
Feita a produção de prova, não logrou demonstrar qual seria o valor da quantia adiantada pela ré ora recorrente a terceiros por conta da autora, para efeitos de cálculo do valor devido pela ré.
Em nossa opinião, concordamos com o entendimento assumido pela primeira instância nos seguintes termos que se transcreve:
“Ao valor dos trabalhos executados (MOP356.050.200,00) há a descontar MOP293.994.710,00, que a ré já pagou à autora (alínea h) dos factos provados) e há a descontar MOP40.923.836,18 que a ré adiantou a terceiros por conta da autora. A ré alegou que adiantou quantia superior, mas não se apurou o valor da quantia adiantada, razão por que terá de atender-se apenas à quantia que a autora aceitou ter sido adiantada pela ré, uma vez que este adiantamento consubstancia facto extintivo de parte do direito da autora e, por isso, pertence ao ónus de prova da ré.” – sublinhado nosso
Segundo a regra de repartição do ónus de prova prevista no artigo 335º do Código Civil, cabe à ré provar que tinha adiantado quantia superior, por ser um facto extintivo de parte do direito da autora, mas não logrando essa demonstração, só poderia aceitar um valor inferior, pelo que improcedem as razões da recorrente nesta parte.
Face às considerações acima tecidas, há-de negar provimento ao recurso.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela recorrente A, confirmando a sentença recorrida.
(…)”; (cfr., fls. 1916 a 1923 e 4 a 19 do Apenso que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformada, a R. “A”, (“甲”), recorreu para este Tribunal de Última Instância, alegando para, a final, produzir as conclusões seguintes:

“1. No dia 20 de Janeiro de 2022, o TSI negou provimento ao recurso interposto pela recorrente da sentença do TJB, mantendo a mesma sentença.
2. Entende a recorrente que a decisão do TSI violou a lei, pelo que deve ser revogada, com alterações correspondentes.
3. No entendimento do acórdão recorrido, a recorrente, tendo admitido que o Sr. C1 é subgerente-geral responsável pela execução dos trabalhos da subempreitada, já não pode questionar os poderes de C1 para representar a companhia.
4. A recorrente não concorda com o supracitado entendimento.
5. Não é verdade que a recorrente não fez prova do âmbito dos poderes de C1, como indicou o acórdão recorrido, e ao contrário, a recorrente enumerou, detalhadamente na al. F) dos factos assentes, todos os tipos de actos que C1 tinha poderes para praticar em representação da companhia recorrente.
6. O conteúdo da al. F) dos factos assentes revela que os poderes conferidos a C1 para representar a companhia recorrente não devem incluir os de constituir, modificar ou extinguir acordos celebrados.
7. In casu, a questão mais controvertida é de saber se C1 tinha poderes para representar a recorrente, com base nos quais negociou com a recorrida a modificação do preço da empreitada no «acordo de subadjudicação».
8. O preço da obra faz parte dos elementos do contrato de empreitada, e foi expressamente fixado no «acordo de subadjudicação».
9. De acordo com o art.º 400.º, n.º 1 do Código Civil, a modificação do elemento do «acordo de subadjudicação», ou seja do preço da obra, só pode ser realizada por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei, e tal poder é diferente do poder de execução da empreitada gozado por C1, reconhecido no acórdão recorrido, uma vez que a execução da obra não trata de declaração negocial, enquanto a modificação do acordo constitui um negócio jurídico bilateral propriamente dito.
10. Como referiu o acórdão recorrido, a recorrente apenas confessou ter conferido a C1 poderes para executar o contrato de empreitada (vide a al. F) dos factos assentes), mas não admitiu que o mesmo tinha poderes para celebrar e modificar o contrato de empreitada em representação da recorrente.
11. No que diz respeito aos quesitos 6º e 12º da base instrutória, o TSI não deu como assente o facto de ser C1 representante da recorrente, mas apenas o alterou para o seguinte: “Provado o que consta da alínea F) dos Factos Assentes.”
12. Não resta dúvida que, o acórdão recorrido, ao concluir, apenas com base no facto de C1 ser subgerente-geral da companhia e ter poderes para executar o contrato de empreitada, que o mesmo podia representar a recorrente para modificar o preço da obra no «acordo de subadjudicação», confundiu, na falta de fundamentos de facto, os poderes constitutivos, modificativos e extintivos de negócio jurídico, com os poderes de execução do negócio jurídico já existente, ou estendeu os poderes gozados por C1 na companhia recorrente, e em consequência, chegou a uma conclusão errada.
13. A questão nuclear reside em saber se “C1 tem ou não poderes para modificar o preço do «acordo de subadjudicação» em representação da recorrente” é uma matéria de facto; e caso seja positiva a resposta, trata-se de um facto constitutivo cuja prova incumbe à autora (recorrida), ou impeditivo cuja prova incumbe à ré (recorrente).
14. Caso entenda que trata de matéria de facto, será obviamente insuficiente a resposta dada pelo TSI, pelo que, ao abrigo dos dispostos no art.º 650.º, n.º 1 do CPC, deve-se ampliar a matéria de facto, e aditar à base instrutória o quesito 23º: “Se C1 tem ou não poderes para modificar o preço do «acordo de subadjudicação» em representação da recorrente”.
15. Caso o MM.º Juiz entenda desnecessária a ampliação da matéria de facto, e formule o juízo apenas com base na base instrutória existente, deve a recorrente, atendendo à natureza do supracitado facto, determinar, em função da repartição do ónus da prova, se o resultado deve ser favorável à recorrente ou à recorrida.
16. Entende a recorrente que o respectivo facto é um facto constitutivo cujo ónus da prova compete à autora (recorrida), tendo as seguintes três razões.
17. Primeiro, segundo a al. C) dos factos assentes, a recorrente é uma sociedade por quotas constituída em Macau, e ao abrigo dos dispostos nos art.ºs 235.º, n.º 1 e 383.º do Código Comercial, a sociedade por quotas é representada por administradores, e na altura dos factos, os administradores da recorrente foram E e G, não incluindo C1.
18. Por isso, cabe à recorrida provar porque é que C1, que não é administrador, tinha poderes para representar a recorrente para modificar o preço da obra no «acordo de subadjudicação» anteriormente fixado pelo administrador E.
19. Designadamente, considerando que o «acordo de subadjudicação» em causa é um contrato de valor superior a MOP$300.000.000,00, ao qual C1 acresceu uma quantia superior a MOP$50.000.000,00 para os trabalhos adicionais, se a modificação desse valor consideravelmente elevado possa ser feita à vontade por um funcionário que não é administrador da companhia, serão, verdadeiramente, violadas as regras da experiência comum e práticas comerciais, bem como o rigoroso regime de registo comercial de Macau (é obrigatório o registo da proposição dos administradores).
20. Segundo, a recorrida alegou ser C1 o “gerente” da recorrente previsto pelo art.º 64.º do Código Comercial, que tem todos os poderes respeitantes ao exercício da empresa, mas tal ilação também se mostra totalmente infundamentada.
21. Em primeiro lugar, C1 exerceu o cargo de “subgerente geral” em vez de “gerente geral”. Caso entenda simplesmente que o “subgerente geral” também pode exercer todos os poderes respeitantes ao exercício da empresa, não só serão violadas as regras da experiência comum, mas também não faz sentido algum distinguir as duas funções de “subgerente geral” e de “gerente geral”.
22. Em segundo lugar, ao abrigo dos dispostos nos art.ºs 235.º, n.º 3 e 233.º, n.º 1 do Código Comercial, a proposição de gerente tem que ser feita mediante deliberação da assembleia geral, e provada pela acta da assembleia.
23. Se a recorrida pretenda provar que C1 é “gerente” que tem poderes para praticar todos os actos respeitantes ao exercício da empresa, pelo menos deve provar que a recorrente procedeu à respectiva proposição através da deliberação da assembleia geral, em vez de racionalizar, apenas com base na similaridade da denominação dos cargos, os actos ilícitos de C1.
24. A recorrida não fez prova do âmbito dos poderes de C1 na companhia, e o acórdão recorrido, apenas com base na similaridade entre o cargo de “subgerente geral” e a palavra “gerente” usada no Código Comercial, ignorou completamente que a área funcional de C1, provada pela recorrente, só incluiu o que foi enumerado na al. F) dos factos assentes, violando obviamente o disposto no art.º 335.º, n.º 1 do Código Civil, segundo o qual àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos, e distribuindo erradamente o ónus de prova à recorrente.
25. Terceiro, segundo a norma supletiva no n.º 3 do art.º 335.º do Código Civil, se for difícil determinar a quem cabe o ónus de prova de “se C1 tem ou não poderes para modificar o conteúdo do «acordo de subadjudicação» em representação da recorrente”, deve tal facto ser considerado como constitutivo, e em consequência, cabe à autora (recorrida) o ónus de prova conforme o n.º 1 do art.º 335.º do Código Civil.
26. Por isso, ao reconhecer que cabe à recorrente provar que “C1 não tem poderes para modificar o conteúdo do «acordo de subadjudicação» em representação da recorrente”, o acórdão recorrido violou os dispostos relativos à distribuição do ónus de prova no art.º 335.º do Código Civil, distribuindo erradamente o ónus de prova à recorrente.
27. Se o MM.º Juiz não concordar com o supracitado entendimento, e considerar que a questão de se C1, na qualidade de subgerente geral, ter ou não poderes para praticar os respectivos factos em representação da recorrente, não é uma matéria de facto, mas sim de direito, vem a recorrente alegar o seguinte.
28. O aumento do preço da empreitada no «acordo de subadjudicação» não é um acto de execução do contrato, mas sim um negócio jurídico modificativo do contrato, que tem que ser praticado por entidade competente para representar a recorrente e a recorrida.
29. C1 não é administrador da recorrente, nem qualquer um dos representantes propostos no n.º 3 do art.º 235.º do Código Comercial. Assim sendo, não obstante que, segundo as al.s M) e R) dos factos assentes, o subgerente geral C1 concordasse com o preço alterado pela recorrida, tal concordância não vinculou a recorrente conforme os art.ºs 235.º, 236.º e 383.º do Código Comercial, nem produziu efeitos na esfera jurídica da recorrente.
30. De acordo com a al. F) dos factos assentes, quanto aos contratos de obras, a área funcional de C1 inclui a elaboração dos contratos de obras, mas não a celebração, modificação ou extinção dos contratos.
31. A recorrente ainda entende que não se verifica a representação sem poderes previsto pela art.º 261.º do Código Civil, uma vez que dos factos assentes não resulta que a recorrente ratificou os actos de C1 conforme o n.º 1 do referido artigo, ou contribuiu para fundar a confiança da recorrida nos poderes de representação de C1 nos termos do n.º 2 do mesmo artigo.
32. C1 não tem poderes para modificar o conteúdo do «acordo de subadjudicação» em representação da recorrente, pelo que devem a recorrente e a recorrida cumprir o contrato conforme o preço da empreitada não alterado de MOP$313.000.000,00, que por sua vez, já foi integralmente pago pela recorrente, razão pela qual é de julgar procedente o recurso da recorrente, e esta não precisa de pagar qualquer preço à recorrida para a subadjudicação da obra de betonagem das fundações por estacas do lote 2 do projecto do Hotel da Taipa da [Empresa(1)].
33. Se o MM.º Juiz não concordar com o supracitado entendimento, vem a recorrente alegar o seguinte.
34. Quanto à questão de deduzir uma quantia de MOP$40.923.836,18 ou de MOP$43.662.565,24 do valor do «acordo de subadjudicação», o acórdão recorrido entendeu que, por não serem provados os respectivos factos (quesito 18.º da base instrutória), devia ser deduzida uma quantia favorável à recorrida.
35. Salvo o devido respeito por opinião diversa, a recorrente não concorda com o aludido entendimento do acórdão recorrido.
36. Não tendo sido provado o quesito 18.º da base instrutória, isto é, a quantia a deduzir do valor da subempreitada foi de MOP$40.923.836,18, não deve tal quantia servir de fundamento para determinar a quantia a deduzir no acórdão.
37. Por isso, o acórdão recorrido incorreu, obviamente, no vício de nulidade por “oposição entre os fundamentos e a decisão” previsto pelo art.º 571.º, n.º 1, al. c) do CPC, e tal nulidade deve ser suprida conforme o art.º 651.º, n.º 1 do CPC.
38. Se o MM.º Juiz entenda que se verifica o vício de insuficiência da matéria de facto, pede-se, nos termos do art.º 650.º, n.º 1 do CPC, para ampliar a matéria de facto e mandar julgar novamente a causa no TSI.
39. Por fim, vem a recorrente impugnar o entendimento do TSI de que o presente recurso tem efeito meramente devolutivo.
40. No âmbito do Processo (apenso) n.º CV1-17-0017-CAO-A, a recorrente já prestou à recorrida uma caução no valor de MOP$29.960.662,36 nos termos do art.º 609.º do CPC.
41. Entende a recorrente que o presente recurso se encontra abrangido pela previsão do art.º 643.º, n.º 2, al. a) do CPC, ou que deve ser aplicada por analogia esta norma, porque a recorrente já prestou, ao abrigo dos dispostos no art.º 609.º do CPC, ao tribunal a quantia exigida pela recorrida, acrescida de juros contados a partir da data da citação.
42. Mesmo que não seja cumprido de imediato o acórdão recorrido, o direito à indemnização da recorrida será plenamente garantido por a recorrente já ter prestado caução suficiente.
43. Em contrário, a recorrida é filial duma sociedade cuja sede se encontra em Hong Kong (vide as fls. 1024 a 1082 dos autos), que não tem qualquer actividade substantiva em Macau, pelo que, se for executado de imediato o acórdão recorrido e condenada a recorrente no pagamento da quantia à recorrida, será difícil recuperar tal quantia quando seja julgado provido o presente recurso da recorrente.
44. Por isso, pede-se ao MM.º Juiz para, ao abrigo dos dispostos no art.º 643.º, n.º 2, al. a) do CPC, atribuir efeito suspensivo ao presente recurso”; (cfr., fls. 1936 a 1948 e 23 a 55 do Apenso).

*

Respondendo, diz a A. “B”, (“乙”), o que segue:

“A. Respostas aos artigos 1º a 55º das alegações do recurso
1.
Salvo o devido respeito por opinião contrária, a recorrida não se conforma com as alegações da recorrente nesta parte, uma vez que não foi feita uma distinção adequada entre as questões de facto e as de direito, bem como foram colocadas algumas questões que não eram de conhecimento pelo TUI, verificando-se a violação dos artigos 639º e 649º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
2.
A recorrida cumpre responder às aludidas alegações do recurso.
3.
De antemão, a recorrente nunca impugnou, no recuso interposto para o TSI, o âmbito instrutório da matéria de facto estabelecido pelo TJB no despacho saneador, bem como não recorreu para o TSI da decisão da matéria de facto proferida pelo TJB.
4.
Por outras palavras, a recorrente aceitou plenamente o âmbito instrutório da matéria de facto do caso e o juízo da matéria de facto feito pelo Tribunal.
5.
Pelo exposto, no recurso interposto para o TSI, a recorrente nunca alegou ou considerou que os factos provados fossem insuficientes para servirem de base da aplicação exacta da lei, bem como não requereu a ampliação do âmbito da base instrutória.
6.
Nestas circunstâncias, a recorrente pediu, nas alegações do recurso, o aditamento do quesito 23º da base instrutória – “Se 丙 (C) podia ou não, em representação da recorrente, alterar o preço fixado no “Acordo de subempreitada da obra””, sendo esta uma questão nova colocada na presente fase de recurso.
7.
É indispensável indicar que os recursos visam rever a existência ou não do erro durante a aplicação da lei feita pelo tribunal recorrido, ou seja, os recursos não visam proceder a um novo julgamento do objecto da acção.
8.
Como foi decidido pelo douto TUI no processo n.º 102/2019: “Os recursos jurisdicionais para o Tribunal de Última Instância não visam criar decisões sobre matérias novas, pelo que se a questão não foi colocada no recurso para a instância inferior, não se pode da mesma conhecer, a menos que se trate de matéria de conhecimento oficioso.”
9.
Assim, nesta fase, a recorrente não pode pedir subitamente o aditamento dum novo quesito da base instrutória.
10.
Ademais, a questão ora impugnada pela recorrente – Se a recorrente é vinculada pela decisão tomada pelo subgerente geral da companhia recorrente onde foi aceite o aumento do preço da obra para o valor de MOP390.698.182,90 – é uma questão de direito, ou seja, esta só pode ser analisada com base nas circunstâncias concretas provadas no caso, em conjugação com o conteúdo do direito material.
11.
Nesta situação, vislumbra-se que não merece razão o pedido de aditamento do quesito da base instrutória – “Se 丙 (C) podia ou não, em representação da recorrente, alterar o preço fixado no “Acordo de subempreitada da obra”” – formulado pela recorrente.
12.
Como ensina o Exmo. Sr. Dr. Viriato Manuel Pinheiro de Lima
“Se o processo houver de prosseguir e a acção tiver sido contestada, o juiz no despacho de condensação selecciona a matéria de facto relevante, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, indicando: (…)
Estas duas peças têm em comum:
- Só se referirem a questões de facto, e não a questões de direito. (…)”
13.
A questão – “Se 丙 (C) podia ou não, em representação da recorrente, alterar o preço fixado no “Acordo de subempreitada da obra”” – é uma conclusão tirada da análise jurídica, sendo uma alegação concludente. As alegações concludentes ou alegações de conceito jurídico não podem ser integradas na base instrutória da matéria de facto.
14.
Por outro lado, nesta fase, a recorrente deixou de impugnar a qualidade de gerente da companhia recorrente de 丙 (C1) e passou a indicar que 丙 (C1) não podia, em representação da recorrente, aumentar o preço da obra em causa e alterar o conteúdo do trabalho.
15.
Os motivos alegados pela recorrente em face do aludido assunto podem sintetizar-se em:
a. Segundo a alínea F) dos factos provados, a 丙 (C1) não compete a alteração do preço fixado no contrato (vide artigos 8º a 22º das alegações do recurso);
b. Cabe à recorrida provar que 丙 (C1) foi proposto pela recorrente, mediante assembleia geral, como gerente (vide artigos 37º a 42º das alegações do recurso); e
c. Cabe à recorrida provar que 丙 (C1) podia alterar o preço fixado no contrato, em vez de caber à recorrente provar que 丙 (C1) não tinha o referido poder (vide artigos 26º a 46º das alegações do recurso);
16.
A recorrida não concorda com a opinião ora alegada pela recorrente.
17.
Porquanto, como acima referido, no recuso interposto para o TSI, a recorrente não impugnou, de forma qualquer, a decisão da matéria de facto proferida pelo TJB, isto é, a recorrente concordou e aceitou plenamente toda a factualidade dada como provada na sentença recorrida.
18.
De acordo com a alínea f) dos factos dados como provados pelo TJB: 丙 (C) é subgerente-geral da companhia ré, cuja funções principal é proceder a cotações e propostas de concursos, subadjudicações e subempreitadas, fixação do preço de cada item das cotações ou propostas de concursos (BQ – Listagem dos Itens das Obras) e elaboração dos contratos de obras, apreciação e autorização dos montantes das obras, orientações para o pagamento dos montantes das obras, etc.
19.
Até que o conteúdo da alínea f) dos factos provados em apreço resulta das confissões da recorrente expostas na sua contestação, nomeadamente:
a. No artigo 16º da contestação, confessou a recorrente que 丙 (C1) tinha sido proposto pela ré como “subgerente-geral”; e
b. No artigo 17º da contestação, confessou a recorrente que 丙 (C1), como subgerente-geral, desempenhava principalmente as funções de realização de cotações e propostas de concursos, subadjudicações e subempreitadas, fixação do preço de cada item das cotações ou propostas de concursos (BQ – Listagem dos Itens das Obras) e elaboração dos contratos de obras, apreciação e autorização dos montantes das obras, orientações para o pagamento dos montantes das obras, etc. (Vide fls. 925 dos autos – contestação da ré)
20.
Na fase em que o caso estava a ser julgado pelo Tribunal a quo, a recorrente admitiu que 丙 (C1) tinha sido proposto pela ré como “subgerente-geral”, e, posteriormente, na presente fase, ela (ainda) impugnou, perante o TUI, que a recorrida não demonstrou que 丙 (C1) tenha sido proposto pela recorrente, mediante assembleia geral?!
21.
Do referido acto se revela um comportamento de venire contra factum proprium, a recorrente tentou ilidir e denegar as duas confissões feitas, sucessivamente, no TJB e no TSI, sendo este um acto processual legalmente proibido (cfr. o art.º 489º, n.º 1 do Código de Processo Civil)!!
22.
Quanto à questão de saber se 丙 (C1) podia ou não, em representação da recorrente, aumentar o preço da obra em causa e alterar o conteúdo do trabalho, no entendimento da recorrente, o conteúdo da alínea f) dos factos provados não abrange o poder de alteração do preço fixado no contrato.
23.
Porém, a tese acima exposta não corresponde à realidade.
24.
Já que segundo a alínea f) dos factos dados como provados pelo TJB: 丙 (C) é subgerente-geral da companhia ré, cuja funções principal é proceder a cotações e propostas de concursos, subadjudicações e subempreitadas, fixação do preço de cada item das cotações ou propostas de concursos (BQ – Listagem dos Itens das Obras) e elaboração dos contratos de obras, apreciação e autorização dos montantes das obras, orientações para o pagamento dos montantes das obras, etc. (negrito nosso).
25.
A recorrente admitiu que 丙 (C1) tinha sido proposto como subgerente-geral da companhia recorrente e tinha os poderes de proceder a subadjudicações e subempreitadas, e fixação do preço de cada item das cotações ou propostas de concursos (BQ – Listagem dos Itens das Obras).
26.
Como a recorrente admitiu que os poderes obtidos por 丙 (C1) eram extensivos à fixação do preço de cada item de qualquer obra e à realização de subadjudicações e subempreitadas, conforme o argumento a maiori ad minus, os poderes de 丙 (C1) abrangem, naturalmente, a fixação do preço da obra em causa e o estabelecimento do conteúdo do trabalho.
27.
Assim, com base nisto, é de refutar a tese exposta pela recorrente no artigo 53º das alegações do recurso – “A área funcional de 丙 (C1) consiste na elaboração dos contratos de obras, e não na celebração, alteração ou extinção dos contratos de obras”.
28.
Pois, basta que se efectue a nova comparação da alínea f) dos factos dados como provados pelo TJB (resultante das confissões da recorrente), demonstra-se que a recorrente conferiu a 丙 (C1) o mais amplo poder de representação, poder esse não fica limitado à competência de elaboração de contratos descrita pela recorrente no artigo 53º das suas alegações do recurso, e que a recorrente ignorou, de forma tanto intencional como desintencional, a verdade.
29.
No que concerne a outro ponto de vista da recorrente, isto é, cabe à recorrida provar que 丙 (C1) podia alterar o preço fixado no contrato, em vez de caber à recorrente provar que 丙 (C1) não tinha o referido poder.
30.
A recorrente apenas entendeu que o sobredito fundamento era incompatível com a lei.
31.
Porquanto, como acima referido, na fase em que o caso estava a ser julgado pelo Tribunal a quo, a recorrente confessou que 丙 (C1) tinha a qualidade de subgerente-geral da companhia recorrente e podia agir na qualidade de subgerente-geral (vide alínea f) dos factos provados).
32.
Ora, a impugnação da alegada repartição do ónus de prova já não faz sentido nenhum, uma vez que já foram claramente provados a qualidade e o poder impugnados pela recorrente, bem como foram completamente confessados pela recorrente.
33.
Além do mais, mesmo que seja necessária a análise da repartição do ónus de prova da qualidade e poder de 丙 (C1), nos termos da lei, cabe à recorrente provar que 丙 (C1) não era competente para praticar acto que vincule a recorrente.
34.
Pois, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 64º do Código Comercial – “É gerente aquele que, sob qualquer designação, consoante os usos comerciais, é proposto pelo empresário comercial para o exercício da empresa.” – e conforme a alínea f) dos factos provados, averigua-se que, evidentemente, 丙 (C1) foi proposto pela companhia recorrente para o cargo de “gerente” previsto no n.º 1 do art.º 64º do Código Comercial.
35.
Nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 65º do mesmo Código, o gerente pode praticar todos os actos respeitantes ao exercício da empresa para que se acha proposto, salvas as limitações contidas na proposição de gerência, não podendo, todavia, onerar nem alienar os bens imóveis afectados ao exercício da empresa se para tal não estiver expressamente autorizado.
36.
Por outras palavras, a lei fez uma presunção, salvas as limitações de certas competências específicas expressamente impostas ao gerente na proposição de gerência, considera-se que o gerente tem o poder de praticar todos os actos respeitantes ao exercício da empresa, em representação do empresário comercial.
37.
Daí se explica e se demonstra que, no caso vertente, cabe à recorrente provar que 丙 (C1) que foi proposto pela mesma como “gerente” da companhia, não tinha o poder de agir em representação da companhia, em vez de caber à recorrida provar que 丙 (C1), como “gerente” da companhia recorrente, tinha o poder de agir em representação da recorrente.
38.
É de reafirmar que a recorrente confessou os poderes conferidos a 丙 (C1) (alínea f.) dos factos provados), e nunca os impugnou por recurso, portanto, nesta fase, a discussão sobre a repartição do ónus de prova do aludido facto já não faz sentido nenhum.
39.
Nos artigos 47º a 49º das alegações do recurso, a recorrente efectuou a análise dos depoimentos das testemunhas e das provas documentais contantes dos autos, mas tal tese não é a matéria que deve ser conhecida pelo TUI no presente recurso.
40.
Já que, nos termos do art.º 47º, n.º 2 da Lei de Bases da Organização Judiciária, em conjugação com os artigos 639º e 649º do Código de Processo Civil, em princípio, o TUI, como órgão judicial que se responsabiliza pela fiscalização de boa aplicação da lei, não intervém na decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto, a não ser que se verifique a violação da lei de processo de prova e/ou da lei substantiva de prova pela mesma decisão.
41.
O facto a provar neste caso não é restringido por determinado meio legal de prova, ou seja, o Tribunal recorrido procedeu a apreciação da prova só por sua livre convicção, além disso, a recorrente nunca impugnou a decisão da matéria de facto no recurso interposto para o TSI, pelo que os artigos 47º a 49º das alegações do recurso merecem ser ignorados.
42.
Por fim, alegou a recorrente que 丙 (C1) não era administrador dela, por isso, mesmo que as alíneas m.) e r.) dos factos provados demonstrem que 丙 (C1) concordou com o preço proposto pela recorrida, tal decisão não vincula a recorrente ao abrigo dos artigos 235º, 236º e 383º do Código Comercial (vide artigo 52º das alegações do recurso), e, por não haver representação sem poderes, a recorrente jamais precisará de efectuar o pagamento pela obra em causa (vide artigos 53º a 55º das alegações do recurso).
43.
Salvo o devido respeito por opinião contrária, a recorrida não se conforma com a referida opinião da recorrente.
44.
É imprescindível apontar que a recorrente, como uma sociedade limitada (pessoa colectiva), não é eternamente vinculada por actos praticados pelo seu administrador, e o respectivo mecanismo jurídico também não é tão inflexível e unitário.
45.
Por exemplo, o Código Civil dispõe a procuração e o mandato, e o Código Comercial dispõe gerentes, auxiliares do empresário, contrato de comissão e contrato de mediação, entre outros, sendo estas as relações jurídicas/fontes de direito que vinculam a parte.
46.
丙 (C1) não era administrador da recorrente, mas isto não significa que, evidentemente, a recorrente possa deixar de responder pelos actos praticados por 丙 (C1), a par disso, os artigos 235º e 236º do Código Comercial que dispõem a competência do administrador da sociedade, não são os únicos articulados usados para justificarem a responsabilidade judicial da recorrente, portanto, a recorrente aplicou erradamente os artigos 235º e 236º do Código Comercial ao presente caso.
47.
Na verdade, a posse por 丙 (C1) da qualidade de administrador da companhia recorrente não é a questão com que se importa o presente caso, visto que este caso se importa saber e provar se 丙 (C1) possui a qualidade que vincule a responsabilidade judicial da recorrente.
48.
De acordo com a alínea f) dos factos dados como provados na sentença a quo: 丙 (C) é subgerente-geral da companhia Ré, cuja funções principal é proceder a cotações e propostas de concursos, subadjudicações e subempreitadas, fixação do preço de cada item das cotações ou propostas de concursos (BQ – Listagem dos Itens das Obras) e elaboração dos contratos de obras, apreciação e autorização dos montantes das obras, orientações para o pagamento dos montantes das obras, etc.
49.
De acordo com a alínea q) dos factos dados como provados na sentença a quo: Em 27.03.2014 a Autora remeteu por e-mail ao subgerente-geral da companhia ré C1 o documento de fls. 219 a 220 que aqui se dá por reproduzido; (resposta ao quesito n.º 10 da base instrutória com a redacção dada pelo douto acórdão do Venerando TSI)
50.
De acordo com a alínea r) dos factos dados como provados na sentença a quo: A cotação supra referida foi obtida a concordância de C1, subgerente-geral da ré, o qual assinou nos respectivos documentos; (resposta ao quesito n.º 11 da base instrutória com a redacção dada pelo douto acórdão do Venerando TSI).
51.
Mais, nos termos do disposto nos artigos 64º a 70º do Código Comercial, 丙 (C1) pode, em representação da recorrente, proceder a fixação do preço em conformidade com o conteúdo de obras, e autorização do preço fixado nos contratos de obra, além disso, no momento em que 丙 (C1) manifestou que estava a agir na qualidade de subgerente-geral da recorrente no momento em que concordou com o aumento do preço da obra até MOP365.000.000,00. Daí se mostra que a recorrente é vinculada pela decisão de 丙 (C1) e necessita de responder pela mesma decisão.
52.
Justamente no aspecto factual, confessou a recorrente que 丙 (C1) era seu subgerente-geral e, no aspecto jurídico, 丙 (C1) era um gerente que tinha os poderes previstos nos artigos 64º e ss. do Código Comercial, ou seja, no sentido do direito comercial, um auxiliar do empresário subordinado com poder de representação, qualidade essa está livre do registo obrigatório.
53.
Os factos provados acima expostos demonstram que a recorrente conferiu a 丙 (C1) o poder de proceder a fixação do preço em conformidade com o conteúdo de obras e demais poderes necessários, a par disso, está expressamente previsto no art.º 65º do Código Comercial a solução da questão de saber se ao gerente do sentido do direito comercial compete ou não a prática, em representação da companhia, dos actos resultantes do exercício da empresa, por conseguinte, não se verifica o problema de representação sem poderes assacado pela recorrente.
54.
Pelo exposto, entende a recorrida que esta parte dos motivos do recurso não merece provimento.

B. Respostas aos artigos 56º a 62º das alegações do recurso
55.
Na petição inicial, alegou a recorrida (B) que, durante a execução da obra, a recorrente (A), em representação da recorrida, pagou parte do montante da obra a terceiro, pelo que a recorrente poderia deduzir MOP40.923.836,18 do montante da obra a pagar à recorrida.
56.
Porém, disse a recorrente que ela, em representação da recorrida, pagou MOP43.662.565,24 a terceiro, pelo que considerou que deveria deduzir MOP43.662.565,24 do montante da obra a pagar à recorrida, ou seja, a recorrente pediu deduzir mais MOP2.738.729,06 (MOP43.662.565,24 - MOP40.923.836,18) do montante da obra a pagar.
57.
Tanto o TJB como o TSI decidiram que, para além do valor de MOP40.923.836,18 deduzido do montante da obra, a recorrente não poderia deduzir mais MOP2.738.729,06 do montante da obra, por não ter cumprido adequadamente o ónus de prova.
58.
Nesta fase, a recorrente interpôs recurso para o TUI com base na mesma questão e invocou os mesmos fundamentos, por conseguinte, conforme o princípio da economia processual e devido à aplicabilidade dos argumentos constantes da contestação, vem a recorrida reproduzir adequadamente o conteúdo da contestação apresentada ao TSI, o que serve do conteúdo da presente contestação:
59.
Visando analisar esta parte do recurso interposto pela recorrente, entende a recorrida que é indispensável rever o processo desde a negociação até ao pagamento do montante da obra.
60.
Segundo as alíneas q) e r) dos factos provados e os documentos constantes de fls. 219 a 220 dos autos, a recorrida e a recorrente (através de丙 (C)) aumentaram o preço da obra até ao valor de MOP390.715.531,80, e, depois, a recorrida fez o desconto de 6,58186508%, então perfazendo o montante da obra de MOP365.000.000,00.
61.
Isto é, a recorrente devia pagar à recorrida a quantia de MOP365.000.000,00, a título do montante da obra.
62.
Segundo as alíneas t) e v) dos factos provados, após iniciada a execução da obra, a recorrida fez o respectivo cálculo e confirmou que o montante total da obra era de MOP38.135.982,52 (sic). A recorrida deu um desconto de 6,58186508% pré-acordado à recorrente, baixando voluntariamente o montante da obra (MOP365.000.000,00) para MOP356.050.200,00.
63.
Segundo as alíneas h) e s) dos factos provados, a recorrida concluiu as obras adicionais no valor de MOP145.480,00 e recebeu da recorrente parte do montante da obra no valor de MOP293.994.710,00.
64.
Isto é, a recorrente devia à recorrida o valor de MOP62.200.896,00 (valor dos trabalhos executados MOP356.050.200,00 - parte do montante da obra paga pela recorrente MOP293.994.710,00 + valor das obras adicionais MOP145.480,00), a título do montante da obra.
65.
Ora, em primeiro lugar, é de apontar que o valor remanescente da obra (MOP62.200.978,00) fundamenta-se no preço da obra acordado entre as partes (MOP365.000.000,00), por isso, tal valor remanescente da obra (MOP62.200.978,00) vincula ambas as partes.
66.
Assim, é imprescindível atender à confissão da recorrida exposta na parte final do artigo 51º da petição inicial. No referido facto constante da petição inicial, a recorrida confessou que, durante a execução da obra, a recorrente, em representação da recorrida, efectuou um pagamento de MOP40.923.836,18, pelo que a recorrida baixou, por iniciativa própria, o valor que devia/podia receber (MOP62.200.978,00) para MOP21.277.141,82 (o valor que devia receber MOP62.200.978,00 - MOP40.923.836,18 dedução).
67.
Podemos saber se merece ou não provimento este motivo do recurso apresentado pela recorrente.
68.
Aqui a recorrente invocou fundamentalmente que, segundo a alínea w) dos factos provados, a recorrente deduziu MOP43.662.565,24 do preço da obra, a par disso, não foi dado como provado o quesito 18º da base instrutória, pelo que entendeu a recorrente que deveria deduzir do montante da obra a pagar à recorrida o valor de MOP43.662.565,24 em vez de MOP40.923.836,18.
69.
Em suma, no entendimento da recorrente, deveria pagar menos MOP2.738.729,06 (MOP43.662.565,24 - MOP40.923.836,18), a título do montante da obra, e, por fim, deveria baixar o valor em dívida (MOP21.277.141,82) para MOP18.538.412,76 (MOP21.277.141,82 - MOP2.738.729,06).
70.
Salvo o devido respeito por opinião contrária, entende a recorrida que a supracitada opinião da recorrente é incorrecta, mormente, considera que a recorrente ignorou as regras da repartição do ónus de prova juridicamente estabelecidas.
71.
Como referido nos artigos 59º a 66º da presente resposta, a recorrente deve, enfim, à recorrida o valor de MOP21.277.141,82, a título do montante da obra.
72.
Se a recorrente pretender deduzir mais MOP2.738.729,06 (MOP43.662.565,24 - MOP40.923.836,18) do valor supramencionado, em primeiro lugar, ela deverá, nos termos do disposto no n.º 3 do art.º 412º do Código de Processo Civil, deduzir excepção peremptória na contestação e invocar factos que extingam os direitos da recorrida, nomeadamente invocar factos concretos que especifiquem a razão da extinção do direito de crédito da recorrida no valor de MOP2.738.729,06.
73.
Em segundo lugar, a recorrente deverá, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 335º do Código Civil, apresentar prova para sustentar a excepção peremptória, se a tiver havido.
74.
Todavia, a recorrente não deduziu excepção peremptória na contestação, ou seja, não invocou nenhum facto concreto destinado à extinção do direito invocado pela recorrida.
75.
Tanto na fase em que o caso estava a ser julgado pelo Tribunal a quo como no presente recurso, a recorrente não especificou por que razão ela podia desrespeitar o acordo existente entre as partes no cumprimento do dever de pagamento, bem como nunca especificou qual contraprestação tinha sido efectuada para poder extinguir o direito de crédito da recorrida no valor de MOP2.738.729,06.
76.
Não obstante a não provação do quesito 18º da base instrutória, não se absolve a recorrente do dever de pagamento, visto que um quesito da base instrutória não provado é apenas considerado como um quesito não invocado nos autos.
77.
Ademais, se a recorrente pretender pagar menos, ela deverá demonstrar a existência da contraprestação do valor de MOP2.738.729,06 efectuada pela mesma.
78.
Como a recorrente não fez, nos autos, uma especificação concreta sobre a contraprestação em causa, tampouco demonstrou a existência da mesma, naturalmente, ela teria de assumir as consequências desfavoráveis resultantes da falta de apresentação de prova.
79.
O TSI determinou que a recorrente poderia deduzir MOP40.923.836,18 do montante da obra, sendo esta uma decisão correcta no entendimento da recorrida, o que deve ser juridicamente pago (sic).
80.
Por fim, é de acrescentar que a recorrente pediu ao Tribunal que procedesse à ampliação da matéria de facto e mandasse julgar novamente a questão da dedução do montante da obra no TSI em conformidade com o n.º 1 do art.º 650º do Código de Processo Civil, sendo este um pedido irrazoável no entendimento da recorrida.
81.
A dedução do montante da obra foi integrada no âmbito instrutório da matéria de facto e, nestas circunstâncias, a recorrente não demonstrou que o valor da dedução fosse de MOP43.662.565,24, sendo esta uma questão de apresentação de prova e não de insuficiência do âmbito instrutório, pelo que não se mostra aplicável o n.º 1 do art.º 650º do Código de Processo Civil.
82.
Pelo exposto, requer-se ao Tribunal que julgue improcedente este motivo do recurso invocado pela recorrente.

C. Conclusão
83.
Nestes termos, a recorrida/autora conclui que todos os motivos do recurso invocados pela recorrente/ré são improcedentes, pelo que vem requerer ao Tribunal que negue provimento ao recurso interposto pela ré”; (cfr., fls. 1954 a 1960-v e 56 a 81 do Apenso).

*

Nada parecendo obstar, sem mais demoras se passa a conhecer.

Fundamentação

2. Como resulta do que se deixou relatado, o presente recurso tem como objecto o (2°) Acórdão – em 20.01.2022 – pelo Colectivo do Tribunal de Segunda Instância prolatado que – como atrás se deixou, integralmente, transcrito – confirmou a sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Base com a qual se condenou a R., ora recorrente, a pagar, à A., ora recorrida, o quantum (total) de MOP$21.277.068,20 e juros à taxa legal, quantia que se entendeu aquela dever no âmbito de um contrato de subempreitada com a dita A. celebrado, (cfr., matéria de facto indicada na “alínea e”).

Atento o teor das “conclusões” pela ora recorrente (R.) apresentadas em sede do presente recurso – que, como sabido é, identificam as “questões” a tratar – verifica-se que impugnada não vem a “decisão proferida sobre a matéria de facto provada”, (e que, assim, por motivos também não termos para a alterar se tem por definitivamente fixada), suscitadas estando, tão só, “duas questões” que, em nossa opinião, dizem apenas respeito à “interpretação e enquadramento (jurídico-legal)” da referida “matéria de facto”.

E, nesta conformidade, (analisadas as “conclusões” da R., ora recorrente), sem esforço se conclui que estas mesmas duas questões que nos são trazidas para a apreciação são as seguintes:
- a primeira, relativa ao âmbito dos “poderes de representação” do subgerente-geral da R. (para efeitos da sua vinculação em sede da execução do contrato de subempreitada com a A. celebrado);
- e, a segunda, quanto ao “valor” a considerar como “descontado” ao que devia ser pago à A. no âmbito do referido contrato de subempreitada.

–– Começando pela primeira, desde logo se nos apresenta que a resposta é de sentido negativo, censura não merecendo a decisão do Tribunal de Segunda Instância, (que se nos apresenta correcta e lógica em face do que “provado” está).

De facto, atentas as “funções” que ao referido “subgerente-geral” cabiam – cfr., “alínea f)” da matéria de facto dada como provada, e resultando ainda, da mesma factualidade adquirida que foi o mesmo que, naquela “qualidade”, recebeu as comunicações (posteriormente) pela A. efectuadas respeitantes à “execução” do aludido contrato, e que, na mesma qualidade, respondeu à A.; cfr., matéria de facto referenciada nas alíneas l), m), q) e r) – sentido não faz vir agora dizer que aquele não tinha “poderes de representação da R.” e que as “decisões” pelo mesmo tomadas não a vinculavam.

Aliás, se um “subgerente-geral”, com as funções explicitadas na dita “alínea f)” – e que, recorde-se, consistiam em “proceder a cotações e propostas de concursos, subadjudicações e subempreitadas, fixação do preço de cada item das cotações ou propostas de concursos (BQ – Listagem dos Itens das Obras) e elaboração dos contratos de obras, apreciação e autorização dos montantes das obras, orientações para o pagamento dos montantes das obras, etc.” – não pudesse, (especialmente, no âmbito destas últimas competências), “acompanhar a execução” de uma empreitada, (certo sendo que foi o que em face da matéria de facto efectivamente sucedeu), é então caso para dizer que à R., ora recorrente, cabia a prova (clara e cabal) que assim não tinha sido, o que, in casu, e de todo, não foi o que sucedeu.

Assim, e necessárias não se apresentando mais alongadas considerações sobre o ponto em questão, vista está a solução para esta parte do recurso.

–– Passando para a “segunda questão”, vejamos.

Aqui, vale a pena recordar o raciocínio que integra a fundamentação pelo Tribunal de Segunda Instância exposta na sua decisão.

Tem o seguinte teor:

“Finalmente, alega a recorrente que houve erro na determinação do valor a deduzir à quantia em dívida.
Mais precisamente, entende a autora que a ré não podia ter deduzido a quantia de MOP43.662.565,24 à quantia em dívida, mas somente o valor de MOP40.923.836,18.
Ou seja, segundo a perspectiva da autora, a dedução só deveria ser de MOP40.923.836,18, enquanto para a ré, há-de descontar a quantia de MOP43.662.565,24.
Por haver dúvida quanto a esse aspecto, foi ordenado pelo TSI, no âmbito do recurso jurisdicional, proceder-se a novo julgamento dessa matéria que não havia sido julgada.
Feita a produção de prova, não logrou demonstrar qual seria o valor da quantia adiantada pela ré ora recorrente a terceiros por conta da autora, para efeitos de cálculo do valor devido pela ré.
Em nossa opinião, concordamos com o entendimento assumido pela primeira instância nos seguintes termos que se transcreve:
“Ao valor dos trabalhos executados (MOP356.050.200,00) há a descontar MOP293.994.710,00, que a ré já pagou à autora (alínea h) dos factos provados) e há a descontar MOP40.923.836,18 que a ré adiantou a terceiros por conta da autora. A ré alegou que adiantou quantia superior, mas não se apurou o valor da quantia adiantada, razão por que terá de atender-se apenas à quantia que a autora aceitou ter sido adiantada pela ré, uma vez que este adiantamento consubstancia facto extintivo de parte do direito da autora e, por isso, pertence ao ónus de prova da ré.” – sublinhado nosso
Segundo a regra de repartição do ónus de prova prevista no artigo 335º do Código Civil, cabe à ré provar que tinha adiantado quantia superior, por ser um facto extintivo de parte do direito da autora, mas não logrando essa demonstração, só poderia aceitar um valor inferior, pelo que improcedem as razões da recorrente nesta parte.
Face às considerações acima tecidas, há-de negar provimento ao recurso”; (cfr., fls. 1922 a 1922-v).

Opondo-se ao assim decidido, diz a R., ora recorrente, o que consta dos n°s 34 a 38 das suas “conclusões”, (notando-se que as restantes dizem apenas respeito ao “efeito do recurso” que não constitui matéria objecto do presente aresto).

E, ponderando no decidido, e no agora alegado, cabe dizer que, também aqui, censura não merece o decidido.

Na verdade, à R. competia – não só discordar, mas – “provar” que o montante em questão era outro, que não o aceite pela A. ora recorrida.

E, assim, tendo tido a oportunidade – até no novo julgamento ordenado pelo 1° Acórdão do Tribunal de Segunda Instância – e não o tendo feito, “sibi imputed”.

Dest’arte, e outra questão não havendo a apreciar, resta decidir como segue.

Decisão

3. Nos termos de todo o expendido, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente com taxa de justiça que se fixa em 12 UCs.

Registe e notifique.

Macau, aos 27 de Julho de 2022


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei

1 Viriato de Lima, Manual de Direito Processual Civil, 3ª edição, CFJJ, 2018, pág. 568.
2 Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, 3ª edição, 2007, pág. 139.
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