Processo n.º 482/2022
(Autos de recurso cível)
Data: 28/Setembro/2022
Recorrente:
- A Consultoria de Engenharia Companhia Limitada (executada e embargante)
Recorrida:
- B工程有限公司(exequente e embargada)
Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
Nos autos de execução movida pela exequente B工程有限公司, melhor identificada nos autos (doravante designada por “recorrida”), contra a executada A Consultoria de Engenharia Companhia Limitada, com sinais nos autos (doravante designada por “recorrente”), foram liminarmente indeferidos os embargos deduzidos pela mesma executada.
Inconformada, recorreu a recorrente (executada e embargante) jurisdicionalmente para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“1. 在對其他不同見解保持充分尊重下,上訴人並不認同被上訴判決的見解。
2. 在本異議中,上訴人主張基於被上訴人違反另一工程合同的義務而需向上訴人支付合共MOP$1,608,059.34的費用,被上訴人則在本執行聲請中要求上訴人支付MOP$210,000.00,以及加上相關遲延利息。
3. 故此,上訴人依據《民法典》第838條規定,以上訴人和被上訴人互為對方之債權人及債務人而主張抵銷本案中被上訴人聲請上訴人拖欠的債務。
4. 首先,倘若上訴人主張的事實獲得證實,毫無疑問符合《民法典》第838條抵銷的要件。
5. 此外,不論上訴人或被上訴人所主張的債權非屬《民法典》第844條不得因抵銷而消滅的債權。
6. 故此,關鍵的問題是,上訴人可否在本異議程序中主張抵銷以消滅對被上訴人的債務。
7. 在本案中,被上訴人是以《民事訴訟法典》第677條c項所規定的私文書作為執行名義,故上訴人必然可依據同一法典第699條第1款之規定,除了以第六百九十七條適用部分所指之依據提出反對外,亦可以其在宣告訴訟程序中可提出作為防禦方法之其他依據提出反對。
8. 上訴人在異議中主張的抵銷根據《民事訴訟法典》第407條第2款b項和412條第3款規定,屬永久抗辯,根據同一法典第699條第1款結合第407條之規定,構成反對執行的依據。
9. 換個角度說,《民事訴訟法典》第699條並無明文禁止主張抵銷作為反對執行的依據。
10. 另一方面,《民事訴訟法典》第218條第2款b項規定了抵銷可作為被告反訴的依據,毫無疑問的是,在執行之異議中,被執行人並不能提出反訴請求,其只可主張宣告之訴中的防禦方法 --- 抗辯或抵銷。
11. 在本案中,的確,上訴人所主張的債權是高於被上訴人的債權,然而,上訴人在異議中並無要求法院按兩者的差額對判處被上訴人向上訴人支付剩餘部份的債權,上訴人主張抵銷的目的僅僅是要求消滅其對被上訴人的全部債務,以使執行聲請的理由不成立。
12. 故此,上訴人在異議中主張的抵銷亦僅僅是永久抗辯,符合《民事訴訟法典》第699條第1款結合第407條之規定構成反對執行的依據。
13. 事實上,再次強調,《民事訴訟法典》第699條本身並無就所主張的永久抗辯類型作出限制,亦無限制所主張抵銷的債權必須經司法確認後均可主張(此亦與《民法典》第838至847條之規定不符),按《民法典》第8條第2款規定,在作出法律解釋時僅得將在法律字面上有最起碼文字對應之含義。
14. 另一方面,換個角度說,在無出現《民事訴訟法典》第700條規定所指的任一情況下,便不應駁回異議,而是應接納異議,並按規定繼續進行有關程序。
15. 事實上,正如上述,上訴人在本案所主張的異議理由正是根據《民事訴訟法典》第699條的依據而作出,並不符合同一法典第700條第1款b項可駁回異議之情況;再者,亦非同一條文c項所指的反對執行之理由明顯不成立而可予以駁回的情況。
16. 故此,根本不應直接駁回上訴人所主張的異議。
17. 最後,必須指出,於2021年6月28日,上訴人已就新所主張的債權針對被上訴人提起了訴訟,案件編號為CV2-21-0048-CAO。事實上,被上訴人為一間有限責任的公司,倘若在本案中不接納上訴人所主張的抵銷,倘若將來上訴人在另案勝訴的話,被上訴人不履行該給付判決的話,上訴人的債權便無法獲得滿足。
18. 基於以上所述,被上訴判決顯然錯誤解釋和適用了《民事訴訟法典》第699條第1款和700條第1款c項的規定。
綜上所述,和依賴 閣下的高見,應裁定本上訴理由成立,繼而撤銷被上訴判決,及命令被上訴法院繼續進行本異議程序。”
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Ao recurso respondeu a recorrida nos seguintes termos conclusivos:
“1. 在本案中,上訴人針對被上訴人之執行請求,以被提出異議人倘欠其MOP1,608,059.34且符合抵銷之永久抗辯為由,提出執行異議。
2. 原審法院則認為上訴人所提出的抵銷並不成立,駁回有關異議。
3. 在尊重不同見解的前提下,被上訴人對上訴人提出的理據和法律觀點並不認同。
4. 而本上訴程序要解決的問題在於,上訴人所提出的異議是否符合《民事訴訟法典》第699條第1款和700條第1款c項,屬於應被駁回的異議。
5. 根據上述法典第699條第1款結合第677條c項之規定,當以私文書作為執行名義,被執行人得以其在宣告訴訟程序中可提出作為防禦方法之其他依據提出反對。
6. 因此,理論上,上訴人可以《民法典》第838條抵銷作為異議的理由。
7. 但是,被上訴批示駁回異議的理由,並不是否定上訴人主張抵銷的可能性,而是根據《民事訴訟法典》第700條第1款c項,裁定上訴人反對執行之理由明顯不成立,亦即在案中明顯不存在抵銷的情況。
8. 按照《民法典》第838條第1款,抵銷的其中一個前提,有關債權需為“可透過司法途徑予以請求”。
9. 而參考葡萄牙波爾圖中級法院於第0431206號案之見解,主張抵銷時,債權的存在應為已被確認的,單單指出一筆假設的、具爭議的債權是不足夠的,亦不應將確認債權的問題放在待決訴訟中解決。
10. 在本案中,上訴人所主張的可用以抵銷的債權係仍具有爭議性的,因此,上訴人提出了CV2-21-0048-CAO以作出追討,所以明顯不符合抵銷的前提。
11. 另外,上訴人在上述陳述結論中第十七點指出,若本案中不接納上訴人所主張的抵銷,倘若將來上訴人在另案勝訴的話,被上訴人不履行該給付判決的話,上訴人的債權便無法獲得滿足,這個說法是毫無道理的,因為上訴人可以另外透過執行之訴進行追討。
12. 倘若接受上訴人以這筆不確定的債權主張抵銷,才是真正的不合理,因為這將會是以一筆俱爭議的債權去抵銷一筆已確定的債權。如被上訴人在另一案中勝訴,這會直接導致被上訴人無法透過此執行之訴實現其擁有的這筆債權。
13. 因此,因上訴人所提出的異議理由明顯不成立,原審法院根據同一法典第700條第1款c項之規定駁回異議之決定正確無誤,應予維持。
綜上所述,根據適用的法律及法官 閣下的高見,懇請法官 閣下:
- 裁定上訴理由不成立;以及
- 維持被上訴批示的決定。”
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Corridos os vistos, cumpre decidir.
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II) FUNDAMENTAÇÃO
Pela primeira instância foi proferida a seguinte decisão, objecto do presente recurso:
“Nos presentes embargos pretende a executada opor-se à execução através da invocação de contra crédito que impende sobre o exequente, resultante de um contrato de empreitada incumprido por este e no qual era empreiteira e aquela adjudicante («dona da obra»).
O alegado contra crédito ascende a montante superior à quantia exequenda e, face ao teor da p.i., não foi ainda reconhecido judicialmente.
Estamos, pois, perante a questão de saber se a executada pode opor-se através de embargos de executado com um crédito que alega ter sobre a exequente, crédito esse que pretendem ver reconhecido judicialmente, nos embargos, e aqui também, compensado com o crédito exequendo.
A questão está sobejamente tratada no direito português, no quadro do CPC em vigor até 2013, e cujo enquadramento normativo é igual ao de Macau.
Transcreve-se aqui ipsis verbis o acórdão do TR do Porto de 28.04.2014 (processo 3/09.TBGDM-A-P1 in DGSI) e por tratar da questão supra referida de forma exemplar, acórdão cujo sumário é o seguinte:
I. A compensação formulada pelo executado na oposição do crédito exequendo com um seu alegado contra-crédito sobre o exequente, não reconhecido previamente e cuja existência pretende ver declarada na instância de oposição, não é legalmente admissível.
II. O crédito invocado pelo executado, para poder ser apresentado a compensação, não pode carecer de reconhecimento judicial a efectuar nos autos de oposição.
Diz tal acórdão: «diremos que como já resulta implícito na delimitação da questão a decidir, cremos que a solução deverá ser encontrada no plano da admissibilidade da compensação formulada pelos executados com um contra-crédito sobre o exequente, não reconhecido previamente.
A compensação é, no dizer de A. Varela, o meio de o devedor se livrar da obrigação, por extinção simultânea do crédito equivalente de que disponha sobre o seu credor. Das Obrigações em Geral, Volume II, pág. 197.
Traduz-se na extinção de duas obrigações, sendo o credor de uma delas, devedor da outra, e o credor desta última, devedor na primeira. Com esta forma de extinção das obrigações, tem-se em vista evitar pagamentos recíprocos entre credores e devedores.
A compensação funda-se na reciprocidade de créditos, como resulta do artigo 847, nº 1, do CC, ao exigir, precisamente, que duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor. O crédito com o qual o declarante extingue a sua dívida é o crédito activo. É com ele que o devedor opera a extinção da sua dívida.
Por sua vez, o crédito passivo é aquele contra o qual a compensação opera. «Pode chamar-se crédito principal àquele que o compensante visa extinguir, por nele ter a posição de devedor, e contra crédito ao que ele invoca contra a outra parte, como instrumento jurídico-económico da compensação». A. Varela, ob. cit., pág. 200.
Se as duas dívidas não forem de igual montante, a compensação opera-se na parte correspondente (artigo 847º, nº 2), sendo certo que a iliquidez de qualquer delas não impede a compensação (artigo 847º, nº 3).
A declaração de compensação é um negócio jurídico unilateral, a que pode chamar-se negócio potestativo, porque, por ela, exerce-se um direito potestativo do declarante. cfr. Vaz Serra, Compensação, BMJ 31, pág. 137.
Ao alegar a compensação, os executados pretendem fazer valer um facto extintivo do direito exequendo; não pretendem reconvir, o que seria inadmissível em processo executivo.
Está aqui em causa, como se refere no recente Acórdão do STJ, de 14.3.2013, «a problemática de saber se a compensação só poderá ser invocada se o contra-crédito estiver já reconhecido e não careça de ser nos presentes autos de oposição reconhecido judicialmente ou se a mesma compensação se admite quando o contra-crédito estiver dependente na sua existência do reconhecimento judicial a efectuar nos próprios autos de execução». C. J. Acórdãos do STJ, Ano XXI, Tomo I, pág. 166 e seguintes.
A questão está muito debatida na jurisprudência e a solução que foi sendo uniformemente decidida é a de que a compensação formulada pelo executado na oposição do crédito exequendo com um seu alegado contra-crédito sobre o exequente, não reconhecido previamente e cuja existência pretende ver declarada na instância de oposição, não é legalmente admissível.
«Para efeitos de compensação, um crédito só se torna exigível quando está reconhecido judicialmente.
Este reconhecimento pode ocorrer em simultâneo na fase declarativa do litígio, contrapondo o réu o seu crédito, como forma de operar a compensação.
Na fase executiva, um crédito dado em execução só pode ser compensado por outro que também já tenha força executiva.
Donde, a compensação não pode ocorrer se um dos créditos já foi dado à execução e o outro ainda se encontra na fase declarativa (…)» igualmente, e por maioria de razão, se nem nessa fase se encontra (sublinhado e prosa nossa)
«Só podem ser compensados créditos em relação aos quais o declarante esteja em condições de obter a realização coactiva da prestação (…).
Tal crédito não é, pois, exigível judicialmente, pelo que não pode ser apresentado a compensação. cfr. Acórdãos do STJ, de 27.11.2003; de 18.1.2007; de 22.6.2006; de 14.12.2006; de 29.3.2007, in www.dgsi.pt.»
Continuando, adequando ainda a narrativa do citado acórdão ao nosso caso, diremos que, deste modo, a alegada compensação pelo valor a que a embargante se acha no direito exigir à exequente e no confronto com o crédito exequendo é manifestamente improcedente, pelo motivo de esse mesmo contra-crédito ainda não estar reconhecido, nem o poder ser nos presentes embargos. O crédito invocado pela executada, para poder ser apresentado à compensação, não podia carecer, como sucede, de reconhecimento judicial a efectuar nestes autos de oposição.
Pelo exposto, por inadmissível o fundamento invocado, rejeitam-se os embargos.
Custas pela embargante.
Registe notifique.”
A única questão colocada neste recurso é saber se a compensação formulada pela executada pode constituir fundamento dos embargos, mais precisamente, saber se um crédito (invocado pela executada para efeito de compensação) só se torna exigível quando está reconhecido judicialmente.
Vejamos.
Estatui-se no artigo 697.º do Código de Processo Civil o seguinte:
“Se a execução se basear em sentença, os embargos só podem ter algum dos fundamentos seguintes:
a) Inexistência ou inexequibilidade do título;
b) Falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da execução;
c) Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento;
d) Falta ou nulidade da citação para a acção declarativa, quando o réu não tenha intervindo no processo;
e) Incerteza, iliquidez ou inexigibilidade da obrigação exequenda, não supridas na fase preliminar da execução;
f) Caso julgado anterior à sentença que se executa;
g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento, salvo tratando-se da prescrição do direito ou da obrigação, que pode ser provada por qualquer meio.” – sublinhado nosso
Por sua vez, preceitua o n.º 1 do artigo 699.º do mesmo Código que “se a execução se basear noutro título pode o executado opor, além dos fundamentos referidos no artigo 697.º, na parte em que sejam aplicáveis, quaisquer outros que lhe seria permitido deduzir como defesa no processo de declaração”. – sublinhado nosso
Ora bem, a executada pretende operar a compensação entre o seu crédito e o crédito invocado na execução.
Entende a decisão recorrida que, como o crédito alegado pela executada ainda não está reconhecido judicialmente, a alegada compensação é manifestamente improcedente.
Como é sabido, tal questão não tem sido objecto de entendimento unânime na jurisprudência portuguesa. Salvo o devido respeito por melhor entendimento, e sem prejuízo do respeito pelas decisões citadas e proferidas sobre a questão em apreço, somos a entender que, pese embora o crédito não tenha sido reconhecido judicialmente, é admissível a compensação invocada pela executada, mormente no caso de a execução se basear em título diverso da sentença.
Melhor dizendo, consagra-se expressamente no n.º 1 do artigo 699.º do CPC que o executado pode opor, além dos fundamentos referidos no artigo 697.º, na parte em que sejam aplicáveis, quaisquer outros que lhe seria permitido deduzir como defesa no processo de declaração, como é o caso da compensação.
Ensina Viriato de Lima1, “Segundo certa tese – dominante na jurisprudência – a compensação por reconvenção só se aplica no caso de o crédito do réu sobre o autor exceder o do autor, e o réu querer a condenação do autor na diferença, pois de outra forma, trata-se de mera excepção peremptória.”
Considerando que a procedência da compensação importa a absolvição total ou parcial do pedido do autor, trata-se verdadeiramente de uma defesa por excepção peremptória.
Como bem observa Lebre de Freitas2, “Diversamente do que acontece na oposição à execução de sentença, a oposição à execução baseada em outro título pode fundar-se em qualquer causa que fosse lícito deduzir como defesa no processo de declaração, dado o executado não ter tido ocasião de, em acção declarativa prévia, se defender amplamente da pretensão do exequente. Pode, pois, o executado alegar, como fundamento de oposição, matéria de impugnação e de excepção. Mas não pode reconvir: a reconvenção, que não é um meio de defesa, mas sim de contra-ataque, não é admissível, nem no processo executivo, nem nos processos declarativos que a ele funcionalmente se subordinam.”
O professor Alberto dos Reis perfilha o mesmo entendimento3: “Desde que o título executivo não é uma sentença, o executado está perante o requerimento inicial do exequente na mesma posição em que estaria perante a petição inicial de correspondente acção declarativa; pode alegar em oposição à execução tudo o que poderia alegar em contestação àquela acção. O executado ainda não teve ensejo de se defender, porque a execução não foi precedida de acção declarativa; defende-se agora como se defenderia no processo declarativo, se tal processo tivesse corrido.”
Ora bem, é bom de ver que, ao contrário do que acontece na execução fundada em sentença condenatória, no caso de a execução se fundar em título diverso de sentença, o executado é citado pela primeira vez para deduzir oposição, pelo que faz todo o sentido o legislador lhe ter concedido meios de defesa mais amplos, a saber, quaisquer fundamentos de defesa admissíveis no processo de declaração, para além dos previstos no artigo 697.º do CPC e admissíveis na execução baseada em sentença.
E não se diga que, para efeito de compensação, o crédito invocado pela executada teria que ser reconhecido prévia e judicialmente, sob pena de lhe ser coartado um meio importante de defesa.
Em boa verdade, para que a compensação possa ser declarada, basta ser o crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material (alínea a) do n.º 1 do artigo 847.º do Código Civil).
Quanto ao sentido da exigibilidade judicial do crédito, entendem Pires de Lima e Antunes Varela4 que: “Exige a alínea a) que o crédito do declarante seja exigível judicialmente no momento em que se declara a compensação e que não proceda contra ele excepção, permptória ou dilatória, de direito material, isto é, fundada em razões de direito substantivo. O requisito da exigibilidade da obrigação afasta desde logo a possibilidade de se compensarem obrigações naturais (art. 402.º), como as resultantes de jogo (art. 1245.º), contra a vontade do devedor.”
O Acórdão da Relação de Porto, de 19.1.2010, no âmbito do Processo n.º 139152/08.8YIPRT.P1, opinou no sentido de que:
“Ora, “crédito judicialmente exigível”, na acepção do artº 847º nº1 al.a) C.Civ., está englobado na “obrigação judicialmente exigível”, ou seja, aquela que dá direito à acção de cumprimento e à execução do património do devedor, nos termos do disposto no artº 817º C.Civ. (cf. A. Varela, Obrigações, II/194, cit. in Ac.R.P. 9/5/07 Col.III/172, que o aqui relator subscreveu enquanto adjunto, sendo ali relator Henrique Araújo). A distinção que se estabelece é assim entre obrigações judicialmente exigíveis e “obrigações naturais” – artº 402º C.Civ. (“diz-se natural a obrigação quando se funda num mero dever de ordem moral ou social, cujo cumprimento não é judicialmente exigível, mas corresponde a um dever de justiça”); da mesma forma, o requisito da exigibilidade judicial afasta a possibilidade de se utilizar para fins de compensação um crédito nascido do jogo, porque este só pode saldar-se mediante o pagamento voluntário – artºs 402º e 1245º C.Civ. e P. de Lima e A. Varela, op. cit., pg. 131. Como acentua assim a doutrina, pode assentar-se em que o crédito é exigível judicialmente quando o declarante da compensação se arroga titular de um direito de crédito susceptível de ser reconhecido em acção de cumprimento – cf. Ac.R.P. 9/5/07 cit. ou Ac.R.P. 10/3/08 Col.II/172. A exigibilidade do crédito, nos termos do artº 847º nº1 al.a) C.Civ., torna-se, assim, o único requisito da declaração de compensação, sendo certo que, se invocada em acção judicial, apenas o reconhecimento judicial da compensação (a operar na sentença final) a poderá tornar efectiva.”
A nosso modesto ver, a exigibilidade judicial da obrigação não pressupõe necessariamente a existência de prévia declaração judicial de reconhecimento do crédito. A obrigação é judicialmente exigível quando o credor tem o direito de exigir em tribunal o seu cumprimento imediato, quer através de acção executiva munindo do respectivo título executivo, quer através de acção declarativa se não tiver título mas permitindo ao credor obter decisão que, reconhecendo a existência e a exigibilidade da obrigação, condene o devedor ao seu cumprimento.
No caso dos autos, a exequente intentou acção executiva contra a executada, munindo de um escrito particular.
Devidamente citada, a executada deduziu embargos à execução, alegando factos constitutivos do seu direito de crédito contra a exequente, pedindo, em consequência, que se opere a devida compensação e se julgue procedentes os embargos.
Se aceitasse o argumento de que a compensação só seria viável se se referisse a um crédito certo, seguro, e não meramente hipotético ou eventual, ou seja, um crédito já reconhecido em acção autónoma, o instituto da compensação, tanto na forma de “compensação por excepção” como na forma de “compensação por reconvenção”, passaria a ter um campo de aplicação extremamente restringido, pondo em causa, assim, o respeito pelos princípios de economia e de celeridade processuais, bem assim do da efectividade da tutela jurisdicional dos direitos, todos consagrados na lei processual civil.
Isto posto, e conforme dito acima, sendo exigível judicialmente a obrigação invocada e não se vislumbrando necessidade da existência de prévia declaração judicial de reconhecimento do crédito, com todo e mui respeito por diferente opinião, somos a entender que é legalmente admissível o crédito invocado pela executada, devendo, assim, serem recebidos os embargos.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, o Colectivo deste TSI acorda em conceder provimento ao recurso jurisdicional interposto pela executada ora recorrente A Consultoria de Engenharia Companhia Limitada, revogando a decisão recorrida para ser substituída por outra que determinará o recebimento dos embargos, devendo os autos prosseguir os seus ulteriores termos processuais, se outra razão a tal não obstar.
Custas da presente instância pela parte vencida nos autos de embargos à execução.
Registe e notifique.
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RAEM, aos 28 de Setembro de 2022
Tong Hio Fong
Rui Perieira Ribeiro
Lai Kin Hong
1 Manual de Direito Processual Civil, 3.ª edição, CFJJ, 2018, pág. 321
2 Código de Processo Civil Anotado, Volume 3.º , 2003, pág. 321
3 Processo de Execução, Volume 2.º, Reimpressão, 1985, pág. 38
4 Código Civil Anotado, Volume II , 1997, pág. 131
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Recurso Cível 482/2022 Página 9